Les Crimes de Grindelwald escrita por themuggleriddle


Capítulo 7
Hogwarts


Notas iniciais do capítulo

Feliz Natal para quem comemora (:



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A chave-de-portal não parecia nada mais que um regador de latão com o brasão de Hogwarts em alto relevo em um dos lados. Jacob observava o objeto com desconfiança, de certo tentando entender a razão de eles estarem parados ao lado dele enquanto Newt olhava atentamente para o relógio de bolso, contando os minutos.

 

“Quando chegar a hora, não solte a minha mão,” o bruxo falou, esticando a mão para o outro homem, que o olhou com as sobrancelhas erguidas. “Vamos visitar um amigo, ele vai nos ajudar a chegar em Paris.”

 

Por sorte, Kowalski sabia onde Tina estava e para onde Queenie iria. Por mais sorte ainda, eles encontraram, marcando uma página da Spellbound que a bruxa esquecera na casa de Newt, um cartão postal que podia indicar um local ainda mais específico na capital francesa, onde podiam encontrar a auror. Quase que a contragosto, sentindo-se frustrado de saber que Dumbledore sabia que ele iria precisar dele muito cedo, Scamander entrou em contato com o antigo professor.

 

Dumbledore não tardou mais que um dia para lhes enviar uma coruja exausta carregando o regador, preso à um bilhete com um horário e a instrução de levar Jacob junto. Aparentemente, os professores de Hogwarts tinham poder o suficiente para subverter os encantamentos que protegiam o castelo de trouxas.

 

“Você não tem problema de enjoo, tem?”

 

“Eu não me sinto muito bem em barcos,” Kowalski murmurou.

 

“Vamos lá. Três.” Newt sentiu alcançou a mão de Jacob, que ainda estava hesitante, e a segurou com força. O regador começou a tremer. “Dois.” O trouxa o olhava com os olhos arregalados, sem saber exatamente o que esperar. “Um.”

 

O objeto sacudiu ainda mais e algo os puxou, fazendo o chão sumir sob os seus pés. Distante, como que sugado pelo feitiço que os puxava ao longo do espaço, era possível ouvir o grito de Jacob, mas a mão dele, pelo menos, continuava firme na de Newt. A viagem não durou mais que alguns segundos, mas o trouxa parecia ter atravessado o Atlântico em um barco agitado quando finalmente chegaram.

 

“Oh.” Kowalski grunhiu, apoiando a mão na barriga e parecendo pálido.

 

“Vamos.”

 

Scamander se pôs a andar, tentando não se deixar levar pelo frio em seu estômago ao começar a reconhecer a paisagem. Atrás de si, o trouxa vinha quase cambaleante, olhando em volta para tentar se localizar no meio do caminho aberto entre árvores altas e escuras. Quando eles viraram na última curva, o próprio Newt teve que parar e respirar fundo, sentindo o coração acelerar.

 

A imagem dos terrenos de Hogwarts sempre lhe tirara o ar e, depois de tanto tempo longe, junto da beleza, vinham também as memórias. Ele se lembrava do lugar exato onde ele e Leta se sentavam ao lado do lago, encarapitados em cima de uma pedra, para estudar e conversar; lembrava também de onde podia encontrar grindilows e girinos nas águas rasas e em qual curva do castelo eles se escondiam para fugir do Professor Prendegast.

 

“Que lugar é esse?” Ele ouviu a voz de Jacob, baixa e surpresa.

 

“Hogwarts.” Newt sorriu, inspirando o cheiro de petricor e virando para olhar o trouxa, que olhava tudo com olhos arregalados e boquiaberto.

 

“A escola de mágica?!”

 

“Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts,” Scamander falou, gesticulando para o outro o seguir.

 

“Você estudou aqui?”

 

“Sim, apesar de não ter terminado o último ano.”

 

“Ah.” O trouxa hesitou um pouco. “Posso perguntar o que aconteceu?”

 

“Um acidente,” o bruxo explicou, desviando o olhar para dois garotos que saíram correndo do castelo, rindo. “Eu e uma amiga estávamos tentando cuidar de um hipogrifo que encontramos na floresta. Outro aluno o encontrou e... Bom, ele não estava acostumado com gente estranha.”

 

“Oh, Newt.”

 

“Ele ficou bem.” Newt encolheu os ombros.

 

“O aluno?”

 

“Ahm, os dois. O aluno e o hipogrifo.”

 

Scamander desacelerou o passo para que o trouxa pudesse observar os terrenos com mais calma. Não era todo dia que alguém como Jacob podia ver Hogwarts como ela realmente era. Na verdade, Kowalski era uma grande exceção e Newt se perguntava quantos trouxas ao longo da história tiveram a oportunidade de olhar o castelo e caminhar pelos seus terrenos.

