Pokémon - Luz do Amanhecer escrita por Benihime


Capítulo 14
De volta ao lugar certo




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— Eu juro, Kyle. — Calista rosnou, finalmente cedendo à sua frustração. — Se eu não conseguir nada na próxima hora, desisto.

Kyle, o Lucario, mal ergueu os olhos da figura de madeira que esculpia. Ele e Calista estavam sentados lado a lado, com as costas apoiadas em uma grande árvore que se erguia no caminho que saía de Pallet. A única resposta que a morena recebeu dele foi um murmúrio de concordância.

— Slowpoke!

Calista parou de escrever e ergueu os olhos do laptop, surpresa, apurando os ouvidos.

— Você  também ouviu isso, Kyle? — Ela inquiriu enfim. — Até parecia ... Nah, não pode ser.

— Hey, Slowpoke! — A voz chamou novamente.

— Não pode ser ...

Então a figura finalmente se tornou visível. Mesmo usando uma enorme capa marrom com um capuz que escondia seu rosto, Calista o reconheceu imediatamente. Reconheceria aquele jeito arrogante de andar em qualquer lugar do mundo, não importando a distância ou o disfarce que ele usasse.

A  irmã de Ash rapidamente fechou seu laptop e o enfiou na mochila que estava ao seu lado, então usou o tronco da árvore como apoio e se pôs de pé. A essa altura a figura encapuzada já estava à sua frente. Ela o abraçou com tanto entusiasmo que quase o derrubou na grama. Gary riu disso, enlaçando a jovem pela cintura e girando-a no ar.

— Seu garoto bobo! — A irmã de Ash repreendeu, dando-lhe um tapinha no ombro. — Me coloque no chão!

Gary obedeceu, ainda com um sorriso bobo no rosto.

— Oi pra você também, Caly-Nite.

— Seu bobão! — A morena repreendeu. — Por que não me disse que estava vindo para casa?

— Era para ser uma surpresa.

— Bom, com certeza foi. — Ela riu de novo, jogando os braços ao redor de seu namorado mais uma vez. — É bom te ver, Gary.

O rapaz a abraçou com mais força, enterrando o rosto nos cachos negros de sua namorada, sentindo o perfume familiar de gardênia.

— Senti sua falta, Caly. — Ele confessou baixinho.

O casal se acomodou sob a árvore. Kyle lançou um olhar desconfiado ao rapaz, o que fez Calista rir consigo mesma. Ela sabia que seu Lucario ficaria com ciúmes. Ele sempre fora super protetor, mesmo quando ainda era um pequeno Riolu que acabava derrotado em todas as batalhas.

— Hey. — A morena disse depois de alguns segundos. — Cadê o Umbreon? Ele não veio com você?

— Não. — Gary respondeu. — Passei na sua casa primeiro e ele ficou por lá com a Mirabelle.

— Coitadinho. Ele vai ter sorte se a Mira não o acertar com uma Explosão Lunar direto na cara.

— E por que ela faria isso?

— Não me pergunte. — Calista deu de ombros, dramaticamente solene. — Mirabelle é assim e pronto. Ela sempre foi completamente maluca.

— Mirabelle é esquisita ... Exatamente como a treinadora dela.

A performer kantoniana revidou aquele comentário com um tapa na nuca de seu namorado. Gary, porém, foi rápido, segurando-a pelo pulso antes que ela pudesse atingi-lo e puxando-a para perto. Calista espalmou a mão livre no peito do rapaz, abrindo um sorriso de satisfação maliciosa.

Antes que a jovem pudesse reagir Gary fechou os centímetros restantes entre os dois e a beijou. Quando se afastaram, ambos estavam sem fôlego, mas o rapaz continuou próximo, sua testa apoiada contra a de Calista. Ela manteve os braços ao redor do pescoço dele, suas mãos cruzadas na nuca de seu namorado.

— Precisamos voltar, não é? — Ela inquiriu baixinho.

— É, precisamos sim.

Kyle foi o primeiro a se pôr de pé, estendendo uma das mãos para ajudar Calista. Ela revirou os olhos, mas aceitou o gesto, achando graça no fato de seu Lucario estar com ciúmes. Devagar, o trio seguiu de volta para a cidade.

— Então ... — Gary indagou, segurando a mão livre de sua namorada. — Como a tia Dehlia tem se comportado?

— Melhor. — Foi a resposta. — Ela tem me dado um tempo desde a última briga. Mas confesso que continuo esperando tudo começar de novo. É estranho as coisas estarem tão calmas.

— Você é estranha. — Ele provocou. — Precisa decidir o que quer, sabia?

— Gahaha, muito engraçado, garoto.

A morena riu, mas apenas brevemente, pois logo ficou séria e desviou o olhar de volta para o chão. O trio caminhou em silêncio por mais alguns segundos, até Calista voltar a falar.

— Gary ... A minha mãe ... Ela não ... — A irmã de Ash passou a mão livre pelos cabelos, presos em um rabo de cavalo bagunçado, em um gesto nervoso. — Eu não ...

