Minguante escrita por JennyMNZ


Capítulo 9
You Have One Wing, I Have Another


Notas iniciais do capítulo

Eu confesso que achei que tinha atualizado semana passada. Sorry~



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Quando Baek Ah deixou o palácio, ele não imaginou que voltaria tão cedo.

Claro, três meses não foram um curto período de tempo, mas comparado aos anos que ele esperava ficar distante, alguns meses eram uma viagem rápida. No entanto, não importa quanto tempo tenha passado, ele ainda despreza o jeito que os portões o fazem sentir preso, que as muralhas o fazem sentir trancafiado, e que as pessoas o fazem se sentir receoso.

Ele era um príncipe, mas as memórias nos corredores e nos pátios o fazem querer ir embora de novo. Correr como um louco em direção ao portão e sair andando o mais longe possível até que aquele lugar fosse só uma lembrança ruim. Fazer tudo desaparecer e evitar pensar na escuridão que cercava aquele lugar. 

Ele jamais teria retornado se não fosse pelos últimos amigos que ele ainda tinha lá.

— Anunciando a entrada do 13º Príncipe, — a voz do eunuco ressoa pela Sala do Trono, e logo Baek Ah se vê diante do Rei.

O irmão dele está mais magro do que ele se lembrava, sua pele mais pálida que antes, contrastando ainda mais com seus robes negros. Os olhos dele estão cansados, e sua expressão está abatida. Ele tem olheiras fundas e parece estar completamente devastado, e Baek Ah quer poder ir até ele e abraçá-lo.

Ao invés disso, ele cai de joelhos.

— Perdoe-me, Pyeha, — ele se lembra de quando se ajoelhou pela última vez naquele mesmo piso, e se pergunta como as suas vidas foram ficar desse jeito.

— Levante-se, — o Rei diz e ele obedece, e então ele vê que seu sorriso é fraco e amargo, — Não precisa pedir perdão. Eu só estava me agarrando a um fio de esperança. Não foi nem um Edito Real.

Ele não consegue manter a cabeça erguida, nem mesmo depois de ouvir suas palavras gentis.

— Mas era um favor para um irmão e uma amiga, — ele diz, ainda sem olhar nos seus olhos, — Me sinto patético.

— Então somos dois, — ele suspira de exaustão, parecendo estar derrotado por um tempo, mas então ele respira fundo e parece se recuperar um pouco, — Venha comigo. Quero respirar um pouco de ar fresco.

Ele segue seu irmão em silêncio, caminhando atrás dele pelos corredores vazios, o som de seus passos soando mais altos no silêncio que cai sobre eles. A sua comitiva de damas da corte e eunucos está ausente, e antes que ele perceba eles já estão caminhando em direção ao jardim e para longe da Sala do Trono.

— Tudo bem abandonar as responsabilidades assim? — Ele não consegue deixar de perguntar em voz alta, não muito a fim de deixar as pessoas pensarem que o Rei estava faltando ao trabalho por causa do seu irmão indefeso.

So suspira de frustração dessa vez, revirando os olhos quando reclama. 

— Você e Soo vivem me enchendo sobre minhas responsabilidades... Eu sou o Rei, eu faço o que eu quiser.

A reclamação é completamente inesperada e Baek Ah começa a rir sem perceber.

— Desculpa, — ele diz quando consegue respirar de novo e So bufa, — Tem razão.

Depois que a risada morre e o silêncio retorna, os pensamentos tristes e intrometidos retornam também. Ele quer falar sobre Hae Soo, mas ele não tem certeza se esse é o melhor momento – se é que existe um melhor momento – e ao mesmo tempo ele não sabe se deveria esperar seu irmão falar primeiro.

Se alguém está sofrendo mais que tudo agora, então seria ele.

Logo eles param de andar e Baek Ah percebe que eles estão debaixo de um mirante. Ele olha para o homem ao seu lado, mas este continua a olhar para frente, então ele só espera.

