Uma Canção de Neus Artells escrita por Braunjakga


Capítulo 10
O fugitivo




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Toledo, Espanha

11 de Agosto de 1714

 

I

 

Nos céus altos da Espanha, sobre a cidade de Toledo, um palácio se erguia.

Tinha torres e muralhas brancas e os telhados sobre as torres eram cones azuis. O palácio era cercado de nuvens e do azul do céu, como se estivesse sido assentado sobre elas.

Dragões voavam livremente sobre os céus, dando voltas e voltas nas torres brancas do palácio, montados em cavaleiros e cavaleiras do dragão chamados Dragooners.

Esse era o palácio flutuante da Ordem do Dragão. Ele voava livremente sobre território espanhol, mas, no geral, ficava sobre a cidade de Toledo.

A sede das Cortes mágicas espanholas também ficava sobre Toledo, mas apenas membros da Ordem do Dragão ou qualquer outra pessoa que estivesse dentro dele podiam ver o palácio e encontrá-lo.

Em um pátio externo daquele palácio, Nadja e Gerard andavam sobre um tapete vermelho.

Na frente deles, havia uma mulher com lança de prata nas mãos olhava para o lado.

Ela também usava uma armadura vermelha como sangue, tinha cabelos lisos, castanhos curtos e olhos também castanhos.

Ao lado dela, fileiras e mais fileiras de soldados da Ordem do Dragão estavam organizadas em blocos de 10 por dez soldados, totalizando 100 soldados por bloco.

Dava para ver mais de 15 blocos como aquele durante a caminhada dos três.

Além disso, havia soldados que portavam bandeiras, espadas e montavam dragões, todos eles em mais absoluto silêncio e respeito quando Gerard e Nadja passaram.

A mulher de lança subiu em uma plataforma acima do solo e berrou para eles:

— Temos a honra de receber no palácio da Ordem nosso Interventor supremo e senhor absoluto da Ordem do Dragão, General Gerard Bernat!

— A-u! A-u! A-u! – Todos os soldados exclamaram, batendo escudos e lanças no chão.

— Vocês estão prontos para morrerem pelo nosso Império na Catalunha?

Os soldados tornaram a exclamar e bater armas.

— Pois bem! Todo aquele que lutar pelo dragão será revivido pelo sangue do dragão!

Os soldados bradaram alto, em uníssono, com uma só voz.

— Agora vão! Temos trabalho a fazer! Viva El Rey y Viva España!

— Sim, senhora!

Os soldados se dispersaram e saíram em revoada pelos céus, bloco por bloco, de forma organizada, como enxame de abelhas, fazendo muito barulho com as armas em mãos.

Depois que a maioria deles saiu, Gerard se aproximou da mulher:

— Luna, eu disse pra vocês, Luna: eu não quero a Ordem interferindo na Catalunha!

— Don Gerard, essas são tropas que o Enric recomendou que enviássemos! O envio tava atrasado e a chegada desse mago inglês apenas acelerou tudo!

— E o Enric tem mais autoridade do que eu, que sou o Interventor dele?

— Mas El Rey tem e eu falei com ele pessoalmente! Ele autorizou o envio. Ele tá preocupado, Gerard! A Catalunya é importante pra nós, não podemos perder ela!

Gerard gesticulou furioso e não escondeu a irritação:

— Olha, Luna, quando essa guerra acabar, vou acertar contas com todos vocês! Com o Enric, com a Pietra…

— E Don Gerard pretende acertar contas contra o próprio rei da Espanha?

Vendo que a coisa esquentava, Nadja voltou-se para Luna:

—  Senhora Luna, o Senhor Gerard está um pouquinho certo! Apesar de ser o procedimento padrão, a gente não tá aqui pra revisar tropas.

Depois, voltou-se para Gerard:

— Senhor Gerard, a senhora Luna está fazendo uma gentileza com o senhor! Quem não gosta de ser bem recebido? Senhor Gerard! Esqueceu que a gente veio aqui pra ver o Inglês? Vamos ver ele primeiro e depois resolvemos essa questão das tropas!

Gerard respirou fundo e falou:

— Tá bom, tá bom! Eu quero falar logo com esse mago e ir embora.

 

Uma mosca se aproximou de Nadja e ela repeliu-a com a mão direita.

 

II

 

Dentro de uma cela, Clow tapava o olho esquerdo com a mão esquerda.

Ele tinha controlado uma mosca para espiar a chegada de Gerard e Nadja no palácio da Ordem e podia ver tudo o que ela via com o olho tapado.

A cela tinha paredes de pedra negra derretida com fogo de dragão, como lembrete aos prisioneiros sobre o destino que os aguardava caso tentassem fugir.