— Não contou sobre nós dois. — Gary completou tranquilamente, quase com gentileza. — Bom, não é como se eu pudesse te culpar. Ainda me lembro o que aconteceu com aquele cara, o Johnny. E seria pior se fosse eu, porque isso tornaria tudo pessoal. Aposto que a sua mãe iria surtar.

— Exato. — Calista assentiu, aliviada por ele entender sem que ela precisasse explicar. — Ela e o seu avô ... Lembra quando ele me pediu que me tornasse sua assistente e mamãe proibiu?

— Sim, eu me lembro. Ela não só proibiu, ela surtou completamente e os dois discutiram por mais de meia hora. Foi uma confusão danada.

— Sim. — A morena respondeu pensativamente. — Eu me pergunto o motivo daquela reação ... O que será que existe entre aqueles dois?

— Esqueça isso. — Gary sugeriu, dando de ombros. — Tia Dehlia pode até não gostar, mas ela não vai me fazer mudar de ideia. Não quando eu sou louco por você desde os meus cinco anos.

A irmã de Ash sorriu, erguendo uma sobrancelha e batendo o ombro contra o de seu namorado.

— É mesmo, garoto? — Ela provocou. — Não tem medo que ela vá acabar com você?

— Claro que tenho. — O jovem riu. — Mas a única aqui que pode me fazer mudar de ideia é você, Caly. Basta dizer. Enquanto isso, por você, encaro qualquer coisa que vier. Mesmo que seja a tia Dehlia enfurecida.

O sorriso da jovem se alargou enquanto se inclinava e dava um beijo na bochecha de seu namorado. Gary podia ser um pirralho mimado arrogante quando queria, mas no fundo sempre seria um garoto doce.

Ela adorava o senso de humor daquele rapaz, ou como ele às vezes parecia capaz de ler a sua mente. Talvez por conhecê-la bem, embora Calista tivesse certeza de que era mais do que simplesmente isso. Os dois eram parecidos, espíritos semelhantes. Por isso formavam um par tão bom.

— Vamos contar para ela. — A morena disse enfim. — Nós dois. Juntos.

— Hoje não. — Foi a resposta. — Temos tempo, gata. Vamos fazer isso direito.

A irmã de Ash assentiu, reconhecendo naqueles olhos castanhos a expressão de um plano que se formava. E, se conhecia Gary bem o bastante, era alguma coisa grande.

— Cuidado com o que vai fazer, Gary. — A irmã de Ash advertiu, preocupada. — Não vá fazer nenhuma besteira.

Gary não respondeu, apenas a soltou e se afastou alguns passos, deixando uma distância casual entre eles no exato momento em que atingiam as primeiras casas da cidade de Pallet. Não muito depois Calista estava em casa, sendo recebida por sua mãe com um sorriso.

— Oi, Gary. — Dehlia disse. — Então finalmente concluiu sua pesquisa?

— Não, senhora. — O rapaz respondeu. — Só voltei por alguns dias para ajudar o vovô. Minha pesquisa ainda está longe do fim.

— Seu avô fala muito bem de você. — A mãe de Calista declarou em tom conspiratório. — Sinceramente, acho que o Sam sente falta de um parceiro de laboratório. Não que ele vá admitir isso, claro.

— Claro que não. — Gary riu. — A senhora o conhece, sabe o quanto o vovô é cabeça dura.

Calista saiu enquanto sua mãe caía na risada com aquele comentário, deixando os dois envolvidos naquela conversa. Ao passar pela sala de estar, encontrou Ash esparramado no sofá com um videogame nas mãos.

— Sério, garoto? — A morena provocou, se aproximando e dando um tapinha no topo da cabeça de seu irmão mais novo. — Não acha que já está velho demais para isso?

— Oi, mana. — Ash cumprimentou, erguendo a cabeça para lhe dirigir um sorriso cheio de malícia. — Fiquei sabendo que o seu namorado voltou. 

Os olhos da performer kantoniana se arregalaram de susto e ela olhou em volta, querendo ter certeza de que ninguém mais ouvira a provocação de seu irmão mais novo.

— Cale essa boca! — Ela sibilou. — A mamãe não sabe sobre Gary e eu, e juro que mato você se ela descobrir por causa da sua idiotice. Entendido?

Isso enfim conseguiu a atenção total do garoto moreno, que a encarou boquiaberto por longos segundos.

— Que merda, Caly! — Ash exclamou, ajustando a postura enquanto falava, encarando a irmã com absoluta surpresa. — Vocês tem que contar pra ela. A mamãe vai surtar se descobrir por outra pessoa. Quer dizer, ela vai surtar de qualquer jeito, mas ... Isso já é loucura!

— Eu sei. — Calista o interrompeu, desabando no sofá ao lado de seu irmão. — Sabemos disso, Ash. Nós vamos contar, só estamos esperando a hora certa. Precisamos de um pouco mais de tempo, só isso.

— Não sei não, mana. Você sabe como a mamãe é. Ela vai ficar furiosa por você esconder uma coisa tão importante.

— E quando foi que você se tornou tão responsável?

— Desde que você se tornou uma bobona irresponsável. Sabe muito bem que isso só vai trazer encrenca.

O tom de reprovação na voz dele irritou Calista, que encarou seu irmão mais novo com a expressão mais ameaçadora que conseguiu. A morena se inclinou, chegando perto o bastante dele para poder sussurrar sem medo de ser ouvida caso sua mãe aparecesse de repente.