— Perdoe-me por ter dado a notícia daquela maneira, — o Rei finalmente fala, se referindo a uma carta que Baek Ah recebera há um tempo atrás com um curto parágrafo que carregava notícias devastadoras, e como seu coração afundou como uma pedra, mesmo que ele tivesse acreditado que estava preparado para qualquer coisa que lhe acontecesse, — Tenho certeza que chamá-lo aqui e lhe contar pessoalmente seria melhor, mas...

— Mas o tempo era essencial, certo?

Ele concorda em silêncio com as palavras de Baek Ah, e consegue até ficar ainda mais sombrio do que antes.

— Soo só descobriu que eu te contei duas semanas atrás, — ele olha para seus pés, soando um pouco culpado quando respira fundo mais uma vez, — Ela não ficou muito feliz por eu ter pedido que você procurasse em todos os quatro cantos do país e das nações vizinhas por uma cura.

Ele consegue imaginar Soo irritada e zangada, dando uma bronca e falando sem parar com seu irmão mais velho, dizendo que ela não queria incomodar ninguém, mesmo que ela precisasse, e que ele precisava deixar os outros em paz. Ele até consegue sorrir com a imagem. 

— Ela devia saber que eu teria ido, com ou sem seu pedido.

— Ela sabe, — So sorri também, e a melancolia se dissipa por um segundo, — Na verdade, ela me perdoou bem rápido.

Um outro pensamento passa pela sua mente e ele não consegue deixar de imaginar silenciosamente. Sua apreensão e preocupação, no entanto, é o bastante para que ele diga seus pensamentos em voz alta.

— Então vocês estão bem? — Ele transparece cautela, porque esse sempre foi um assunto sensível, mas a expressão desafetada e inabalável do seu irmão o tranquiliza.

— Nós estamos bem, apesar de tudo o que houve. Alguns problemas aqui e ali. — O irmão dele parece querer deixar o assunto de lado, mas então ele olha para os lados e decide elaborar, — Eu acho que você sabe o que aconteceu com Wook.

Baek Ah concorda solenemente, ainda lamentando que o 8º Príncipe tenha escapado de sua sentença, mesmo que fosse seu irmão.

Pessoas mais justas não tiveram uma sentença mais justa.

— Eu sabia que ela teve alguma coisa a ver com seu julgamento. — Porque Hae Soo não suporta ver pessoas morrendo ou sendo condenadas à morte, seja uma pessoa boa ou ruim, — Mas era verdade? O falcão?

— Ele era culpado de traição. Se o falcão foi obra dele ou não, pouco importa.

— Eu tinha certeza que você ia matá-lo. Como Hae Soo te convenceu?

Baek Ah tinha muitas teorias, algumas muito irrealistas para ser verdade, outras não muito boas. O temperamento do Rei e sua ira eram de uma força a ser temida, e nem mesmo os sermões de Hae Soo podiam fazê-lo parar quando ele tinha se decidido a fazer alguma coisa.

Mas então os olhos do homem ficam escuros e ele olha para ele com suspeita.

— Eu sei que você já sabe da história deles, — ele fala num tom que não deixa dúvidas sobre o que ele está falando e Baek Ah arfa de surpresa.

— Ela te contou?

— Eu era mesmo o único que não sabia?

— Bem, um dos poucos.

— Mas por quê?

Sim, por quê? Essa era a única questão que Baek Ah nunca conseguiu entender. Por que ela deliberadamente escondeu um assunto tão grande, que poderia acabar se tornando num problema ainda maior? Por que ela esconderia algo que, se usado pela pessoa errada, poderia destruir tudo o que ela vinha lutando para conseguir?

Ele não consegue entender a lógica dela, mas ele sabe o que ela diria agora, e isso é melhor do que debater sobre assuntos amorosos.

— Hae Soo disse alguma coisa sobre não querer deixar as coisas piores entre vocês. E também alguma coisa sobre você matá-lo, — Baek Ah ainda não tem certeza se aquela parte era verdade ou não, — Tirando isso, eu tenho certeza que ela já se esqueceu dele.

