Quando Tudo Mudou escrita por Ronaldo Araujo


Capítulo 1
Capítulo 1




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Capítulo 1 

Eu sou um garoto de 17 anos normal como qualquer outro, embora muitos não concordem comigo. Eu tenho sonhos, faço planos para o futuro, quero ter filhos, quero me casar um dia e quero muitas coisas que qualquer jovem em qualquer parte do planeta também quer ter. Talvez eu seja considerado atípico por não gostar de certas coisas que a maioria dos jovens da minha idade gosta ou talvez por levar uma vida diferente da deles, mas mesmo assim eu sou um garoto comum. Antes que você se pergunte, isso não se trata de algum tipo de doença rara ou qualquer coisa semelhante. É apenas o meu jeito de ser, o meu estilo que, apesar de não ser provocador, incomoda muita gente e faz com que se afastem de mim ou que me chamem de esquisito, mas eu não estou nem aí. Eu não me importo e nunca me importei.

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O ano de 2014 foi o ano em que a minha vida tomou rumos que até então eu não imaginava, foi o ano em que aconteceram muitas coisas, muitas delas inesperadas e irreparáveis. Foi o ano que me moldou, que me ensinou muitas coisas, que me transformou e que me adaptou. Esse ano tem muito do que eu me tornei hoje. Esse ano foi o ano em que tudo mudou.

No verão de 2014 eu conheci dois grandes amigos, Allan e Mathew. Eu não sou de fazer amigos facilmente, mas os conheci na escola no começo do ano e nos apegamos rapidamente. Lembro-me bem que Allan e Mathew vieram juntos de outra escola e, logo de cara, fizeram amizade comigo na primeira semana de aula. Antes de conhece-los eu me sentia sozinho, isolado, abandonado, rechaçado, rejeitado e infeliz. Mas ainda bem que os conheci. Hoje somos um trio.

Eles são aquele tipo de amigos que é bem presente na nossa vida, sabe? Aquele tipo de amigos que compartilha tudo conosco, por mais insignificante que seja o assunto. Que enche o nosso chat com memes os quais somos forçados a responder. Aquele tipo de amigos que conta piadas sem graça a fim de nos fazer rir e, apesar de não ter graça alguma, somos obrigados a rir para não perder a amizade. Admita, todos nós temos esse tipo de amigos. E se você não tem, provavelmente você seja esse amigo para alguém, ou estou errado?

Meus dois melhores amigos são aquele tipo de pessoa que vira a noite jogando videogame comigo sem se cansar ou se queixar porque já é tarde, que compartilha todas as notas tiradas nos exames e que ri da nossa cara quando consegue uma nota maior que a nossa. Eles são demais, se parecem muito comigo, o que fez com que eu gostasse ainda mais deles, pois antes de conhecê-los, eu não tinha amigos, a não ser o meu cachorro Einstein que desde sempre soube me dar atenção. Sim, por mais estranho que possa soar, eu tenho um cachorro que se chama Einstein. Sim, eu sou apaixonado por física, algum problema? Mas apesar de eu ter um cachorro com um nome de um dos caras mais brilhantes na minha concepção, o nome não foi exatamente devido ao fato de eu ser “casado”, ter um caso de amor ou algo do tipo com a física moderna, dei esse nome ao meu cachorro porque ele tem um bigodinho em curva que se assemelha muito ao de Albert Einstein. Ele pertence à raça Bearded collie, sabe? É aquele tipo de cachorrinho de pelos lisos. Eles são basicamente uma bola de pelos ambuante.

Enfim, vou parar de falar do meu cachorro e vou dar continuidade ao “currículo” de meus dois grandes amigos. Embora eu tenha dito que Allan e Mathew se parecem muito comigo, somos caras extremamente diferentes fisicamente. Allan é branquelo, tem cabelos negros e bastante lisos que cobrem toda a sua orelha. Ele usa uns óculos de lentes muito grossas que mais parecem duas lupas que ajudam seus dois olhos grandes e castanhos a enxergar melhor. Tem o nariz afilado que aponta na direção de baixo como o bico de uma águia.  Além disso, Allan é maior que eu e é um pouco gordinho. Por outro lado, Mathew é negro, magrinho, tem olhos castanhos escuros e não tem o cabelo muito grande, pois acho que não o favorecia, a não ser que decidisse usar Black Power. Tem uma boca grande e o nariz um pouco achatado. Ele também é maior que eu, mas é menor que Allan. Meus dois amigos são altos, sua altura se resume a 1,80 e 1,75. Me sinto um anão na frente deles.  

