A Primeira Cor do Céu escrita por JMBLUEBUBBLE


Capítulo 2
Calanta Cromwell


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/778112/chapter/2

É como pegar fogo.

         Não no bom sentido; no péssimo mesmo. O fogo... te consumindo de dentro para fora. Começa no seu coração... depois vai até a garganta e depois sobra a sua cabeça para ter que aguentar tudo o que aconteceu. É horrendo. Seus olhos ardem como nunca arderam antes e sua vontade, a de que tudo acabe bem, é destruída aos poucos. A angústia... Depois de um tempo, você deseja que aquilo tudo acabe, bem ou mal. Aí, quando acaba…

        É como se afogar.

        Você sabe o que está acontecendo. Não é bobo. Você tenta e tenta…. Mas parece que toda aquela agonia nunca acabará. Sente que não aguenta mais... sente-se pesada e parece que vai explodir. Então você não suporta... A água que antes ardia nos seus olhos chegou a seu peito. Não para; mas sabe que vai parar alguma hora, mas ela parece tão distante... você tenta se concentrar em algo, mas sabe que vai morrer e tudo a sua volta é uma imensidão azul... tão igual, mas tão diferente... E quando pensa que a ardência chegou ao seu máximo; a pressão te pega.

         Abro meus olhos para o mundo e aproveito para encarar o triste teto de meu quarto.

         – Ela está muito mal – Ouço eles dizerem atrás da porta.

         É melhor não dar bola. É claro que não sabem muito o que dizer.

Caramba, é incrível como basicamente tudo é azul neste quarto. Eu gosto de azul, mas já está enjoando. Sempre preferi laranja, mas ninguém se importa mesmo...

— Chamamos um médico? – Dessa vez é minha mãe. É possível ouvir em sua voz o cansaço e a dor. Acho que ninguém está sofrendo mais que ela.

         Um silêncio horrível desperta no ar. Que droga... me afundo no colchão e finjo dormir.

         – Vou vê-la. Não diga nada. – Minha mãe se pronúncia. Começo a contar.

         1... 2... 3... Toc, toc, toc.

         – Calanta? – Surpreendentemente, eu me assusto. Talvez eu esperasse a voz normal dela. Suave e aveludada. Ela está bem acabada. Como disse, não faz sentido.

         Antes que eu pudesse dizer “VAI EMBORA, MÃE!” o mais educado possível, ela entra. Solto um suspiro.

          — Calanta – Ela vem andando com classe até mim.

         Analiso-a cuidadosamente como se ela não fosse minha mãe, o que claro, era doideira. Ela é minha mãe. Basta ver seus cabelos e a cor dos olhos para não duvidar, se bem que dizem que tenho a fisionomia de Antônio.

         – Como está se sentindo? – Ela se agacha ao meu lado na cama e me ajuda a sentar.

         – Eu estava tentando dormir – Respondo. Tento inutilmente escapar de sua mão enorme que tenta me apalpar o rosto inteiro.

         – Calanta, me deixe ver! – Ela se enfurece. Bufo e reviro os olhos. Mamãe suspira. – Isso tudo é ridículo!

         Antes que eu pudesse lhe pedir pra se retirar, George, meu padrasto, grita do lado de fora:

         – É MELHOR SE APRESSAR!

         – O quê? – Ela parece estar em uma briga dentro de si entre contar o que está acontecendo e jogar tudo para os ares e começar a chorar, então ela começa a apalpar o meu maravilhoso lençol de flores... azuis! Olha que surpreendente.

          – Calanta, filha… Eu preciso que se arrume. Pra agora. Olha o quanto é… bem, essa não é você – Ela aponta para mim. – E quem diria! Está chorando!

         Ela diz como uma reprovação. Concordo. Eu não gosto de chorar. Odeio. Me da agonia só de pensar. Aquela água salgada... me da repulsa. Odeio chorar pois mostra que sou mais fraca do que realmente sou, na minha humilde opinião. Por esse motivo, eu as limpo antes mesmo de sair do olho. Faz tempo desde que alguém me viu chorar mas agora, simplesmente veio  como que para compensar este tempo em que fiquei sem uma lágrima escorrendo. 