— Você acha? — Ele não gosta quando seu irmão parece tão inseguro e vulnerável, então ele suspira em antecipação de uma longa conversa.

— Vocês já estão juntos há anos. E mesmo antes de ficarem juntos ela já gostava de você, — ele cogita a ideia de cobrar sempre que precisar intervir na vida amorosa de seu irmão ou dar conselhos de relacionamento, — Você não está pensando que ela ainda sente algo por ele, está?

Baek Ah sabe que seu quarto irmão vê a lógica de suas palavras e que ele está seguindo a sua linha de raciocínio, mesmo que isso não o agrade. É frustrante para So o quão complicadas, e ao mesmo tempo simples, as coisas são no departamento de romance, e ele sorri quando o vê emburrado. Ele não pode deixar de pensar que o Rei fica meio bobo quando está fazendo birra. Pelo menos, até que o dito Rei diga o que está pensando.

— Eu só queria que ela tivesse se apaixonado por você.

Não é a primeira vez que ele ouve essa ideia ridícula, mas que nem da última vez, ele se engasga com a própria respiração e não consegue se recompor. 

— O-o quê? Hyungnim!

— O que foi? Pelo menos eu não ficaria tão irritado assim.

— Mas por quê?

— Eu não te odeio, — ele responde como se isso explicasse tudo, e muda de assunto antes que Baek Ah possa pedir uma clarificação melhor, — Porque ela amava ele, pra começo de conversa?

Ele tem duas respostas para isso, uma curta e uma longa, mas seu irmão não vai ficar satisfeito com nenhuma delas, então ele tenta se esquivar da pergunta sendo vago.

— Bem, ela não amava amava ele, sabe.

Hae Soo provavelmente tentou essa explicação antes, porque ele suspira e olha para os céus, como que pedindo paciência. 

— Você também com essa história de diferentes tipos de amores? — Ele exclama e Baek Ah decide que a resposta longa é melhor. 

— Mas são diferentes. — Ele se esquece que tinha decidido evitar discussões amorosas e tenta ser o mais claro o possível para que seu irmão não possa refutá-lo, — Que nem eu amei Myung Hee-nui diferente de como amei Woo Hee. Pense em como você nunca pensou que poderia amar Hae Soo antes de saber quem ela realmente era. E o que você sentia por ela antes é parecido, mas não é a mesma coisa que você sente agora. O problema com ela e nosso oitavo irmão foi que ela se apaixonou antes de conhecê-lo de verdade. Tá certo que era amor, uma versão menor e mais patética, mas as raízes não estavam fundas o bastante, então ele logo murchou e morreu. Vocês dois são mais parecidos com um carvalho, inabalável mesmo durante a tempestade. E isso é que é amor. Amor verdadeiro, e real.

Quando o Rei não diz nada, Baek Ah acha que ele finalmente entendeu. Que agora seus melhores amigos vão parar de serem teimosos e vão viver felizes juntos pelo tempo que ainda lhes resta. Que agora as discussões bestas sobre amor e romance vão acabar e que eles vão focar em assuntos mais importantes e urgentes.

O homem olha para ele em silêncio, e então meneia sua cabeça em silêncio para si mesmo, como se estivesse repetindo as palavras de Baek Ah mentalmente.

— Belo discurso, — So diz com uma voz pensativa, — Mas não me faz me sentir melhor. Você sabia que eles quase se casaram?

— Sério? Isso ela não me contou. — O choque dele o faz se esquecer imediatamente de como o homem menosprezou seu argumento. Ele suspeitava que algo desse nível tivesse acontecido, mas saber com certeza é uma coisa completamente diferente.

— Parece que eu arruinei os planos deles quando a pedi ao falecido Rei Taejo, e depois quando bebi o veneno.

— E depois quando a fez se apaixonar por você. — Baek Ah pensa um pouco em como as coisas são e o quanto tudo mudou entre eles, e suspira entretido, antes de conferir se a situação está bem, — Você não está com raiva dela, está? Vocês brigaram de novo por causa disso?

— Não, não estou, — o Rei grunhe, — Eu acabei de dizer que estamos bem.

