Oh meus deuses! escrita por Lily


Capítulo 3
03. O que Astrid Haddock pode fazer.




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"03. O que Astrid Haddock pode fazer.”

A tempestade já estava intensa quando o jantar foi servido. Astrid estava sentada em uma das cadeiras mais altas do salão da mesa dos chefes, a cadeira ao seu lado era destinada a Soluço, ambas tinham tinham a mesma altura, porém alguns desenhos entalhados as diferenciavam. Havia sido um pedido de Soluço para mostrar que eles eram iguais e tinham o mesmo nível de poder sobre a aldeia. Era claro que todos em Berk sabiam o significado daquelas cadeira, mas para os visitantes, principalmente para Thanori, as cadeiras apenas formavam um belo par.

—Estou adorando Berk. Tudo é tão… intrigante. - Thanori disse enquanto esticava os braços acima da cabeça e olhava para as pessoas no salão, sua esposa, a bela Freyan, apenas afirmava com a cabeça e sorria de maneira educada. - Principalmente a academia, devo dizer que é encantadora. Estou surpreso que Berk vincou depois da morte de Stoico, pensei que ela acabaria em chamas.

—Soluço é um ótimo chefe. Um dos melhores que Berk já teve. - ela afirmou tentando soar calma e não preste a arrancar a cabeça dele. Uma risadinha chamou a atenção dela, Astrid levantou a cabeça e olhou para Cabeçaquente que sorria de forma debochada. - Ele planejou e construiu a maioria das inovações da aldeia para facilitar os trabalhos manuais. Na Velha Berk tínhamos muito mais trabalho para reconstruir as casas depois dos ataques dos dragões, mas depois de Soluço tudo ficou mais fácil.

—Ah, os dragões! As bestas aladas! - Thanori exclamou tão alto que Astrid tinha certeza que mais da metade do salão o ouvirá. -  Tivemos problemas com as bestas em nossa ilha, mas graças aos Deuses elas sumiram.

Astrid desviou levemente o olhar se voltando para sua comida. Não havia sido os deuses que levaram os dragões, havia sido a escolha que Soluço teve que fazer dois anos antes. A noite que os dragões haviam partido para o mundo oculto tinha sido horrível para todos, principalmente para Soluço, mas a pior parte havia sido quando de repente tudo havia ficado silencioso até o rugido do alfa ecoar pela imensidão chamando todos os dragões para casa. Astrid não havia hesitado em sair de sua tenda e ir até a de Soluço, ela havia acalentado-o sussurrando palavras tranquilas e afirmações. Eles fizeram isso pelas noites que se seguiram até toda Nova Berk estar pronta, depois não havia motivos para adiar o inevitável, o casamento ocorreu logo nos primeiros dias do inverno quando a neve e o sol compartilhavam seus poucos momentos de harmonia.

Melequento havia chamado-os de loucos por se casar em meio ao inverno, porém havia algo de belo em ser um idiota apaixonado. Tinha sido lindo e maravilhoso do jeito como ela sonhara.

—Quando meu irmão tinha dez anos, ele derrubou seu primeiro dragão. - Theria, a irmã gêmea de Thanori, disse com um grande orgulho em sua voz. - E matou quando tinha quinze.

Soluço montou em um dragão quando tinha quinze e acabou com uma guerra de trezentos anos. Astrid segurou a língua para não falar mais que o necessário, pois, aparentemente, o povo de Hinkard não eram fãs de dragões como eles.

—Essas botas são de um zíper arrepiante. - Thanori colocou os pés sobre a mesa revelando as botas de couro em um tom esverdeado. Astrid sentiu a tensão tomar conta do salão, ela nem precisava olhar para o lado para perceber que as conversas haviam cessado e que todos os olhares agora estavam voltados para o diálogo que acontecia na mesa principal. - Eu o matei há uns quatro anos. Devo admitir que nunca havia me divertido tanto. Mas quando uma cabeça começou a procurar a outra…

—Como licença! - Perna-de-peixe bateu as mãos contra a mesa de madeira com tanta força que algumas gotas da sopa dela voaram para fora da tigela.

