Outro Dia no Paraíso escrita por MPrior


Capítulo 3
Do Outro Lado da Rua


Notas iniciais do capítulo

Olá gente, como estão?
Tenho 7 relatórios pra fazer e aqui estou eu hahahaha Triste.
Espero que gostem do capitulo, finalmente a historia esta ganhando forma, amém.

Gostaria de agradecer a chance que deram a fic, os comentários, que são muito importantes :D e espero que continuem gostando.

OBS : Eu esqueci de esclarecer algo no cap passado e parece que deixei muitos confusos, perdón! Então, todos os textos em itálico são flashbacks, São os únicos momentos que teremos flashabacks, e sempre que tivermos eles, serão da Bella. Do seu ponto de vista.

Bem, é isso! Aproveitem, nós vemos lá embaixo.

PS: Desculpem qualquer erro ortográfico, não tive tempo de revisar decentemente.



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 — Como assim vamos ter que encerar o projeto? — Eu não podia acreditar nisso. Nosso centro de ajuda era um dos únicos da cidade, alias, acho que era o único de fato.

— Sinto muito Bella, mas não temos mais como mantê-lo — Disse desanimado — Você sabe que estamos passando por dificuldades e que dependemos que doações para manter o centro. Eu tentei retificar os custos, mas... — Suspirou — Vamos avisá-los para que possam procurar outro lugar e em uma semana vamos ter que fechar.

— Ah, que merda Jake! — Suspirei triste. Para onde toda essa gente ia? É verdade que o centro é pequeno, mas tínhamos pouco mais de 30 pessoas que ajudávamos regularmente.

 — Eu sei — Segurou o meu ombro direito — Fizemos o que conseguimos Bella. Eu queria poder fazer mais.

  — Eu sei Jake, eu sei — Suspirei apertando sua mão que ainda descansava em meu ombro — Bem, por enquanto ainda estamos aqui. Vamos trabalhar, tem gente que precisa da nossa ajuda.

 

#

 

O fim de semana passou rápido e tranquilo, e logo os primeiros raios de sol da segunda-feira despontavam no céu.

Arrumei-me calmamente para ir ao trabalho, e após um rápido café desci no elevador ate a garagem, feliz por meu carro finalmente ter saído da oficina e não precisar pegar um taxi mais uma vez. 

O caminho ate o escritório foi um tanto lento com o trafico rotineiro das manhãs de segunda. Entre uma parada e outra no transito moroso, ao olhar pela janela reconheci a rua onde estava. Era a mesma rua onde eu praticamente correra ridiculamente na noite de sexta passada.

Abaixei o vidro, agora com a luz do dia e sem o impulso infundado de fugir como um garotinho assustado poderia observar melhor. Pude identificar um ou outro sem teto entre as pessoas apressadas que passavam por ali, sem nem ao menos desviar o olhar uma única vez para eles, me perguntei se eu me parecia essas pessoas visto por esse ângulo. E foi então que ouvi a mesma voz. Estava um pouco mais alta que o sussurro quase inaudível do qual me lembrava, mas sem sombra de duvidas se tratava da mesma pessoa.

— Tenha um bom dia, senhor  Dissera a dona dela, que agora caminhava em minha direção lentamente, muito lentamente. E conforme se aproximava mais pude notar as marcas em seu rosto, ela claramente esteve chorando. Usava um jeans justo, que apesar da aparente tentativa de ser devidamente lavado ainda apresentava algumas poucas manchas, sua camiseta estava em melhor estado, azul escura com alças, de algum tecido mais flexível já que não marcava nenhuma parte de teu corpo.

— Bom dia, senhor  Disse ela assim que parou ao meu lado no carro, estendendo um papel que peguei mecanicamente.

Observei seu rosto, ao menos tentei. Apesar das marcas de lagrimas nas faces e dos olhos levemente avermelhados sob as bochechas, era belo. Cabelos castanhos claros, quase louros, soltos emaranhados em volta do rosto de feições miúdas. Não consegui ver seus olhos, pois mantinha a cabeça levemente abaixada. Eu não dava mais de 22 anos para ela.

— Tudo bem?  Me ouvi perguntando sem nem ao menos perceber.

— Oh!  Pude ouvir o espanto em sua voz e a confusão estampada em seu rosto, antes de um pequeno e indecifrável sorrido surgir  Você sabe  Começou ela, gesticulando com a mão, como se falasse sobre leviandades  Apenas outro dia no paraíso.

Franzi o cenho. Não era a resposta que eu esperava. Estava preparado pra um singelo e sem maiores questionamento tudo bem, ou uma história triste e longa de como a vida pode ser horrível e injusta, ou até mesmo um pouco de rispidez justificada. Mas nunca, jamais isso.

E imagino que ela esperava qualquer coisa de mim, menos um questionamento sobre seu estado. Infelizmente, acho que fizemos um trabalho tão bom em fingir que não os vemos, que eles já se sentem realmente invisível.