Tem um pedido silencioso na voz dele para deixar o assunto para lá, mas ainda existem algumas perguntas que não foram respondidas. 

— Ele sabe da doença dela? — Baek Ah pergunta cautelosamente mais uma vez, mas seu irmão arfa em aversão.

— Eu não ligo para o que acontece com ele. Se ele sabe ou não, não me importa. E não pode deixar sua residência e ela não irá para lá. Eles jamais vão se ver novamente.

Ele deixa o silêncio se firmar por um momento antes de fazer outra pergunta perigosa.

— Nosso décimo-quarto irmão sabe?

— Não vamos falar mais deles, — seu irmão praticamente implora e praticamente ordena ao mesmo tempo, e Baek Ah larga o assunto de vez antes que o deixe mais entristecido ou completamente irritado.

— Tudo bem, então.

Ele volta os olhos para o lago, mas antes que possa fazer outra pergunta, So toca no seu ombro de leve, indicando uma direção completamente diferente com um meneio da cabeça, chamando a atenção de Baek Ah para a mulher caminhando por entre os canteiros de flores, parecendo minúscula à distância. 

— Ela veio te ver, — So comenta e ela começa a acenar para eles de longe, como se aquela fosse a sua deixa, — É melhor ir até ela, ela não pode ficar andando por aí assim.

O vento de fim de tarde do outono não é frio o bastante para deixá-los desconfortáveis, mas ele sabe que o hanbok dela é fino demais para ser considerado uma proteção apropriada, e Hae Soo não tem nenhuma outra cobertura, então ela começa a se preocupar também. Ele se apressa para ir de encontro a ela, e então pára e se vira quando nota que seu irmão continua imóvel.

— Não vem comigo?

— Me junto a vocês dois mais tarde. Tenho muitas responsabilidades.

— É, eu acho que é isso que Hae Soo vai dizer.

— Vá logo.

Ele se prepara para correr, mas uma dúvida atravessa sua mente e ele se vira para pedir um conselho.

— Espera, como eu converso com ela? — Ele sabe que a pergunta é estúpida no momento que ele a acaba de formular e seu irmão ri.

— Como sempre, ou ela vai te bater.

 

 

— Wangjanim! Você voltou! — Qualquer outra mulher não o teria abraçado, mas Hae Soo não é qualquer mulher, então ela pula até ele e ri em voz alta quando seus braços o envolvem, — É bom te ver!

— Me desculpe por ter demorado tanto.

Ela se afasta do abraço, ainda sorrindo, mas com olhos reprovadores. 

— Eu achei que você fosse ficar pelo menos um ano fora, — ela suspira e sacode a cabeça, — Você está mudando seus planos, Pyeha não devia ter pedido que voltasse.

— Sim, ele devia. E você também devia, — o sorriso dela se apaga com a repreensão, — Eu não acredito que você estava com uma doença do coração e não me contou.

Os olhos dela brilham com tristeza e ele se sente horrível mais uma vez. 

— Você se sentiria pior por ter ido se eu tivesse contado, — ela explica com calma, e ele sabia que era isso o que ela diria, então ele não pode ficar com raiva.

— Eu me senti pior quando voltei.

Isso parece ser evidente nos seus olhos porque ela sorri suavemente para ele, e sua voz ganha um tom reconfortante e quase maternal. 

— Por que se sentir mal quando a culpa não é sua e você não pode fazer nada para impedir? — Ela consegue falar como se não fosse morrer em alguns anos e não há nada que eles possam fazer quanto a isso. Então ele suspira, incapaz de replicar o argumento e segue a direção dela. Andando na direção dos corredores do palácio, onde o vento não vai atingi-los com força. 

— E como meu irmão está?

— Tenho certeza que acabou de conversar com ele.

— E eu tenho certeza que ele está tentando manter as aparências. Como ele está?

Soo hesita antes de responder. Ela baixa o olhar para seus pés e suspira infeliz, como se estivesse tentando encontrar palavras mais brandas. 

