Espadas, Chamas e Chifres escrita por Risadinha


Capítulo 2
Bigode


Notas iniciais do capítulo

Primeiramente, sinto muito pela demora. O cap está bem básico, por isso não está grande. Nesse começo, muitas coisas ainda vão estar para acontecer... mas relaxa que piorá kkkkkkkkkk
Enfim, não quero ocupar vocês.
Boa Leitura!



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Elesis não gostava de olhar as veias escuras de seu braço, mas era preciso. Toda vez que olhava, a aparência tinha mudado. Ou clareavam ou escureciam. Nunca sabia como estariam.

Ela puxou as mangas do casaco, pondo um fim na sua ansiedade do dia. Tinha questões maiores para resolver.

Por isso entrou no Conselho. Nenhum soldado a parou, seu caminho seguiu firme pelos corredores já reformados do prédio. A última vez que esteve ali, paredes não existiam pela delicada intromissão de Gerard. Dois anos deve ter sido o suficiente para a reconstrução do desastre deixado por ele.

— Ora, quem é vivo sempre aparece.

No silêncio do corredor, Elesis esperava ouvir qualquer vozes além daquela; até mesmo Cazeaje em si serviria. Infelizmente, aquela pessoa era tão pior quanto a antiga líder.

Elesis se voltou para Edel, um sorriso tão cínico quanto da capitã.

— Infelizmente, digo o mesmo de você — disse Elesis. — O que faz ainda aqui? Achei que tivesse voltado para Serdin com seu irmão.

— Canaban precisa de ordem, então estou aqui a serviço do líder. — As mãos se gesticularam em volta do uniforme que usava. — Diferente de você, sem função alguma aqui.

Edel poderia ter mudado visualmente, o cabelo pálido amarrado em um rabo de cavalo, parte próxima à nuca raspada. Ela parecia letal; mais do que verdadeiramente era. No entanto, a personalidade ácida continuava consigo.

— Eu fiz muita coisa, ok? — retrucou Elesis, começando a perder a postura. — Mais do que você e seu traseiro real.

Edel se manteve firme.

— Ter acompanhado Lass numa missão importante não é um trabalho.

Elesis contorceu os dedos das mãos, preparada para esganar Edel pelo pescoço. Mais uma provocação e ela teria feito isso, porém se conteve. Deixaria isso para uma outra hora.

— Tanto faz! Eu tenho um encontro com seu líder, então com licença.

Elesis parou diante a lâmina do florete. Edel manteve a arma apontada para ela, sem aparentar hesitação do que poderia fazer.

— Não é tão simples assim, Elesis. O líder está muito ocupado.

A espadachim acertou um tapa na ponta da lâmina.

— O seu líder está ocupado — ela disse. Então abriu um sorriso debochado. — Meu amigo não.

Elesis seguiu adiante, com avisos ríspidos vindos da capitã. Se Cazeaje nunca foi capaz de impedir a espadachim de conseguir algo, do que Edel seria?

***

— Rabo de cavalo!

Elesis invadiu a sala do jeito mais invasivo possível. Sentado do outro lado da mesa, atrás de pilhas de papéis, estava Ronan, assustado com a entrada repentina da espadachim.

— Hã, Elesis? — O rapaz perguntou, atordoado. Ele largou a caneta, estendendo as trêmulas mãos na frente do rosto. — Eu não estou sonhando?

Enquanto Ronan continuava a questionar a própria sanidade, Elesis se aproximou da mesa. Notou como seu velho amigo parecia exausto, olheiras marcando a expressão e o longo cabelo solto sobre os ombros.

— Você é mesmo real? — Ronan perguntou para ela.

Elesis abriu um sorriso sereno e acertou um tapa na testa do mesmo. Ele se encolheu em dor.

— Isso é real o suficiente?

— Acho que sim — murmurou Ronan. — O que faz aqui? Digo, depois de tanto tempo.

Elesis se sentou na beira da mesa, empurrando as pilhas de papeis para o lado.

— Todo mundo vai mesmo perguntar isso? Eu voltei! Festejem!

