O Diabo do Sertão escrita por Júlio Oliveira


Capítulo 25
Sertão dividido


Notas iniciais do capítulo

Muito obrigado pela paciência. Boa leitura!



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Olhares de estranheza marcaram o encontro. Com o Sol em seu ponto máximo no céu, os dois grupos se examinavam com cautela. De um lado, os cangaceiros de Lúcio Arcanjo estavam cansados de traição. Fortemente armados, mantinham revólveres e espingardas em punho, pois sabiam que não podiam se dar ao luxo de serem pegos de surpresa novamente. Do outro lado, Diabo e Miguel lideravam os miseráveis civis. Os sedentos por água e justiça não eram muitos, mas também tinham seus próprios problemas para resolver com o prefeito. Num céu sem nuvens, apenas Deus era testemunha do encontro que mudaria o destino de Água Funda para sempre.

Eles estavam na nova base de operações da Lagoa da Esperança. Não mais um lugar, mas um grupo. Dito isso, o ambiente não esbanjava luxo: ao invés de várias acomodações, havia apenas uma pequena casa no centro do árido terreno. E lá de dentro, Breno Farias saiu calmamente. Com um copo de cana na mão, o homem deu goles intercalados com encaradas para os dois lados. Viu Lúcio e sua trupe com armas em mãos, enquanto o Padre e seus aliados pareciam um tanto quanto passivos. Exceto Diabo, claro. O homem continuava parecido com um cão raivoso, sem nunca afastar a mão do revólver.

— Eu pensei que a gente fosse fazer uma aliança, não um tiroteio — o político falou jocosamente. Ninguém riu. — Vamos, pessoal. Pra que tanta tensão?

Um pouco mais afastado, um temeroso João Cego encarava seus antigos algozes. As cicatrizes da tortura eram visíveis, mas eram seus olhos que entregavam o verdadeiro horror que ele vivera. Levantando-se com lentidão, caminhou rompendo o silêncio que se instalara após a fala estúpida de Breno. Todos os olhos se viraram para sua direção, com exceção de Diabo. Ele seguia vigilante e encarava seus antigos companheiros como se eles pudessem disparar a qualquer momento.

— Esses fi de rapariga mataram Antônio! Eu fui torturado por eles, Miguel! — João dizia com ímpeto. Com o dedo em riste, ele não parecia mais temeroso. — Nós vai mesmo fazer aliança com eles?

— Você matou um dos nossos pra começar — Amanda respondeu prontamente.

— Calma, gente — Padre e Lúcio falaram quase que ao mesmo tempo. Entreolharam-se por um breve momento antes do silêncio voltar a imperar.

Respirando fundo, o religioso se virou na direção de seu grupo. Lúcio ficou admirado com a atitude: virar as costas para um punhado de armas apontadas era um verdadeiro ato de coragem.

— Nós já falamos sobre isso, amigos — Miguel mantinha a firmeza a cada nova palavra que saía da sua boca. — Eu sei que nós e os cangaceiros tivemos nossos conflitos. Mas chegou a hora de deixar isso para trás. Antônio não gostaria que ficássemos numa guerra eterna. É necessário que a gente evolua e busque algo melhor. Lembrem-se, não é só por nós mesmos, mas por toda Água Funda e região. Será que não vale a pena arriscar por um futuro melhor?

Silêncio. João continuava desconfiado, enquanto Breno Farias seguia quieto. Observando tudo no mais absoluto silêncio, Zé e Bia não sabiam como reagir. A garota, mais corajosa que o rapaz, cerrou o punho num gesto de confiança em relação às decisões do padre. José, por outro lado, segurou no ombro dela. Não gostava de ver todas aquelas armas apontadas para a mulher de sua vida e a criança que estava em seu ventre.

Repetindo o gesto de coragem e confiança do padre, Lúcio virou-se para seu time e disse:

— É exatamente isso, meu povo. E tem também a cabeça do Marcondes Maia. — Ao dizer isso, foi recebido com gritos de apoio e tiros para o alto por parte de seus aliados. Diabo chegou a ensaiar um sorriso, mas se conteve. — A gente vai ter a cabeça dele numa bandeja.

— Ótimo, ótimo — Breno começou a aplaudir. No centro, ele gesticulou para que os líderes de cada grupo se aproximassem. Miguel e Lúcio logo se viram frente a frente. — Agora vamos, apertem as mãos.