— Ele ficou arrasado no começo, — ela responde com uma voz triste, — E então ficou em estado de negação. Ele está aceitando aos poucos, mas está melhor agora. Ele é forte, ele vai ficar bem.

— E você? — Quando ele faz a pergunta ela sorri largamente, mesmo que seus olhos estejam lacrimejando. 

— Desde que eu possa estar com ele, eu vou ficar bem. Seja por muito ou por pouco tempo.

— Mas eu sei que você queria ficar com ele por muito tempo.

O sorriso dela desaparece e ela dá de ombros, derrotada. 

— O que eu posso fazer? Há muitas outras coisas que eu queria, mas eu tenho que aceitar o jeito que as coisas são. É o único jeito.

Baek Ah não tem palavras para confortá-la ou aconselhá-la, então ele controla as lágrimas que insistem em cair e continua em silêncio. 

Ele recusa a oferta dela de enviar alguém para preparar um banho para ele, mas se senta no Damiwon para tomar chá, esperando que isso o ajude a relaxar. 

Hae Soo não suporta o silêncio então ele começa a puxar conversa sobre os assuntos mais mundanos, deixa as coisas mais leves para eles poderem conversar. Ela faz perguntas sobre suas viagens, o que ele viu e o que ele fez, quem ele conheceu e para onde ele foi. Então ela começa a conversar sobre as coisas do palácio, quem casou com quem, as damas da corte que foram embora e as novas que ainda não tinham aprendido direito o processo de fazer sabão – o que acaba levando ela a descrever todo o processo de fazer sabão. Ela também menciona ter ido visitar o túmulo de Eun e esperar um dia poder visitar sua Unnie.

Baek Ah não se importa nem um pouco. Por alguns momentos ele pode ouvir Hae Soo falar sem parar e fingir que não há nada de errado. 

Depois que as damas da corte se retiram com as xícaras vazias e eles ficam sozinhos novamente, ela coloca um envelope casualmente em cima da mesa. O movimento teria passado despercebido se ele não estivesse olhando para o móvel na hora. 

Ele então levanta os olhos para ela, uma pergunta já se formando nos seus lábios, mas ela fala antes que ele tenha a chance. 

— Eu ainda acho que Pyeha não devia ter pedido que você voltasse, mas estou feliz que esteja aqui, — o tom de voz dela muda um pouco e ela fala com gravidade, mesmo embora seu sorriso continue vívido e amigável, — Você chegou bem na hora.

Ele se lembra da promessa dela de chamá-lo sempre que precisasse dele, e do comentário que ela fez, de que talvez ela fizesse isso muito em breve. Ele não entendeu na hora, mas agora que ele pensa nisso, ele conclui que Hae Soo já vinha planejando fazer alguma coisa no meio desse drama. 

Ele se pergunta se isso tem alguma coisa a ver com a carta lacrada que ela passa para ele, mas ele não a toca de imediato. 

— Era isso o que você queria? Estava pensando em me pedir pra procurar uma cura?

— Não exatamente, embora tivesse algo a ver com a minha doença, — ele espera uma explicação, mas ela desvia os olhos dos ele e se esquiva da pergunta, — Mas não importa mais. As coisas mudaram. Vou explicar mais tarde, mas você chegou no momento ideal.

Ele pega a carta lentamente, mas não a abre. Ele olha para ela e tenta pensar numa solução para os problemas deles. Algo que diminua o desamparo de seus amigos, ponha um fim nesse pesadelo distorcido e faça as coisas voltarem a ser como eram. 

Ele quer um milagre, para que não tenha que ver o que está na carta. 

— Eu posso continuar procurando.

