Entre vírgulas escrita por Heloísa Bernardelli


Capítulo 4
Capítulo 3




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/774189/chapter/4

— Ele até tentou ligar para o Gale, mas o Gale tava ouvindo música.

— Quem? O Jesse ou o Walter?

— O Mike!

— Ah!

—E aí o Jesse matou o Gale!

Lucjan riu de como a mãe parecia verdadeiramente indignada com o fim da temporada do que havia se tornado seu seriado favorito nos últimos tempos. Desviando parte da atenção da massa de batatas que manuseava, deixou que seus olhos a espiassem logo ao seu lado, fatiando um gomo de kielbasa, uma espécie de linguiça caseira que costumava fazer parte do desjejum dos sábados.

Já era um hábito mesmo antes de Lucjan, que era o caçula, nascer. No fim de semana, Liliana acordava ainda mais cedo que o de costume para preparar o café da manhã tradicional polonês, com todos os itens que o compunham. Ela própria não tinha costume de comer, tomava apenas algumas xícaras de chá preto.

Liliana sabia exatamente o que preparar para o marido e cada um dos filhos, e o fazia com tanta disposição e alegria que Lucjan nunca havia tido coragem de dizer a ela que não precisava se sacrificar tanto. Em vez disso, com certa idade, começara a acordar junto com a mãe para ajudá-la. No inverno, quando começavam a organizar os ingredientes, o sol nem pensava em nascer ainda. Costumavam pegar suas xícaras de chá e se sentar junto à janela para ver o céu clarear preguiçosamente, indo do azul muito escuro para o cinza familiar.

Mas estavam no meio do verão, então já era dia quando saltaram da cama para começar os preparativos naquele sábado. Liliana passou o café, que eles se sentaram na varanda dos fundos para tomar, dividindo uma fatia de pão que ela havia assado no dia anterior. Conversaram sobre a semana um do outro, como sempre faziam, e sobre o que tinham planejado para os dias seguintes. Liliana ainda perguntava de Marlena todas as vezes, mesmo meses depois da separação entre eles. Talvez porque quisesse acreditar que, assim como todos os outros, aquele término não seria definitivo. Lucjan, que não podia dizer a verdade, mas também não conseguia mentir para a mãe, dizia que ainda não queria falar a respeito. Ela respeitava, acariciava seu rosto e oferecia um sorriso confiante. Era quando Lucjan passava mais perto de acreditar que tudo ficaria bem, mas quando também acabava tomado de medo.

A mãe era tudo o que tinha naqueles dias. A ideia de perdê-la despertava nele o terror mais primitivo. O tempo todo em que estavam por perto, Lucjan criava fantasias em que contava a ela o verdadeiro motivo pelo qual Marlena tinha se afastado e por que ele vinha perdendo peso e sono, adoecendo sem parar. Para cada situação inventada, ele imaginava uma reação diferente da mãe. Nenhuma delas o tranquilizava. Pelo contrário, às vezes precisava se despedir bem rápido e se trancar no cômodo mais perto para não a assustar com suas crises de ansiedade. A frequência vinha aumentando, e elas eram cada vez mais intensas.

Lucjan tinha a impressão de que, cada vez que adiava aquela confissão, ela ia direto para um bolo de outras confidências silenciadas, que fazia seu estômago doer continuamente e seu coração parecer sobrecarregado todos os dias. Tinha períodos de melhora, mas na maior parte do tempo sentia todos os músculos do seu corpo doloridos de tão tensionados. Nunca relaxava, porque vivia intimidado pela ideia de que qualquer brecha acidental, qualquer tropeço inesperado, colocaria tudo a perder. Não conseguia lidar com a sensação de que cada uma de suas escolhas poderia entregá-lo: fosse a quantidade de açúcar em seu café ou a maneira como caminhava.

Talvez esse fosse o motivo de todos aqueles sonhos em que andava sobre uma espécie de plataforma estreita, tão alta que não conseguia ver nada abaixo de si. Sempre estava no meio dela, não conseguia identificar de onde vinha ou para onde ia. Na maioria das vezes acabava caindo de lá, e a corda que havia ao redor de sua cintura se arrebentava no meio do caminho para o chão. Lucjan normalmente acordava antes do impacto, com seu corpo trêmulo e encharcado de suor.