— Estou falando sério, Ash. Se você sequer pensar em contar para a mamãe, juro que coloco um Electrode debaixo da sua cama e faço ele explodir. — A jovem de olhos verdes ameaçou, seu tom baixo e letal. — Melhor ainda: eu vou, pessoalmente, entregar seu Pikachu para a Equipe Rocket.

Essa última ameaça cumpriu sua função, uma vez que Ash apenas encarou sua irmã mais velha, mudo de surpresa. Duas manchas vermelhas apareceram nas bochechas do garoto, um sinal do mau gênio que os dois irmãos compartilhavam.

— Você não faria isso. — Ele sibilou em resposta. — Não se atreveria!

— Me dê um motivo. — A morena rebateu impacientemente. — Sou uma mulher de palavra, pirralho. Quando foi que fiz uma ameaça que eu não podia cumprir?

Ash estremeceu involuntariamente, soltando um pequeno arquejo de ultraje. Sabia que Calista tinha razão.

Ela apenas continuou a encará-lo de braços cruzados, seus olhos verdes tão brilhantes que pareciam prestes a fulminá-lo com raios a qualquer instante.

— Está bem, você venceu. — O rapaz mais novo cedeu enfim, derrotado. — Vamos manter segredo. Prometo.

— Ótimo! — Calista relaxou, sorrindo e bagunçando o cabelo de seu irmão mais novo. — Ei, Ash, por acaso você viu a Mira?

— Lá em cima, no seu quarto.

Calista subiu para dar uma olhada na sua pokemon e a encontrou enrodilhada sobre sua cama, dormindo a sono solto. Umbreon estava ao lado dela, envolto nas fitas azuis da pokemon tipo Fada e também dormindo pesadamente.

Bem devagar, a irmã de Ash desceu novamente e chamou Gary para ver a cena. O jovem pesquisador pokemon riu ante a visão do novo casal.

— Eu não disse? — O rapaz provocou, abraçando Calista por trás, seus braços se enrolando ao redor daquela cintura fina. — Perdeu a aposta, Caly.

— Quando foi que apostamos? — Calista rebateu beligerantemente, sem se virar para olhá-lo, porém se apoiando contra o peito de seu namorado. — Eu não me lembro de aposta nenhuma.

— Que conveniente. — Gary zombou, puxando-a para mais perto. — Agora você vai fingir que esqueceu para poder se dar bem. Isso é trapaça.

— Certo. — O suspiro dramático da irmã de Ash se misturou a uma risada enquanto ela virava para olhar seu namorado nos olhos. — Você me pegou. O que vale?

O neto do professor Carvalho fingiu pensar por um momento e então sorriu maliciosamente, com a expressão mais deslavada do mundo.

— Um beijo. — Ele respondeu simplesmente, sem sequer hesitar.

A surpresa foi tanta que Calista inconscientemente recuou um passo, arquejando audivelmente. Gary, cujo braço esquerdo ainda envolvia a cintura da jovem, sentiu sua mão deslizar, descansando contra a base da coluna da morena.

— Aqui?! — A irmã de Ash exclamou em um sussurro sibilado. — Ficou maluco, garoto?

— Vamos, Caly-Nite, você sabe muito bem que gostou da ideia.

— Ash tem razão, sabia? — Ela rebateu, se divertindo com a confiança arrogante do rapaz. — Você é um tremendo babaca.

— Mas você gosta de mim mesmo assim.

Calista riu, seu sorriso adquirindo um quê de malícia enquanto a mão de Gary firmava a pegada em suas costas, puxando-a para perto e prendendo-a. Ela espalmou ambas as mãos no peito do rapaz, bem devagar, apenas para provocá-lo.

Foi ele quem tomou a iniciativa, firmando sua nuca com a mão livre, enrolando os dedos entre seus cachos negros e se inclinando para beijá-la.

Calista, rápida, virou o rosto, e seus lábios meramente roçaram a bochecha do rapaz, enquanto o beijo dele se perdia entre seus cabelos. Ela se inclinou, usando as mãos para se apoiar enquanto sussurrava no ouvido de seu namorado:

— Achou mesmo que seria assim tão fácil?

Gary ouviu a risada sussurrada da jovem enquanto ela se afastava, um som macio e sensual que lhe causou arrepios. Ao erguer os olhos, recebeu um sorriso brincalhão.

— Que?! — Ele exclamou enfim. — Não é justo, Caly. Isso foi muita maldade!

— Você disse um beijo, não que tipo de beijo. A culpa é toda sua. Da próxima vez ... Não peça. Aja.

O sorriso sumira. Ela agora o encarava com seriedade, embora aqueles olhos verdes brilhassem com pura malícia. Calista o estava provocando, desafiando Gary a levar a cabo o que ela acabara de dizer e roubar-lhe um beijo ali mesmo, naquele instante.

Ele teria mesmo aproveitado a oportunidade, se Dehlia não os tivesse chamado naquele exato momento. Por sorte, ela apenas queria saber se Gary gostaria de ficar para tomar café.