 

“Como funciona?” o homem perguntou. “O ensino. A única coisa que sei de colégios internos é que eles são caros e os alunos vivem de nariz empinado.” Jacob olhou o magizoologista dos pés a cabeça e riu. “Bom, você não vive de nariz empinado...”

 

“Entramos com onze anos e ficamos aqui por sete anos. No quinto e no sétimo ano temos provas que vão nos ajudar a conseguir um emprego no futuro,” o bruxo explicou. “As matérias em Hogwarts são coisas básicas de magia: Feitiços, Transfiguração, Poções, Defesas, Herbologia, Astronomia. Tem também as matérias optativas, como Divinação ou Runas Antigas, mas ainda assim é apenas uma pincelada na superfície dessas áreas. Quem quer realmente se especializar em algo acaba procurando por universidades ou tutores depois que termina o colégio.”

 

“Existem universidades bruxas também?” Kowalski perguntou.

 

“Claro. Oxford está cheia delas.”

 

“Você foi para uma universidade bruxa? Pra estudar animais?”

 

“Ahm, não.” Newt deu um sorriso sem graça e levou a mão até o bolso do casaco, sentindo o relevo sutil do corpinho de Pickett ali dentro. “Não existe muita gente que estude animais mágicos do jeito que eu decidi estudar. A maioria estudava formas de caçá-los ou usar partes deles para fazer magias e poções. Estudei sozinho, indo atrás deles e... aprendendo com eles.”

"E como funcionam os trabalhos? Quero dizer, pelo que Queenie diz, na América os bruxos são bem fechados," o trouxa continuou. "Tem trabalho pra todo mundo? Vocês trabalham com coisas não mágicas também?"

"Bom, boa parte dos bruxos trabalha no Ministério," disse Newt, torcendo o nariz. "É um lugar que oferece estabilidade e tem tantos departamentos que você consegue encontrar o seu cantinho. Claro, existem outras profissões... curandeiros, professores, pesquisadores, artistas, atletas... Alguns se arriscam mais que os outros e se embrenham na comunidade trouxa."

"Mas a maioria é do governo?"

"Bom, sim, acho que toda família tem alguém no Ministério..." O magizoologista coçou o queixo, parando por um momento para observar o castelo. "Alguns tem mais sucesso do que outros lá dentro."

 

"Estou errado em assumir que seu irmão tem mais jeito com esse tal Ministério do que você?" perguntou Kowalski, arqueando uma sobrancelha e fazendo o bruxo rir.

"Bruxos são como trouxas, Jacob," ele falou, retomando a caminhada. "Toda família precisa de uma ovelha negra."

 

***

 

Era possível ouvir as risadas e conversas dentro da sala. As aulas do Professor Dumbledore sempre foram uma das melhores em Hogwarts, já que o homem conseguia sempre incorporar a prática até nas tarefas mais chatas de Defesas Contra as Artes das Trevas. A julgar pelo sorriso no rosto dos alunos e as conversas animadas quando estes saíram da sala de aula, o bruxo continuava um professor tão bom quanto costumava ser.

 

“Aula do que ele dá mesmo?” perguntou Jacob, em um sussurro, enquanto se grudava ao lado de Newt para não ser levado pelo fluxo de alunos, que os olhavam com curiosidade.

 

“Defesas Contra as Artes das Trevas,” o bruxo respondeu, abaixando  o olhar quando notou uma aluna da Corvinal o encarando por mais tempo do que os outros.

 

“Defesas Contra as Artes...?” Kowalski sussurrou. “O que vocês esperam que essas crianças façam depois que saírem da escola?”

 

“A varinha é um instrumento do dia-a-dia, mas também é uma arma,” disse Newt. “Nós demoramos para entender isso, mas as aulas de Defesas ajudam muito uma vez que a ficha cai.”

 

Quando os estudantes acabaram de sair, os dois entraram na sala. As mesas estavam afastadas do centro e havia um sofá no fundo, em frente a janela que dava para os terrenos do castelo. Dumbledore estava de costas para eles, rabiscando algo em um pedaço de pergaminho em sua mesa.

 

“Dumbledore?”

 

“Ah, Newt.” O homem se virou com um sorriso, erguendo a mão para tirar os óculos em meia-lua que já estavam quase caindo da ponta do seu nariz. Ele riu, sacudindo o objeto. “A idade chega para todo mundo.” Albus guardou os óculos no bolso do colete dourado que estava usando e passou a observar Jacob. “Este é o seu amigo americano?”

 

“Jacob Kowalski,” o magizoologista falou. “Esse é Albus Dumbledore. Ele foi meu professor de Defesas quando estudei aqui.”

