O Voador escrita por Gabriel Gorski


Capítulo 15
De Volta Ao Navante




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/772688/chapter/15

Ecco não queria acreditar, mas não conseguia não crer. As coisas faziam um grande e bom sentido e, por um momento ou dois, ponderou fugir da Ordem de Sainlorth para ingressar na Ordem de Alvedrena, mesmo não entendendo como Agheor era o cara ruim da história.

— Com magia nos fez voltar no tempo? – Perguntou Nthaír.

— Sim. – Ela respondeu. – Mas eu disse, é raro e difícil de se fazer. Há muitas consequências para executá-lo com eficiência. Por isso fiz estes cortes no braço. É necessário um sacrifício de sangue.

— E agora nós nos multiplicaremos eternamente?

— Na verdade, quando ‘vocês’ chegarem, a chama os consumirá. Então só existirão vocês dois novamente.

Que destino cruel para duas pessoas.

— És a criadora da chama? – Perguntou Ecco, certo da resposta.

Derália assentiu.

— Como você desfará? – Nthaír insistia em conhecer os segredos dos feitiços.

— Não são membros de Alvedrena. Não saberão. Hão de ir antes que cheguem. – E se levantou para abrir a porta, expulsando-os.

Ecco e Nthaír saíram e ouviram a porta atrás deles batendo. Caminharam pela rua em direção aos Portões do Mar, em silêncio. Ecco tinha nas mãos o pergaminho e pensamentos no cocuruto. Pensou em abri-lo quando Nthaír segurou o seu braço.

— Não abra aqui. Não podemos perder o pergaminho.

Era verdade. Nthaír colocou as mãos nos bolsos e então disse.

— Eu tenho algumas moedas. Vamos comprar uma bolsa pra guardar o pergaminho.

Negociaram com um vendedor na rua principal por quatro alanges dois grandes sacos feitos de couro, com alças e garras de shorins para fechá-los

— Que dia. – Disse Ecco, ao saírem com as bolsas nas costas.

— cha que poderíamos fugir para entramos na ordem? – Perguntou Nthaír, especulando.

— Talvez. – Respondeu. – Vai ser difícil.

— Onde fica a sede de Alvedrena?

Ecco riu. Não sabia, e estavam saindo do lugar onde estava a única pessoa que sabiam que poderia lhes ajudar.

Ambos atravessaram os portões e seguiram a estrada até o Capitão de Ferro. Para a surpresa dos dois, todos já haviam retornado.

— Estão atrasados, érujos. – Disse o Capitão Gage quando subiram à bordo. – Mas serão perdoados por estarem aqui antes do ocaso.

Todos se reuniram próximos ao mastro grande, sentando-se sobre grandes caixas de madeira ou apenas recostando-se. Os últimos foram Ecco e Nthaír.

— Espalhem aqui o que conseguiram. – Disse o capitão. – Queremos ver o que é.

Ao todo, seis itens foram postos ali: Rezz deixou um arpão de ferro e trínio; Arian trouxe uma pedra perfeitamente quadrada, entalhada com runas antigas; Casiraghe deixou um olho tão grande quanto uma laranja; Lophan exibiu uma adaga de bronze e aço; Ondaro levou um bracelete de aço, grande demais para o braço de qualquer um ali e, por último, Ecco colocou o saco com o pergaminho em meio às outras coisas.

— Antes de tudo, quero lhes explicar sobre os testes. – Disse o capitão. – Para cada dupla foi dado um teste único, mas com os seus padrões de semelhança. Alguém conhece a semelhança entre as torres?

— Os nomes são relacionados à pedras brilhantes. – Disse Zäja após alguns segundos de silêncio, quando ficou claro que ninguém mais falaria.

— Exato. – Confirmou o Capitão Gage. – As torres não receberam estes nomes por coincidência. Todas elas pertencem à Alvedrena, uma grande aliada dos Voadores, responsável por administrar os enylas. De alguma forma, as pedras servem como fonte de magia e poder.

— O que é um enyla, capitão? – Perguntou Ondaro, que já não parecia tão magricela, pálido ou fraco quanto à quando Ecco o conheceu.

— Enylas são aqueles que estudam os poderes sobrenaturais.

— Como um exorys? – Falou Arian.

— Quase. – Disse Gage. – Quase isso. Os exorys têm uma grande ligação com os enylas, os érujos e todos os outros membros das trinta e duas Ordens, mas são mestres de estudos gerais e das ciências do mundo, uma grande perda de tempo.

Graças aos exorys, a Assolação não significava mais o fim de tudo que as raças conheciam. Atualmente, mais de treze anos depois, Os exorys mudaram o mundo, mas talvez o capitão estivesse certo em dizer que eram perda de tempo.

— As Armadas de Sainlorth não são lugar para timoratos.

Isso não é nem um pouco interessante, pensava Ecco. Se eu fugir e me tornar um enyla, não terei que ser um voador. Para alívio próprio, alguém fez uma das perguntas que retinha para si.

— É possível pertencer amais de uma Ordem, capitão? – Perguntou Arian novamente.

— Sim. – Respondeu. – Mas só poderão fazer os testes de admissão de outras Ordens caso concluam os testes que já começaram.

O intendente Richard tomou a palavra.

— Vocês têm o direito de escolher a Ordem, mas precisam passar em todos os testes para ingressarem e exercerem funções.