— Não, obrigada. — Ele respondeu em voz alta, já descendo as escadas. Calista o acompanhava de perto, apenas alguns passos atrás. — É melhor eu ir, o vovô está esperando. Tchau, senhora Ketchum. Tchau, Caly.

— Não precisa ser formal, Gary. Pode me chamar de tia Dehlia, como sempre fez. — A matriarca dos Ketchum rebateu. — E até mais. Mande um olá ao Sam por mim.

— Pode deixar. — O rapaz respondeu. — Vou chamar o Umbreon.

— Não precisa. — Calista protestou, um plano já se formando em sua mente. — Deixe-o dormir. Amanhã de manhã eu o levo de volta para o laboratório.

— Isso mesmo. — Dehlia concordou. — Não será problema nenhum para nós, Gary.

— Tudo bem, então. Obrigada.

— Não por isso, querido.

Calista acompanhou o rapaz até a porta. Antes de sair ele discretamente se virou para a morena e sussurrou:

— Deixe a janela aberta hoje à noite. Eu tenho uma surpresa para você.

Os olhos dela brilharam de malícia e deleite com aquelas palavras. Gary, de alguma forma, conseguira antever seus planos e adiantar-se a eles.

A morena estendeu uma das mãos, descansando-a no ombro do rapaz, então se inclinou para lhe dar um beijo na bochecha, como fizera tantas vezes quando eram mais novos. Teria sido um gesto puramente fraternal, não fosse o fato de que Gary a sentiu chegar um pouco mais perto do que o necessário.

Por um breve momento o neto do professor Carvalho sentiu o corpo de sua namorada pressionado contra o dele e foi envolvido por uma aura de perfume floral, então ela se afastou com a expressão mais inocente do mundo e um sorriso doce como mel.

A irmã de Ash demorou um segundo a mais do que o necessário para fechar a porta, prolongando o contato visual. Os dois trocaram olhares de antecipação. Mal podiam esperar para que a noite chegasse.

Horas mais tarde, uma batida soou na janela, acordando Calista de um sono leve. A morena sentou-se na cama, sorrindo para a figura sombria que lhe acenava do outro lado do vidro. Mesmo na escuridão, o sorriso de Gary era visível.

Uma vez que a janela só abria por dentro, ela afastou as cobertas, se pôs de pé e foi abri-la para o rapaz. Ele se empoleirava em um galho da árvore que crescia logo abaixo, um de seus braços segurando algo contra o corpo com firmeza, uma coisa que matinha coberta com sua capa.

Calista estendeu uma das mãos, arqueando a sobrancelha como se o desafiasse a pegá-la. Gary riu silenciosamente, aceitando a ajuda de sua namorada.

Uma vez dentro do quarto, depositou com cuidado o objeto que carregava sobre a antiga escrivaninha de madeira, mantendo-o coberto com sua capa. Só então voltou-se para Calista, passando um braço pela cintura dela e puxando-a para si. A jovem se aninhou de boa vontade em seus braços, quente e ainda exalando aquele perfume de flores.

— Tão misterioso. — Ela provocou, livrando-se do abraço e se jogando na cama com um gesto gracioso, os olhos verdes brilhando na semiescuridão como os de um Liepard. — O que você está tramando, garoto?

Gary abriu um sorriso malicioso e se inclinou sobre Calista, apoiando uma mão de cada lado do rosto da namorada. Ela não tentou levantar. De fato, ela nem se moveu, o que o neto do professor Carvalho encarou como um desafio.

Chegue mais perto. Aquele olhar malicioso parecia dizer. Se é que você se atreve.

— Talvez isso. — Ele respondeu enfim, se inclinando para dar-lhe um beijo no canto da boca. — Ou isso ...

Os lábios dele desceram um pouco mais, roçando-lhe a jugular. Calista sorriu, apreciando a atitude, mas o empurrou e voltou a sentar-se na cama.

— Já falamos sobre isso, não foi? — Sua voz era quase um ronronar. — Não me provoque, Gary-Ados.

— Você mesma disse ... — Gary rebateu. — Quando eu quiser um beijo, é melhor agir.

— Você aprende bem rápido, huh?

— Ah, você não faz ideia.

Dessa vez ele a beijou de verdade. Uma das mãos dela agarrou sua camisa, puxando-o para mais perto. Despreparado para aquele gesto, Gary caiu por cima de Calista. A morena riu contra seus lábios, sem interromper o beijo.

Ele tomou aquilo como consentimento, envolvendo a cintura dela com os dois braços e traçando uma linha de beijos por seu pescoço, até chegar-lhe ao colo, parando onde o decote da camisola dela começava. Foi recompensado pelo gesto com um arquejo de surpresa, que logo se transformou em suspiros de prazer.

— Pare de bobagem! — Ela sussurrou, seus braços envolvendo-o pelo pescoço. — Se minha mãe entrar aqui e nos vir, ela vai nos matar.

— Duvido muito. — Gary riu, plantando um beijo na base da garganta de Calista. — Se te conheço direito, trancar a porta foi a primeira coisa que você fez.

Touché. — Ela riu, admitindo a verdade naquela declaração. — Mas é melhor pararmos. Sério.

