O Diabo do Sertão escrita por Júlio Oliveira


Capítulo 22
Ligação sanguínea


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura!



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Era de praxe: bastava uma pessoa um pouco mais famosa ir parar no hospital que o lugar enchia. Tal fenômeno não era originado do amor das pessoas pelo famoso em questão, muito menos por uma numerosa família que o indivíduo viesse a ter. Na verdade, tudo se resumia a uma palavra: curiosidade. Talvez até duas: curiosidade mórbida, a gosto do freguês. O fato era: uma boa parcela do povo de Água Funda estava discutindo as mais diversas teorias que justificassem a ida repentina do filho do prefeito para o hospital. Alguns até mesmo recapitulavam a história.

— Eu vi, eu vi, eu vi — um senhor clamava por atenção no meio daquele ruído infindável. — Eu tava sentado na frente da minha casinha quando o minino passou arrastado por uns amigo. Tinha sangue na cara!

— Sangue na cara?! — Uma idosa se mostrou preocupada. — Ele tomou um tiro?

— Não, não, num foi tiro não — Um terceiro se meteu na conversa, algo que já era costumeiro para todos presentes. — Eu falei com um amigo dele e ele mim contou que Guilherme perdeu o ôi.

— O olho?! Jesus, Maria e José! Quem é que faria um negócio desses? — Uma quarta pessoa adentrou a conversa que, de forma orgânica, expandia-se e abraçava todos ali perto.

— Isso é coisa de bruxa — a idosa se benzeu imediatamente. — Eu li num livro que elas faz essas coisa pra falar com o demônio.

— Limpe essa boca, dona Rita — um dos participantes da conversa sentiu um arrepio atravessar o corpo. — Nunca diga esse nome.

— Demônio? — Algum inconveniente perguntou.

— Jesus! — Um último exclamou com irritação.

Dentro de um dos quartos, Francisca Maia experimentava sensações horríveis. Primeiro, via-se diante de seu filho ferido. O garoto estava deitado sobre a cama com o olho fechado. O outro, aquele que fora furado pela garrafa de vidro, estava protegido por um curativo. O médico já havia atestado: não servia mais para nada. O pobre Guilherme estava condenado a enxergar o resto da vida pela metade. Sua mãe segurava as lágrimas, pois não queria que seu filho despertasse enquanto ela estivesse chorando. Além disso, um outro sentimento alimentava seu espírito além da tristeza: a raiva.

Todo o ruído advindo da sala de espera do hospital era irritante. Sem barreiras acústicas decentes, absolutamente todos os pacientes podiam ouvir aquela algazarra. E, para a mãe do garoto que era vítima de teorias escabrosas, a experiência era especialmente dolorosa. “Eu vou acertar um tapa na cara do primeiro desgraçado que aparecer aqui”, ela pensava com ódio. Quem dera: seria ótimo poder descarregar toda aquela frustração. “Frustração”, a palavra ecoou em sua mente e então lembrou do marido. O homem devia estar passando por um verdadeiro inferno.

E estava mesmo. Em apenas um dia, Marcondes teve três grandes perdas: primeiro, descobriu que a operação instaurada contra os cangaceiros fora um fracasso, algo que foi confirmado pela caixa macabra que recebera. Logo em seguida, teve que lidar com o fato de que Diabo fora resgatado da prisão. Quando pensou que teria descanso, o prefeito recebeu a notícia na noite daquele mesmo dia: seu filho tivera o olho furado.

Como se não bastasse a vermelhidão comum de sua pele, o estressa havia transfigurado Marcondes Maia numa espécie de soldadinho do Diabo. E foi com essa mesma postura e expressão que ele adentrou o hospital.

— O prefeito — alguém chamou a atenção. — Marcondes, o que...

O individuo foi interrompido. Sem dizer uma palavra, o prefeito decidiu que aquela não era a hora para teatro. Gesticulando de forma abrupta, sua expressão de raiva deixou claro que não tinha a menor vontade de tocar no assunto. Além disso, cinco figuras ameaçadoras o seguiam: armados com revólveres e espingardas, os homens andavam atrás do prefeito e traziam uma clara feição de desprezo para com os curiosos que buscavam identificá-los.

