Outro alguém escrita por Aislyn


Capítulo 5
Capítulo 4


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura!



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Os últimos degraus foram vencidos com grande esforço, arrancando de Katsuya um suspiro cansado quando finalmente se viu em frente ao corredor que levava ao seu apartamento. Não desgostava do novo trabalho, mas andava esgotado. O serviço era diferente do que fazia na Shirozumi, mas o uniforme era o que mais o chateava, sendo bastante excêntrico. Nos dias com eventos especiais não tinha um horário fixo de saída e não se importaria muito com essa parte se não morasse tão distante, o que significava chegar tarde, caso conseguisse pegar a condução. Os colegas, por sua vez, não eram ruins, mas também não eram muito legais. Num geral, não chegava nem perto do ambiente familiar que a antiga cafeteria proporcionava.

 

Para piorar, agora tinha que cuidar sozinho de si mesmo e das coisas de casa. Não tinha mais a ajuda da mãe para preparar seu almoço ou do pai para dar uma carona e nem a irmã para rirem juntos no fim do dia. O período de castigo fora de casa havia acabado no mês anterior, mas ninguém da família o procurou dizendo que podia voltar, então imaginou que não era bem-vindo.

 

Conforme se aproximava da porta, a cena à frente se tornou um tanto confusa. O ponto meio avermelhado que imaginou ser um vagalume, era na verdade um cigarro aceso. Aproximando mais, conseguiu identificar quem o segurava entre os dedos, sentado no chão com as costas apoiadas contra a entrada: Mikaru.

 

— O que está fazendo aqui? – Katsuya parou em frente ao homem, encarando-o de cima antes de estender a mão, mas Mikaru não o encarou de volta, entretido com a fumaça que subia lentamente.

 

— Esperando você para conversar. – Mikaru respondeu após um instante, ignorando a mão e se levantando sozinho, espanando a poeira da calça enquanto se afastava da porta.

 

Katsuya encarou sem acreditar que o empresário estava mesmo ali, lembrando-se então que precisava pegar a chave para entrar, batendo nos bolsos da calça e da mochila até encontrar o que procurava. Takeo disse que ia convencer o outro a procurá-lo, mas não imaginou que seria tão rápido. Não fazia nem duas semanas que haviam conversado!

 

— E-entra… está um pouco bagunçado. Não ando com muito tempo pra organizar, mas… ahm… – Katsuya parou em frente à porta que levava ao quarto, acendendo a luz enquanto tentava afastar algumas caixas do caminho, mas estacou ao notar que Mikaru permanecia próximo à entrada.

 

Não sabia como começar aquela conversa. Não sabia o que Takeo havia dito para convencê-lo a ir até ali, mas precisava cumprir sua parte na promessa e contar a verdade.

 

Mikaru observava algum ponto aleatório fixamente, depois balançou a cabeça de leve numa negativa, voltando o olhar para o outro lado e fixando na pia. Katsuya viu o instante em que a louça voou em sua direção, afastando um passo e levando o braço à frente do corpo, mas a imagem sumiu da mesma forma que surgiu. Por diversas vezes, Katsuya conseguia ver no olhar de Mikaru uma vontade de externar vários sentimentos, mas ele sempre se controlava, agindo da maneira mais racional possível. Como que para confirmar que sua ilusão era apenas isso, Mikaru retirou os sapatos, caminhando até a bancada onde apagou o cigarro e o jogou no lixo, só então encarando-o de volta.

 

— Disseram que você queria falar comigo… – Mikaru começou incerto, desviando de novo o olhar para algum ponto da cozinha, puxando o ar com força antes de continuar – Disseram também que eu devia te procurar, já que nunca faço isso, o que te leva a duvidar do interesse vindo da minha parte… Reli as últimas mensagens que trocamos e, posso ter entendido errado mas, em algumas delas quem propôs os passeios fui eu. Dos que você sugeriu, só neguei dois; um por já ter compromisso para o mesmo dia e o outro porque não estava com vontade de sair.

 

Katsuya deixou a mochila escorregar pelo ombro, apoiando-a contra a parede, sem desviar o olhar um instante sequer do homem à sua frente. Ele realmente estava disposto a conversar e parecia querer ouvir seu lado também. Não podia deixar a oportunidade passar. Prometeu a Shiroyama que faria tudo a seu alcance e aquela era sua única chance.