— Não é bem uma festa que quero fazer para você. — Ele arrumou a postura, enfim o Ronan que Elesis conhecia. — Precisou mesmo dois anos para você voltar?

— Olha, eu não planejei ficar dois anos fora — foi sincera. — Mas coisas aconteceram, coisas se resolveram e... aqui estou!

Ronan manteve seu olhar fixo em Elesis por um longo instante, até, enfim, um sorriso quebrar a expressão cansada dele. De repente, não era mais o líder de Canaban sentado atrás da mesa, e sim o velho amigo de infância da espadachim.

Elesis esticou a mão e Ronan a apertou.

— É tão bom saber que você está de volta — ele comentou. — Sentimos sua falta.

— Pretendo não ir embora tão cedo. Acho que alguns dias de folga me farão bem.

Ronan soltou a mão de Elesis, rindo de maneira genuína.

— Não, Elesis, você não vai ter folga porque isso não faz parte da sua natureza.

Ela não precisou pensar muito para concordar.

— Verdade. Teria alguma missão pra mim, a propósito?

— Não, e mesmo que eu tivesse, não te daria uma. Vá descansar, Elesis.

— Diga para um pássaro não voar. — Ela se apoiou na pilha de papeis ao lado. — Vamos, me diga algo que eu possa fazer.

Ronan pegou alguns papeis e bateu na mesa, organizando todos em uma pilha.

— No momento, estou muito ocupado com o torneio continental, então não, não tenho algo para você — ele abriu um sorriso falso.

Elesis fez uma careta e Ronan mostrou a língua. O momento infantil durou pouco, terminando na percepção da espadachim ao que seu amigo disse.

— Espera. — Elesis arrumou a postura, mais atenta. — Torneio continental?

— Ah. — O som saiu engasgado. A forma como Ronan reagiu dizia muito sobre o que pensava no momento.

Não era para ter dito.

Principalmente para aquela pessoa que Elesis era.

— O que é esse torneio?! — Um brilho cresceu nos olhos da mesma. — Eu posso participar?!

Ronan ergueu ambas as mãos.

— Calma, Elesis. Isso não é para qualquer guerreiro como você — ele disse.

— Eu não sou qualquer um! — Olhou ofendida. — Esqueceu que foi por minha causa que você está sentado aí?

Pelo suspiro soltado, Ronan sabia ao que ela se referia. Embora Lass tenha parte dessa responsabilidade, Elesis deu início a toda revolução contra Cazeaje. A espadachim era alguém tão importante que agia excentricamente, o que a fazia parecer menos por tudo que fez.

— Não estou dizendo que você é fraca — corrigiu o rapaz. — Estou dizendo que esse torneio não é seu. Pertence aos Conselhos, a pessoas importantes.

Dessa vez, Elesis cruzou os braços.

— E eu não sou importante? — Ela questionou.

O líder do Conselho de Canaban não sabia mais o que dizer à pequena fúria escarlate.

— Isso não é exatamente um torneio aberto — continuou a falar, contudo. — Sete pessoas são escolhidas para representar cada continente.

— Eu posso representar um.

Ronan riu.

— Desculpe, não é assim que funciona, Elesis. Durante esses dois anos, deve ter percebido isso.

A espadachim descruzou os braços. É, ela tinha percebido.

***

A neve continuava a cair e Elesis não sabia até quando. Desde que chegou em Canaban, o frio congelante não foi embora; aparentemente, não iria tão cedo.

Além do mais, ela não se importava, apenas quando estava do lado de fora. O que era agora. Agasalhada dos pés a cabeça, a espadachim carregava sua espada nas costas enquanto procurava por algum lugar da escola para treinar. Todos os salões de treino estavam ocupados por garotas e garotos, alunos demais para ela lidar sozinha.

Adulta, era o que Elesis era. Não agia como uma, mas deveria, principalmente na frente dos novos alunos da Lothos e Grandiel.

O pensamento esvaiu da espadachim ao parar em meio ao pátio coberto por neve. Um local grande e vazio, somente ela e sua espada. Um ponto vermelho em meio ao branco. Sem muito o que fazer, Elesis começou a juntar neve, deixando sua criatividade a levar para algum lugar com aquilo.