 

“É um prazer, Sr. Dumbledore.” O trouxa esticou uma mão, a qual Dumbledore apertou com entusiasmo. “Eu estava falando para o Newt, senhor, que é meio estranho ensinarem... crianças a se defenderem de magia negra.” O trouxa indicou a porta com o polegar. “Apesar de que elas parecerem ter se divertido.”

 

“O prazer é meu, Sr. Kowalski.” O professor sorriu. “Apesar do nome, nem tudo o que ensinamos aqui é sobre magia negra. A magia ‘das trevas’ e ‘da luz’ se intercalam muito e você nunca sabe quando vai encontrar um barrete-vermelho no meio de uma viagem, não é, Newt?” Dumbledore riu e indicou a escada atrás de sua mesa. “Que tal subirmos até o meu escritório para conversarmos melhor?”

 

Newt já havia entrado no escritório do professor quando ainda era aluno. A primeira vez, foi quando era um primeiroanista e atacou um colega depois deste ter feito uma piada infeliz sobre o gato perdido do qual ele tomava conta nos intervalos das aulas. Bom, “atacou” talvez fosse uma palavra muito forte, pois tudo o que Newt fez foi atingir o colega com um Tarantallegra que o deixou sapateando no meio da sala de aula. A última vez, foi logo depois de ser expulso, enquanto esperava os pais e tentava ao máximo não chorar.

 

O lugar não havia mudado muito. A grande mesa de madeira continuava em frente a janela que tinha uma bela vista do lago e as paredes estavam cheias de livros e badulaques brilhantes, muitos dos quais Scamander não tinha ideia para que serviam. Dumbledore os chamou para se sentarem e Jacob olhava tudo com olhos arregalados, como se estivesse vendo algo muito surpreendente. Bom, Newt não podia julga-lo, ele estava, sim, vendo algo surpreendente.

 

“Pelo que entendi da sua carta, você está disposto a aceitar a minha proposta,” o professor falou, sorrindo ao se sentar em sua cadeira. Contra a luz, os cabelos do homem pareciam mais vermelhos do que realmente eram.

 

“Precisamos ir para Paris atrás de Queenie, a... bom, ela e Jacob estão juntos,” Scamander explicou, enfiando a mão no bolso do colete e tirando dali o cartão postal esquecido por Goldstein. “Ela disse que iria para lá encontrar Tina, digo, a irmã dela, Porpentina Goldstein. Ela é uma auror do MACUSA.”

 

“Que está em Paris atrás de Credence,” o homem falou, apoiando os cotovelos na mesa e encostando as pontas dos dedos umas nas outras. O professor observou o cartão sobre a mesa por alguns segundos, antes de esticar uma mão para alcançá-lo e observar a foto das escadarias ali.

 

“É, ela está lá fazendo isso.”

 

Dumbledore suspirou, olhando para o lado e encontrando uma bacia metálica que flutuava sobre o lado da mesa. Jacob tinha os olhos grudados na água que enchia o objeto, de certo vendo alguma memória que ali flutuava. Newt esticou o pescoço para olhar a superfície ali dentro e franziu o cenho ao ver a silhueta de dois jovens, as mãos erguidas, segurando uma a outra. Antes que pudesse ver mais detalhes da lembrança, o professor esticou a mão e tocou a superfície do líquido com a ponta da varinha, fazendo a imagem tremer e sumir, pouco depois de Scamander conseguir distinguir algumas características dos rapazes da penseira: cabelos ruivos e cabelos loiros, mãos pálidas com o que parecia ser um filete de sangue escorrendo pelo pulso e dedos se entrelaçando de um jeito parecido com o que ele e Leta haviam feito na casa de Theseus.

 

“E vocês querem ir atrás dela,” o professor murmurou, empurrando a penseira para longe.

 

“Iríamos atrás de Credence também,” Newt falou, olhando os outros objetos sobre a mesa do professor: livros e pergaminhos, cronogramas de aulas e rabiscos de pesquisas.

 

“E por que esta moça, Queenie Goldstein, foi para Paris do nada?”

 

“Houve uma discussão,” o magizoologista respondeu. Jacob, ao seu lado, se remexeu na cadeira. “Queenie... Ela talvez tenha se interessado por algumas propostas de Grindelwald.”

 

Dumbledore suspirou, parecendo cansado.

 

“Eu não me surpreenderia com isso.”

 

“Queenie não vai se juntar a ele,” disse Kowalski, finalmente olhando o professor. “Ela é uma  boa pessoa.”