O religioso deu um olhar um tanto quanto inquisidor para o político. O cangaceiro achou aquilo tudo muito estranho, mas preferiu não aumentar a tensão do momento. Os dois apertaram as mãos e, logo após o gesto, foi possível sentir a tensão se dissipando no ar.

— Graças a Deus! — Breno jogou as mãos para cima como se comemorasse a vitória de seu time do coração. — Estamos resolvidos então? Cangaceiros e... e... como que fala mesmo? Esperanceiros? Isso! Cangaceiros e esperanceiros unidos! Viva!

Enquanto o político falava, Diabo caminhou lentamente na direção de seus antigos companheiros. Com a arma já guardada, ele se dirigia especificamente para Lúcio. Estando próximo do líder, era possível sentir os tensos olhares em sua direção. Cangaceiros e esperanceiros sabiam que Diabo não era exatamente um homem previsível. Dessa forma, o bom comportamento recente dele não era garantia de nada.

— Eu só quero que a gente faça algo que preste agora — o ex-cangaceiro falou baixo, de forma que apenas Lúcio pudesse ouvir. — É bom ter ocê no time agora.

E, de forma que surpreendeu a todos, Diabo deu um forte abraço em Arcanjo. O líder dos cangaceiros retribuiu com carinho e confiança, dando tapinhas nas costas e dizendo:

— Uma vez cangaceiro, sempre cangaceiro. — Diabo deu uma risada abafada ao ouvir isso. — A gente vai ajeitar as coisa.

Finalmente se desvencilhando de seu antigo chefe, Diabo voltou os olhos para os outros membros de seu velho time: Eduardo e Amanda. A equipe estava bem menor do que antes e o homem cheio de cicatrizes não deixou de se atentar a isso. Cumprimentando os membros restantes, que receberam os cumprimentos com muita alegria, ele voltou para sua posição original com um raro sorriso no rosto. Ao ver tal expressão, João Cego sentiu um calafrio atravessar o corpo.

— Então é isso? — Breno voltou a chamar a atenção de todos. — Pazes feitas? Grupo reunido, agora temos que dar um jeito em Marcondes Maia. O homem é forte e, não importa o que a gente faça, ele sempre dá um jeito de dar a volta por cima.

— Tem um jeito fácil de resolver isso — Eduardo falou pela primeira vez.

— Qual?

— Metendo uma bala no quengo dele — Diabo antecipou a resposta e deu uma gargalhada. Seus antigos companheiros de cangaço riram junto.

— Exatamente — Eduardo confirmou.

Caminhando de um lado ao outro, Padre Miguel balançou a cabeça ao ouvir aquela ideia.

— Quem dera fosse fácil assim — comentou. — Acontece que Marcondes não só tem um filho capaz de sucedê-lo. Mais do que isso, ele tem o nome Maia. Vocês devem saber bem: uma família poderosa com tentáculos que vão além do nosso pequeno estado. Então mesmo que vocês dessem um tiro em sua cabeça, apenas trocaríamos seis por meia dúzia. Apareceria um novo Maia, só que dessa vez com uma arma eleitoral nas mãos: “mataram meu familiar pois ele queria o melhor para essa cidade. Me elejam ou o mal triunfará”. E pronto. Narrativa feita, vitória deles. E nós seremos os que mais contribuíram com isso.

Pensativo, Eduardo parecia ter dificuldades para colocar a cabeça para funcionar. Com os braços cruzados, Lúcio refletiu antes de falar.

— O padre certo. Além do mais, o homi deve com novos guardas. Se dispensou os nossos serviços, é porque tem alguém que faça melhor — o líder falou.

— Ou que ele pensa que faz melhor — Amanda complementou.

— Sim, sim. De toda forma, matar não vai adiantar muito, não agora. Eu concordo com o padre.

— Mas então, que utilidade a gente tem? — Eduardo questionou.

Mais uma vez, silêncio. Miguel olhou para Breno, que devolveu o olhar. O religioso então se aproximou ainda mais dos cangaceiros e explicou a ideia geral.

— A era dos grandes bandos acabou. Olhem para vocês mesmos. Lembro quando falavam do bando de Lúcio Arcanjo. Vários homens e mulheres atuando e causando terror por onde passavam. Depois que se venderam para Marcondes, a coisa começou a desandar — as palavras do padre soaram como provocativas para os cangaceiros, mas o grupo se conteve. — Quantos vocês são agora? Três mais um? E tem a sua mãe também, não é? O fato é que o presidente não quer mais grupos como os seus. Como consequência, os governadores também não o querem, e assim os prefeitos. Vocês estão condenados a não ser que mudem a forma de agir.