Só pelo tom dela, Gary sabia que Calista não falava sério realmente. Ou pelo menos não tanto quanto gostaria. Ele resolveu provocá-la ainda mais, mordiscando-lhe de leve o lóbulo da orelha.

— Ou o que, Caly? — Sussurrou, vendo os arrepios surgirem na pele dela.

— Ou ... Não vou mais beijar você. Nunca mais.

— Ok, ok, parei. — O rapaz riu, fazendo uma careta de pavor fingido ao se afastar, deitando ao lado de sua namorada.

Ela riu baixinho e deitou ao seu lado, com a cabeça em seu peito. Gary passou um braço pelos ombros dela, enquanto sua mão livre brincava com aqueles cachos negros. Nenhum dos dois falou nada por longos minutos.

— Caly ... — Gary enfim quebrou o silêncio. — Sobre aquilo ... Eu quero falar com sua mãe primeiro. Quero mostrar a ela que não estou brincando quando digo que gosto de você.

— Tem certeza?

— Claro. Eu até já planejei tudo.

— Não, não isso. — Ela ergueu o rosto para encará-lo, apoiando a cabeça em uma das mãos. — Tem certeza de que isso é sério? Nós dois, quero dizer.

— Claro que é sério. — Foi a resposta. — Caly, sou louco por você desde que eu era criança. Até já falei com o meu avô, ele vai me ajudar.

— Perfeito! — A jovem performer sorriu. — Seu avô é a única pessoa que minha mãe cabeça dura ouve. Boa ideia, garoto.

— Só espero que ela não fique muito furiosa.

— Está brincando? — Calista deu uma risadinha, divertindo-se ao imaginar a cena. — Ela vai cuspir fogo, comer você vivo, caçá-lo até o fim do mundo ...

— Tá, eu já entendi. — O rapaz exclamou, rindo. — Sua mãe sempre me apavorou, sabia?

— É, eu sei. Ela é mais assustadora do que um Gyarados furioso.

Calista pôde ouvir a risada de Gary reverberar pelo peito do rapaz em resposta àquela piada boba.

— Hey Caly ...  — Ele chamou após mais algum tempo em silêncio. — Se eu te convidasse para ir comigo a Alola, você aceitaria?

A jovem nem se deu ao trabalho de erguer a cabeça para olhá-lo dessa vez, seus dedos brincando distraidamente no peito de Gary, traçando desenhos erráticos sobre a camisa do rapaz.

— Sim, claro que eu aceitaria.

— Ótimo, então partimos em uma semana.

Isso atraiu sua atenção. A morena se livrou do braço que envolvia seus ombros frouxamente, rolando para o lado e sentando-se na cama para encarar Gary, surpresa.

— O que?! — Ela exclamou num sussurro incrédulo. — Está falando sério?

Gary não se moveu, simplesmente se acomodou mais confortavelmente e lhe abriu um sorriso, cheio de si.

— É claro que estou.

Os olhos verdes dela se arregalaram ainda mais, enquanto uma centelha de prazer os iluminava.

— Pensei que fosse uma piada!

— Mudou de ideia?

A pergunta foi parte provocação, parte advinda de uma preocupação sincera. Gary havia planejado aquilo tudo há semanas, nem sequer considerara a possibilidade de Calista dizer não, e se amaldiçoou em pensamento por ter sido tão idiota.

— Claro que não! — Ela garantiu, agora mais gentilmente. — Eu vou com você.

— Certo. — Ele sorriu, aliviado. — Você vai adorar Alola, Caly! É uma região incrível!

Calista se permitiu mais um pequeno sorriso enquanto voltava a se acomodar com a cabeça no peito de seu namorado. O jovem passou um braço por seus ombros mais uma vez, puxando-a para mais perto.

— Me conte como é lá.

— Vou fazer melhor do que isso. — Gary prometeu. — Vou tirar uma folga e te mostrar tudo.

— Parece uma ótima ideia. Era essa a sua surpresa?

— Parte dela. Por que? Não gostou?

— Eu adorei!

Os dois continuaram deitados juntos, abraçados, conversando em sussurros por um longo tempo. Calista adormeceu sem sequer perceber. Gary sorriu ao vê-la dormindo. Ela parecia mais nova, ele quase podia ver a adolescente rebelde que aquela mulher fora um dia.

Devagar, com cuidado para não acordá-la, o rapaz se desvencilhou dos braços dela e acomodou-a mais confortavelmente na cama, puxando os cobertores até seus ombros.

Ao se dirigir para a janela, lançou um último olhar por cima do ombro, hesitando por um momento antes de tomar sua decisão e voltar para o lado dela. Calista entreabriu os olhos, encarando-o por entre pálpebras semicerradas de sono. Um pequeno sorriso curvou-lhe os lábios.

— Não é nada cavalheiresco sair desse jeito, Gary-Ados. — Ela provocou, sua voz ligeiramente rouca por causa do sono.

— Nunca fui um cavalheiro. — Ele rebateu. — Você mesma disse: sou um babaca.

Mas ela não protestou quando Gary se inclinou para beijá-la mais uma vez. Pelo contrário, aqueles braços perfumados o envolveram e o puxaram para mais perto.

