O Internato escrita por Rain


Capítulo 14
Catorze




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Acordo em minha cama, sentindo dores por todos os lados. Minha cabeça latejava e eu enxergava tudo embaçado. Me pergunto como vim parar no meu quarto. Em instantes me lembro de tudo o que ocorreu na noite passada. Com certeza fui trazido de volta para o quarto logo após ser apagado pelos dois brutamontes jogadores de basquete.

O despertador toca e uma onda de terror me invade. O que vou fazer agora? Como vou lidar com esse plano de vida? Não posso dizer nada a ninguém. Valentina foi clara ao ameaçar todas as pessoas próximas a mim, tenho que manter sigilo.

— Bom dia, Toni — diz Victor levantando da cama.

Eu permaneço em silêncio tentando pensar numa desculpa pra faltar a aula hoje sem parecer suspeito.

— Não vai levantar? — pergunta Victor se aproximando da minha cama.

— Cara eu acordei morrendo de dor de cabeça, não estou me sentindo muito bem. Hoje não vou pra aula. — digo sem nem mesmo me virar para ver Victor.

— Quer que eu fique com você?

— Não, está tudo bem. Mais tarde vou na enfermaria.

— Ok. Melhoras pra você.

— Obrigado. Boa aula.

Victor se arruma e vai embora.

Levanto-me devagar ainda sentindo meu corpo latejar de dor. Vou até o espelho no canto do quarto e examino meu corpo pra ver como estava a situação. Como previsto, não estava nada boa. Roxos por toda parte e o rosto um pouco inchado. Tento pensar em algo que posso fazer sem que ninguém me veja nessa situação. Apenas uma pessoa pode me ajudar sem fazer perguntas que me compliquem. Infelizmente, ela é a última a quem eu gostaria pedir algo neste momento.

Pego meu celular e ligo para Alice, ela atende.

Dez minutos depois, aqui está ela. Batendo na porta do meu quarto. Abro a porta para que ela entre. Encontro Alice sorridente, mas seu sorriso logo cai por terra ao ver meu estado.

— Meu Deus, Toni. O que houve com você?

Rapidamente puxo Alice para dentro do quarto e fecho a porta.

— Isso foi um presentinho da sua tão amada presidente. — respondo.

— Eu não entendi, por que ela faria algo assim com você?

— Não se faça de boba, Alice. Eu sei tudo sobre o grande esquema por trás desta escola. E também sobre essa droga de plano de vida. — digo pegando o plano de vida que estava no chão embaixo da minha cama e mostrando a ela.

— Plano de vida? Eu não sei nada sobre isso, Toni. Acredite em mim.

— Você faz parte do grêmio. Como não sabe disso?

— Eu sou apenas uma secretária. Boa parte dos negócios relacionados ao grêmio apenas a presidente e a vice-presidente que cuidam. — Alice pega a pasta com o plano de vida da minha mão e folia as primeiras páginas — Mas que droga é essa? Como assim seu proprietário? Isso só pode ser brincadeira.

— Não é. Valentina fez questão de deixar bem claro.

— Isso não é certo, como que ela está envolvida nisso. Eu não posso acreditar. — os olhos de Alice se enchem de lágrima. Eu vou falar com Valentina. Deve haver algo que eu possa fazer.

— Deixa isso pra lá, eu vou tentar resolver do meu jeito. Eu não te chamei aqui pra isso, preciso que me ajude a tirar os inchaços e roxos do meu corpo. Ouvi nos corredores do colégio que você é filha de médicos e pretende seguir a área, pode me ajudar?

— Claro. Primeiro você precisa de um banho, está fedendo. Também precisa limpar as áreas machucadas.

Alice me ajuda a chegar no vestiário do meu andar. A essa hora provavelmente estava vazio, já que todos os alunos estavam em aula. Tirei minha roupa e entrei no chuveiro. Alice saiu para pegar alguns remédios e coisas que se usam quando se é espancado. Depois que terminei o banho, me enrolei na toalha e voltei para o quarto. Minutos depois Alice volta com uma bolsa de primeiro socorros. Ela colocou uma bolsa de gelo na região inchada do meu rosto e esparadrapo nas partes machucadas.

— Eu realmente não sei o que dizer, estou muito sem graça. — rompeu o silêncio.

— Não precisa ficar assim, nada disso foi culpa sua. Só reflita sobre as pessoas com quem anda e saiba que elas não são boas. Nenhuma delas.

Alice passa um corretivo que trouxe consigo nas regiões roxas do meu rosto e pescoço, cobrindo cada uma delas.

— Você não entende. Eu não faço parte do grêmio porque quero, faço porque meu pai me obriga. Mas não posso simplesmente compactuar com isso. Não depois do que fizeram com você e do que fazem escondido.

— Desculpa por estragar a visão que você tinha da presidente.