Quando percebeu, um boneco de neve tinha sido feito. Não o melhor, era muito feio a ponto de Elesis se questionar sobre suas habilidades artísticas.

Então ela se afastou da criação, na esperança de achar algum ângulo que favorecesse o amontoado de neve. Não encontrou. Sem sucesso, sentou-se na neve, encolhida do frio enquanto observava o boneco.

— Cunhadinha!

A palavra ecoou pelo pátio. Elesis congelou, de todas formas possíveis. Não era uma palavra que esperava ouvir, muito menos vinda dele.

Lupus parou do seu lado, mãos na cintura e um sorriso debochado no rosto.

— Há quanto tempo! — Ele gritou, dramático.

Elesis não se expressou na mesma empolgação. Um olhar nervoso foi tudo que deu.

— De todas as pessoas, você não era quem eu esperava encontrar, Lupus.

— E ainda tem um ótimo senso de humor. Senti falta disso.

Elesis bufou uma fumaça de ar.

— O que faz aqui? Achei que você estivesse em outro lugar — ela questionou.

Lupus se moveu, traçando um caminho aleatório pela neve.

Distante, Elesis pôde ver melhor sua aparência. Nada havia mudado no jovem caçador. O mesmo corte de cabelo, o mesmo jeito letal de andar. Por ser um haro, talvez sua aparência não mudasse tanto quanto um humano.

— Não faz muito tempo que voltei, ruiva — respondeu o caçador. — Tenho trabalho para fazer.

— Então você vai ficar aqui... no colégio?

— Grandiel cedeu meu antigo quarto, então sim, vou ficar por aqui. — Um longo sorriso se abriu. — Será ótimo passar mais tempo com minha cunhadinha.

— Ughr!

Lupus continuou a andar, até parar ao lado do boneco de neve. Não reparou nos detalhes feios da figura, simplesmente apoiou o braço sobre a cabeça do mesmo e olhou firme para Lesis.

— Falando em família — ele mencionou —, onde está meu querido irmão?

Aquela pergunta. Novamente. Por outra pessoa.

Elesis o encarou.

— Por que não liga para ele e descobre? — Rebateu a espadachim.

— Porque ouvir você falar é melhor. — Elesis manteve o semblante mais sério, e Lupus percebeu sua reação. — Algo aconteceu?

Elesis desviou o olhar. O bastante para as sobrancelhas do caçador arquearem.

— Então algo aconteceu.

— Estou começando a achar que seu único propósito na vida é tornar a minha um inferno.

— Um deles — ele ergueu um dedo. — Os outros envolvem ganhar dinheiro.

A espadachim revirou os olhos.

— Mas tenho que dizer, eu me preocupo com meu irmão. Temo que ele possa sair ferido dessa relação.

O incomodo de Elesis podia ser sentido de onde Lupus estava. Ela parecia brava, mas uma ira contida e transformada em seriedade.

— Eu nunca faria algo assim com o Lass — ela disse. — Nunca.

— Nesse caso, ele fez algo.

Sem uma resposta da parte da espadachim, o caçador teve sua confirmação.

— O que meu irmão fez com você?

Uma pergunta que parecia soar preocupação, mas que era apenas feita por mera curiosidade.

— Encontrou outra garota, só que menos esquentadinha? — Questionou Lupus.

Elesis se ergueu, punhos cerrados como os olhos carregados de raiva. Apesar disso, o caçador não mudou a postura.

— Ou ele quer uma loira agora?

— Você não veio fazer uma missão? Por que não vai logo?!

Lupus desencostou do boneco de neve, mas não saiu do lugar.

— Estou com tempo de sobra, não se preocupe — disse ele. — Aparentemente, você também.

— Também tenho missão para fazer — olhou ofendida.

— As missões do Lass não são suas.

Elesis tirou a espada das costas. O simples manuseio da lâmina fez a neve a sua volta desaparecer. Ou melhor, derreter. Mana exalava da espadachim, apenas o calor das suas chamas vermelhas sendo o suficiente para isso.

Lupus não reagiu, ainda provocativo de onde estava.