— E o que ocê sabe sobre isso? — O orgulho ferido de Lúcio falou por ele.

— Saber? Eu não sei de nada. Apenas abro meus olhos e observo o mundo ao meu redor. Vocês deveriam fazer isso mais vezes — o religioso prosseguiu. — De toda forma, vocês devem mudar a forma de atuação. Preciso repetir? A era dos grandes bandos acabou. Esses bandos são fáceis de achar e a polícia conta com armas cada vez melhores.

— Nós podemos roubar as arma dos homi — Amanda interrompeu.

— Terão que sobreviver a eles primeiro — Miguel contra-argumentou. — O que precisa ser feito é agir com cautela. Chega de ataques enormes, balas voando para todos lados. Vocês precisam agir de maneira mais isolada.

— Isolada? — Até Diabo ficou sem entender.

— Sim! Marcondes diz que mantém a cidade sob controle. Diz que a polícia e seus jagunços armados são o suficiente para manter o povo de Água Funda a salvo, mas é mentira! É mentira, porque ele mesmo é o maior violentador desta terra — dando uma pausa, Padre Miguel sentia como se uma inspiração divina alimentasse seu corpo e sua mente. — Precisamos mostrar ao povo de Água Funda que ele não pode prover essa segurança, que ele não consegue! Daí as ações isoladas: roubos, depredação de propriedades, incêndios. Jesus Cristo, não peço que vocês machuquem ninguém, mas que espalhem o medo e a desconfiança. Sei que parece errado e talvez seja, mas é um preço necessário pela libertação de nossa amada terra. Isso abrirá os olhos da população e eles poderão enxergar com maior propriedade quem é quem neste lugar. O que me dizem?

Espantados com as palavras do padre, os cangaceiros se entreolharam. Depois, sorriram.

— Daremos o nosso melhor — Lúcio Arcanjo assegurou.

Dito e feito. Os meses seguintes foram um verdadeiro inferno para o povo de Água Funda. Como recomendado pelo padre, não havia assassinato ou disparo contra civis, mas roubos, incêndios e badernas se tornaram comuns. Com os rostos cobertos, os cangaceiros dividiam-se e tiravam o dia para infernizar a cidade. Augusto e os policiais não conseguiam dar conta da atividade criminosa dos homens, que acontecia de forma estratégica.

Obviamente, os cidadãos tinham certos prejuízos: mercadinhos fechavam, pessoas perdiam empregos e o medo era uma constante na cidade. Ainda assim, Miguel seguia dizendo o de sempre:

— É um preço que precisa ser pago.

E, sem pensar muito em questões de moral ou filosofia, os cangaceiros se sentiam bem com isso. Tinham a benção de um homem da igreja para fazer aquela baderna. Em outras palavras, o roubo e a depredação estavam divinamente justificados. Em meio ao caos, Marcondes não podia fazer nada a não ser arrancar os poucos cabelos que lhe restavam. O pistoleiros que contratara não davam conta do recado, enquanto as pesquisas indicavam que Breno Farias estava a ponto de virar a eleição.

Por outro lado, o novo assentamento da Lagoa da Esperança prosperava. Enquanto os bandidos faziam bandidagem, os miseráveis tentavam produzir alguma riqueza. Simpático para com animais, José não só cuidava de Carlinhos, como também tomava conta de umas vaquinhas que o padre conseguira. João Cego ainda pediu ajuda aos homens para construir novas acomodações no terreno. Por fim, o lugar foi ampliado: não apenas uma casinha no centro de tudo, mas uma residência capaz de acomodar várias famílias. Não havia luxo, mas havia espaço. E isso bastava.

Maria Beatriz, que via sua barriga crescer com cada vez mais velocidade, ajudava dentro do possível com as plantações. Mas o solo árido era, acima de tudo, infértil. Por fim, o grupo pôde contar com os alimentos conseguidos por Padre Miguel nas doações da igreja. Não era a situação mais confortável, mas serviria para ajudá-los a sobreviver pelo tempo que fosse necessário, ainda que tanto Bia como Zé quisessem mudar isso rapidamente.

A garota ainda pensava no diário que entregara ao padre. O que ele revelava poderia ser muito útil para a eleição de Breno Farias, mas era estranho o religioso ainda não ter utilizado o texto a seu favor. “Ele deve estar pensando em algo melhor”, ela deduziu. O rapaz, por outro lado, lembrava-se de como toda aquela confusão começou: a busca pela mãe de Bia na casa de diversão. Ele prometera para si mesmo que retornaria ao local quando a poeira baixasse. Passou-se um dia, dois, uma semana, duas. E então um mês, dois, até que ele perdeu a conta. Será que a poeira já tinha baixado?