—Perna-de-peixe. - Astrid o olhou em alerta.

—Acaba com ele, maridão! - Cabeçaquente exclamou enquanto se empoleirava no ombro esquerdo de Perna-de-peixe enquanto Cabeçadura ficava do outro lado. Astrid passou a mão sobre o rosto suspirando pesadamente já prevendo o pior.

—Uma cabeça estava procurando outra cabeça porque ela estava com medo. Porque pessoas ignorantes como você não percebem que os dragões só atacam quando se sentem ameaçados. - Perna-de-peixe disse sem desviar o olhar de Thanori. Era uma cena estranha, Perna-de-peixe era enorme, bem maior que Thanori, e não apenas na altura, seu amigo era corpulento e espaçoso, enquanto o líder de Hinkard era baixo e ocupava um pouco mais se espaço que Soluço.

—É isso aí! - Cabeçadura exclamou batendo nas costas do cunhado em incentivo.

—Isso vai acabar em uma guerra. - Melequento murmurou, Astrid se virou para encontrá-lo sentado na cadeira de Soluço. Ela arqueou as sobrancelhas. - O quê? Ele nem está aqui.

—Perna-de-peixe, Cabeçadura e Cabeçaquente, posso falar com vocês um segundo. - ela pediu já se levantando e arrastando Melequento pelo chifre de seu capacete para longe da mesa. Astrid não precisou se virar para saber que os outros três estavam lhe seguindo. Ela caminhou para um lado afastado do salão, o caminho que levava até o corredor dos chefes.

—Sabe, acho que você pode me soltar agora. - Melequento resmungou.

—Que tal tentarmos não começar uma guerra. - ela sugeriu da maneira mais irônica que conseguia, anos de convívio com Soluço ajudaram nisso. - Berk não precisa de novos inimigos.

—Eles são estúpidos!

—Eu sei que eles são, Perna-de-peixe. Mas eles apenas não tiveram a oportunidade de conhecer os dragões como nos conhecemos. - ela disse. - Sei que vivemos em paz com dragões, e acabamos esquecendo que outras ilhas não são como as Berk. Eles não tiveram um Soluço para mudar suas opiniões. Thanori só fez o que sua tradição mandou. Ele não tem culpa de ser um ignorante com os dragões.

—E ser tão idiota como uma galinha. - Melequento murmurou.

—Hey! Não ofenda as galinhas! - Cabeçadura disse indignado. Astrid revirou os olhos.

—Agora vamos voltar para lá. Tentem se manter calmos ou eu mesma farei vocês se acalmarem. - ela ameaçou. - Do jeito mais viking possível.

—Embora eu esteja muito curiosa para saber o que você iria fazer com a gente. Prefiro continuar o meu jantar. - Cabeçaquente falou antes de girar e sair de volta para o salão. Astrid a seguiu ainda lançando olhares de repreensão para os outros. Ela já estava perto de sua mesa quando sentiu alguém puxar seu braço com cuidado, Astrid se virou e sorriu minimamente ao encarar sua mãe.

—Você está bem? - ela indagou passando a mão sobre o cabelo dela e abaixando os fios rebeldes.

—Estou. Apenas estou tomando cuidado para não começar uma nova guerra. Preferia que Soluço estivesse aqui. É ele quem cuida dessa parte diplomática. Eu sou um desastre nisso.

—Não, você não é. Soluço confiou a tribo a você porque sabia que é a melhor opção. Você é a esposa dele. A pessoa em que ele mais confia, e só os deuses sabem o quanto aquele garoto ama você. - Astrid riu baixinho sentindo a mão de sua mãe descer até seus ombros. - E o quanto você o ama. Você não é apenas uma das melhores chefes de Berk apenas porque é a primeira a mulher a comandar  a aldeia, mas porque você faz isso com o coração. Você é ótima no que faz, querida. - Astrid sorriu e assentiu com a cabeça, sua mãe sorriu de volta. - Agora faça um favor a todos e volte para o salão antes que o garoto Ingerman soque o tão grande, e cabeçudo, chefe de Hinkard.