— Você sabe que é verdade — insistiu o mesmo.

A neve que sobrou à volta subiu no momento que Elesis avançou. Um raio vermelho disparado em direção ao caçador. Bastou um corte com a espada e outra parte da neve derreteu.

Além disso, o boneco que ela tinha construído. Partido ao meio, apenas o torso para baixo mantido inteiro. O que não poderia dizer o mesmo de Lupus. Elesis olhou em volta à procura do mesmo, apenas o encontrando metros distante dela.

E do lado do caçador, uma figura mais alta e com chifres.

Elesis mudou a postura ao perceber Dio. O longo cabelo que o asmodiano agora tinha dificultou o rápido reconhecimento da espadachim.

— Dio! — Elesis exclamou, surpresa.

Ela guardou a espada nas costas. Ao dar o primeiro passo na direção dele, um vulto escuro veio de outra e a pegou pelo torso. Elesis caiu no chão junto com a figura desconhecida.

— Ela está de volta!

Elesis continuou caída no chão, perdida no que aconteceu. Explicações surgiram quando a pessoa que a derrubou se levantou, visível para ela.

Sieghart segurou Elesis pelos braços e a pôs de pé. No entanto, a espadachim se manteve paralisada diante o mesmo.

— Sieg? — Elesis perguntou, tanto para si quanto para o próprio rapaz.

— Sim, sou eu! — Ele respondeu.

Pela voz e agitação, ela sabia que era seu antigo amigo, mas algo a impedia de reconhece-lo por completo.

Então Dio parou ao lado dela, um sorriso em compreensão.

— Você se acostuma — comentou o asmodiano.

— Ah — exclamou Sieghart. — Está surpresa por causa disso?

Ele apontou para o próprio rosto. Para o grosso bigode. Lentamente, Elesis assentiu em confirmação, sem conseguir desviar o olhar do novo “acessório” preso ao rosto do rapaz.

— Que horror — comentou Lupus.

— Ei! — Sieghart olhou ofendido. — Não me insulte só porque está com inveja.

— Não estou, pra ser sincero.

— Diz isso, mas gostaria de ter um que eu sei.

Todos olharam com negação.

— Eu já falei pra você raspar essa coisa — debateu Dio. — Parece um rato colado na sua cara.

Com isso, toda seriedade do momento se rompeu. Elesis riu, Lupus abriu um sorriso de lado. Sieghart não teve a mesma reação.

 ***

Elesis colocou a mão no peito. Sob seus dedos e o tecido da roupa, ela sentiu seu coração bater. Era uma batida acelerada, que logo se acalmou quando percebeu.

— Por que não deixa o cabelo crescer?

A pergunta de Sieghart a tirou dos pensamentos. No refeitório, apenas tinha eles, Dio e Lupus ocupando a mesa. Ela tinha se distanciado da conversa que tinham.

— Eu gosto dele assim — ela respondeu. — Também serve de lembrete.

Sieghart continuou a comer sua comida enquanto a observava. Ele fez um gesto com a mão, para que ela continuasse a explicar.

— Eu não tenho mais as outras chamas, então meu cabelo não muda de cor mais ­— disse em um tom baixo. — Por isso eu deixo assim, porque só tenho as vermelhas agora.

Sieghart parou de comer.

— Espera... como você perdeu as chamas? — Ele questionou. A mesma pergunta era vista nas feições de Dio e Lupus. — Eu nem sabia que tinha como perder as chamas.

— Depois da luta contra a Cazeaje. É difícil explicar — soltou uma risada nervosa.

Nenhum deles reagiram igual. Elesis encarou as próprias mãos, o sorriso ainda presente.

— Não que eu tenha me tornado uma inútil, sabe? Apenas perdi parte dos meus poderes.

— Eu acredito que você ainda consiga vencer o Sieghart, Elesis — disse Dio, sorrindo.

Ela sorriu de volta.

— Não força a barra, Dio — Lupus interferiu. — Elesis é apenas mais uma espadachim qualquer.

— Uma espadachim que te derrotou e matou Cazeaje — rebateu Elesis, orgulhosa.

