Os Treze Guardiões escrita por Miss Lidenbrock


Capítulo 25
O preço da imortalidade


Notas iniciais do capítulo

Vamos conhecer um pouco mais de Lauro agora...



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— Temos que avisar a eles! – exclamei, alarmada – Eles estão nas mãos de um bruxo das sombras! Temos que fazer alguma coisa!

— Precisa se acalmar, Lorena – Lauro falou, com toda a tranqüilidade do mundo. Era como se nenhum desastre estivesse acontecendo. – Infelizmente, ainda não podemos sair agora. Você não está em condições de andar por todo o bosque.

Fiquei boquiaberta de indignação. Revoltada, olhei para Eric, em busca de apoio. Mas ele me fitou com um olhar de desculpas.

— Você se machucou muito na queda – falou – Não sei se é uma boa ideia andarmos agora.

Passei as mãos pelos cabelos, frustrada.

— Vocês não estão entendendo – falei – São meus amigos. E... E a minha família? – me ocorreu de repente. Arregalei os olhos, apavorada. – E se elas estiverem correndo perigo? Você disse que Kaî está se aproximando! Preciso protegê-las!

— Kaî ainda não está aqui, Lorena – Lauro falou pacientemente – Eu teria sentido sua presença. Um bruxo poderoso como ele não passaria despercebido. Quanto a sua família... – ele inspirou fundo – Não se preocupe. Eu venho observando vocês. Há alguns dias, conjurei um feitiço de proteção na casa. Não é muito forte, mas deve bastar por enquanto.

Cerrei os olhos, repentinamente desconfiada. Porque ele fizera isso? Qual era o interesse dele?

Adivinhando meus pensamentos, ele suspirou.

— Entenda, eu estou aqui para proteger os novos guardiões – disse ele – E você e eu, nós temos uma ligação particular. Ambos dividimos o mesmo animal guardião. Claro que proteger os outros é de suma importância, mas você é ainda mais. Você é a líder.

Isso me pegou de surpresa. Eric também, pelo visto, pois ele arregalou as sobrancelhas.

— Achei que o líder fosse o Ricardo – falou – Sabe, por ser o leão e tudo mais.

Lauro balançou a cabeça.

— É comum cometer esse tipo de erro – ele disse – Mas o leão, apesar de ser considerado “rei da selva”, não representa a liderança. O tigre é o maior dos felinos. Representa a força de espírito, o poder de comando. Essa é você, Lorena.

Pisquei, me sentindo surpresa e confusa. Eu não identificava nenhum tipo de “força de espírito” ou “poder de comando” em mim. Eu era só uma garota normal, sempre fora.

— Eu entendo o que você quer dizer – Eric afirmou, olhando pra mim com um sorriso de canto.

Que bom que alguém entendia, porque eu não compreendia mais nada.

— Bem, se eu sou a líder, então talvez vocês devessem me escutar – falei, tentando usar aquilo a meu favor – Temos que voltar; temos que ajudar os outros. Eric, são seus amigos também. E eles podem estar em perigo. Tem alguma coisa errada, eu posso sentir.

Eric fez uma careta. Eu podia jurar que ele também sentia que algo não estava certo. Ele suspirou, esfregando a mão no rosto.

— O problema é como você vai se locomover – ele disse. Então, algo brilhou em seus olhos escuros. – A não ser que...

— Que o quê? – perguntei. Porque eu toparia qualquer coisa. Tudo pra ajudar meus amigos e minha família.

Eric hesitou, depois seus lábios se curvaram num meio sorriso divertido.

— A não ser que você suba em mim. – completou.

Abri a boca, sem conseguir falar nada. Senti meu rosto esquentar pavorosamente diante do olhar de Eric.

— Como é? – finalmente consegui dizer.

Eric resfolegou uma risada. Aquilo não era nada engraçado!

— Se eu me transformar em lobo – ele explicou com paciência – Vou ter força o suficiente pra te carregar. E só você fingir que eu sou um cavalo e... humm... Montar em mim.

Definitivamente, meu rosto estava quente.

— Mas isso é... É... – eu não conseguia arrumar uma palavra pra definir.

— Você tem alguma ideia melhor? – Lauro perguntou. Parecia estar se divertindo.

Parei pra pensar alguns segundos, então bufei, desgostosa. Eu não tinha nenhuma.