Às vezes acontecia de passar tanto tempo tentando se desenroscar de sua angústia, que não podia recordar de algumas coisas, como o que acontecera desde o momento em que ele e a mãe tinham servido o café naquele sábado até o instante em que ouviu o pai se manifestar com um riso, que se parecia muito com um rosnado.

— Inacreditável! — Lucjan o ouviu dizer, com o rosto todo atrás do jornal. — Esse pedał* de merda! — Kornél continuou, ainda que ninguém tivesse demonstrado qualquer interesse por sua indignação inicial. — Anna Grodzka. — E forçou uma gargalhada antes de enrolar o jornal e jogá-lo na mesa, por pouco não sobre a xícara de Liliana. Anna Grodzka estava concorrendo ao cargo de deputada nas eleições daquele ano, a primeira mulher transgênero a se envolver na política europeia — Até ontem era Krystof.

— Eu li que ele vai tentar aprovar cirurgias de troca de sexo de graça se ganhar — Bartosz comentou, depois enfiou uma porção de ovos na boca. — Imagina a quantidade de gay que vai votar nele agora.

— Nela — Lucjan corrigiu, sem se dar ao desgosto de olhar para algum deles. Afoito, tentou engolir o pedaço de panqueca de batata que colocou na boca, sentindo como se tivesse acabado de pôr tudo a perder.

— Ele vai ganhar — Marcel acrescentou e, se não tivesse enfatizado tanto o pronome, Lucjan pensaria que nem o tivessem escutado antes. — A Polônia tá cada vez mais longe do bom senso. Vocês acham que, em outro momento, o Palikot estaria subindo desse jeito? Um partido que só faz criticar a igreja, defender a legalização do aborto e do casamento de gay.

Lucjan segurou seu garfo com mais força. Tanto quanto o esforço que fazia para não deixar escapar por entre os dentes o que pensava sobre o assunto e, especialmente, o que pensava sobre a opinião ignorante do pai e dos irmãos. Normalmente o teria feito, mas agora temia o tempo todo que parecesse pessoal, uma tentativa de se defender.

— Eu espero estar morto quando legalizarem casamento de pedał na Polônia.

Lucjan afastou a cadeira e se levantou de uma só vez. Teve dificuldade em se equilibrar, com o corpo tremendo de raiva. Imaginou uma cena em que, num tom claro e seguro, diria: "Eu provavelmente sou um pedał". Mas tudo o que fez, com os olhos perigosamente úmidos, foi levar a louça que tinha usado até a pia antes de sair da sala de jantar, torcendo para que conseguisse voltar a respirar.

Lucjan era o último de quatro irmãos. Todos eles com uma diferença de dois anos de idade, como se Kornél e Liliana tivessem planejado com cuidado as gestações. Exceto por Marcel, que era o segundo mais velho e havia se casado no ano anterior, os outros três ainda moravam com os pais.

Bartosz, o primogênito, tinha ficado noivo por muitos anos e até se mudara para um apartamento com Blanka, mas levara só dois meses antes de correr de volta para casa. Dissera à família que ela "não estava preparada para a vida a dois", o que, na língua de Bartosz, Lucjan imaginava que significasse que Blanka, diferentemente de Liliana, tinha se negado a assumir sozinha as tarefas que deveriam dividir.

Lucjan não tinha uma boa relação com nenhum deles, embora não pelos mesmos motivos. Marcel porque estava sempre duvidando e caçoando dele, muito mais do que os outros dois. Edek porque era pouquíssimo disponível, estava sempre quieto e soturno pelos cantos. Mas nada se comparava com a crueldade que era ter que conviver com Bartosz.

Os dois não se falavam havia anos. Tinham chegado a se aproximar uma época, logo que o mais velho voltara para a casa dos pais depois de ter vivido alguns anos na Cracóvia para finalizar a faculdade de contabilidade. Lucjan tinha vinte anos e achou que seria legal se finalmente começassem a assumir que haviam crescido e se tratassem com algum respeito e maturidade. Mas foi exatamente naquele momento em que tudo aconteceu.

Lucjan percebera muito facilmente quando Marlena começara a ficar cada vez menos à vontade na presença de seu irmão, a ponto de ir embora quando ele chegava, ainda que estivessem no meio de um filme ou refeição. Um dia a levara até em casa e, com ela apertada em um abraço afetuoso, ouvira a namorada contar, sob o fôlego e um amontoado de repugnância, que Bartosz a tinha encurralado no corredor dos quartos no mês anterior.