— Não faça isso, — ele congela quando ouve a voz dela e o jeito que o comando soa. Ela respira fundo, olhando para fora, para os campos verdes pálidos, parecendo se perder na visão enquanto ela continua a pensar em voz alta, — Eu já consigo senti-la. A morte. Quando eu recebi meu prazo, senti medo e pavor; tristeza por aqueles que deixaria para trás. Mas agora é mais do que isso. Agora é esse frio que se espalha pelos meus dedos. É esse vazio crescendo dentro de mim. Uma sombra que se aproxima à medida que minha luz tremeluz sem poder fazer nada, — ela sorri de novo, mas dessa vez com tristeza e melancolia, — Eu estou minguando, Baek Ah-nim. Estou ficando cada vez mais fraca conforme as horas se vão, e eu temo o dia que eu me vá por completo.

— Soo-yah... — Ele tenta encontrar algo para dizer que a faça se sentir melhor, se sentir mais leve e otimista, mas ela sacode a cabeça suavemente, a derrota clara no seu rosto. 

— Não há cura, Wangjanim, — os olhos dela estão marejados quando ela se vira para ele, mas ela não chora, — Isso não é uma crise, nem uma doença temporária. Isso é o fim, e ele está chegando.

 

 

— Você ainda está tenso, — seu irmão comenta rigidamente. E mesmo que ele não esteja olhando para ele, é óbvio a quem ele se refere.

Baek Ah engole a comida em silêncio, lembrando de como as refeições com ele depois de sua coroação sempre tinham esse tipo de atmosfera e como ele sempre se sentia intimidado quando seu irmão se sentava com toda sua aura régia ao seu lado. Ele devia ter escapado das conversas de Hae Soo antes do Rei se juntar a eles para jantar, mas agora é tarde demais. 

— Você ainda é o Rei, — ele responde com a voz mais respeitosa que tem. O homem mais velho claramente não se satisfaz com isso, uma vez que ele suspira e olha para ele com uma expressão exasperada.

Mas antes que Baek Ah possa pedir perdão por cometer um crime digno de morte pela quarta vez, Hae Soo intervém animada, reclamando com o irmão dele.

— Não seja tão duro com ele, — ela coloca a mão no seu braço, e aperta um pouquinho, de um jeito que Baek Ah não sabe se é um toque de conforto ou de repreensão. Deve ser dos dois, — Nem todo mundo consegue ser tão irreverente quanto eu.

Nem mesmo a animação de Soo parece alegrar o humor de So, e Baek Ah se sente culpado por trazer mais preocupações para eles. 

— Depois de tudo o que passamos, eu queria que pelo menos isso não mudasse, — ele fala com uma voz de rejeitado e o coração de Baek Ah afunda um pouco.

Ele abre a boca para tentar consertar as coisas, pelo menos um pouco. Ele resiste à intimidação que emana no homem impetuoso ao seu lado, resiste ao impulso de submissão que vem de anos de prática e de etiqueta, se lembra do quão fácil foi conversar com ele algumas horas atrás antes de focar nas necessidades de seu irmão por ora.

Ele abre a boca para deixar as coisas melhores para eles, para que eles possam ter uma refeição agradável, mas é interrompido antes que sequer comece a falar.

— Tenta provocar ele um pouco mais, — Hae Soo diz com um largo sorriso, — Ele vai acabar relaxando uma hora.

— Ela vai é acabar indo embora de novo, — Soo diz com um suspiro, mas Baek Ah não deixa de notar o lamento falso na voz dele.

— Mas ele sempre volta.

So e Soo riem em voz alta com toda a vontade quando veem a sua expressão de confusão, e ele descobre que estão tirando sarro dele.

O alívio dele é maior que a indignação, mas a confusão é maior que o alívio. Ele estava tentando lidar com um peso enorme no peito, mas eles pareciam estar numa situação melhor que a dele. Eles parecem agir como se nada estivesse acontecendo e Baek Ah começa a se perguntar se tem algo de errado com ele.

— Como vocês conseguem agir normalmente?

Como vocês conseguem fingir que a morte não se aproxima?

Silêncio segue depois de sua pergunta. Os olhos de So caem, que nem como quando eles conversavam mais cedo, e ele sente outra onda de culpa. Soo, no entanto, dá de ombros com um suspiro, e fala com um tom repreendedor.

— Não é como se eu fosse morrer amanhã, — seus olhos se voltam para o homem ao lado dela, e ela repousa sua mão na dele com um pedido silencioso, — Pyeha...