 

— Eu até entendo se você reclamar que não sou bom em demonstrar, Katsuya. Não sei falar bem sobre o que sinto… Mas daí a afirmar que terminamos porque eu não te procuro? Que vir atrás de você teria salvado a relação? Como se só você corresse atrás… E só para completar, foi você quem quis terminar.

 

Katsuya ergueu as mãos, num claro sinal de rendimento. Ele não tinha como negar tudo aquilo. Mikaru havia se preparado e muito bem para aquela conversa. Foi ingenuidade sua pensar que o empresário chegaria ali e escutaria sua desculpas, o perdoaria depois e então voltariam a ser o casal que eram antes.

 

— Você tem razão, em tudo que disse. Não tenho como contestar.

 

— Então…? Era mesmo só uma desculpa pra terminar. Achou que, com a notícia, eu ia surtar e implorar pra você ficar? Não aconteceu.

 

— A nossa situação estava estranha. Eu não sabia se a gente estava indo bem, se você ainda queria alguma coisa comigo. Eu estava desesperado! Achei que ia reagir de outra forma.

 

— Você sabia que eu queria, caso contrário não estaria com você. Não estaríamos nem saindo juntos!

 

— Esse é o problema, Mikaru. Não tem como saber se você não falar! Eu até tento adivinhar algumas vezes, mas não dá pra levar nossa relação na base das suposições. Eu sei que estou pedindo demais, querendo que você demonstre e diga o que sente, mas você também exige muito, querendo que eu pegue as informações no ar. Desculpe se sou devagar pra algumas coisas, mas também acho que não vai te arrancar pedaço ser um pouco mais romântico.

 

— E se eu não quiser? – Mikaru cruzou os braços, indignado. Katsuya estava exigindo bem mais do que se imaginava oferecendo.

 

— Ah… bom… – Katsuya não imaginou que uma negativa chegaria tão rápido. Pensou que ele ia aceitar a ideia, pelo menos para tentar um pouco, mas se enganou – Então, desculpe tomar seu tempo.

 

— É só isso que tem a oferecer? Nenhum motivo a mais? Toda a situação envolve que eu te procure e mude minhas atitudes?

 

— Não sei o que posso fazer de diferente que outra pessoa também não possa… – ele não podia oferecer algo como um bom estilo de vida, já que Mikaru não precisava daquilo e nem um relacionamento maduro, já que não tinha muitas experiências. Companhia, carinho, atenção, tudo isso Mikaru podia obter com qualquer pessoa com quem se envolvesse e gostasse dele.

 

— Ok.

 

Mikaru deu de ombros, virando-lhe as costas e caminhando para a saída. Não tinha porque ficar ali se Katsuya não tinha nada a ofertar. Era fácil pedir para que a outra pessoa mudasse e se adaptasse, mas por que ele não podia dar o primeiro passo para melhorar o relacionamento dos dois? Não é como se Mikaru estivesse exigindo muito. Talvez devesse mesmo dizer mais sobre como se sentia, mas os problemas que tiveram recentemente foram devido à Katsuya omitir o que acontecia à sua volta e não ele.

 

Tsc… a quem queria enganar? Os dois estavam errados! Não adiantava jogar a culpa pra cima do garoto. Kurosaki se envolveu com amizades ruins, testou medicamentos que não devia, escondeu coisas que fazia, mas parte da culpa era sua por não dar brechas para o rapaz se aproximar e confiar nele.

 

Calçou novamente os sapatos, repassando toda a situação em sua mente, para ter certeza que havia esgotado todas as possibilidades, mas foi puxado de seus pensamentos por um toque em seu braço, que o envolveu firmemente.

 

— Espera! Eu disse pra ele que não ia desistir de você até tentar tudo que pudesse! – Katsuya notou que pegou Mikaru desprevenido ao vê-lo se encolher com sua aproximação – Por que está com medo de mim? Não vou fazer nada!

 

— Nunca se sabe… – murmurou em resposta, sentindo-se incomodado – Me soltar seria uma boa amostra disso.

 

— Desculpe… eu… acho que pensei em um argumento. – afastou-se alguns passos, liberando a passagem do corredor – Podemos conversar mais um pouco?

 

— Tudo bem… – Mikaru caminhou de volta para o quarto, pegando os cigarros no bolso e acendendo um enquanto se dirigia para a pequena varanda. Maldito hábito.