O rapaz se deixou ir, perdendo-se naqueles lábios. Sabia que poderia ser uma encrenca gigante caso fossem descobertos, mas não se importava. Seu lugar era ao lado dela, pelo menos naquela noite. E, se dependesse de Gary, em muitas outras mais.

Na manhã seguinte Calista abriu os olhos bem devagar, com as pálpebras ainda pesadas de sono, enquanto uma de suas mãos se estendia em uma busca inconsciente. Ao seu lado encontrou apenas lençóis vazios aquecidos por um raio de sol que entrava pela janela aberta. Gary já havia saído. Calista suspirou pesadamente. É claro que ele não poderia ficar.

Ela sentou-se devagar, ainda lânguida e com uma rara sensação de paz, seus lábios esboçando um sorriso ao lembrar da noite anterior. Há anos não se sentia tão segura, e talvez nunca na vida tivesse se sentido tão absolutamente adorada.

Correndo os olhos pelo quarto, seu olhar se deteve sobre a escrivaninha. Gary havia deixado ali o objeto misterioso que trouxera na noite anterior, e um sorriso iluminou o rosto da morena quando se deu conta de que era um ovo pokemon.

Curiosa, pôs-se de pé para vê-lo mais de perto. Um bilhete estava preso sob a incubadora do ovo, onde se lia simplesmente "surpresa". Calista não conteve uma risada com aquela piada boba.

— Caly. — Ash chamou, batendo de leve na porta ao passar correndo. — Anda, mana, café da manhã. Mamãe te chamou há mais de meia hora.

— Já vou, seu pirralho irritante.

A morena substituiu a camisola que usara para dormir por jeans e camiseta, prendendo o cabelo em um rabo de cavalo e saindo rapidamente do quarto. De bom humor, saltou os dois últimos degraus da escada e caiu com um baque sobre sua perna boa, dando um enorme susto em sua mãe.

— Calista Ketchum! — Dehlia repreendeu da cozinha. — Quantas vezes vou ter que dizer para não fazer isso, sua menina levada?

— Menina levada? — A jovem performer rebateu, rindo. — Sério, mãe? Quantos anos acha que eu tenho, onze?

— É o que parece.

— Caramba, a senhora sabe mesmo ser má! — A  morena provocou ao entrar na cozinha. — Bom dia, mãe.

— Bom dia. — Dehlia riu, apesar de ainda tentar parecer zangada com as travessuras de sua filha mais velha. — Por que tanta pressa, meu bem? Caiu da cama?

— Não, nada disso. — Calista sentiu suas bochechas esquentarem e tentou esconder o rubor entre seus cachos negros. — Eu só estava pensando ... Que é melhor levar o Umbreon de volta logo depois do café da manhã.

— Boa ideia. — Sua mãe concordou, lhe dirigindo um sorriso travesso ao lhe entregar um prato de ovos com bacon. — Mas alguma coisa me diz que não vai ser necessário.

— Huh? — Calista inclinou a cabeça, e encarou sua mãe, confusa. — Por que a senhora acha isso?

— Coma antes que os ovos esfriem. Vamos esperar e ver se estou certa.

Calista deu de ombros e obedeceu. Dehlia estava de bom humor naquela manhã, então as duas se demoraram à mesa, conversando descontraidamente. Mais ou menos meia hora mais tarde, ouviram uma batida na porta.

— Eu atendo. — Havia um tom divertido na voz de Dehlia, e ela parecia estar contendo um sorriso. — E, se precisar de alguma coisa, vou estar lá fora cuidando do jardim.

A jovem assentiu e, pouco depois, Gary entrou na cozinha.

— 'Dia, Caly.

O sorriso dele foi caloroso, assim como havia sido na escuridão de seu quarto na noite anterior.

— Bom dia. — Ela retribuiu, sorrindo de volta. — Dormiu bem?

— Como um bebê. E você?

— Não me lembro de dormir tão bem há muito tempo. — A irmã de Ash lhe dirigiu uma piscadela travessa. — Quer café? Ainda está quente.

— Quero sim. Obrigado.

Calista se pôs de pé e pegou uma xícara no armário, que encheu até a borda com café e entregou para Gary. O rapaz tomou um gole, inconscientemente girando e se apoiando na bancada, espalmando a mão livre sobre a superfície de metal para manter o equilíbrio.

A morena pôde visualizá-lo claramente no laboratório, tomando café durante um intervalo em uma tentativa de se manter acordado.

— Huh? Que foi, Caly? — O jovem pesquisador pokemon olhou para a xícara de café e então corou ao compreender, abrindo um meio sorriso constrangido. — Ah, desculpe. Velhos hábitos.

Calista sorriu com carinho. Estava acostumada a pensar em Gary como um garotinho, o irmãozinho de sua melhor amiga de infância. Mesmo que essa visão obviamente houvesse se modificado, ainda estava lá de certa forma, e era bom ser lembrada do jovem em que aquele garotinho se tornara, e do homem que ele viria a ser.

— Está tudo bem. — Ela declarou com um leve dar de ombros. — Não me importo. Na verdade, acho até meio ... Charmoso.

