Mais que o Tempo escrita por Le petit prince egoiste


Capítulo 10
Dez


Notas iniciais do capítulo

Só quero sentir outra vez
Seu corpo bem perto de mim
Mas quero esquecer o silêncio
Do meu peito
Quero lembrar de você
Como na primeira vez



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Pietro acabou dormindo na casa de Délia, pois voltara do karaokê bêbado demais. À hora que acordou, deviam ser seis da manhã. A casa estava silenciosa. Num rompante, tomado pela lembrança dos bons momentos com Júlio, ele decidiu abrir a porta do meio novamente para, quem sabe, encontrar com Luccino. Preocupava-lhe o futuro do relacionamento dos dois. Seriam as casas conjugadas uma alternativa ao amor proibido? Será que ficaram bem? Pé ante pé, Pietro encontrou a porta. Sem pensar muito, viu que a chave estava lá e abriu-a...

x-x-x

“Que bom que veio, major Otávio”

Pietro tentou se localizar. Ok, de novo no quartel. Ao entrar, deparou-se com um homem sisudo com um sinal perto da boca. Parecia ser o tal coronel Flávio que havia ficado no lugar de Brandão.

“Aqui estou, senhor” Otávio bateu continência.

Flávio observou-o longamente. Não era uma inspeção agradável.

“Sabe por que está aqui, major?”

“Não, senhor.”

Flávio se encostou um pouco mais na mesa.

Eu... Andei recebendo umas denúncias. Contra o senhor. Quero saber até que ponto são verdade. Elas me diziam que o senhor tem um... Relacionamento secreto com outro homem.”

Otávio engoliu em seco, sentindo o peito queimar. O velho não tinha blefado.

“Eu...”

“O que tem a dizer sobre isso?”

“Eu... Eu não nego, senhor” Seu coração martelava entre a coragem e o pânico. Flávio não parava de encará-lo.

“E você me diz isso sem nem um gaguejo?”

“Na minha opinião, senhor, não estou fazendo nada de errado.”

Flávio deu um soco inesperado na mesa.

“Você! Está causando um atentado contra a honra deste quartel! Inadmissível! Coronel Brandão poderia permitir uma coisa dessas, mas eu! Não sou fraco como ele! Sou, major?”

“Mais forte não é, senhor” Retrucou Otávio.

“Atrevimento! Disparate! Não vai me dizer quem é?”

“Jamais.”

“Certo. Proteja o seu... Concubino. Apesar de tudo, o senhor é um bom soldado. Por isso, escute o meu conselho. Chamei sua namorada para vir até aqui. Lídia Benedito, não é? É uma boa moça. Uma depravada, é claro, mas nada que o marido não possa mudar. Case-se com ela. Em nome da honra. Eu poderia mandar você embora? Poderia. Mas não vou fazer isso. Você ainda tem uma chance. Case-se com ela e faça o favor de limpar seu nome e o nome deste quartel. Do contrário, fora daqui.”

“Neste caso, passo amanhã para buscar minhas coisas.”

Flávio empalideceu, surpreso com a ousadia.

“Não, não, não vou assinar nada. Vá para casa com sua namorada e pense melhor. Até mais ver, major. Ah! Veja quem chegou!”

Lídia adentrou no recinto fazendo barulho demais.

“Tatázinho! Vim te buscar para um passeio!”

Pietro vislumbrou Lídia. Era Bruna em versão atrevida e saltitante.

 “Lídia. Vamos, vamos.”

“Credo, Tatázinho! Não precisa falar assim comigo. Se eu fico triste, o bebê também fica triste...”

Pietro franziu o cenho, assustado com a informação. Ainda existia um bebê! Um filho! Ele estava frustrado e com raiva.

“Lídia, hoje não, Lídia, hoje não!”

“Mas Tatázinho!”

“Hoje não!”

Otávio saiu correndo do quartel. O mais rápido que pôde, foi direto para a oficina de Luccino. Quando este o viu, mostrou seu melhor sorriso, mas apagou-o assim que percebeu a aflição do major.

“Otávio... O que houve?”

 Otávio caiu em seu colo, chorando. Parte das lágrimas era dele, a outra parte era de Pietro. A roupa de Luccino se encontrava molhada. Otávio passou os braços pelas costas do amado, encontrando aos poucos o seu conforto, apertando-o forte para não perdê-lo, sentindo o cheiro da sua nuca que tanto o acalmava.

“O que houve, amore mio?”