— Eu sempre soube que ela fazia coisas ruins, Toni, mas preferia fingir que não era real. E bem, olha no que deu. — Alice termina de passar o corretivo nos meus roxos — Pronto, não está perfeito, mas vai servir. — ela me entrega o frasco de corretivo — Pra você, é o mínimo que posso fazer pra me redimir.

— Obrigado.

Alice vai embora.

Volto a me deitar pra descansar mais um pouco. Ainda com a bolsa de gelo no rosto, já sentia meu inchaço diminuir, porém nem com essa pequena melhora meu ânimo voltava. Em minha mente se passavam dezenas de coisas ao mesmo tempo. Formas de tentar sair dessa situação em que me meti, mas nenhuma solução me vinha a mente. Eu simplesmente não sei como me livrar desse plano de vida.

Pouco tempo depois, Victor chega.

— Como você está? Se sente melhor? — perguntou sentando-se ao pé da minha cama.

— Acho que sim, só sinto algumas dores pelo corpo. — respondo agradecido por Victor ser desatento e não perceber nada.

Victor abre sua mochila e tira algo enrolado em vários guardanapos. Depois tira uma garrafa de suco de laranja que provavelmente ele pegou de alguma máquina de refrescos espalhadas pelo colégio.

— Aqui. Trouxe pra você. Você tem que se alimentar.

Desenrolei os guardanapos e lá tinha um lanche natural com uma porção a mais de peito de peru e uma maçã.

— Muito obrigado, Victor. Você é um grande amigo. Conte comigo sempre.

— Eu sei. — Victor sorri hesitante. Seu sorriso se desfaz e ele respira fundo. — Ah, Sebastian me questionou sobre a sua ausência na aula. Eu falei pra ele que você não acordou bem e ele disse que vinha te ver.

— Ah… ok.

Por fora eu tentava soar calmo, mas senti meu rosto queimar e minha testa começar a suar após a revelação de Victor. Tudo o que eu queria evitar nesse momento era Sebastian, mas ele está vindo até mim.

As últimas duas horas passaram como um raio. Tudo por que eu não queria que o período de aula acabasse. Logo Sebastian estaria aqui e eu não teria saída. Eu já estava suando frio e a tensão que emitia do meu corpo provavelmente poderia ser sentida a metrôs de distância. Não demorou muito até que Victor aparecesse acompanhado de Sebastian. Eu me virei para o outro lado para fingir que estava dormindo, na esperança que ele fosse embora, mas conhecendo Sebastian, seria inútil.

— Acho que ele está dormindo, Sebastian. Mas pode entrar e esperar ele acordar se quiser.

Não demorou para que Victor saísse novamente para a prática de futebol. E agora estávamos nós três, Sebastian, eu e a tensão que emitia de todo meu corpo. Eu sabia que essa desculpa de dormir não colaria por muito tempo, pois em algum momento eu teria que acordar, mas quanto mais tempo eu pudesse ganhar, melhor.

Depois de mais ou menos uma hora, Sebastian tenta me acordar chamando pelo meu nome suavemente e alisando meu cabelo. Não tem mais escapatória. Abro meus olhos suavemente e faço toda aquela encenação de alguém acordando.

— Oi. — disse Sebastian abrindo um sorriso.

— Oi.

— Victor me disse que você não estava bem. Como está agora? Já foi a enfermaria?

— Melhor, eu acho. Ainda não fui.

— Vamos então, eu levo você lá.

— Sebastian está tudo bem, sério. — digo sentando-me de frente pra ele.

— O que é isso no seu rosto? — Sebastian põe a mão na região que estava inchada e eu não hesito em demonstrar dor.

— Toni o que é isso? Quem fez isso com você?

— Não é nada.

— Como não é nada?! Seu rosto está inchado! Quem fez isso com você? — pela primeira vez vejo Sebastian alterado.

— Sebastian por favor, se acalme.

— Eu só vou me acalmar quando acabar com a pessoa que fez isso no seu rosto. — Sebastian pucha o cobertor com o qual eu estava coberto e começa a examinar meu corpo e vendo os esparadrapos colados. — Toni quem foi que te bateu? Me diga.

Meus olhos se enchem de lágrimas. Eu não conseguia dizer nada, só sentir culpa.

— Não vai dizer nada?

— Eu não posso. — lágrimas escapam dos meus olhos.

— Achei que fosse alguém importante pra você. Alguém de confiança. Pelo jeito estava enganado.

Sebastian se vira para sair do quarto e eu me levanto rapidamente e o abraço por trás.

— Não vá, por favor. Se eu pudesse… — minhas palavras somem.

Sebastian solta minhas mãos de sua cintura e sai pela porta sem olhar para trás.