— Não chegou a me beijar — ela assegurara -, mas ele tentou.

Foram precisos Edek e Kornél para tirar Lucjan de cima do irmão mais velho naquela noite. Bartosz não tentara se defender - por orgulho ou por reconhecer seu erro, Lucjan não sabia, mas também não se importava. Desde então, muito para o desapontamento de Liliana, os dois não se falavam.

Com Kornél, por sua vez, os sentimentos nunca vinham sozinhos. Sempre de dois em dois, e normalmente um era o extremo do outro. Desde muito pequeno, Lucjan se pegava a odiá-lo, para logo depois se desesperar por sua atenção. Quando tomado de cólera, chegava a confessar a Marlena que não aguentava mais vê-lo todos os dias, mas era a primeira pessoa para quem mostrava as medalhas que ganhava em torneios de natação. Mesmo depois de adulto, ele se rebelava em segredo, mas sempre buscava pela aprovação do pai.

 

—--

 

— Você vai votar pelo Palikot?

Lucjan quase tinha se esquecido de que Edek estava no quarto. Seus olhos buscaram pelo irmão, que estava junto à escrivaninha e de costas para ele.

— Eu não sei ainda — respondeu, temendo que sua verdadeira resposta desencadeasse uma discussão. — Mas não se preocupe, duvido que eles ganhem de qualquer forma.

— Por quê?

— O partido não existia até ano passado, e a maior parte do país é conservadora, contra as propostas dele — Lucjan explicou. — Provavelmente a Plataforma Cívica vai ganhar.

— Se eles receberem um bom número de votos, talvez consigam eleger dois deputados para a câmara baixa — Edek disse, e Lucjan não sabia se já tinha ouvido o irmão falar uma frase tão longa antes. O assistiu girar na cadeira para ficarem de frente um para o outro. — Talvez Anna Grodzka consiga entrar no Sejm.

Lucjan se perguntou o que significava aquela conclusão.

Na verdade, não conseguia entender nenhum elemento da conversa que tinham acabado de ter. Suspeitou que Edek estivesse apenas esperando que ele comemorasse a chance de Anna Grodzka ser a terceira transgênero no mundo inteiro a entrar como membro de um parlamento, para então começar a confrontá-lo.

— Talvez.

Edek concordou brevemente com a cabeça antes de voltar-se outra vez para a escrivaninha. Um instante depois, Lucjan o ouviu murmurar:

—Talvez eu vote neles.

Com o irmão de costas para ele, Lucjan se deu a liberdade de expressar no rosto toda a sua confusão e surpresa. E era a esse ponto de desespero que havia chegado, no fim. De se alegrar e tranquilizar ao menor e mais indireto sinal de apoio. De se convencer de que o fato de o irmão parecer não achar um absurdo que aprovassem o casamento entre pessoas do mesmo sexo talvez significasse que não estaria sozinho quando tudo viesse a ruir. No fundo, Lucjan sabia que não mudava muita coisa, mas, ainda assim, era tudo a que podia se agarrar naquele momento.

 

—--

 

Lucjan precisou se curvar para conseguir verificar sua imagem no espelho do banheiro. Não tinha nada errado com a camisa escolhida ou com o cabelo, que penteou mais uma vez com os dedos, mas ainda se sentia tão inapropriado. Como se aceitar o convite de última hora de Ewelina fosse errado. Ora, quem ele achava que era para ir e levar como acompanhante sua melancolia? Ela provavelmente seria inconveniente, fazendo com que ele risse sem vontade e concordasse com qualquer coisa, porque não tinha lá muita energia para argumentações. Ela sussurraria no ouvido de todos os colegas que Lucjan não estava bem, e eles tentariam animá-lo e enchê-lo de vodca, o que só faria com que todas as barreiras que tivera o cuidado de erguer dia após dia ficassem frágeis e bambas. Talvez caíssem. E aí quem é que daria conta de seu desespero, senão ele mesmo?

Será que estava exagerando?, perguntou-se depois de dez minutos encostado na parede úmida do lado de fora do bar. Não estava, concluiu quando finalmente se empurrou para dentro, direto para os olhos de repente animados de Damian. Aquela era mesmo uma péssima ideia.