No entanto, Marcondes teve dificuldades de passar pela multidão. O espaço entre o balcão da recepção e o corredor que dava acesso aos quartos estava lotado. Algumas pessoas um tanto quanto incômodas tentavam a todo custo invadir a área para ver o verdadeiro estado de Guilherme Maia. Não conseguindo passar, o prefeito olhou para trás e soltou um rápido assobio para um dos homens que o acompanhavam. Soltando um sorriso zombeteiro, a figura ameaçadora revelou um dente de ouro e, lentamente, tomou a frente de Marcondes. Era alto e seu rosto estava coberto de cicatrizes horríveis. Além disso, tinha um bigode robusto e oleoso, contando ainda com um hálito capaz de ser sentido a quilômetros de distância.

Com tais qualidades em jogo, rapidamente conseguiu afastar os candidatos a invasores. Dessa forma, o prefeito e os outro quatro capangas conseguiram acessar o corredor. Indo até a porta do quarto, Marcondes disse:

— Fiquem aqui fora. Se virem alguém estranho, já sabem.

Os cinco homens gesticularam de forma positiva enquanto colocavam as mãos sobre as armas. O prefeito rapidamente adentrou o quarto onde estava a sua família.

— Finalmente! — Francisca rapidamente se levantou da cadeira onde estava sentada e abraçou seu marido. — Esse povo é doido!

Não havia qualquer resquício de bom humor na voz da mulher. Na verdade, ela se sentia aliviada por finalmente poder desabafar com alguém sobre o comportamento quase sádico dos habitantes da cidade. Marcondes concordava com aquele pensamento.

— Por mim, eu pegava esses cinco pistoleiros e metia o pipoco em todo mundo dessa cidade disgraçada — sem pudor, foi direto ao ponto. Não havia teatro, havia apenas Marcondes. — Num dá mais, Francisca. Num dá mais.

— Você acha que os cangaceiros fizeram... — Francisca buscou forças para dizer exatamente o que queria, até que finalmente apontou para seu filho deitado na cama — ...isso?

— Não, não — o esposo coçou o grosso bigode. — Guilherme andava de bar em bar e devia se meter nessas brigas. Agora a explosão e aquela caixa? Meu Deus. Tem alguém me sacaneando, isso é certeza!

A alguns metros dali, Valter se via finalmente de frente para o hospital. Ainda sentia uma dor em seu ombro: o tiro de Augusto o forçara a fazer uma operação não tão bem feita pra evitar sangramentos indiscretos. Ainda assim, tinha que estar presente: a sua própria ausência no dia da explosão já era suspeita por si só. Sumir por mais tempo seria quase como um atestado de culpa.

Ajeitando a camisa branca e rezando para os pontos em seu ombro não se desfazerem, começou a caminhar no meio da multidão e usou sua elevada estatura para, de maneira rápida, enxergar o possível quarto onde Guilherme Maia estava. Era fácil identificar: com a porta protegida por cinco pistoleiros, não tinha como não ser o lugar certo. Aproximando-se do grupo armado, apresentou-se:

— Eu sou Valter. Talvez cês não saibam, mas eu trabalho pro Marcondes.

— A gente sabe sim — o que tinha um dente de ouro falou. — É aquele que fica doente nos dias que o chefe mais precisa, né?

Os cinco homens soltaram uma gargalhada em uníssono, enquanto um desajeitado Valter sentia um tremendo desconforto tomando conta de seu ser. Vendo-se sem escolhas, emulou as risadas e logo em seguida soltou uma desculpa esfarrapada:

— Nós não escolhe essas coisa.

— É verdade — Dente de Ouro concordou. Bateu rapidamente na porta do quarto e chamou. — Chefe, é o Valter aqui fora.

— Mande ele entrar — a voz de Marcondes foi ouvida.

Com um sorriso sorrateiro, o pistoleiro abriu a porta para Valter. O ex-cangaceiro rapidamente adentrou o quarto e se deparou com os três membros da família Maia. Àquela altura, Guilherme já estava desperto. Com apenas um olho funcionando, sua expressão denotava toda a tristeza e decepção que o cercavam.

Tirando o chapéu que levava na cabeça, Valter cumprimentou o seu chefe e a esposa dele. Por último, olhou para o filho do prefeito e disse:

— Espero que fique melhor, Guilherme.