— Pra quê ficar triste agora, quando ainda estamos juntos? — O sorriso do Rei é pequeno e quase imperceptível, mas é um sorriso mesmo assim, — Vamos deixar a tristeza para a hora dela.

Então ele olha para ela e seu sorriso aumenta e brilha quando o vê o sorriso travesso dela, e Baek Ah decide que se alegrar e aproveitar o presente é muito melhor do que viver com medo e tristeza, então não decide ficar pensando demais nas coisas tristes, e só focar no jantar com seus amigos.

Ou ao menos tentar, e ficar assistindo as brigas deles pela comida.

— Ei, por que está pegando esse? — A voz ultrajada de Hae Soo logo quebra a paz, — Eu ia pegar esse! — Ela diz se referindo ao pedaço de frango que So segura com seus talheres. 

— Calma! É pra você, — ele diz num tom apaziguador, um pouco chocado com o surto dela. 

No entanto, antes que ele possa colocar a carne na tigela dela, ela usa seus próprios talheres para impedi-lo e afastá-lo.

— Quero não. Eu ia pegar pra você.

Baek Ah pisca, mais uma vez confuso, mas So suspira, como se aquela não fosse a primeira vez que uma coisa do tipo acontecia, e continua a oferecer o frango para ela, persuadindo-a a aceitá-lo.

— Mas é o seu favorito.

— Eu sei que é meu favorito. Agora coma.

— Você não triscou em quase nada. Coma.

— Eu trisco em outra coisa. Coma você.

— Soo-yah, você precisa se alimentar.

— Eu estou me alimentando. Vocês dois estão vendo, — ela olha para Baek Ah e ele concorda com a cabeça, ela estava mesmo comendo muito, — Eu tenho que cuidar de você porque você ficou duas noites sem dormir. É o seu favorito também. Coma.

— Você está doente, coma você.

— Por que vocês não dividem? — Baek Ah intervém antes que a briga fique ainda mais ridícula ou ainda mais longa do que uma briga por um pedaço de frango cozido deveria ser, e suspira aliviado quando eles seguem sua sugestão.

So e Soo sorriem um para o outro quando comem o pedaço dividido de frango, e Baek Ah não pode deixar de sorrir também quando os vê assim. O silêncio pacífico de ter companhia o ajuda a diminuir um pouco a melancolia.

— Ei, eu queria essa! — Ele ergue os olhos quando ouve Soo reclamar em tempo de ver seu irmão roubar um pedaço de alga da tigela dela, uma expressão fingida de indiferença no rosto dele.

— Então você ia oferecer pra mim, não é isso?

— Não, eu ia comer, — ela impede que ele coloque a alga na sua tigela com seus talheres enquanto ele continua a puxar, — Me devolve.

— Não, é minha agora. Você recusou a última coisa que eu te ofereci.

— Mas eu quero essa de verdade. Não vale.

Baek Ah suspira novamente, concluindo que é melhor desistir de paz e silêncio e se contentar em ser o mediador deles por hoje. Como eles jantavam sem destruir o palácio enquanto ele estava longe, ele não tem ideia.

— Por que vocês não dividem? — Ele sussurra com uma voz cansada.

 

 

Soo não apaga todas as suas velas naquela noite. É um pouco tarde para ela ainda estar acordada, mas ela se senta em silêncio no chão do seu pequeno quarto, observando a chama tremeluzir diante dela. Ela está cansada, mas tem muita coisa na cabeça dela para ela dormir, então ela nem tenta.

É por isso que ela não se sobressalta quando as portas se abrem silenciosamente e Baek Ah entra quase que correndo. Ela espera que ele feche a porta e se aproxime dela antes de falar.

— Você leu. — Não é uma pergunta. Se ele está aqui agora é porque sabe o que está passando pela mente dela nesse momento. E o único jeito de saber é abrindo o envelope lacrado que ela deu para ela, deixando-o claramente confuso.

Ele não está confuso agora.