Exceto pela mesa em que estavam Ewelina, Ania e Damian, apenas outras duas estavam ocupadas. Não havia tumulto ou música alta, apenas um bocado de gente que parecia estar tentando tornar aquele sábado menos pior. Ou este era ele?

— Aí está você! — Ewelina comemorou com os dois braços para cima, um shot de vodca saborizada em cada uma das mãos.

Lucjan aceitou o sorriso e um dos copos. Concordou com o brinde silencioso e entornou a bebida azul, para só então se curvar e cumprimentá-la com um beijo. Depois de Ania, chegou a Damian, que esticou o pescoço para oferecer a própria bochecha, já muito vermelha por causa do calor e do álcool. Lucjan não soube bem por que encarou aquilo com tamanho bom humor e naturalidade, mas beijou o alto do rosto morno dele antes de ocupar a cadeira restante.

— Você não vai acreditar — Ewelina começou enquanto empurrava outro shot pela mesa em sua direção. Este era vermelho sangue. — Albin terminou comigo.

Lucjan segurou o copo a meio caminho da boca, então o devolveu na mesa. Suas sobrancelhas reunidas demonstrando sua preocupação.

— Sinto muito, Ewe.

— Tá tudo bem. Eu estava de saco cheio — a mulher continuou e propôs outro brinde, que Lucjan aceitou sem pensar muito. — Minha única preocupação, para ser sincera, é o Pan Wąsy. — Senhor Bigode era o nome do gato que Ewelina e Albin tinham adotado logo que foram morar juntos. — Ele ainda teve a coragem de me dizer que o gato é dele.— E o soluço que ela deixou escapar fez com que Lucjan se perguntasse quanto tempo ela o havia segurado. — Eu quem encontrei, eu compro a ração, Senhor Bigode dorme na minha barriga.

— E o apartamento? — Ania perguntou, brincando com o canudo colorido de sua bebida mais colorida ainda.

— Tanto faz. Ele pode ficar com aquela caverna. — Outro soluço. — Eu só quero meu gato, isso ele não pode ter. — E erguendo a caneca de cerveja, que parecia intercalar com as doses de vodca, Ewelina exclamou: — Ao bom e único Senhor Bigode!

Deve ter sido no meio do quinto ou sexto shot quando Lucjan parou de se preocupar com a hora que iria embora. Agora nem parecia fazer tanto sentido querer escapar daquela situação. Talvez estar ali, naquele bar, com aquelas pessoas, aquilo sim fosse escapar. As memórias da manhã desagradável foram perdendo a nitidez e, mesmo que ele tentasse, não conseguiria se recordar de seu último riso fácil, ou quando foi que tinha se sentido tão relaxado. Com os ombros leves e os olhos brilhando outra vez, deixou-se perder em meio à confusão de histórias cômicas, gargalhadas soltas e os muitos brindes que faziam cada vez menos e menos sentido.

Ele e Damian conversaram muito mais do que tinham conversado nos últimos meses, e no meio da madrugada ele conseguiu perceber por que tinham sido tão próximos. Por que tinha terminado com ele em seus braços em algum momento. E aquela deveria ser a primeira vez que não se apavorava diante daquela conclusão - a de que beijaria Damian ali, naquele exato momento, caso tivesse a oportunidade. Talvez porque o álcool tivesse baixado sua guarda, ou talvez porque tivesse chegado a hora de dar a si mesmo abertura para pensar sobre isso.

— Um shot pelos seus pensamentos — Damian ofereceu. Lucjan não se lembrava de como ou por que tinha saído da mesa e ido parar no balcão, mas lá estava ele.

— Se eu tomar mais um shot, nunca saberemos quais eram meus pensamentos.

Damian riu com vontade, depois puxou o banco mais próximo para se sentar. Lucjan continuou em pé, mas não forçou os olhos para longe da figura leve do outro rapaz. Os cabelos ondulados, que a luz azulada do bar fez parecer roxo, os olhos vagando pelos arredores como se observasse tudo e nada ao mesmo tempo, as bochechas coradas se destacando na pele branquíssima.

— Você está vendo alguém?

Lucjan não entendeu a pergunta de Damian. Deu uma olhada ao redor, porque por um instante pensou que o bar tinha esvaziado e era sobre isso que ele falava.