— É hoje, Bia — disse com determinação. — É hoje que vou ver sua mãe.

O casal estava no quartinho recém construído. Era escuro e quente, mas era melhor do que dormir ao ar livre. Sentado no colchão de palha, José olhava para sua esposa. De costas, Beatriz virou-se lentamente revelando sua grande barriga. Não havia forma alguma de disfarçar a gravidez.

acha que dá certo? — ela queria que desse, mas conhecia os riscos.

— Eu disse que eu ia fazer isso, num disse? Então eu vou fazer — ele assegurou. — O que de pior pode acontecer?

A moça deu uma risada ao se lembrar de todas as confusões que ocorreram da última vez. Ela não precisou dizer uma palavra sequer para que Zé decodificasse aquela risada.

— Nem pensar. Dessa vez eu vou me comportar, juro! — Ele levantou a mão direita como se fizesse um juramento diante da Bíblia Sagrada. — E outra, com os cangaceiros por aí, eles vão poder mim salvar se a coisa pegar fogo.

— Espero que você não precise deles — Bia se aproximou do homem da sua vida.

Ele deu um tenro beijo em seus lábios e, logo em seguida, abaixou-se e beijou sua barriga.

— Painho já volta, mininho! — Zé transmitia puro amor em sua voz.

— Você nem sabe se é menino mesmo — Beatriz riu.

— Claro que eu sei — ele começou a se ajeitar para ir cumprir sua missão. — Eu sou o pai. Eu sei de tudo.

De pé, ele deu uma última olhada para a mulher de sua vida, que ainda ria da última declaração que o rapaz dera. Os olhares se cruzaram numa onda de tenro amor e, após alguns segundos de hesitação, ele finalmente saiu. Cruzou a sala principal empoeirada, abriu a porta e deixou a nova Lagoa da Esperança. Do lado de fora, caminhou sob o Sol amarelo do sertão até Carlinhos, que aguardava ansiosamente o retorno de seu dono.

— Vamos lá, Carlinhos — José acariciou a cabeça de seu animal antes de montá-lo. — Temos uma rainha pra salvar.

O “Cabaré do francês” estava no mesmo lugar de sempre: no meio do nada, perto de tudo. José, dessa vez, não se assustou ao ver os tijolos intercalados por grades. Aquela prisão de prazer e libertinagem até parecia um castelo amaldiçoado, mas o rapaz havia tomado uma boa dose de coragem antes de encarar aquele desafio. Batendo na porta, aguardou alguns segundos antes do careca de sempre aparecer.

— Quem é você? — falava da portinhola aberta. — Espera! Você é o que furou o olho do filho do prefeito?!

Zé sentiu seu coração parar por um breve instante. Suando frio, o rapaz não sabia o que responder. “Ele perguntou de forma feliz ou raivosa?”, tentava refletir. Não sabia se tal atitude foi vista como algo bom ou mau, então coube-lhe apenas aquilo: o silêncio.

— O gato comeu sua língua? — o careca insistia.

— Eu... Eu acho que vim aqui quando aconteceu esse negócio — inseguro, José de Lima inventava mil histórias na cabeça enquanto contava outras mil. — Acho que se eu furei alguém, foi completamente sem querer, intendeu?

O careca gargalhou. Fechando a abertura e abrindo a porta, ele deu as boas-vindas a José.

— Você podia ter dito isso antes — disse com ânimo na voz. — Oh, Francês, olha quem chegou aqui!

José parecia uma estátua: sem saber como agir, deixava que a inércia o conduzisse. E ela conduziu até o seu extremo: após o chamado do careca, um homem de rica barba se aproximou. Tinha um hálito regado a álcool e Zé logo o reconheceu: era o cafetão que Bia falara antes, o homem responsável pela separação entre filha e mãe.

— Então esse é o nosso herói? — Tinha um sotaque que o rapaz nunca ouvira na vida. — Como falam na minha terra: merci beaucoup!

Zé não conseguia acreditar naquilo. Estava realmente sendo bem tratado? Poderia mesmo ser chamado de “herói” depois de tudo que aprontou?

— Ele não fala muito — o careca comentou com o Francês.