         – Mãe – Começo, fungando e limpando meu rosto. Via seu olhar esperançoso, como se eu realmente fosse seguir o que disse. – Eu não vou sair daqui.

         Imediatamente seu rosto esperançoso se desmancha. Quase ri. Quase.

         – Calanta... – Eu podia ver as suas rugas, suas marcas de cansaço... tão linda..., mas tão quebrada.

         Ela me analisa cuidadosamente. Eu já estava melhor. Funguei mais umas 5 vezes. Pronto. Melhor. Nada mais de chorar.

         – Okay. ­– Ela suspira e me encara. Eu não queria retribuir, mas ela estava apertando meu queixo, me forçando a prestar a atenção em tudo o que disser. – Saiba que foi muito mal-educada lá em baixo... E não! Nem venha dizer que a culpa é minha por não te educar direito. Eu te conheço. Isso você herdou de seu pai.

         Sinto uma dor no peito. A pressão... O fogo... A vontade de chorar... vejo o mesmo em minha mãe.

         – NUNCA. Eu disse: nunca. Nunca mais me desobedeça! Quem te autorizou a atender o telefone? Não… e como se não bastasse ainda desliga na cara do senhor. – Ela suspira novamente. – Fiquei envergonhada. Tive que terminar a conversa!

         Ahhh... agora vinha o olhar. Aquele olhar. O de cachorro abandonado. Okay... Okay. Eu mereço, não devia ter feito aquilo. Mas já foi! Já era! PUFF! Dava para ver que mamãe não gostou nada de ter que falar com o cara e nem eu. Vamos combinar: ele é um babaca! Eu nunca  havia o visto antes. Eu nem sei direito quem ele é! Primeira vez que falo com ele e olha o que me diz...

         Mordo o lábio inferior.

         Isso não aconteceu... Não aconteceu...

         “Calanta Cromwell? É a senhorita mesmo? Sinto dizer... seu pai morreu nesta madrugada, provavelmente entre 3 e 5 horas. Eu... sinto muito.”

          O que aquele cara queria? Nunca vi mais gordo e já acha que pode simplesmente ligar na minha casa e já dar uma notícia dessas? Está enganado.

         Não aconteceu, não aconteceu...

         Sinto o fogo voltar a queimar intensamente em minha garganta.

         —... Bem, é por isso que não deixamos você atender aos telefones  – Volto a prestar atenção à conversa. Minha mãe joga os braços pro ar... Estava chorando.

         – Bom... Sabe que não é verdade. – Digo em relação aos telefones. Era verdade. Sou e sempre fui proibida de atender aos telefones de casa. Nem pergunte, eu não sei porquê, mas aquele motivo não é! – Desculpe, não queria atender, mas...

— Nunca mais me desobedeça – Ela enxuga as lágrimas. Será que ela sabe mesmo o que aconteceu? – Agora, vá! Se arrume. O quanto antes você sair melhor pra todos...

Opa...

— Mãe? – Chamo. Ela já estava na porta. Não a encaro.

— Sim?

— Pode repetir o que disse?

         Ela me olha desnorteada. Por 2 minutos inteiros fica me encarando com suas sobrancelhas franzidas e então algo dentro dela deve ter se iluminado porque de repente ela estava correndo até mim com as mãos erguidas como se quisesse me esganar.

         Antes que eu pudesse correr ela já estava me agarrando e me empurrando para a cômoda. Ela pega uma bolsa em um canto e joga até mim. Essa não é a minha mãe. É incrível como a morte muda as pessoas.

         – VOCÊ VAI COLOCAR TUDO DE IMPORTANTE DENTRO DESSA BOLSA! ENTENDEU? – Ela berrava enquanto apontava pra mim. Na porta, George conferia a hora. Mas que diabos está acontecendo?

         3 segundos depois ela e George haviam decido e me deixado sozinha em um mar azul, sufocada pela água, fumaça e uma bolsa vazia – que também era azul.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "A Primeira Cor do Céu" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.