—Você sabe — Damian continuou —, está saindo com alguém?

— Ah. — Ele deveria ter ficado surpreso, mas estava bêbado demais para isso. — Não. Ninguém.

— Nós poderíamos sair qualquer hora.

— Eu acho que não.

Lucjan estranhou a própria resposta tanto quanto Damian pareceu ter feito. Os dois se entreolharam, surpresos e envergonhados.

— Você ainda está chateado com o que aconteceu?

Em qualquer outro momento Lucjan ficaria furioso pelo tom de voz desdenhoso de Damian, quase como se sua chateação não significasse tanto assim. Mas significava tanto assim, ou mais. Acontece que não tinha nada a ver com Damian.

— Não — respondeu. — Só não é um bom momento para estar com alguém.

— Você não precisa passar por isso sozinho.

— Você está enganado — Lucjan murmurou. — Eu preciso.

Lucjan teria explicado que não estava falando sobre apoio, ou ter alguém com quem contar. Teria dito que se referia a todas as incertezas e as aflições diárias, a saber exatamente quem era, mas não ter ideia de como lidar com isso. Não era sobre encontrar alguém para recebê-lo no ponto de chegada, mas sobre não poder ser carregado até lá. Precisava ir com as próprias pernas. E enquanto ia, precisava ir ao seu jeito e no seu tempo. Meio torto. Meio vacilante. Meio sozinho. Mas sem se deixar distrair ou desistir no meio do caminho.

— Lout! — Ewelina gritou, agarrando o punho de Lucjan e a barra da camiseta de Damian de uma só vez. — Senhor Bigode está esperando por nós.

E nenhum deles saberia dizer como foi que acabaram invadindo o apartamento que antes pertencia a Albin e Ewelina. Lucjan nem mesmo se lembrava como tinham chegado até lá, se de táxi ou de repente andando. Se recordava muito vagamente de Ewe sentada no meio fio com o gato nos braços, enquanto Ania vomitava todas as muitas cores das doses que tomara mais cedo.

Não se lembrava do momento em que decidiram ir embora, ou onde tinham se despedido. Tudo o que sabia era que apenas ele e Damian estavam caminhando juntos quando o sol começou a despontar em algum lugar do céu. Em alguma esquina, se abraçaram. Longa e saudosamente. Um desses abraços que sabemos que é o último, mas estava tudo bem que fosse. Lucjan esperou ali, no meio da rua, até que Damian tivesse desaparecido em uma descida íngreme lá na frente, depois foi para casa.

Cambaleou sem muita segurança para dentro e se arrastou pela escadaria como se ela fosse muito maior do que realmente era. Atravessou o corredor com seu corpo esbarrando na parede. Passou pela porta do quarto de Bartosz - onde havia anos o pai também dormia -, depois pelo próprio quarto. Continuou, e continuou. Sem saber por quê, mas também incapaz de se dissuadir da ideia.

Liliana não acordou quando ele entrou. Mesmo quando se deitou na cama, a mãe demorou a notar sua presença. Lucjan apoiou a cabeça em algum lugar entre o peito e o ombro dela. Sentiu quando seus braços vieram confortá-lo, hesitantes, mas afetuosos.

— Mama — ele soprou, suas lágrimas caindo uma atrás da outra no colo receptivo de Liliana. — Eu preciso te contar uma coisa.

Lucjan a ouviu suspirar delicadamente antes de beijar com carinho sua testa.

— Eu sei — ela disse, no mesmo tom quase inaudível. Lucjan se encolheu um pouco mais, como se achasse possível voltar para dentro dela, se esconder, nascer de novo, ou nunca mais vir ao mundo. — Agora durma, meu filho. Durma.

— Teź cię kocham, mama.

— Eu também amo você, querido. Também amo você.

 

 

—______

[*]Abreviação polonesa para pederasta; termo pejorativo atribuído a homossexuais.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Oi, querides!

Não apareci durante essa semana para deixar o capítulo 3, mas prometo não ser tão negligente na próxima.

Agradeço a todos que deram uma passadinha por aqui, para fazer companhia a mim e ao Lucjan. É sempre mais fácil quando caminhamos juntos.

Espero que estejam gostando,
me contem o que estão achando!

Xx ♥
Lô Bernardelli



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Entre vírgulas" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.