Ele não deu atenção à provocação embutida nas palavras dela, apenas se limitou a tomar outro gole de sua bebida. Os dois terminaram de beber seus cafés em silêncio. Ainda sem falar, Gary lavou as duas xícaras e as deixou no escorredor. Força do hábito, é claro.

— Lembra quando eu era criança e vinha dormir aqui? — Ele indagou, seu tom quase nostálgico. — O vovô estava sempre tentando fazer Ash e eu nos darmos bem.

Calista riu consigo mesma, lembrando-se daquela época.

— Está aí uma batalha que já começou perdida. Vocês dois nasceram rivais.

— É, pode apostar. Falando nisso ... Por onde anda aquele bobão?

— Treinando. Ash tem saído cedo todos os dias.

— Ele sempre se esforça o máximo que pode. — Gary admitiu, sua voz denotando algo que Calista não esperava: respeito. Talvez até uma pontinha de admiração. — Mas tenho que admitir: se não fosse pelo Ash, eu não estaria onde estou hoje. Foi por causa dele que me esforcei tanto, porque queria estar sempre um passo à frente. Provar que era melhor do que ele, sabe?

A morena assentiu. Conhecia bem aquele sentimento. Por um breve segundo seus pensamentos se voltaram para ela, a única pessoa que conseguira despertar seu lado competitivo. A única pessoa no mundo que já sentira vontade de não apenas superar, mas esmagar completamente, e acabara por não conseguir vencer.

— Bem ... Você conseguiu. — Ela disse delicadamente. — De certa forma, pelo menos.

— Nah, aquilo era coisa de criança. Demorei pra entender, mas finalmente percebi que não existe competição. Ash e eu somos bons em coisas completamente diferentes. — O neto do professor Carvalho abriu um sorrisinho arrogante. — Não que eu não seja um treinador dez vezes melhor do que ele, é claro.

— Ora, ora, ora, alguém amadureceu. — Calista declarou, bem humorada. — Falando nisso, você devia me contar sobre a sua jornada alguma hora dessas. Eu adoraria ouvir tudo.

— Quem sabe? — Gary respondeu, seus olhos subitamente se desviando para o chão em uma onda inesperada de timidez. — Então ... Sobre sua mãe ... Quero falar com ela. Hoje à tarde. Só ... Por favor, me prometa que não vai ficar para ouvir.

Isso a pegou de surpresa. Calista se recuperou logo, cruzou os braços e o encarou com uma sobrancelha erguida, provocando-o com um olhar e um sorriso malicioso.

— Por que? —Inquiriu. — Que segredo está escondendo?

Os olhos do rapaz se arregalaram de choque, mas Gary se controlou rapidamente antes que sua namorada notasse qualquer coisa.

— Quem disse que tem um segredo? — Ele rebateu, disfarçando seu nervosismo com impaciência. — Só ... Me deixe fazer isso direito, Caly. Por favor.

— Está bem. — Ela cedeu, embora um tanto contrariada. — Vou estar fora hoje à tarde, até o anoitecer. Tem minha palavra. E, seja lá o que vai fazer, é melhor fazer direito, ouviu?

— Pode deixar, Caly. Não vou te desapontar nessa ... Eu espero.

A irmã de Ash relaxou, abrindo um sorriso encorajador.

— Aposto que não vai, mesmo.

Um pouco depois disso Gary chamou seu Umbreon e os dois voltaram para o laboratório.

Calista tentou agir como se fosse apenas mais um dia normal, mas passou o tempo todo sentindo borboletas se agitarem em seu estômago, mesmo quando saiu para passar o dia vagueando com Mirabelle e Cinnamon. A sensação de nervosismo a fez lembrar de sua primeira vez como Coordenadora Pokemon em Hoenn, quando entrara em pânico e acabara fazendo tudo errado. Sinceramente esperava ter superado essa tendência.

Gary também estava longe de estar calmo. Ele andava de um lado para o outro no laboratório de seu avô, incapaz de se concentrar em qualquer coisa que não fosse a tarefa que o aguardava.

— Vovô ... O senhor tem certeza? — O rapaz inquiriu, erguendo os olhos de um documento que lia no computador. — Quero dizer ... Certeza de que ela vai aprovar?

— Eu conheço Dehlia. Ela vai ficar zangada, mas vai aceitar. Se você realmente estiver sendo honesto. Tem certeza sobre tudo isso, Gary?

— Tenho. — Foi a resposta, dada sem a menor hesitação. — Eu amo Calista.

O professor Carvalho ergueu o rosto, com um sorriso se formando em seus lábios.

— Foi o que pensei. — Ele disse. — Ela é incrível, não é?

— A mulher mais incrível de todas. — Foi a resposta. — Nunca conheci ninguém como ela.

— Então lute por ela. — O homem mais velho aconselhou. — Não deixe a mulher que você ama escapar por entre seus dedos, como eu fiz.

— O senhor?!

— Isso não importa. — A resposta foi firme, encerrando o assunto. — A questão é: você está pronto?

— Estou.

— Mais uma coisa: você sabe que o pai de Calista era o meu melhor amigo, não sabe?

— Sei. E daí?

— E daí que, quando ele desapareceu, prometi protegê-la. Considero Calista parte de minha família tanto quanto você ou Daisy. Se a magoar, vai ter que se entender comigo. Entendido?