Eu tenho 1,65 de altura e não me considero tão baixo, me considero uma pessoa de tamanho médio, embora me sinta sempre o menor do grupo. Não me considero branco, me vejo com um tom muito amarelo, não como os Simpson, mas mais amarelado que os asiáticos, se é que me entende. Tenho os olhos um pouco pequenos, mas não são puxados. Não quero além de nerd, ser chamado de japa. Meu cabelo é castanho claro e não o deixo muito longo, mas é estilo Beatles. Estilo boyband. Meus olhos são negros e não uso óculos, um fator que me favorece, pois, um dos estereótipos dos nerds é os óculos. Me sinto bem com isso, me sinto bem em não usar óculos. No entanto, é triste ter de usar aparelhos nos dentes devido ao fato de serem extremamente tortos e desajeitados, não como a representação das ondas sonoras, as batidas de um coração em seu estado normal ou como as letras de uma criança que está aprendendo a escrever, mas tortos como a torre de Pisa na Itália, só que amarelados devido a alta quantidade de café que eu tomo para me sentir acordado durante as noites em meu quarto.

Allan e Mathew, assim como eu, não se encaixam em quase nada. Eles não são da turma dos populares, nem dos atletas, nem dos descolados e tampouco dos riquinhos. As meninas não os notam quando passam pelos corredores. Ninguém lança um olhar de admiração ou desejo quando passamos, ninguém nos nota. Nem um olhar sequer. Acho que por isso nos damos tão bem, eles gostam exatamente das mesmas coisas que eu e estão exatamente na mesma situação desprezível que eu. Eles são de fato as pessoas com as quais eu mais me identifico. Nem minha própria família se parece tanto comigo como Allan e Mathew.

Não querendo me gabar ou enaltecer os meus amigos, mas eles sempre tiram boas notas em todas as provas e nunca mataram aula, como a maioria dos jovens de nossa escola. Sim, a maioria dos nossos colegas mata ou já matou alguma vez uma ou mais aulas, ou inclusive um dia inteiro de aula para passearem pela cidade ou ir à praia que fica a uns 40 minutos daqui. Não que isso seja uma característica específica dos jovens da minha cidade, mas desde que me mudei para essa escola (3 anos atrás), isso tem se tornado bem frequente. E para ser sincero, eu não sei qual a vantagem de se fazer tal coisa, principalmente quando se trata de alunos de escola privada que estão gastando atoa o dinheiro de seus pais para matar aula. 

Enfim, acho que você deve estar nos classificando como os nerds da escola como a maioria das pessoas, pois acho que só nos resta esta opção, não é mesmo? Para você podemos até ser da turma dos nerds, os esquisitões ou qualquer outro adjetivo referente a isso, embora eu não goste de ser tratado assim, pois acho que soa um tanto pejorativo. Mas tudo bem, basicamente eu sou um nerd, e me orgulho disso no bom sentido da palavra. Porém, não estou sozinho nessa, meus amigos são uns nerds também (risos).

Bem, antes que você se pergunte, eu me chamo Rick. Na verdade, me chamo Ricardo, mas preferiria não ter mencionado esse detalhe. Moro com meus pais em uma pequena e tranquila cidade no interior cujo nome não posso mencionar. Moramos na casa número sete desde quando me entendo como pessoa e temos dois vizinhos que moram na casa da frente, o senhor Patrick e a senhora Stephanie, ambos aposentados. Não os conheço bem para tentar descrevê-los com detalhes, mas tudo o que sei é que nunca tiveram filhos. Eu acho triste vir para este mundo e não deixar sua semente, lamento muito por eles. Talvez um dos dois seja estéril ou simplesmente decidiram não ter filhos, mas acho triste o fato de viverem sozinhos, sem filhos, sem netos correndo pela casa, fazendo bagunça em seu jardim. Na verdade, eu nunca vi a sua família, sempre os vejo sozinhos sentados numa espreguiçadeira posta na calçada entre o seu jardim, onde passam toda a tarde sentados. Velhos e solitários olhando a nossa calma e tranquila rua, atentos a cada folha que cai, a cada pássaro que pousa nas árvores, a cada carro que passa na rua e a qualquer movimento ao seu redor. Apesar de serem solitários, estão sempre demonstrando estar felizes. Eles sempre nos cumprimentam com um grande sorriso em seus rostos enrugados, nos trazem lembrancinhas no natal, no ano novo, ou coisa do tipo. Todos os anos eles fazem sempre a mesma coisa, parece algum tipo de tradição que eles querem levar para a vida toda. Seria melhor se tivessem filhos para dar continuidade a esse velho costume que os dois velhinhos possuem. O segredo de manter vivo um costume ou uma tradição, é sem dúvidas a continuidade, como uma forma de preservar. Mas quando eles morrerem, o que não está tão longe, pois acho que têm quase 80 anos, quem vai continuar isso para eles? Bom, tenho certeza de que eles sempre vão ser lembrados por minha família, mas sua tradição vai para o caixão juntamente com eles. Eu sei que meus pais vão guardar todas as lembrancinhas de todos os anos, isso é bom. É uma maneira de permanecerem em nossa memória.