— Você me derrotou uma única vez. — Lupus levantou da cadeira. — E foi o Lass quem matou Cazeaje.

A seriedade cresceu imediatamente na espadachim. Sua espada não estava mais em seu cinto, havia deixado no quarto antes de vir para o refeitório. Era uma sorte para Lupus, porque ela teria agido sem pensar.

— E mesmo assim, ela fez mais coisa que você — Dio dirigiu a palavra para o haro.

Lupus poderia entrar na mesma onda de intensidade que Elesis demonstrava. Faltava um único empurrão para ambos começarem uma luta ali. No entanto, Lupus tinha um temperamento controlado, inabalável para agir como a ruiva do outro lado da mesa.

Ele deu um sorriso de lado, então assentiu para Dio.

— Essa discussão não vai a lugar nenhum ­— comentou Lupus, andando em direção à saída. — Nos vemos depois.

Elesis apenas observou o mesmo partir e dar entrada para Jin. O ruivo pareceu surpreso ao passar por Lupus, porém não teve cumprimento de nenhuma das partes.

Jin deu um aceno para Dio, então se voltou para Sieghart.

— Você ainda está com essa coisa na sua cara? — O ruivo perguntou.

— O que deu em vocês hoje? — Indagou Sieghart. — Hoje é o dia de me perturbar?

— Na verdade, esse dia — dizia Elesis — são todos os dias.

Todos riram, menos o próprio motivo das risadas.

De repente, Elesis berrou. Suas mãos pararam contra o peito novamente, a dor e as batidas do coração se elevaram. Perguntas de preocupação surgiram a sua volta, incapacitada de responder qualquer uma no momento.

— Elesis, o que foi? — Jin perguntou, desesperadamente preocupado.

Então, a dor simplesmente deslizou para fora de seu corpo. As batidas do coração continuaram aceleradas, mas a dor não existia mais.

— Teve um ataque cardíaco? — Sieghart perguntou. Pareceu uma piada típica dele, o que não era pela expressão séria que ele esboçava.

Elesis negou.

— Não... Parecia uma espada atravessando meu peito — ela respondeu.

— Tipo um ataque cardíaco.

— Não, era exatamente uma espada... deixa pra lá. Estou bem, isso que importa.

A preocupação não desapareceu, pelo contrário, pesou mais.

Elesis poderia ser a espadachim mais forte de todo mundo, ter derrotado a maga mais forte de Ernas, mas ainda seria vista como uma garota que precisa de apoio dos outros. Ela poderia precisar, o que não admitiria.

Tudo estava bem, reforçou com um sorriso bem convincente.

***

Elesis ainda conseguia sentir a dor em seu peito. Pelo restar dessa sensação fria, ela encarava o celular em mãos, indecisa do que realmente fazer. Segundos se passavam e nenhuma coragem a motivava a fazer o que tinha que ser feito.

Elesis cruzou os braços e pernas. Não sabia por que estava do lado de fora, sentada na beirada de um chafariz congelado. Ela poderia muito bem ter pensado sobre isso dentro do colégio, mas, aparentemente, o frio a forçava tomar uma escolha.

— O que faz aqui fora, Elesis?

Lothos se aproximou, braços cruzados sob o grande casaco que usava. Como Elesis, seu cabelo curto balançava pela fraca brisa da noite.

— Eu precisava pensar — disse a espadachim. — Aqui é um bom lugar para isso.

O olhar da comandante se estreitou, procurando por outro motivo. Foi então que viu o celular nas mãos de Elesis.

— Sei que não deveria perguntar sobre isso...

Pelo tom usado, Elesis soube do que se trataria a pergunta.

— Então não faça — ela pediu, sem parecer grossa.

— Mas eu vou fazer porque me preocupo com você. O que aconteceu entre vocês?

Elesis manteve um longo olhar para a comandante, então o desviou para o lado. O que tivesse para responder, ela evitou.

Lothos sentou ao lado dela. Próximas e sozinhas, as duas guerreiras pareciam pessoas comuns tendo uma conversa diversa. Mas o assunto não era tão simples quanto parecia.

— Às vezes, eu sinto falta do Astaroth — sussurrou Lothos.