— Melhor?! — O príncipe Maia ainda estava na fase da raiva. — Aquele fi duma quenga me cegou! Me cegou! Olhe, Valter, olhe! Eu virei um pirata!

— Bem... — o coitado do visitante não sabia como responder toda aquela angústia que era jogada em cima dele. No fim, preferiu o silêncio.

Vendo que o clima estava ficando cada vez mais pesado, Marcondes pediu para que Francisca ficasse com o filho.

— Vou ali fora trocar umas palavrinhas com Valter — explicou.

A dupla foi até o corredor e seguiu o caminho oposto do barulho. Ainda podiam ouvir as conversas histéricas, teorias conspiratórias e ideias estúpidas, mas sentiam-se fisicamente – e emocionalmente – afastados do cidadão médio de Água Funda.

— A coisa anda difícil, Valter — Marcondes se deu ao direito de desabafar. — Esse negócio de ser político é uma disgraça. Primeiro acabam com o seu nome e depois vão pra cima de sua família. Olhe isso! Esse povo todo aí fora só pra falar abobrinha do meu filho. Vê se pode!

— É complicado mesmo — Valter sentia suas mãos suarem. Colocou-as nos bolsos da calça para tentar acalmá-las, mas só fez sentir ainda mais calor e agonia. — Num fácil pra ninguém.

— Não, não . No mesmo dia, pouco tempo antes do que fizeram com meu filho, mandaram uma caixa horrível com um dos agentes do estado. O homem estava em picadinhos, Valter. Em picadinhos! Meu Deus! Eu repito e ainda num consigo acreditar. E depois teve ainda essa explosão e esse cangaceiro salvando Diabo. Onde o mundo vai parar, Valter? Mim diga!

Pela primeira vez, o ex-cangaceiro pôde ver o que pareciam ser lágrimas se formando nos olhos do prefeito.

— Sobrou até pro coitado do Augusto. O homi é meio paspalho, mas sempre me ajudou. Agora levou um tiro. Minha Nossa Senhora! — Àquela altura, Marcondes nem mais olhava para o homem esguio. Encarava o chão, quase como se pudesse prever que estava a poucos passos de se ver enterrado sob o mesmo. — Não aguentei, Valter. Sei que faz um bom trabalho, mas também tem um filho pra cuidar, né? Por isso chamei os pistoleiros ali. Quero ver algum cangaceiro chegar perto.

Apesar de toda emoção presente na voz do prefeito, isso aliviava Valter. Ele sentia que podia se esconder debaixo daquela verborragia, de forma que Marcondes não perceberia seu nervosismo ou culpa pulsante.

Mim desculpa — Maia continuou de forma penosa, com as lágrimas finalmente descendo pelo seu rosto. — Num tem homem que aguente carregar esse fardo sozinho.

— Não, num tem — o empregado simplesmente concordou.

E, diante de tamanha fragilidade, o homem esguio se viu sendo abraçado pelo seu chefe. Foi um momento estranho em que ele sentiu a culpa que o afligia sendo usada para confortar e aquecer a alma de um de seus inimigos, ainda que de forma indireta. No entanto, teve algo que chamasse a sua atenção de forma muito pior. Colocando a mão sobre o ombro ferido de Valter, o prefeito cutucou – literalmente – a ferida. O ex-cangaceiro rapidamente se afastou, mas não conseguiu disfarçar um claro gemido de dor.

— Valter? — Marcondes estranhou. — Você bem?

— Sim — Valter soltou um sorriso falso e mal ensaiado. Com a mão sobre o ombro, pôde sentir uma certa umidade. — Eu dei um jeito no meu...

Antes que pudesse concluir a fala, percebeu seu chefe esboçar uma expressão de estranheza e preocupação. Calando-se, olhou para o próprio ombro e percebeu que havia sangue escorrendo e manchando sua camisa branca.

— Meu Deus, Valter! — Os olhos arregalados do prefeito indicavam que a preocupação era legítima. — Graças a Deus você num hospital. Vá cuidar disso logo!