~

Meu pai se chama Richard e minha mãe Karol. Eu não costumo falar da minha família para ninguém, mas posso ser gentil e falar um pouco deles para você. Aliás, antes que eu me esqueça, a minha irmã se chama Karla e é mais nova que eu, ela tem 14 anos e está cursando o 9° ano do Ensino Fundamental. Karla se parece comigo fisicamente ao ponto de algumas pessoas acharem que somos gêmeos, o que é ridículo, pois temos três anos de diferença. Ela tem a pele clara e meio amarelada, tem cabelos longos da cor castanha, olhos negros e um nariz bem desenhado. Ela tem o meu tamanho e acho que vai crescer mais ainda. É magra, o que dá a sensação de que ela é uma pessoa alta, mas tem apenas 1,65 de altura.

Karla nunca demonstrou interesse pelos estudos e sempre achou a ideia de estudar uma babaquice, mas sempre consegue notas razoáveis, o que me deixa impressionado. Enfim, deixando a vida da minha irmã um pouco de lado, e entrando um pouco na nossa relação... embora eu não tenha muita intimidade com a minha família e apesar de não dialogar muito com eles, pois passo boa parte do meu tempo trancado no meu quarto, eu os amo muito e significam muito para mim. Eles são os seres humanos com os quais eu mais me relacionei nesta vida, mesmo que bem pouco. Amo todos eles, especialmente a minha mãe, embora desconfie um pouco do seu amor, pois ela é formada em psicologia e desde sempre eu tenho percebido que ela gosta de analisar as pessoas, sobretudo quando essa pessoa sou eu. Às vezes acho que estou sendo a “cobaia” da mamãe para a produção de alguns artigos sobre emoções, transtornos, personalidade, etc., mas não me importo com isso, quem sabe um dia eu os leia e tente achar alguma solução para a minha vida pessoal. A amo, mesmo me achando o ratinho de laboratório da mamãe que sempre me tratou como o esquisitão da família. Bem, eu não deveria ter mencionado isso, mas acho bom desabafar de vez em quando, embora minhas teorias possam estar equivocadas.

Sobre o meu pai, ele é cirurgião, e trabalha numa cidade vizinha não tão distante daqui. Acho seu trabalho legal, pois ele está salvando vidas na medida que pode, mas por outro lado, não tem muito tempo para a família, pois passa boa parte do tempo no trabalho, não que eu me importe muito com isso. Já minha irmã, assim como eu, passa o dia no quarto, mas diferente de mim, ela coloca o som no volume máximo, de forma que eu sinta que todas as vidraças da janela vão se romper a qualquer momento, mas acredito que ela faça isso para não ser incomodada por ninguém e tento entendê-la. Bom, acredito que sem eles eu não seria o que sou, na verdade eu nem sei o que sou, mas tudo bem. Bom, eu não tenho a melhor família que alguém poderia ter. Sei que soaria muito clichê se dissesse o contrário, mas devo admitir que são indubitavelmente muito especiais para mim, apesar de nossa estranha e distante relação.