— Não se acanhe, ami — o Francês colocava a mão de forma amigável sobre o ombro de José. — Você fez um grande serviço para mim. Eu e o prefeito até que nos damos bem, mas aquele filho merde dele só me dava dor de cabeça. Obviamente eu não podia fazer nada, mas você conseguiu. Incroyable! Por favor, aproveite a noite com uma das nossas garotas. Por minha conta, ami.

Impressionado demais para emitir qualquer palavra que fosse, José respondeu com um sorriso. Sendo acompanhado pelo estrangeiro, o jovem nordestino era apresentado às mais belas madames da casa de prazeres. Seus olhos, entretanto, buscavam apenas uma: a mãe de Bia, Bárbara. Não tardou para achá-la.

— Aquela ali — Zé apontou na direção da sua sogra.

Trajando um vestido curto, Bárbara estava claramente no modo automático. Sem olhar José nos olhos, apenas caminhou na direção do quarto indicado pelo cafetão.

— Divirta-se — ele disse a José.

O rapaz foi até o quarto e agilmente trancou a porta. A sua frente, sua sogra estava um tanto quanto maquiada, mas era impossível esconder os olhos: eles traziam mais do que tristeza, mas uma verdadeira fadiga daquela vida.

— Como é que você gosta? — ela perguntou enquanto ia tirando o vestido.

— Não, não, não! — José cobria os olhos enquanto falava. Doía-lhe só de pensar na possibilidade de ver a mãe de sua esposa desnuda. — Eu sei que ocê pensa que eu sou mais um desses homi, mas eu vim pra tratar de um negócio sério.

Olhando com estranheza para Zé, a mulher sentou-se na cama.

— O quê? — Bárbara não demonstrava grande interesse.

— É isso aqui — José tirou do bolso um pingente com duas pequenas fotos. Ele entregou o objeto para a mulher. — Tá vendo? Eu sou o marido de Bia.

A sogra não conseguia tirar os olhos das fotografias. Ela se lembrava bem do dia que dera o pingente com as fotos para sua filha. Toda aquela carga de lembranças fez com que ela derramasse algumas lágrimas. Zé até pensou em consolá-la, mas se conteve. Talvez fosse realmente a hora dela sentir tudo aquilo.

— Como ela... como você me achou? — Bárbara intercalava a fala com soluços.

— Foi uma coincidência daquelas. A Bia viu o homi barbudo. E aí eu vim procurar ocê — ele explicou.

— Eu nem sei o que dizer — ela deu uma pausa. Pensativa, foi até a mesinha do lado, pegou um lápis e uma folha de papel. — Espere um instante.

Zé aguardou alguns minutos enquanto a senhora escrevia. Ele se sentia aliviado: estava finalmente falando com a mãe de Bia. Entretanto, tal conquista trazia novos desafios: como tirá-la dali? Como resolver as pendências que ela pudesse ter com o estrangeiro?

— Aqui — Bárbara despertou José de seus pensamentos. Ela entregou-lhe o papel com vários escritos. — Entregue para minha filha, por favor.

Dobrando a folha e guardando-a no bolso, o rapaz assentiu com a cabeça.

— Pode deixar, dona Bárbara. Mas eu vim aqui falar de outra coisa também — ele prosseguiu.

— O quê? — Curiosa, a sogra só conseguia pensar em Maria Beatriz. — Por favor, diga-me como está minha filha.

— Por onde começar? — José deixou escapar um sorriso enquanto se lembrava de todas as aventuras recentes. — Ela está grávida. É, tá com um buchão de dar inveja. Mas ela tá bem. Nós tá vivendo numa casinha mais afastada da cidade, mas tem comida e tudo mais que a gente precisa. Ela sente muito sua falta, dona Bárbara.

Tentando conter as lágrimas, Bárbara deu um tenro abraço em José.

— Muito obrigada... — ela disse ainda sem saber o nome dele.

— José. Zé de Lima — ele revelou.

Bárbara sorriu enquanto continuava a pensar sobre como sua vida podia mudar. Depois de anos, será que finalmente reencontraria sua filha? Entretanto, ela sabia muito bem que havia um grande empecilho.

— Eu vou tirar a senhora daqui — José garantiu. — Ainda não sei como, mas vou dar um jeito.

— Não é tão fácil, garoto — a sogra falou de forma seca. — O Francês não é tão bom quanto parece. Não se deixe cair na lábia dele.

— Eu sou bom de lábia, dona Bárbara. Confie em mim. Você e sua filha vão se reunir de novo.


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Notas finais do capítulo

Muito obrigado pela leitura! Espero que tenha gostado ;)



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