Ele faz que sim com um meneio e se ajoelha na frente dela.

— Eu também a queimei.

— Boa ideia, — Hae Soo se pergunta se ela deveria queimar todas as suas cartas secretas do seu baú, antes que alguém as encontre e frustre seus planos.

Pelo menos, agora que o 13º Príncipe sabe, ela não vai mais estar completamente sozinha. Ele é o único que estaria disposto a ajudá-la com aquele problema, e se ele não parece estar feliz com o conteúdo da carta, então com certeza ninguém mais estaria.

— Quem mais sabe? — Ele pergunta depois do que parece ser uma eternidade.

— Só nós dois.

Ele arfa em choque e incredulidade, sacudindo a cabeça em desaprovação.

— Você está louca, Soo-yah?

— Você disse que ia me ajudar.

— Não pelas costas do meu irmão! Você precisa contar pra ele...

— Eu vou, — ela interrompe seu discurso antes que ele possa começá-lo. Ela sabe o que ele vai dizer porque ela já disse todas as mesmas coisas para si mesma. Ela passou noites incontáveis debatendo consigo sobre como contar para ele, quando contar para ele, ainda sem se sentir pronta para partir seu coração mais uma vez, — Eu prometo que vou contar. Mas você não pode me deixar sozinha.

— Não vou. Vou ver o que posso fazer, mas você precisa conversar com ele.

Ela concorda lentamente com a cabeça, e suspira quando pensa que logo vai ter outra conversa difícil com o Rei.

— Isso é justo.

O 13º Príncipe belisca a ponte do nariz e grunhe exasperado, provavelmente ainda tentando encontrar sentido em toda a série de eventos, passando pelos mesmos conflitos internos que ela passou.

— Isso é o caos, — ele murmura e respira fundo, — Por que essas coisas estão acontecendo?

— Já parei de me perguntar isso, — ela diz amargamente e deixa os ombros caírem, — Não podemos mudar as coisas agora. Só podemos esperar que elas melhorem.

— Tem certeza que isso vai melhorar as coisas?

O meneio dela é solene e cheio de conflito, e a voz dela vacila um pouco quando ela fala.

— Ele não vai entender. Wangjanim, você é minha única esperança.

Há um momento de silêncio enquanto Baek Ah fica pensativo e quieto, sua respiração pesada e errática. Ela o observa silenciosa, apreensiva. Seus dedos se entrelaçam uns nos outros, sua mão treme e seus próprios pensamentos sombrios vêm até ela.

O Príncipe finalmente respira fundo e dá sua resposta.

— Vou partir em breve. Vou dizer a ele que vou procurar uma cura em outro lugar. Quando tiver preparado tudo, eu volto. — Ele se levanta para ir embora antes que mude de ideia, olhando para ela para lhe oferecer um último conselho, — Até lá, encontre um jeito de contar para ele. Ele é forte, ele vai ficar bem.

— Dessa vez eu acho que ele não vai.

— Ele precisa, — ele fala com um tom mais firme para lhe dar coragem, — Eu também queria que houvesse outra saída, mas se é isso o que decidiu, então tem que ir até o fim.

O 13º Príncipe se retira do seu quarto, deixando-a sozinha com uma vela solitária e seus pensamentos obscuros e consumidores.

Aquela noite o Rei não vai vê-la, então ela aproveita para escrever uma nova carta.

Ela pega um envelope novo, simples e liso, mas não escreve nenhum nome nele. Ela pega a maior pilha de cartas e esconde a nova debaixo delas, junto com outros envelopes lisos e parecidos, esperando que eles fiquem lá em segredo e nunca sejam descobertos. Pelo menos até a hora chegar.

Quando a hora chegar ela pode queimar todos eles.


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Notas finais do capítulo

Eu nem gosto de fazer suspense nas coisas...

Músicas lindas dão nomes de capítulos lindos
Link para os curiosos musicais -> https://youtu.be/KcCpwR_hzpo

Opiniões são bem vindas.
Elogios sempre aceitos.
Críticas apreciadas.

:)



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