Havia uma pequena janela por onde entrava luz há três metros de altura e uma porta de madeira com uma janelinha com barras de ferro era o único meio de chegar no exterior.

Não dava para usar magia na cela, mas Clow achou um jeito de usar:

— Rapazes, temos companhia! Chegou um peixe grande querendo conversar comigo! Vocês estão preparados?

Kero ficou calado, mas Yue respondeu:

— Eu confio em você, eu sempre acreditei em você!

Yue deu um toque de leve na bochecha de Clow como se estivesse acariciando-a e Clow respondeu, tocando as mãos do guardião:

— Eu nunca vou deixar de acreditar nas suas palavras… só tou com um pouco de medo, Yue.

— Então, Clow, vamos ter que jogar ele de lado e vamos acreditar no futuro.

Os três fizeram sim com a cabeça.

Assim que fizeram isso, um pó cobriu o corpo de Kero e Yue.

Eles ficaram invisíveis.

Um dos guardas da Ordem do Dragão abriu a cela.

Ele estava acompanhado por mais dois guardas, todos armados de lanças e vestidos com armadura vermelha como sangue, um deles com algemas especiais para que Clow não pudesse usar magia.  

O primeiro guarda se assustou quando viu a cela sem dois de seus prisioneiros:

— Cadê os outros dois que estavam com você?

— Não sei, milorde, devem ter achado um jeito de escapar dessa cela fajuta de vocês enquanto eu tava dormindo ou enquanto vocês estavam fazendo aquela barulheira toda lá em cima…

— Ora seu!

Os outros dois guardas começaram a bater em Clow com estocadas de lanças, mas um terceiro interveio:

— Vamos parar com isso! Precisamos do prisioneiro inteiro pra interrogatório! deixem que nossos interventores decidam o que fazer com ele! Deem o chamado geral! Aqueles dois não devem ter ido tão longe!

Depois de tanto apanhar, Clow foi algemado nas mãos e nos pés e arrastado pelos guardas até a sala do interrogatório.

 

III

 

Sala do interrogatório.

Não era uma sala estreita e apertada cheia de instrumentos de tortura, porque os interventores eram os instrumentos de tortura.

Era uma sala ampla, quadrada, como um galpão gigantesco, quadrado, de cem jardas de largura, comprimento e altura.

A sala era completamente iluminada pela magia das pedras brancas, as mesmas que revestiam as paredes externas do palácio, apesar de não ter nenhuma janela dentro dela, apenas uma porta de metal era a entrada e saída do lugar.

No centro da sala, havia uma mesa de madeira com duas cadeiras, uma de frente para a outra, onde já estavam Clow e Gerard.

Nadja e Luna observavam de longe, próxima à porta.

— Então, é o senhor que é o senhor Clow… muito bem, senhor Clow Reed, eu não estou aqui pra saber dos dois subordinados que estavam com o senhor e acabaram por fugir, eu estou aqui pra saber da arma mágica que os separatistas roubaram de Gibraltar e agora parece que o senhor estava atrás delas…

— Então o senhor é o chefe desse joça toda, milord?

— As perguntas são sobre o Senhor, senhor, Clow, não sobre mim! O senhor não está em posição para questionamentos!

— E tão pouco o senhor, milord, pelo que eu vejo. Se o senhor tá tão interessado em saber que “arma” é essa que os separatistas têm, por que o senhor não vai direto pra Barcelona e pega ela das mãos deles? Se não tiver com eles, tortura eles nessa sala até ter a confissão! O senhor pouparia tempo e pessoal com essas medidas!

            – Sou eu quem faz as perguntas aqui!

             – Mas o senhor tem nesse palácio poder o suficiente pra isso, não tem? Porque não usar?

Nadja e Luna se encararam com a resposta de Clow para Gerard..

Ele começou a ficar nervoso:

— Senhor Clow, eu estou sendo muito bonzinho com o senhor, bonzinho até demais, quando muitos já me pediam pra usar mais rigor com o senhor…

— E porque não usa? Sua amiga tá doida pra usar! – Clow apontou com os lábios para Luna.

— Eu não acredito em violência.

— Mas elas alí acreditam… A Ordem da qual o senhor faz parte acredita… Viu como conquistaram o México? O Peru? Você não sabia disso, milord? As armaduras que vocês usam são vermelhas como sangue por que? Será que elas se alimentam do sangue derramado por vocês?

Gerard bateu com o punho na mesa. Relâmpagos saíam dele:

— Mas que falha de segurança é essa?

Gerard olhou para Luna e ela gesticulou, pois não sabia o que responder.