“Está doendo muito, Luccino! Eles nos odeiam, nos odeiam!”

x-x-x

Pietro voltou ao presente com o rosto molhado de choro e as roupas de Otávio.

Tantas informações! Um filho! A quase expulsão! A verdade espalhada pela cidade! E não podia contar com Brandão e Mariana, que estavam longe. E aquele Flávio! O sinal perto da boca lembrava o de Vinícius, filho de Vitor e Délia, o que fazia sentido, se Vitor fosse Brandão na vida passada. Brandão e o novo coronel não pareciam se dar bem. Tampouco Flávio e Otávio. Seria ele o responsável por sua desgraça? Será que Luccino e Otávio foram obrigados a se separar?

Pietro continuava a chorar. Assustou-se quando viu Júlio chegando.

“Pietro? Está chorando?”

Ele tentou apagar a tristeza do rosto. Impossível.

“Está doendo muito, Luccino...” Pietro falou com a voz embagada.

“Luccino?”

“Quer dizer... Eu...”

“E essas roupas, Pê?”

Pietro observou a si mesmo com o uniforme do exército.

“Me deixa, Júlio!”

“Não, não. Vem cá.” Júlio chegou perto, pegou em sua mão e o levou para o sofá. Não a soltou. Mesmo quando o olhava com o rosto preocupado. Mesmo quando repetiu a pergunta do que havia acontecido. Mesmo quando Pietro chorava sem responder. Ele não a soltou.

“Está tudo bem, Júlio.”

“Não está, não. Mas se não quiser me falar, eu entendo. Anda, vem aqui.”

Júlio o trouxe para perto dos ombros, afagando seus cabelos com cuidado.

Ficaram nessa posição por algum tempo. Era perto das sete da manhã. Aos poucos, Júlio sentiu Pietro se desprendendo dele, os ombros devagar parando de tremer, o rosto vermelho secando.

“Bom dia.”

Afastaram-se. Ricardo entrou.

“O que faz aqui tão cedo, Júlio? Pietro, você com essas roupas...”

“É, exatamente. Ele queria me mostrar... Um monólogo que escreveu, querido.”

“Certo, um monólogo” Sussurrou o marido, desconfiado. “Vou lembrar de perguntar ao seu pai se você é ator. Pê. Estou indo buscar o carro.” Ricardo saiu para buscar Bel, que iria com ele. Pietro esfregou os olhos, soltando as mãos de Júlio.

“Não faça isso” Júlio pegou-as de volta. Pietro percebeu quando o polegar dele acariciou seu dorso.

Pietro soltou o ar, voltando os olhos para o escritor.

“Obrigado.” E saiu de volta para seu quarto.

x-x-x

Ao chegar à oficina, Ricardo encontrou Giovani. Para sua completa surpresa, este, quando o viu, levou um susto tão grande que machucou a mão com o martelo. O irmão de Pietro praguejou alto.

“Desculpe! Droga!” Giovani sentia algo emanando de Ricardo para ele. Uma energia pesada e indecifrável. Sua mera presença o deixava desconfortável. “Veio buscar o carro?”

“Sim”

“O senhor está bem?” Bel perguntou.

Giovani sorriu em meio à dor.

“Estou sim, querida. Estou sim.”

“Está sangrando”.

“Foi um estrago dos grandes. Acho que o Pietro vai ter que ficar com o papai aqui até sarar. Que droga!”

“Eu tenho um remédio aqui na minha bolsa. Nunca se sabe quando a Mariazinha ou o Capitão Todo vão precisar sarar. Salvar o mundo dá um monte de ferida.”

“Ah, então eu devo agradecer aos dois. Ah, ótimo, querida”.

Enquanto Ricardo verificava o carro, Bel enrolou o esparadrapo da bolsa nos dedos de Giovani. Ele terminou o serviço, ajustando as voltas que ficaram tortas. Ricardo chamou a filha para ir embora.

“Posso ficar, papai? Ainda não está pronto!”

Ricardo olhou de Giovani para a filha. Talvez precisasse de um tempo sozinho.

“Ok. Leve-a de volta quando terminarem.”

Assim que saiu, Bel falou baixo ao pé do ouvido de Giovanni:

“Não se preocupe com ele. Só é um pouco mau humorado. E quando está de mau humor, faz tudo errado. Papai Júlio disse que ele estava num péssimo dia quando escolheu o bolo para prefeito do Brasil...”

“Bolo? Prefeito do Brasil?”

“É! Ele escolheu o bolo. Eu prefiro pudim.”


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