—Mãe!

—Não diga não percebeu o quanto ele é cabeçudo. Nem um nadder mortal tem uma cabeça daquele tamanho.

Astrid se viu rindo ao ser levada de volta a sua mesa. Mal podia esperar para contar tudo a Soluço quando ele voltasse.

♢♢♢♢

Ela acorda antes do sol nascer, mas mesmo assim já pode ouvir o barulho das mulheres na cozinha. Valka ainda está dormindo ao seu lado, a cabeça apoiada na parede e as peles apertadas contra seu corpo. Astrid empurrou lentamente o cobertor grosso que elas dividiam e se levantou tentando fazer o mínimo de barulho possível. Então com cuidado ela passa pelo meio dos labirintos de pernas e braços estendidos tentando não pisar em ninguém.

Astrid segue até o corredor dos chefes puxando o casaco de Soluço contra o seu corpo, ela pode sentir os bonecos dos dragões cutucando sua barriga e o bebê. Ela caminha pelo corredor observando as figuras imponentes pintadas nos escudos, os antigos chefes de Berk, a linhagem de Soluço e de seu filho. Astrid para na frente do escudo de Stoico, seu sogro tem um olhar onipotente enquanto uma das mãos está sobre o ombro de um pequeno e franzino Soluço. Ela sorriu minimamente antes de se aproximar do próximo escudo, um suspiro sai pela sua boca ao observar seu marido. Instintivamente ela coloca a mão sobre a barriga acariciando-a sobre as camadas de tecido.

Astrid senta na parede oposta ao quadro de Soluço, com a mão ainda sobre a barriga, ela sussurra baixinho.

—Seu pai é um grande homem, sabia? E não estou falando de seu físico, ele ainda está meio abaixo dos padrões vikings, mas ele definitivamente está acima no nível de inteligência. Ele é um grande bobão pacificador, ele faz de tudo para evitar confrontos e isso é muito bom porque eu nunca tinha visto tantos vikings pedindo desculpas um para o outro. - ela disse enquanto colocava a cabeça contra a parede. Astrid encarou a pintura em silêncio, o casaco de Soluço apertando contra seu corpo e o cheiro dele faziam com que ela se acalmasse.

—Eu tenho que admitir que nem eu sabia que Cabeçadura tinha um talento como esse. - Cabeçaquente disse se sentando ao lado dela. Astrid riu e aceitou o manto que ela estendia para que elas dividissem. - Soluço ficou tão gostoso nessa pintura.

—Quente!

—Que? Eu apenas estou dando um singela opinião. Não é como se eu não tivesse falado isso antes.

Astrid revirou os olhos. Ela já havia falado aquilo antes. Muitas vezes.

—Ainda é cedo, você não deveria estar dormindo? - ela indagou apertando o manto entre os dedos.

—Perna-de-peixe rolou para o lado e eu caí, eu estava usando-o como travesseiro. - Quente disse. O clima ainda estava mais frio do que no salão, pelo menos lá eles tinham fogo. - Perna-de-peixe quer um filho. - ela subitamente falou, Astrid apenas a encara pelo canto do olho. - Eu não deveria estar surpresa, somos mulheres vikings, normalmente temos filhos aos quinze, acho que somos as únicas que ainda não tem filhos.

Astrid abriu e fechou a boca sem saber o que falar. Ainda não.

—Acho que estamos ocupadas demais salvando o arquipélago e os dragões.

—É. Mas mesmo com tudo isso, eu ainda sinto mais medo de um bebê do que de dez caçadores.

—Eu sei. Eu também me sinto assim.