— E quem não quiser ser membro de nenhuma ordem? – Perguntou Rezz, com suas feições severas, de quem compra briga e sai ganhando.

Estava de braços cruzados desde que se encostou ao mastro, estando mais longe de todos e dava para entender que o teste dele foi, digamos, cheio de problemas. O capitão o entendia, entretanto. A Torre do Edaestro era o pior de todos os testes.

— Se não ingressar em nenhuma, estará fora do Novo Mundo. – Vomthire temeu que ele perguntasse sobre a necessidade de se estar no Novo Mundo, pois não saberia respondê-lo. Felizmente, Rezz se limitou a bufar e revirar os olhos.

Ecco duvidou daquela afirmação, mas não tinha coragem para verificar a veracidade daquelas palavras. Decidiu que pensaria numa forma de escapar dali depois quando viu que o capitão se retirou para sua cabine.

— Quando vamos comer, capitão? – Perguntou Ondaro.

— Depois que os sinos tocarem. – Respondeu, fechando a porta.

A tripulação se dispersou em seus afazeres, mas os aprendizes continuaram por ali, contando suas histórias. Dwanthar também. Cada dupla pegou de volta seus pertences.

— Como foi sua missão, Ecco? – Perguntou Arknel. Mesmo sendo um jovem balute, sua barba já era maior que a do capitão.

Ecco contou tudo que aconteceu a Nthaír e ele, desde o momento que conversaram com Gor’lathos até a conversa com Derália antes de retornarem. A princípio estava tímido, mas logo se soltou. Todos ouviram a história com bastante atenção, sem interrupções. Quando terminou, os aprendizes estavam fascinados com o que ouviram e Zäja perguntou.

— Cadê o pergaminho?

Ecco tirou o pergaminho da bolsa e puxou a fita vermelha que o envolvia, guardando-a num bolso. Zäja foi o primeiro a perceber que haviam dois pergaminhos, um sobrepondo o outro de modo quase imperceptível. Ecco os separou, revelando um mapa parcial de uma terra estranha.

— Turale. – Zäja leu. – Mrasth, Rohgow, Gal’hari e Parália.

Tinham diante dos próprios olhos um mapa muito raro. Provavelmente, era o maior mapa em relação a Turale, contendo quatro grandes reinos. Só existiam (ou existiram) dois ou três mapas maiores, dados como destruídos ou perdidos desde a Assolação. Mesmo assim, nenhum deles mapeava todo o continente.

— É um mapa bem raro. – Disse Zäja, animado. – Não existem mais cartógrafos ou vagamundos.

— Por isso os érujos crescem tanto? – Perguntou Arian.

— Sim, sim, sim. – Disse Dwanthar. – A Armada tem sido muito importante para os grandes senhores e suas viagens. Como você sabe que os érujos tem crescido?

— Eu não sou da Ilha do Caçador. – Explicou. – Nasci em Gal’hari. Eu tive nove irmãos, todos mais velhos, que foram convocados.

— Seus pais procriam como coelhos. – Disse Etro, fazendo com que todos rissem.

Cuidado, rapaz, pensou Ecco, olhando para Lophan. Foi dessa forma que eu perdi um bom amigo.

Ecco chegou a se perguntar o que tinha acontecido com Garold naquele dia. Ele não costumava dizer aquele tipo de coisa ou brincar com coisas tão sérias. Aquela era uma dúvida que não sairia da cabeça dele tão cedo.

Para pensar noutra coisa, Ecco esticou o outro pergaminho sobre o mapa, mostrando as mesmas engenhocas que vira quando pegou o pergaminho pela primeira vez.

— O que são esses traços? – Perguntou Nthaír.

— Não sei bem. – Respondeu. – Isso me parece algo que voa.

— Minha vez. – Disse Arian.

— Qual foi a torre? – Alguém perguntou.

— A Torre do Esmeráldico.

Arian começou a contar a história, mas não demorou para que Etro o interrompesse, acrescentando algum detalhe inútil ou uma correção que provavelmente era mentira, já que logo discutiam. Os aprendizes desenvolviam uma amizade entre si, Ecco percebia enquanto enrolava os pergaminhos na fita vermelha por causa das risadas que ouvia.

Ecco, entretanto, não estava interessado naquilo. A fita que tinha carregava inscrições deformadas, mas que, com um pequeno esforço, eram capazes de serem lidas. Conseguiu ler o seguinte: “Em Go’ov...anfiteatro... Desconhecido de Mrasth”.

Bendita a mão que escreveu esses garranchos, pensou. Ecco passou muito tempo observando a fita, negligenciando a devida atenção às histórias. Durante todo esse tempo, conseguiu compreender as palavras icanes e outro. Parou de ler apenas para admirar os espólios.

O cubo de pedra não fazia absolutamente nada, sendo a maior decepção da noite. Já o olho de um ciclope, segundo Zäja, era, pelo menos, um grande troféu de batalha.

O arpão de ferro e trínio se mostrou muito grosso para encaixar em qualquer um dos quatro besteiros posicionados na proa e na popa, e acabou não servido de nada.

A adaga tinha as lâminas bem afiadas, e seria considerada como o item mais interessante que tinham ali, não fosse o bracelete que Arknel e Ondaro trouxeram. Havia nele dois círculos que, quando pressionados simultaneamente, preenchiam o interior do item, como se fosse um portal. Por via das dúvidas, decidiram não mexer com isso.

Os sinos ecoaram.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "O Voador" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.