Marcondes apontou para a direção na qual vira um médico momentos atrás. Quase pálido, Valter manteve-se em silêncio. “Não, ele não está desconfiando de mim”, refletiu de forma positiva. Caminhou na direção indicada pelo chefe e, sem a necessidade torturante de olhar em seus olhos, soltou o ar numa expressão que misturava alívio e medo. O alívio advinha do simples fato de não estar mais na frente de Marcondes. O medo, no entanto, era crescente e estava a um passo de imperar sobre seu espírito. O ex-cangaceiro sentia: estava próximo de ser descoberto. As pistas estavam aí. Precisava tomar uma atitude rápida e, principalmente, cuidar da segurança de seu filho. Era ele quem mais importava. “Breno Farias”, o nome do político surgiu em sua mente. “Ele pode me ajudar”, concluiu enquanto buscava uma forma de tratar seu ferimento.

As feridas estavam por todo lugar, mas nem todas eram físicas. No caso de Lúcio Arcanjo, por exemplo, o homem sofria com uma profunda crise em seu casamento. Sua mulher, Regina, não aguentava mais toda a violência que cercava o bando. Isso não era uma novidade: eles discutiam sobre o tema desde que se juntaram. Mas na época tudo era tão diferente. Lúcio era um aventureiro, não um bandido. E Regina era só uma mulher apaixonada, não uma mãe.

Agora, com a morte de Carmen e a traição de Marcondes Maia, a tensão no grupo estava a ponto de explodir. A esposa do líder do bando sentia que a qualquer momento um novo algoz poderia aparecer para matar o restante de sua família. Para piorar, ela nem mesmo estava confiando em seu marido: Lúcio a assustara profundamente depois daquele horror que fizera com um dos agentes da lei. O cangaceiro era violento, claro, mas não era de seu feitio torturar e mandar mensagens macabras para seus inimigos. Aquilo estava fazendo Regina se perguntar se realmente valia a pena deixar as crianças num ambiente como aquele. Infelizmente para Lúcio Arcanjo, ela já havia encontrado uma resposta.

— O quê?! vai embora? Embora pra onde, mulher?! — Revoltado, Lúcio buscava entender sua esposa.

O casal discutia no quarto. Sobre a cama, as poucas roupas da mulher estavam dobradas e, ao lado delas, uma singela mala jazia aberta. Sem olhar para o rosto do marido, Regina continuava a encher aquela mala, que já contava com uma boneca de pano e um carrinho de madeira, além um pequeno pacote com carne seca e uma garrafa com água.

— Fale! — Lúcio voltava a gritar. Chegou até mesmo a dar um soco na parede, ação que lhe causou dor, mas ineficiente para mudar sua postura violenta. — O que é que ocê quer?!

— Eu não aguento mais! — Regina se deu a liberdade de gritar de volta. Já estava há tempo demais ignorando seu marido. Agora, sentia que podia ter seu momento catártico. — Eu te disse que esse lugar não era bom. Te disse que essa vida num era boa. Eu disse! E então nossa Carmen morreu! Ela morreu, Lúcio, entendeu isso?

— É sério? — Enfurecido, o rosto do cangaceiro lentamente se transfigurou numa espécie de autodesprezo. Andando de um lado para o outro, coçou sua rala barba que crescia e deixou de encarar sua mulher enquanto falava. — Se tem alguém aqui que entendeu as coisa, esse alguém sou eu. E é por isso que eu vou um jeito, Regina! Confie em mim!

Àquela altura, Caio e Carla já colocavam seus ouvidos na porta do quarto dos pais. Não que precisassem, mas ajudava a entender algumas palavras que fossem ditas em uma intensidade mais baixa. Ao mesmo tempo, alguns membros do bando como Eduardo Peixeira e Amanda Macho se aproximavam para saciar a curiosidade.

— Eu vou juntar meu bando e nós vai acabar com o prefeito! Confie — o marido prosseguiu. — É só a gente se ajeitar, mulher.

não entendeu nada, Lúcio — apesar da voz chorosa, o rosto de Regina era pura raiva. — Eu num quero vingança! Eu num quero guerra! Eu só quero viver em paz com minhas crianças!

— “Minhas”? Pensei que fossem nossas!

— Elas não vão ficar aqui nem mais um dia, Lúcio.

Desgostoso, Arcanjo começou a tirar as roupas postas dentro da mala de maneira brusca. Viu os brinquedos e os arremessou longe também.

— Você doido? — Regina se segurava para não bater no homem.