—Imagine eu, sentada em uma cadeira com os pés para cima sendo paparicada para dar à luz a bebês gorduchos de olhos azuis como os meus. E então eu vou ser ainda mais paparicada… Ok. Você me convenceu. Eu quero bebês!

Astrid riu batendo com o ombro contra o dela. As duas ficaram em silêncio, apenas com o barulho das pessoas despertando no salão. Astrid sabia que teria que se levantar e ir até suas visitas, como chefe de Berk ela deveria ser cordial e educada, mas depois da histórias de ontem ela mal conseguia olhar para cara de Thanori sem querer esmagá-la.

—Quando nossos visitantes vão embora? - Cabeçaquente indagou, Astrid retirou a manta e se levantou, sua amiga repetiu a ação.

—Logo, eu espero. A tempestade já passou e eles já podem seguir seu próprio rumo.

—Toda a aldeia ficará grata por isso. - Astrid riu concordando com ela. Era óbvio o desgosto do povo pelos visitantes indesejados. - Agora eu tenho que voltar antes que Perna-de-peixe acorde, vou aproveitar para ir até a minha casa e ver como está a situação. Talvez um parede tenha caído e Perna-de-peixe aceite minha sugestão sobre ampliar o nosso quarto.

—E se a parede não estiver caída?

—Então eu terei que derrubá-la. Porque é como aquele velho ditado, quando uma parede cai, amplie e faça um quarto de rei!

—Não acho que esse ditado exista. - Astrid disse, mas Quente apenas riu e a puxou pela mão.

—Ninguém precisa saber.

♢♢♢♢

Os perdas não haviam sido tão exorbitantes, fora alguns telhados caídos e árvores curvadas, ninguém havia se ferido ou teve a casa totalmente destruída, para infelicidade de Cabeçaquente. Agora Astrid seguia feliz até o porto para dizer adeus aos visitantes, metade de Berk havia havia se empoleirado na borda do penhasco para observar a partida dos barcos.

—Devo dizer que a estadia foi melhor do que eu imaginava. - Thanori disse com aquele tom rude. - Dormir no chão não é uma grande experiência, mas foi como acampar.

Astrid tinha certeza que ele não sabia como era realmente acampar.

—Berk é um lugar tão bonitinho. - Freyan afirmou segurando o braço do marido com força, desde que havia chegado Astrid pode notar seu incômodo, ela parecia tentada a pular no mar e nunca mais voltar. - Agora vamos.

—Claro, apenas… - Thanori olhou ao redor parecendo procurar alguém. - Onde está Theria? Não a veja desde que acordamos.

Astrid reprimiu o impulso de revirar os olhos, ela estava inquieta e o que mais queria era jogar todos nos barcos e mandá-los embora. Aquilo era algo que seu eu de quinze anos faria, mas definitivamente não era algo Astrid Haddock poderia fazer.

—Kiron, veja se ela está no barco. - Thanori ordenou e um dos seus guerreiros saiu a passos rápidos até o barco mais próximo. Pelo canto do olho Astrid notou uma Valka impaciente, ela também não havia gostado muito da visita. A tensão era quase palpável em toda a aldeia, mas todos sabiam que os ânimos iriam se acalmar e que tudo voltaria ao normal assim que os barcos deslizassem para além do porto.

Então de repente um grito tomou o ar, Astrid sentiu seu estômago revirar prevendo o pior. Melequento foi subitamente lançado do barco caindo de barriga no cais, ela respirou fundo e não moveu nenhum músculo quando viu seu amigo apenas de roupas íntimas se encolher diante dos olhares que toda a Berk lhe lançava, Theria estava um pouco mais atrás apertando o robe contra o corpo. Astrid não precisou de palavras para saber o que ele havia feito. Ela se perguntava como era possível que Melequento conseguisse estragar tudo sem nem precisar abrir a boca. Era incrível!

 


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Notas finais do capítulo

Obs. Cabeçaquente é um patrimônio histórico que deve ser preservado.



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