— Tudo bem – grunhi por entre os dentes – Mas não faça nenhuma gracinha.

Eric sorriu, iluminando seu rosto cor de chocolate, fazendo meu coração idiota dar um pulinho no peito.

— Então – disse ele – Todos a bordo.

*                                                  *                                             *

Eu me sentia ridícula.

Tudo bem, andar em Eric não era tão desconfortável assim. O lobo era imenso. Mesmo sobre quatro patas, era quase da minha altura. Era cinzento com pelos negros nas patas e no focinho, e nos seus olhos escuros havia um quê de Eric.

Lauro andava tranquilamente ao nosso lado, de vez em quando vistoriando o ambiente, como se esperasse que o perigo surgisse a qualquer momento.

Eu começava a me sentir sonolenta com o balançar do flanco de Eric. Meus olhos pesavam, e eu me deitei como pude, passando os braças por volta do tronco do lobo.

— Lorena – chamou Lauro, após alguns segundos.

— Hum? – respondi, já bêbada de sono.

Ele hesitou. Parecia estar escondendo as palavras.

— Os sonhos... Eles não vão parar – falou – Eu ainda não consegui cortar a comunicação. Então, o que quer que você veja... Ou ouça... Tente não julgar tão rapidamente, certo?

— Uhum – murmurei, meus olhos já se fechando. Me perguntei vagamente o que ele não queria que eu visse.

E ele estava certo. Assim que dormi, sonhei.

Eu estava do lado de fora da mansão. Todos os antigos guardiões se espalhavam pelo jardim. Alguns sentados à beira da fonte, outros simplesmente estirados na grama. Pareciam quase jovens normais aproveitando o dia de sol.

Quase.

Diógenes estava no centro dos jovens, olhando em volta, parecendo tão preocupado em mirar a floresta quanto Lauro enquanto estávamos andando.

De repente, a expressão de preocupação sumiu de seu rosto. Ele voltou-se para um dos meninos, um sorriso benevolente no rosto.

— Obrigado por ter sido o primeiro a se transformar, Santiago – falou – Se voluntariar para esta tarefa é muito importante.

Olhei, com um sobressalto, para o jovem que agora eu sabia ser Santiago – embora muito mais jovem. Ele parecia pálido e assustado, como se houvesse acabado de passar pela pior das experiências.

— Ele é uma cobra – riu um outro rapaz. Reconheci como o jovem de cabelos castanhos que havia zombado de Jaqueline. Leônidas. — Será que é porque é muito fino? — completou, fazendo o garoto ao seu lado, um jovem pálido e de cabelos escuros, dar risada.

Santiago ficou muito vermelho. Parecia prestes a explodir.

— E você tem um ego tão grande, Leônidas – acusou – Será que não é pra compensar alguma coisa?

Foi a vez de Leônidas ficar vermelho. Olhou em volta, para ver se alguém havia escutado. Pelo visto não costumava ser insultado em público.

— Ora, cale a boca, seu meio-índio descarado de uma...

— Basta – Diógenes comandou, se aproximando de repente – Os guardiões devem ter harmonia entre si. E isso inclui as relações fora do treinamento.

Tanto Santiago quanto Leônidas baixaram a cabeça em submissão.

— Desculpe, mestre – Santiago murmurou.

Diógenes botou a mão no ombro do Santiago, a expressão gentil.

— O animal guardião nem sempre é o que parece – disse ele.

Santiago levantou os olhos, um brilho incrédulo e esperançoso iluminando-os.

— A cobra – falou Diógenes, falando em voz alta dessa vez, chamando a atenção de todos – Representa a persuasão e a inteligência. Pode ser traiçoeira e enganadora, sim, mas também pode ser conselheira e confidente.

— Pff. Enganadora – Leônidas sussurrou para o amigo – Como se o magrelo ali fosse algum dia enganar alguém.

Se Diógenes escutou o comentário, não demonstrou.

— A coruja – ele continuou – representa a sabedoria. Ela nos guia em momentos sombrios, nos auxilia em nossa jornada. Mas também pode ser feroz – ele acrescentou, sorridente – Afinal, é uma ave de rapina.

Um rosto brilhou pra mim na multidão. O filho de Diógenes, Arturo. Ele ainda me lembrava desesperadamente alguém, mas eu não conseguia me lembrar quem.

— O leão – continuava Diógenes – Representa um coração corajoso e puro. Pode ser forte, mas também pode ser brando, a cola que une os demais guardiões.