— Tenha um bom dia, senhor  Disse ela e se afastou tão lentamente quanto veio.

Observei seus movimentos com mais atenção, e constatei que devia ela devia ter calos nas solas de seus pés. É nítido que ela não pode caminhar, mas ela esta tentando, visivelmente com grande dificuldade.

E então ela se foi, sumiu como uma miragem. Se perdendo entre os carros que já retornavam ao movimento no transito que melhorara.

Finalmente cheguei ao escritório, e me entreguei a minha rotina. Mais um dia no meu próprio paraíso, pensei.

No decorrer do dia, entre uma reunião e outra, uma assinatura aqui e outra ali, me pegava pensando na garota sem nome, e me recriminando rapidamente quando isso ocorria. Era um tanto perturbador pensar nela.

E no fim do dia, decidir pegar um caminho diferente para casa, não querendo correr o risco de cruzar com ela novamente. Enquanto dirigia parte de mim me recriminando pela recém infantilidade adquirida, e a outra parte tentava me convencer categoricamente que eu não tinha nada a ver com aquilo, afinal que culpa tinha eu se a garota estava naquela situação.

E assim eu fiz nas próximas semanas, pegando caminhos diferentes para não passar por aquela rua novamente. Não que eu não me compadecesse da situação, eu apenas tinha essa sensação, mesquinha talvez, que a situação era muito mais incômoda para mim do que para ela, do que para todos eles. Havia algo no olhar deles, como se soubessem de alguma coisa oculta, como se vissem um mundo além do qual enxergamos com nossos olhos. Ate a voz soava diferente, carregada de uma cadência desconhecida, suave e dura ao mesmo tempo, e o conjunto de tudo isso despertava algo ruidoso no mais intimo do nosso ser.

Lembrei-me de repente de algo que Seth me dissera alguns anos atrás. Sobre essa mulher que ele encontrara trombando com as pessoas na rua, de como pensou que ela estava bêbada, drogada ou com algum tipo de doença mental pela forma que ela sorria quando recebia algum comentário irritado. Disse-me ele que quando foi oferecer ajuda ela lhe dissera que estava bem, e confidenciou que ás vezes fazia isso para sentir que estava viva, sobre como se sentia tão invisível as vezes que chegava a duvidar de sua própria existência. Então trombava com as pessoas para se certificar que estava realmente ali, tão real quanto qualquer um.

Era extremamente desgastante e cansativo conciliar o sentimento de compaixão e ânsia de fazer algo, ajudar de qualquer forma que fosse, com o senso rotineiro e ate um pouco narcisista de que nada daquilo tinha a ver com você, que sua vida já tem suas próprias atribulações suficiente para querer salvar o mundo. Sua vida simplesmente não pode parar, independente das adversidades submetidas aos menos afortunados.

 Por mais que isso soe horrível, só posso orar ao Deus que acredito, entregá-los a própria sorte e esperar do fundo da alma que ela seja boa.

Fui tirado de meus devaneios pelo toque do meu celular. Com um suspiro retornei ao trabalho.

No fim da noite tudo o que eu desejava era um banho quente e cama.

Essa era o plano, mas por mais que tentasse não conseguia esquecer a misteriosa garota. E isso, sinceramente, já estava começando a me perturbar de verdade.

Ainda que contrariado não pude evitar de passar pela rua onde sabia que ela poderia estar. Dirigia devagar, observando, torcendo para não encontrá-la e orando para que estivesse ali. E ao que parecia a oração soou mais forte, pois logo a avistei.

Estava sentada nos primeiros degraus da entrada de uma loja, um tanto afastada dos outros poucos moradores de rua que estavam se abrigando do frio ali, mas perto suficiente caso precisasse de ajuda. Com o que? Me negava a imaginar.

Ela claramente estava com frio, seus ombros estavam curvados para frente, os cabelos soltos ao vento, e abraçava os joelhos para se proteger do frio.

Observei-a por mais alguns segundos e antes que pensasse demais estacionei o carro e sai, caminhando em sua direção.

— Oi  Disse parando em sua frente.  Foi a coisa mais idiota para se dizer, mas não tinha  nada melhor.

— Eu não faço programa  Disse sem levantar a cabeça, parecendo entediada e um pouco irritada.

Franzi as sobrancelhas, um tanto ofendido.

— Eu não quero transar com você  Rebati, um tanto grosseiro, percebi tardiamente.

Ela levantou a cabeça, parecendo assustada. Estava um pouco escuro, seus olhos cansados e ainda mais avermelhados que antes,  e mais uma vez não conseguir destingir cor alguma.

  Eu... Achei que... Eu...  Suspirou  Desculpe.