Clow gargalhou:

— Como vocês são tão fáceis de entender… Vocês mesmo se destroem e estão uns contra os outros! – Clow aplaudia. – Se vocês fossem mais unidos como nós, ingleses, eu até temo em saber o que podia acontecer! Vocês, Ordem do Dragão, são uma piada!

Luna fazia não com a cabeça ouvindo Clow.

Gerard se irritou tanto que liberou uma pequena descarga elétrica contra Clow, o bastante pra ele tirar a mão da mesa com o susto que ele tomou.

Clow abanou no ar com o choque.

— Tá divertida a piada agora, Senhor Clow?

Clow só deu risada.

— Me diz! Que arma é essa?

Clow ainda gargalhava:

— Sim, agora eu vejo tudo… no dia que você ver essa arma… Você vai se arrepender do dia que nasceu, milord!

Mais uma descarga elétrica atravessou o corpo de Clow.

Gerard ficou tão irritado com as risadas que a descarga foi um pouco mais forte.

          O cabelo de Clow ficou branco e seus olhos negros ficaram roxos.

          Gerard olhou mais uma vez para Clow e entendeu, sem acreditar, que foi vítima de uma armação.

           Puxou o rosto de Clow com tudo e ele se desfez como borracha.

Luna e Pietra ficaram espantadas:

— Esse aí não é o Senhor Clow! É o capacho dele, Senhor Yue! – Disse uma Nadja com as mãos na boca.

— Quer dizer que eu estava sendo piada o tempo todo, né, Luna? – Disse Gerard, berrando.

Em vez de ficar retraída, Luna ficou mais ousada:

— Eu não sei nada sobre isso, Don Gerard! Eu só sei que eu prendi esses homens numa cela embaixo do palácio e de lá não saíram! Nem pra tomar sol!

— Não saíram é? Como é que usaram magia? Hein? Isso foi uma falha de segurança das grandes! Alguém ajudou eles! Não se pode mais confiar em você, Luna?

— Não é questão de confiar ou não confiar, Don Gerard! A Nadja me disse que esse tal de Clow tem um poder mágico incomum! Isso é tudo o que eu sei!

— E o Enric que você bajula tanto não tem informantes na Inglaterra pra conhecer os magos importantes do país, não é? Agora pra saber o que eu comi ontem ele tem gente pra falar pra vocês!

— Sim, eu errei! Eu errei feio em não querer saber quem e como era nosso inimigo! Mas entenda, eu…  

— Entenda nada! Já tou por aqui com esses desmandos de vocês sem a minha autorização! É isso que dá confiar muito! O meu problema foi confiar no Enric e dar muita liberdade pra vocês! Agora eu vou comandar tudo de uma vez! E vou começar agora! – Gerard deu um soco forte na mesa e olhou para Luna. – Se você quiser acertar desde já, Luna, traga todos os guardas que tiveram contato com esse mago, até mesmo chame de volta se precisar os que você enviou pra Catalunya… agora é a vez deles de encararem essa sala.

Luna bateu continência e disse antes de sair:

— Sim, meu senhor! Conforme ordenado!  

— Senhor Gerard, o senhor não quer saber se os ingleses estão ajudando os separatistas? É cedo para desistir! Apenas começamos!

— Nadja, de um jeito ou de outro, os separatistas vão usar essa tal “arma”; conforme eu for fechando o cerco por lá, uma hora eu vou encontrar quem tá usando e o tipo de ajuda que os ingleses estão dando pra eles… Agora…. – Gerard se agachou para ver Yue. – Quanto à ele… Leva ele pra cela! Quem sabe o inglês não volta pra pegar ele…

— Sim, senhor Gerard!

Nadja levantou Yue e o anjo prateado encarou o Interventor mais uma vez:

— Sabe por que o senhor não vai arrancar nenhuma informação minha, milord? Porque falta amor! Vocês não tem nenhum amor, só laços vazios! A gente já ganhou, você vai perder!

Nadja puxou os cabelos de Yue com força.

— Some com ele daqui!

Nadja tirou Yue da sala.

Gerard sentou-se na mesa com uma dor de cabeça horrível, aguardando Luna e os soldados, meditando nas palavras de Yue:

— Laços vazios… Eu luto por Neus, eu luto pelo meu país! Eu não luto por laços vazios! Eu tenho amor de verdade por eles!

Uma mosca voou ao redor de Gerard, incomodando o interventor.

Gerard de um um golpe e esmagou a mosca na mesa:

— Essa mosca de novo… Será que está me vendo de algum canto, Senhor Clow?

A mosca ainda se mexia.

Nos céus, em algum ponto, montado em Kero, Clow sorria, com o olho esquerdo tapado:

— Mylord é mais inteligente que os outros, Mister Gerard!

 

Continua…


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