Caio no choro imediatamente. A dor de ver alguém que amo passando pela porta dessa forma foi equivalente a que sinto só de imaginar o grêmio fazendo mal a minha família. Tanto meus pais quanto Sebastian são importantes, e hoje o grêmio me fez perder um deles. Isso só faz minha raiva por todos os envolvidos nesse esquema nojento por trás da boa fama desse colégio aumentar. Choro de tristeza e por ser incapaz de fazer algo que me tire da situação em que estou. Choro também de raiva e de empatia por todas as pessoas que sofreram nas mãos do grêmio antes de mim. Provavelmente jovens que tinham um sonho de crescer na vida, que acharam que estudando no Elite poderiam ter a oportunidade que nunca tiveram. Mas acabaram sendo jogados nesse esquema sujo, simplesmente por não fazerem parte da elite.

Ouço barulho do lado de fora do quarto. Provavelmente são alunos voltando da prática esportiva. Preciso me recompor. Em breve Victor também chegará e não quero ter que explicar a ele o motivo de estar no chão ao lado da cama chorando. Victor sabe dos meus sentimentos por Sebastian, mas explicar nossa briga iria além do que posso dizer a ele.

Levanto-me do chão e volto a minha cama, me enrolo em meu cobertor e fico deitado até cair no sono.

Na manhã seguinte, me preparo pra ir a aula. A animação era zero, graças a toda a minha situação. Mas não tinha como evitar ir a aula por mais um dia. Passei o corretivo que Alice me deu para esconder os roxos que ainda pairavam em meu rosto e em alguns arranhões no pescoço. Victor e eu seguimos para o refeitório para tomar nosso café. Após um dia me alimentando mal, tudo que eu mais queria era encher minha bandeja de comida, e foi isso que eu fiz. Larguei mão da minha dieta balanceada e coloquie várias coisas gordurosas que haviam disponíveis. Victor estranhou minha mudança repentina de alimentação, mas apenas observou calado. Ao caminharmos para nossa mesa onde costumávamos sempre sentar, avisto Sebastian. Meu coração começou a pulsar mais rápido no mesmo instante. Nossos olhos se cruzam. Sebastian se levanta imediatamente, joga sua bandeja no recipiente propício e sai do refeitório. Minha vontade é de chorar, mas seguro as lágrimas que começam a surgir em meus olhos.

— O que houve entre vocês dois? — questiona Victor ao sentarmos.

— Eu não estou a fim de falar disso agora.

— Tudo bem.

Continuamos sentados lado a lado calados, cada um tomando o seu café. Somos surpreendidos por uma linda garota loira sentando a nossa frente. Era Alice.

— Bom dia, posso me sentar aqui? — perguntou ela.

— Já sentou. — respondeu Victor antes que eu pensasse em dizer algo.

— Desculpem, se estiver incomodando eu posso sair.

— Não. Está tudo bem Alice. Só… é estranho. Você sempre come na mesa do grêmio. — digo.

— Eu não faço mais parte do grêmio.

— Por que você saiu do grêmio? — disse Victor.

Alice me olhou intrigada. Sua expressão era clara, era como se ela dissesse no olhar “pelo jeito você não disse nada a ele”.

— Isso é algo que você entenderá lá na frente.

Tomo meu último gole de café e me levanto.

— Preciso ir, vejo vocês mais tarde.

Fui mais cedo para a aula. Não tinha muito o que fazer sem Sebastian, e, não posso negar que estou com um pouco de medo de andar por aí sozinho. Entro na sala de biologia. A sala está vazia. Fecho a porta atrás de mim e sento-me na cadeira que costumo sentar sempre. Abaixo minha cabeça e começo a sentir lágrimas caírem de meu rosto. Tudo o que eu queria era poder falar com Sebastian, este é o momento que eu mais preciso dele e ele não está aqui. Me sinto tão sozinho e pesado por não poder externar isso pra pessoa que mais confio.

Ouço a porta se abrir.

Seco minhas lágrimas rapidamente e olho na direção da porta. Lá estavam duas pessoas que eu não queria encontrar de jeito algum, nunca mais. Os brutamontes jogadores de basquete.

— Olha quem nós encontramos sozinho de novo. — disse o mais alto sentando em cima da minha carteira. — O que faz sozinho aqui a esta hora? — ele alisava meu rosto. O que me deixava enojado.

— O que querem agora? Já não foi o bastante me espancarem?

— Na verdade não. Nós odiamos garotos como você. — disse o mais baixo.

— Garotos como eu?

— Sim, gayzinhos como você, e que de alguma forma ganham popularidade. As meninas suspiram por você onde quer que vá. Está cheio de garotos como você neste colégio. Mas você é quem mais nos irrita. — respondeu o mais alto apertando o meu rosto na região do maxilar.

— O que vocês querem de mim? Já estou cansado disso.

O sinal toca.

— Nada. Você já vai ter o que merece. Nós só queremos brincar um pouco com você enquanto isso. Agora que seu namoradinho não está mais por perto, se prepare, Toni.

Os dois garotos vão embora. E se perdem na multidão de alunos entrando pela porta.


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Notas finais do capítulo

Olá leitores, como estão? O próximo capítulo sai na segunda-feira.
Um grande abraço :)



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