— Não se preocupe  A tranquilizei  Então...  Você não faz programa?  Arqueei a sobrancelha. Não era segredo nenhum que algumas delas, moradoras e rua ou mesmo as que estavam um patamar a cima da miséria usassem seus corpos como fonte de renda, e era menos segredo ainda que homens inescrupulosos se aproveitavam dessa condição para cometer as maiores atrocidades que não poderiam cometer em qualquer outra situação. Em suas mentes depravadas se estavam pagando então podiam tudo.

Era um negocio tão antigo quando o mundo: se havia quem vendesse haveria quem pagaria e vise versa. 

— Não  Respondeu visivelmente ofendida, irritada e envergonhada.

Que estranho.  Ofendida e envergonhada eu entendia. Mas irritada? A suposição realmente parecia enfurece-la. Percebi tardiamente que fora pragmático. Não é porque acontecia que todas pensavam e viam isso com solução. 

Ela me olhou mais atentamente, inclinando a cabeça de lado. E me peguei perguntando se ela conseguia enxergar alguma coisa com os olhos naquele estado, e há quanto ela não dormia ou não parava de chorar para que eles chegassem naquilo. Porque eu sabia que aquilo não era resultado de drogas ou outras substâncias e sim apenas uma resposta natural do corpo ao estresse excessivo.  

— Eu... Conheço você  Disse por fim me tirando de meus devaneios  Você é o senhor do semáforo não é?  Perguntou surpresa. Mas não mais que eu.

— Você se lembra de mim?  Perguntei espantado.

— Claro  Deu um pequeno sorriso  Não é todo dia que escuto Você está bem? — Explicou dando de ombros diante da minha expressão confusa.

— Bem, você tem boa memória  Comentei.

— Imagino que não mais que você.  Mais surpreendida estou eu de você se lembra de mim Comentou com o cenho franzido.

— Bem, não é todo dia que eu encontro alguém... Como você.

Ela levantou a sobrancelha, desacreditada, e olhou ao redor em sinal de desafio.

Suspirei. Ela tinha razão. O que mais havia na rua era... Gene como ela  O que eu quis quiser é que você... Me tocou  Expliquei, confuso. Não sabia se essa era a expressão certa a usar. Eu tampouco sabia o que estava acontecendo comigo.

— Jamais encostei no senhor! Se defendeu, incrédula.

— Me tocou aqui  Eu expliquei, estendendo a mão sem raciocinar, encostando um dedo entre o vão de seus seios, sentindo seu coração pulsar na ponta do meu dedo.

Ela se sobressaltou, tanto pelo susto do meu toque impensado, quanto pela diferença de temperatura, imagino. Ela estava perigosamente fria.

— Tome  Disse tirando meu casaco e estendendo-o para ela tentando disfarçar meu próprio desconforto. Eu não saia por ai encostando nas pessoas então não sabia o que me levou ao ato.

— Não, obrigada! Não posso aceitar  Recusou prontamente, envergonhada.

— Pode. E deve  Estendi-o de novo em sua direção  Ou quer morrer congelada?  Perguntei cruelmente.

A ideia pareceu assustá-la profundamente, e ela pegou o casado pesado e grosso agradecendo.

— Vamos, coloque logo.  Disse incentivando-a, que atendeu rapidamente e suspirou alegremente quando o calor a envolveu.

— Obrigada. De verdade  Disse se levantando. O casado era grande demais para seu corpo, parecia um vestido. Uma criança em roupas de adulto, pensei perturbado.

— Obrigada mesmo!  Agradeceu mais uma vez depositando um rápido beijo na minha bochecha. Sofri um sobressalto, pego de surpresa, tanto pelo contado quanto pela temperatura. Seus lábios também estavam gelados. 

Deus, ela estava sendo congelada viva.

Eu... Me desculpe, eu não... É ... Disse ela se afastando rapidamente quando se deu conta do que fizera. Olhou para os lados parecendo um tanto atordoada.

— Eu... Preciso ir  Disse eu também atormentado.

— Ah... Claro   Suspirou soando triste e começou a retirar o casaco.

— Não, é seu  Disse interrompendo-a.

— O que?  Perguntou confusa  Não, eu não...

— Ele é seu  Afirmei decididamente. Jamais deixaria a garota congelando ali. E não é como se o maldito casaco fosse me fazer falta.

— Apenas... Se cuide  Disse me despedindo apressadamente.

— Obrigada  Sorriu, um sorriso, verdadeiramente um sorriso, sincero e simples  Se cuide também.

Acenei com a cabeça e me virei voltando para meu carro, ainda perturbado com o encontro. Dei partida e antes de virar a esquina pude vê-la.  Voltara a se sentar, seus cabelos ainda estavam balançando ao vento, ainda abraçava os joelhos, mas seus ombros não estavam mais curvados.

Ao menos o frio se fora.


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Notas finais do capítulo

É isso, nos vemos.
Besos y una buena semana para todos!



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