Eu li que o Sol se encontra a 149.616.000 km de distância da Lua, no entanto, percebi que mesmo tendo uma relação distante, eles sempre estão relacionados em vários aspectos. O Sol é sempre quem a ilumina, sempre a deixa visível e a protege da escuridão do vasto espaço sideral com seus poderosos raios que alcançam uma distância significantemente grande aos nossos olhos. Ela retribui a luz recebida do Sol e nos aparece pela noite, linda e radiante, a princesa da noite. É como nossa relação, por mais distante que possamos ser um dos outros, o amor de meus pais sempre me influencia de alguma forma, sempre penetra em mim, não como raios solares, mas em forma de absorção de caráter, me entende? É a sensação de ser amado e tentar retribuir isso em minhas ações no dia a dia com as pessoas que amo. Sempre me sinto iluminado por eles e seu imenso amor de viver em família, mesmo distante. E mesmo sabendo de tudo isso, eu sempre prefiro estar sozinho e desfrutar desse amor comigo mesmo.

Você já percebeu que eu não tenho muitos amigos e que não falo tanto com a minha família e isso é um fato. Talvez a minha casa seja um sistema e cada um de nós segue a sua própria órbita. Eu, por exemplo, todos os dias, na maior parte do tempo, os livros e jogos de tiro são a minha mais fiel companhia, pois nunca questionam nenhum aspecto da minha vida, além de não ficarem procurando os meus defeitos e me julgando por eles. Eles estão ali simplesmente para serem usados por mim e fazerem com que eu me divirta durante as noites em meu quarto quando estou livre de qualquer interrupção humana. Os jogos me trazem paz, matar meus adversários me dá prazer. Gosto de ter tudo em meu controle, distante das opiniões contrárias das outras pessoas. Deve ser por isso que prefiro passar a minha vida distante de todo mundo e seguir a minha órbita, pois percebo que ninguém me ama como eu sou. Bom, talvez apenas os meus pais e meus dois amigos me aceitam tal como sou.

Bom, eu não me importo muito com isso, só estou comentando. Enfim, hoje é sábado e, enquanto a maioria dos jovens da minha cidade estão em festas ou em bailes, em bares ou botecos, segurando um copo cheio de álcool na companhia de uma garota ou um crush qualquer, eu estou em minha casa, em minha cama, segurando um bom e velho livro de química orgânica. Eu sei que o álcool é um elemento da química orgânica e a sua fórmula se faz presente várias vezes em meu livro, mas isso não vem ao caso, porque ingerir essa substância não faz muito sentido para mim. O bom de estudar química, em especial a química orgânica, é que eu sei que o álcool em bebidas é tido como uma droga, pois causa alterações fisiológicas e comportamentais nas pessoas, por isso não vejo sentido em tomar cerveja ou qualquer outro tipo de bebida que contenha essa substância. Sim, eu amo ler e adoro estudar. Busco sempre me informar das coisas antes de usá-las, procuro sempre estudar todos os detalhes das coisas e analisá-las minuciosamente, para assim poder descartar o que não tem utilidade para mim, como é o caso do álcool e seus produtos derivados.

Como já mencionado, amo ler e estudar, principalmente algo relacionado a qualquer tipo de ciência, linguagens ou qualquer outra coisa que faça mais sentido para mim. Às vezes leio não porque eu quero adquirir mais conhecimento, pois acredito que já tenho bastante. Portanto, leio apenas como forma de distração, para ver o tempo passar mais rápido, para estar em meu mundo, em minha órbita, para evitar pessoas e distrações. É por isso que estou lendo nesta noite, pois amanhã pela manhã os meus amigos Allan e Mathew virão para a minha casa para jogarmos videogame, conversarmos e comermos as deliciosas comidas que minha mãe faz. Não que eu queira enaltecê-la, mas as comidas que ela prepara são melhores que qualquer outra refeição em qualquer um restaurante desta cidade. Todo mundo que já provou as suas refeições, seguramente se encantou. Não que alguém tenha me dito ou mencionado algum tipo de opinião a respeito, mas sempre que vejo alguém comendo algo que minha mãe prepara, eu busco analisar cada expressão e sempre consigo algo positivo.

A minha mãe é boa no que faz e disso eu não tenho dúvidas. Eu a amo, principalmente porque ela me ama e sempre faz tudo para me agradar, sobretudo quando nota que estou triste. A minha mãe é o tipo de mãe com a qual todos sonham ter, ao menos é o que eu acho. Não que alguém queira ter uma mãe psicóloga que possivelmente possa estar te analisando friamente, mas sim pelo fato de ela ser super amável e atenciosa com quem realmente é importante em sua vida.


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