— Sim, vovô.

— Ótimo. — O professor sorriu mais uma vez, seu olhar agora demonstrando aprovação. — Então boa sorte, meu neto.

Gary saiu do laboratório com Umbreon caminhando ao seu lado, coração batendo loucamente e a mão esquerda segurando firmemente a caixinha em seu bolso.

Quando Calista voltou para casa, já ao anoitecer, Dehlia a esperava sentada no sofá, de braços cruzados e expressão sombria. Ela se pôs de pé ao ver sua filha mais velha entrar.

— Gary esteve aqui hoje à tarde. — Anunciou sem preâmbulos.

A morena hesitou, pega de surpresa. Não esperava que sua mãe fosse ser tão direta. Algo naquela atitude impediu que reagisse na defensiva como normalmente faria, e Calista se viu procurando as palavras certas para dizer.

— Mãe, eu ...

— Não tente explicar. — A interrupção foi firme e exigente. — Por que não me contou, Calista?

A irmã de Ash sentiu um aperto no peito ante o tom de mágoa na voz de sua mãe. Mas não havia como negar ou voltar atrás, e Calista estava cansada de tentar fingir que o passado não acontecera. Pela primeira vez, diria o que realmente pensava, e não para usar a verdade como uma arma, mas porque sabia que mereciam aquela chance. As duas precisavam desesperadamente daquilo.

— Está mesmo me fazendo essa pergunta, mãe? — Desafiou, se esforçando para manter qualquer sinal de rispidez longe de sua voz e falhando miseravelmente. — Depois de tudo o que aconteceu ... Eu não achei que a senhora entenderia.

Dehlia voltou a sentar no sofá, sua expressão toldada por tristeza e arrependimento tão profundos que Calista sentiu pena dela. A jovem lembrou-se das semanas intermináveis após o desaparecimento de Liam, quando via aquela mesma expressão nos olhos de sua mãe. Por um momento Calista se sentiu novamente  como uma garotinha confusa, tentando encontrar um modo de aplacar o sofrimento de sua mãe.

— Que tipo de monstro você acha que eu sou, afinal?

A pergunta em voz baixa quebrou o transe. Ainda hesitante, Calista sentou-se ao lado de sua mãe. As duas ficaram sentadas juntas em quase total silêncio, quebrado apenas pelos soluços suaves de Dehlia, enquanto a sala mergulhava na escuridão.

Todos esses anos de ausência ... Todas as brigas ... Calista finalmente percebeu, uma realização tão óbvia que a performer kantoniana ficou surpresa por não ter sabido desde o começo. Eu não fui a única que saiu ferida.

— Me diga uma coisa. — Sua mãe disse enfim, quebrando o longo silêncio. — Você o ama?

— Sim, mãe. Eu amo Gary. Claro que sim.

Dehlia conhecia sua filha bem o bastante para reconhecer a incerteza na voz dela, mas preferiu não comentar nada. Deixaria que ela descobrisse por si mesma.

— Então não vou me opor. — Declarou simplesmente. — Sei que perdi esse direito há muito tempo. E, mesmo que eu quisesse ... Não faria diferença, não é?

— Não, mãe. — Mas, mesmo sob a amargura, Calista sabia que aquilo não era completamente verdade. — Não faria.

— Como eu pensava. — Isso foi dito com um suspiro de derrota, um suspiro trêmulo pelas lágrimas. — Caly, eu ... Cometi muitos erros com você, minha filha. Acredite ou não, quero consertar as coisas. Estou fazendo o melhor que posso.

— Sei disso, mãe. — A morena afirmou gentilmente. — Eu ... Eu só não sei direito como agir. É tão estranho ... Depois de tanto tempo.

— Eu entendo. — Dehlia esboçou um pequeno sorriso. — Ouça, Gary me contou sobre Alola. E quero que você vá com ele.

— Mas mãe, eu ...

— Não. Apenas vá, está bem? Você merece isso. Seu pai ... Ele estaria feliz, sabia? Sobre você e Gary. — Dehlia abriu um sorriso nostálgico, seu olhar perdido por um momento em algum lugar do passado. — Então ... Se isso importa ... Vocês tem minha benção.

Calista não pôde acreditar no que ouvira. Por um momento apenas ficou imóvel, sem se atrever sequer a respirar, com medo de quebrar qualquer que fosse o encanto lançado.

Com um arquejo sufocado e lágrimas correndo livremente pelo rosto, a morena jogou os braços ao redor de sua mãe num abraço apertado e impulsivo.

— É claro que importa. — Calista garantiu, ouvindo sua própria voz tremer. — Importa muito. Obrigada ... Mamãe.

Os olhos de Dehlia se encheram de lágrimas. Há muito, muito tempo não era chamada daquela forma. Havia quase esquecido como aquela palavra soava.

A mulher mais velha hesitou por um momento, mas enfim passou o braço livre pela cintura de sua filha, abraçando-a com a mesma força com que a jovem a abraçava.

Naquele momento, as duas sentiram: uma parte do que quer que estivesse quebrado entre elas, uma pequena parte, encaixando novamente no lugar certo. Sendo reparada.


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