— Quem manda aqui sou eu! — O líder do bando gritou com agressividade. No entanto, sua postura raivosa logo foi desmontada ao abrir da porta. Do outro lado, Caio e Carla olhavam para a cena assustados. — Meus filhos...

Paralisado, Lúcio lentamente buscava se recompor. Por um breve momento, pôde vislumbrar para onde a violência estava conduzindo sua família: viu todos mortos, ao mesmo tempo em que ele tinha a condenação de viver com tal memória horrorosa. Não, ele não queria isso para Regina, muito menos para as crianças. Com os olhos úmidos, começou a se afastar lentamente. Da porta aberta, Eduardo e Amanda entraram cautelosamente.

— Lúcio — Amanda falou com a maior calma do mundo. — Vai ser mais seguro pra elas. A Regina tinha falado com nós antes. O Eduardo pode levar ela e as criança pro terreno de seu sogro.

Silencioso, o homem Arcanjo olhava para o nada. Odiava como tudo estava transcorrendo, mas não podia lutar contra os fatos. Engolindo o choro e a raiva, perguntou:

— Eles vão te receber bem? Depois de tantos anos?

— Eu não sei — Regina estava enfraquecida em decorrência de toda aquela tensão. — Mas eu tenho que tentar. Por eles.

Olhando para onde sua esposa apontava, Lúcio viu seus filhos ainda vivos. Abaixando-se para ficar na altura deles, deixou que algumas lágrimas caíssem, mas não sem antes dizer o quanto os amava. Tudo se passou muito rápido daí pra frente: quando viu, já estavam na carroça conduzida por Eduardo Peixeira.

— Obedeçam sua mãe — foi a última coisa que Lúcio disse antes de perdê-los de vista. Em relação a sua mulher, não disse nada. Não tinha coragem de soltar uma só palavra depois da discussão recente. Sobrou para ele apenas a culpa e o ressentimento. — Eu devia ter obedecido mais.

Vendo a tristeza justificável do líder, Amanda se aproximou dele com delicadeza.

Num quer encher a cara não? É uma boa hora pra isso — ela ofereceu da melhor forma que podia.

— Não — desgostoso, Lúcio sabia que nem o álcool afogaria as mazelas da sua alma. — Mim arrume um cavalo. Eu quero andar por aí.

Dito e feito: poucos minutos depois, o cangaceiro se via no meio do calorento sertão. Com seu cavalo, tudo que fazia era seguir sem um destino certo. Os cascos levantavam a areia do solo árido enquanto Lúcio dava curtos goles num cantil que trouxera cheio de água. Olhando para o horizonte que misturava o azul e o amarelo, pensava em como sua vida seguiria dali para frente.

— Eu vou findar minhas pendência e então vou ver Regina e meus filho de novo — falava em voz alta para o universo ouvir. — Ela vai ver que eu sou um homem bom e vai pedir desculpas por...

Teve seu discurso interrompido quando viu uma silhueta interromper o horizonte tedioso. Um jumento ia na frente de uma carroça, sendo ele conduzido por um rapaz, ao mesmo tempo em que uma moça lia alguma coisa. Ainda estavam distantes e a imagem se fazia borrada pelo grande calor do local, mas Lúcio podia ouvir eles falarem algo.

— Ele é um fi de uma rapariga? De verdade? — O rapaz falou com grande surpresa.

Lúcio riu. Àquela altura, já estava passando ao lado do casal, que o ignorou da mesma forma que fizera com todos os outros que passaram por aquele caminho. Até que a garota falou:

— Imagina quando o padre souber disso — havia um misto de animação e curiosidade em sua voz.

“Padre?”, o cangaceiro pensou por um momento. “Tão falando do Miguel? Será?”, questionou-se. Seguindo em frente, olhou para trás algumas vezes. Será que aquele casal teria algo a oferecer para o cangaceiro? Se estiverem falando de Miguel, seria possível que formassem uma aliança contra Marcondes? O cangaceiro sabia que ele e o grupo da Lagoa da Esperança tinham muitos motivos para cultivar um ódio mútuo. Mas será que um inimigo em comum não poderia mudar essa situação?


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Notas finais do capítulo

Muito obrigado pela leitura!

O que achou do capítulo?
Quais as teorias?

Até breve :D



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