— Eu vou ser o leão – Leônidas sussurrou de novo – Pode apostar.

Diógenes lhe lançou um olhar severo, mas também paternal. Eu podia apostar que ele considerava todos aqueles jovens como filhos.

Ele continuou falando sobre o significado e a função de cada guardião, e eu me desliguei dele, procurando um rosto na multidão. Finalmente achei. Lauro estava recostado na parede da mansão. Longe dali. Fui andando até ele, estranhando a condição de não ser vista nem ouvida.

Lauro olhava para os lados, como se esperasse estar sendo observado. Por um instante, achei que ele soubesse que eu estava ali. Mas então uma voz chamou a atenção de nós dois.

— Psiu! – chamou. Lauro ergueu o rosto imediatamente, como um animal faria.

— Aqui! – a voz repetiu, e Lauro deu um largo sorriso. Se esgueirou para trás da mansão, e encontrou Jaqueline, parada e de braços cruzados, o encarando.

— Você veio – ele se aproximou para, talvez, abraçar a garota, mas Jaqueline pôs a mão a frente do quarto, afastando-o.

— Vim porque você me implorou pra conversar. Mas não pense que o perdoei – falou ela, a voz dura. – Eu o vi cortejando Martha outro dia. Age como se a união de vocês fosse verdadeira, embora pra mim diga que eu sou a única. O que está acontecendo, Lauro?

Lauro coçou a nuca. Parecia muito cansado.

— Ah, Jaque – ele suspirou – Você precisa entender. Preciso interpretar esse papel para meu pai. Ele está muito esperançoso quanto a esse casamento. E está doente, você sabe. Sinto que devo agradá-lo, pelo menos por agora.

A expressão dura de Jaqueline pareceu vacilar. Quase como se não pudesse evitar, ela segurou as mãos de Lauro, que as apertou com ternura.

— Não agüento mais todo esse fingimento – falou ela – Quando enfim ficaremos juntos?

Lauro deu um pequeno sorriso, acariciando a mão de Jaqueline com o polegar.

— Quando a guerra acabar, lembra-se? – disse ele – E então ficaremos juntos para sempre.

Jaqueline então soltou as mãos de Lauro, usando-as para abraçar o próprio corpo.

— A guerra pode durar anos a fio – afirmou ela – E para sempre é muito tempo.

— Não para bruxos – assinalou Lauro – Não se usarmos o feitiço da imortalidade.

A expressão de Jaqueline tornou-se aterrorizada, e ela estremeceu.

— De jeito nenhum, Lauro. – falou – O preço é alto demais. Lembra da rima?

Lauro suspirou. Então, começou a recitar:

“Da lua, a fase mais cheia – disse – Dos rios, o canto da sereia.”

— “Do mais belo dos animais, o viço – recitou Jaqueline – Do fogo mais azul, a chama. E, para completar o feitiço...

— ... A vida daquele que mais se ama.” – completou Lauro.

Um arrepio violento percorreu minha espinha. De repente, tudo o que eu queria era sair dali.

Jaqueline envolveu o rosto de Lauro com ambas as mãos. Parecia muito vulnerável.

— Eu jamais poderia fazer isso – sussurrou ela – A pessoa que mais amo no mundo é você.

Lauro pegou a mão dela, acariciando suavemente. Devagar, inclinou-se para plantar um beijo casto nos lábios da menina.

— Todos os guardiões, para dentro da mansão! – A voz de Diógenes flutuou até eles.

Os dois se entreolharam.

— Eu vou primeiro – disse Lauro – Depois você.

Jaqueline assentiu rapidamente, enquanto Lauro desaparecia para a frente da mansão.

De novo, o sono começou a se desvanecer. Eu me vi novamente dentro de um redemoinho, e então, tudo se tornou um borrão.

Acordei com um susto.

Tudo permanecia igual. Eu continuava no lombo de Eric. Lauro ainda andava do nosso lado.

Lauro.

Ele não envelhecera. Portanto, devia ter usado o feitiço da imortalidade.

Ele matara alguém. Não, não qualquer alguém.

Ele matara a pessoa que mais amava no mundo.

Olhei para o rosto de Lauro, seu semblante tranqüilo ao andar ao nosso lado.

Em quem estávamos confiando?


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Notas finais do capítulo

E aí, o que acham?



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