Mas Elesis conseguiu ouvir. A única pessoa que deveria saber disso.

— Por mais que eu o odiasse maior parte do tempo, eu gostava dele — continuou Lothos. — Não em um jeito romântico.

A comandante agitou as mãos, nervosa. A espadachim conteve uma risada, mas esboçou um sorriso.

— Consigo entender o motivo — comentou Elesis.

— Astaroth, por mais que não parecesse, era um grande amigo.

— Não sei, ele quase me matou uma vez.

— Se Astaroth quisesse te matar, teria feito isso em segundos. — Elesis olhou ofendida e Lothos balançou os ombros. — Essa é a verdade.

Era uma verdade, o que não significava que a espadachim concordaria com isso. Sua última luta com Astaroth quase acabou com ela, resultando em sua derrota. Entretanto, uma derrota injusta por uma luta desequilibrada; Astaroth no seu 100% e Elesis com o problema nas pernas. Como poderia ganhar assim?

Embora isso, a espadachim não corrigiu Lothos. Permaneceu em silêncio, atenta ao que ouvia.

— De qualquer jeito — a comandante retomou o assunto —, o que estou querendo dizer com isso é: ficar com raiva de alguém tão próximo não é bom.

— Por que diz isso? — Elesis a olhou de sobrancelhas arqueadas. — Não é como se o Lass fosse morrer.

— Morte não deveria ser sua maior preocupação. Há outras maneiras piores de perder uma pessoa, Elesis.

Um frio interior que fez a espadachim se remexer. A machucava o pensamento, a simples possibilidade de ficar eternamente distante das pessoas que amava. Lass, tecnicamente, poderia não morrer por causa das chamas, mas ainda podia perde-lo.

Raiva não era capaz de suprimir suas outras emoções por muito tempo. Uma hora ou outra, o gás acabaria.

Lothos levantou. Neve se acumulava em seus ombros.

— Vamos entrar — a comandante gesticulou.

Elesis também levantou, mas não saiu do lugar.

— Você diz que sente falta do Astaroth — mencionou Elesis. — Então o que diria se o visse? Agora, nesse instante.

Pela surpresa que teve, ela nunca tinha parado para pensar sobre isso.

— Bem... não seria palavras que eu usaria para me expressar.

Elesis riu e Lothos esboçou o mesmo. Elas conseguiam concordar em uma coisa.

***

Tem algo de errado com a Elesis.

A voz rouca ecoou dentro da cabeça de Lass. Não a escutou na primeira vez, somente na segunda quando as chamas usaram o nome da espadachim para chamar sua atenção.

— Do que você está falando? — Ele perguntou.

Eu não sei, só sinto uma mana diferente nela.

Lass passou a mão pelo rosto, suor e respingo de sangue deixando sua face. Cansado, era isso que estava, mas permaneceu andando pela trilha da floresta.

— Olha, se veio apenas me dizer isso...

É uma mana diferente. Uma que ela nunca teve antes.

Lass parou. Não pelo que as chamas disseram, e sim pela aproximação repentina.

Ele se virou, katana de lado e um passo à frente. Um rápido corte no ar e o garoto com a faca na mão desabou no chão. Como todo os outros que tentaram se aproximar do ninja.

Lass tirou o sangue da lâmina e a devolveu a bainha.

O que você acha?

— Eu não sei — e realmente não sabia o que dizer. — Mas deve ser importante para você me avisar.

Eu te aviso sobre coisas importantes.

Lass colocou a mão sobre o peito, acima do corte que ainda se curava.

— Você não falou sobre o cara de antes que me perfurou com uma espada.

Ainda doía. Normalmente, todos os ataques que ele recebia poderiam ser lidados por serem um costume da sua rotina de combate. Mas foi a primeira vez que usaram uma espada mágica nele. Entendia de onde vinha a estranha sensação, tão nova e familiar.

— Tanto faz...

Voltou ao seu caminho. Passando sobre corpos que antes se moveram contra ele com armas e magias. Agora apenas se tratavam de cadáveres.

— Estamos voltando para casa — anunciou Lass.


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Notas finais do capítulo

Review?
* Lass is coming



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