 

— Vou fazer um pouco de chá pra gente. – Katsuya pegou a chaleira e mesmo sem receber uma resposta, decidiu preparar a bebida – Me escuta daí? Você perguntou o que eu tinha a oferecer, mas eu quem apontei as mudanças que queria em você, então nada mais justo que você fazer o mesmo. O que quer que eu mude? O que fiz de errado e você não quer que aconteça?

 

Katsuya lançou um olhar de expectativa para o fundo do quarto, mas não tinha certeza se havia sido escutado. Não queria levantar a voz e deixar todos os vizinhos a par do que acontecia em seu apartamento. Terminou de preparar a bebida, levando duas canecas consigo, depositando uma delas na mureta à frente de Mikaru, que parecia distraído olhando algum ponto à frente.

 

— Você voltou a fumar… – Kurosaki apontou o óbvio, conseguindo sua atenção de volta.

 

— Sim… me ajuda a acalmar… – confessou com uma risada seca, apagando a ponta do cigarro na mureta – Seu tempo de castigo não acabou? Pensei que ia voltar pra casa dos seus pais na primeira oportunidade.

 

— Ah… acabou, mas… não é como se algum deles tivesse vindo me procurar. Acho que nem eles me querem por perto.

 

— Eles só não sabem como se aproximar. Às vezes eu também fico em dúvida sobre como te abordar. Você mudou… Se tivesse que apontar algo que você pode me oferecer… eu queria que você fosse como antes.

 

— Takeo-san me disse o mesmo. – Katsuya comentou após encará-lo um instante – Que você gostava de como eu era antes, mas não tenho certeza se entendi… 

 

— Nós descobrimos o que funcionava ou não pra nossa relação com as tentativas, fazendo várias coisas juntos… não sei quando mudou, mas logo você estava pedindo conselhos para Izumi, como se ele me conhecesse e soubesse o que gosto, depois vieram seus amigos do curso, você queria fazer o que eles faziam, ter um namoro como o deles… No meio do caminho deixou de ser algo só nosso. E eu… eu tinha medo de me envolver e machucar no processo, descobrir que você só estava brincando ou curioso para saber como seria esse tipo de relação. Nós dois perdemos o foco do que queríamos.

 

Terminaram a bebida em silêncio, cada um perdido nos próprios pensamentos em relação ao outro e à situação que passavam. Realmente haviam se perdido no meio do caminho, porque apesar de tudo, o começo não havia sido tão ruim. Foi cheio de erros, tentativas, vontade de jogar tudo pra cima, mas conseguiram seguir em frente.

 

— Como ficamos? – Katsuya questionou baixinho, virando-se para encarar o empresário enquanto aguardava a resposta. De sua parte, ele queria mais uma chance, e já havia perdido a conta de quantas vezes pediu outra oportunidade, mas tudo dependia de Mikaru. Se ele não quisesse, então não iria mais insistir.

 

— Posso pensar um pouco? Está ficando tarde e nós dois temos que trabalhar amanhã. – sem esperar resposta, Mikaru voltou para dentro do apartamento, levando consigo a caneca que depositou na pia – Onde está trabalhando agora?

 

— Ah… melhor você não saber… – Katsuya resmungou amuado, sentindo o rosto queimar de vergonha. Ainda bem que havia seguido logo atrás, assim sua expressão não era vista.

 

— Tudo bem. Não precisa me dizer se não quiser.

 

— Acho que é o tipo de lugar que você não passaria nem na porta.

 

— Muito ruim? – vários tipos de estabelecimentos suspeitos passaram pela mente de Mikaru, mas ele achou melhor não perguntar demais e nem confirmar nada.

 

— Não chega nem aos pés do tipo de cafeteria que a Shirozumi é…

 

— Ah… entendo. – era uma cafeteria, menos mal. O garoto não estava envolvido com nada ilegal ou perigoso – Eu te procuro depois.

 

— Fica. Por favor…

 

Katsuya sabia que estava soando desesperado, mas agora que o tinha por perto, não queria deixá-lo de novo. Tinha medo que Mikaru não o procurasse e que aquela fosse a última vez que se veriam.

 

— Você não tem outra cama.

 

Como Mikaru podia negar quando ele mesmo não tinha certeza do que queria? Se realmente quisesse terminar não teria ido ali, independente dos argumentos usados por Shiroyama. Só precisava de uma desculpa.

 

— Se eu tiver, você fica?


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