O VERÃO havia começado e com isso, as longas férias que os alunos da U.A tanto aguardavam com fervor. A maioria dos alunos estava aproveitando o tempo livre em viagens com sua família, ou então treinavam intensamente na chance de melhorar suas peculiaridades para o próximo ano letivo. Mas não Ochako Uraraka. A garota estava trabalhando meio período como funcionária de um pequeno café que abriu na cidade, na tentativa de conseguir dinheiro e ajudar seus pais que não aceitaram que ela ajudasse no trabalho deles.

Mesmo não sendo aceita, ela tinha que dar um jeito de ajudar seus pais. Aquele era seu foco no verão. Infelizmente teve de rejeitar saídas para a piscina com Ashido e Momo e aquilo lhe deixava um pouco aborrecida, mas era por uma boa causa. Até porque ela estranhamente já havia se acostumado com o ambiente do café, que era calmo e tinha o melhor chocolate quente do mundo.

Apoiou os cotovelos na bancada de atendimento enquanto fitava o café vazio. Junto do verão, a temporada de chuvas começou e aquilo parecia afastar a clientela do local, que era localizado em um bairro não muito famoso, mas que era próximo da praia. As gotas de chuva batiam no vidro com rapidez e Uraraka observava aquilo tudo com um rosto sonolento. Seus cabelos castanhos curtos caiam sobre seu rosto deixando-a com uma aparência não muito focada no trabalho, e ela tinha muita sorte de sua chefe não estar ali, porque certamente lhe daria uma repreensão das grandes.

O aroma do chocolate quente que estava dentro de uma das enormes garrafas térmicas, pronto para ser servido, fazia com que Uraraka se sentisse confortável. Talvez até demais, porque já estava com seus olhos cerrados enquanto se apoiava no balcão e sequer sentia a respiração irritada da pessoa que estava em sua frente.

— E aí, cara redonda? Não vai me atender? Porra. – A voz grosseira e nada delicada de seu colega preencheu seus ouvidos e fez com que a pequena garota levantasse sua cabeça em um susto, batendo as delicadas mãos no avental marrom.

— B-bakugou-kun, desculpe, não vi você aí. – A voz de Uraraka saiu sonolenta, e isso fez com que o garoto revirasse os olhos avermelhados e lhe fitasse de forma agressiva.

— Jura? Achei que tinha visto, cara redonda. Era óbvio que você estava dormindo. É desse jeito que você trabalha? – Bakugou continuou com seus comentários nada gentis e desnecessários, mas Ochako sentia uma pontada de razão nele. Estava errada em dormir no trabalho.

Ela abriu um sorriso amarelo tentando ignorar as críticas do loiro que estava na frente do balcão de braços cruzados e respirou fundo, fitando as orbes vermelhas. — Como posso te ajudar? Já decidiu o que vai pedir? – Ela abriu um sorriso um pouco envergonhado e suas bochechas se tornaram rosas ao dizer a frase normal de atendimento. Ela já estava acostumada com aquilo, mas atender um colega de classe dava uma sensação estranha.

O loiro arqueou as sobrancelhas enquanto apertava sua camiseta preta, irritado como sempre. Seu olhar passou entre as tortas e pastéis salgados que estavam em exposição no balcão de vidro. — Não decidi ainda. – Respondeu, com o tom alto de sua voz.

Uraraka franziu o cenho e lhe fitou com uma expressão desacreditada. Passou as mãos em seus cabelos castanhos tentando se distrair enquanto o loiro olhava incessantemente para a parte de salgados. Bufou. Aquele cara ia demorar horas no ritmo e indecisão que estava. Abriu seu sorriso amarelo mais uma vez. — A r-recomendação de hoje é o cupcake de chocolate. – Sua voz saiu suave, e falhou no momento em que o rapaz cravou o olhar feroz nela.

— Eu pedi por alguma recomendação? Cupcake de chocolate, é? Eu tenho cara de quem gosta de comer esses doces ruins, cara redonda? – Bakugou fitava o cupcake que tinha cobertura de chantilly e marshmallows coloridos.

Uraraka cruzou os braços, impaciente assim como ele já estava, e quando Bakugou finalmente decidiu seu pedido quase cantou aleluia na sua frente. Porém, fazer aquilo certamente resultaria em sua morte. Sorriu com desdém ao ouvir o que ele queria.

— Eu vou querer essa porra de cupcake, então. Se for ruim eu não volto aqui nunca mais. – Bakugou bufou, desconfiado de sua própria escolha e Uraraka quase soltou um “seria ótimo se você não voltasse”, mas se controlou. Afinal, ele ainda era um cliente. E tinha dinheiro. O que significava que sua comissão no final do mês aumentaria.

— Vai querer algo para beber, senhor? – Uraraka colocou luvas para pegar o cupcake e coloca-lo em um pequeno prato azul claro.

— Senhor? Eu tenho cara de velho, por acaso? Bom, pelo menos meu rosto não é redondo. – Bakugou abriu um sorriso debochado e Uraraka corou.

— É as regras de atendimento daqui. Mas você não precisa ser tão mau educado, Bakugou-kun. – Ela disse seu nome com um tom de voz debochado, também. Pela primeira vez, sentia se corajosa o suficiente para enfrenta-lo, embora estivesse atrás de um balcão. Não se submeteria aos deboches de seu colega.

— Uma xícara de café é o suficiente. Sem açúcar. – O loiro colocou as mãos no bolso e deu as costas para Uraraka, que finalmente parou de segurar sua respiração, intimidada pela presença de seu colega explosivo. Nem mesmo um ambiente calmo como aquele parecia afetar a aura de Bakugou. Arrumou o cupcake de chocolate com cuidado e traçou um desenho de um gatinho no prato com calda de chocolate, que era mais um dos traços da cafeteria onde trabalhava e admirou sua própria obra de arte. Ele estava com uma orelha que parecia deslocada, e se analisasse bem, seu desenho parecia um pouco indecifrável, mas estava fofo. Serviu a xícara de café rapidamente para que não houvesse reclamações e colocou na bandeja para entregar na mesa do rapaz.

Andou até a mesa que ele havia escolhido, uma bem próxima da janela, provavelmente para admirar a chuva, e depositou o pratinho com cupcake e a xícara de café. Virou as costas para Bakugou e três segundos depois o loiro ria alto.

— Que porra é essa, Uraraka?! – Ele tinha um sorriso que mostrava todos os seus dentes e seus olhos vermelhos fitavam a garota que corou no momento em que notou ao que ele se referia. Bakugou apontava para seu desenho de gato.

Ochako bufou e andou até ele, indignada. — É um gato, ué.

— Onde caralhos isso se parece com um gato? Você matou o animal, parabéns. – Katsuki continuava rindo com gosto do desenho feio da menina, e aquilo fez com que Uraraka ficasse muito irritada. Por algum motivo estranho, quando ele fitou o rosto vermelho de vergonha e raiva dela, aquilo lhe pareceu estranhamente agradável. A garota de cara redonda ficava adorável quando estava irritada.

Ele piscou com força ao notar seus próprios pensamentos e calou seu riso, fazendo com que a colega voltasse ao balcão de atendimento com passos duros e altos no chão. Passou a colher que estava na xícara de café no gato feito de calda de chocolate, destruindo-o. Gostaria de ter feito o mesmo com o pensamento repentino que invadiu sua cabeça, mas não era possível. Ignorou aquilo e focou sua atenção em estraçalhar os marshmallows coloridos com os dentes.

Uraraka observava aquela cena com atenção, onde podia ver claramente que Bakugou descontava toda a sua raiva no pequeno produto fofo e alimentício que fazia parte da cobertura do bolinho. Nada educado. Mesmo.

A chuva estava mais leve lá fora, e o ambiente estava silencioso novamente. Sentia-se aborrecida pelas atitudes do rapaz e esperava nunca mais vê-lo por ali novamente, mas ao mesmo tempo, quando Bakugou não estava falando — ou comendo, ele parecia ser uma pessoa decente.

Seus pensamentos foram interrompidos quando seu celular vibrou no bolso de seu avental, e ela sorriu ao ler o nome que estava em suas notificações. “Deku-kun“. Abriu a conversa e o garoto de cabelos verdes havia lhe enviado uma foto de suas férias, onde era possível ver All Might sorrindo no fundo enquanto Midoriya segurava um sorvete. Ochako se sentiu feliz ao fitar a expressão alegre do garoto que ela gostava. Porém, logo sua alegria foi por água a baixo quando a voz de Bakugou preencheu o ambiente, mais uma vez.

— Eu não sabia que as atendentes podiam ficar de namorinho no celular enquanto trabalham. – O loiro estava irritado mais uma vez. — Quero pagar, cara redonda.

Ochako assentiu com a cabeça e enquanto abria o caixa, pensou em começar uma conversa com Bakugou. Coisa que nunca conseguia fazer. E que o garoto sequer dava espaço para aquilo, também. — Por que não foi viajar, Bakugou-kun?

— Não quis. – Ele respondeu rapidamente e tirou algumas moedas de sua carteira que até então estava no bolso de sua calça. — Pode ficar com o troco, cara redonda. Depois daquele desenho, você merece. – Ele sorriu debochado e Uraraka revirou os olhos, pegando o dinheiro.

— Obrigada e volte sempre! – Ela repetiu roboticamente a frase que falava sempre que um cliente pagava, e Bakugou passou a mão em seus cabelos despenteados, distraído com algo.

— Se eu voltar, verei mais desenhos seus? – Ele riu, continuando com seu deboche e Uraraka resolvou entrar na brincadeira.

— Com certeza! Posso até fazer você, se me pedir. – Ela mostrou a língua para o rapaz, que se mostrou levemente surpreso por ter seu deboche retribuído, já que não esperava aquela atitude daquela garota. — Pode ser até com chocolate amargo. Exatamente como você! – Uraraka sorriu, delicada, porém atacando o rapaz diretamente.

— Eu te vejo amanhã então, cara redonda. – Ele fez um leve aceno com as mãos enquanto sorria cinicamente e abria o guarda-chuva preto na porta da cafeteria. Sem falar mais nada, saiu andando pela calçada com um semblante de tédio e Uraraka lhe seguiu com suas orbes marrons até onde pôde.

Ela disse que era para ele voltar sempre por causa de seu trabalho; mas ela realmente não queria ser zombada por seus desenhos novamente. Estava ferrada, caso Bakugou realmente estivesse falando sério.

Ferrada.