 

“Nem todos que se deixam levar pelo discurso de Grindelwald são pessoas ruins, Sr. Kowalski. Ele consegue ser bem persuasivo... Sedutor, até,” o homem explicou. “Ele sabe encontrar e brincar com ponto fraco das pessoas. É cruel e horrível como ele faz isso e como conseguiu ensinar alguns de seus apoiadores.”

 

“Queenie queria se casar,” o padeiro murmurou.

 

“Ela falou dos trouxas que pensavam coisas ruins sobre você,” disse Newt, olhando para Jacob rapidamente. O homem pareceu confuso. “Por conta da sua religião.”

 

“Oh Deus, eu falei milhares de vezes que aquilo não era nada.” Kowalski sacudiu a cabeça, escondendo o rosto na mão. "Devem ter falado isso uma ou duas vezes, o resto foram só coisas que ela ouviu!"

 

Dumbledore observou o trouxa por um momento, as sobrancelhas franzidas e os olhos azuis brilhando. Newt se perguntou se o homem estava tentando, de alguma forma, entrar na mente do trouxa. O professor era um exímio legilimente. Não era natural, como Queenie, mas alguém que, com muito treino, havia conseguido a habilidade de entrar na mente dos outros com facilidade, sem ser notado. O magizoologista já havia sido alvo da legilimência do bruxo, quando fora expulso do colégio, e agora realmente esperava que ele não estivesse usando aquele poder para ler a mente de Jacob, alguém que nem podia tentar se defender de tal magia.

 

“Nós vamos atrás delas,” disse Newt, tentando interromper qualquer possiblidade do professor estar vasculhando os pensamentos do amigo. “E vamos atrás de Credence, também. Afinal, Tina está atrás dele.”

 

“Muito bem.” Albus pigarreou. “Há um homem que cuida de uma... passagem para o continente. Não é algo supervisionado pelo Ministério.” O bruxo encarou Newt por um segundo, deixando claro que se tratava de algo ilegal. “Enviarei uma mensagem para ele dizendo que vocês irão aparecer lá amanhã de manhã. Ele fica em Dover.”

 

“Quanto?”

 

“Última vez que chequei, ele cobrava trinta galeões para a França,” o professor falou, sorrindo de lado. “Seu irmão não ficara sabendo. Ele é um homem discreto, esse meu conhecido.”

 

Scamander suspirou e assentiu.

 

O barulho de passos ecoou pelo escritório, vindo da sala de aula lá embaixo, seguido de vozes. Não eram vozes juvenis, de alunos da próxima turma que esperava por uma aula, mas sim vozes de homens e mulheres adultos e eles não pareciam felizes. Scamander encontrou os olhos do professor, que parecia sereno, e depois se virou para Jacob, que o olhava confuso.

 

“Dumbledore?” uma voz chamou do pé das escadas e Newt sentiu um arrepio atravessar o próprio corpo.

 

“O que Theseus está fazendo aqui?” o magizoologista perguntou em um sussurro apressado.

 

“Esta é uma ótima pergunta, Newt,” disse Dumbledore, se levantando e atravessando a sala. “Esperem aqui. Não saiam.”

 

Os dois homens observaram o professor sair da sala e, depois que a porta se fechou, ouviram a voz calma deste cumprimentando os aurores do Ministério. Scamander sentiu os dedos tremerem e um nó surgir em sua garganta.

 

“Newt?” A voz de Kowalski, baixinha, o chamou. “Está com medo que seu irmão o encontre aqui?”

 

“Ele vai saber que eu quero sair do país,” o magizoologista sussurrou, “E ele sabe que eu não posso.”

 

“Ele não vai saber que você está aqui, amigo.” O trouxa deu um tapinha em seu ombro, antes de apontar para a penseira, que estava flutuando no canto da sala. “Hey, o que é aquilo?”

 

“Uma penseira,” Newt respondeu. “Você coloca memórias ali dentro. São bem úteis em julgamentos e para quando você quer... se lembrar de algo.”

 

“Oh.”  O trouxa se levantou e andou até o objeto, encarando a água ali dentro. “Como funciona?”

 

Scamander se aproximou, tentando manter os passos ainda mais silenciosos do que o usual, e esticou a varinha para a superfície líquida da penseira. Uma memória prateada se grudou à ponta da madeira e o bruxo a ergueu, colocando-a em um pequenino frasco de vidro equilibrado, de certo por magia, na beirada da penseira. A memória escorregou para dentro do recipiente e ficou girando, emitindo um brilho fraco. O magizoologista ignorou a curiosidade que tomava conta de si e que o impelia a ler a etiqueta do frasco (ele reconhecera um “G” na caligrafia elegante do professor, mas se forçou a não continuar lendo), antes de erguer a varinha até a própria têmpora. Quando ele a afastou, um fio dourado de magia se esticou entre o objeto e sua cabeça, finalmente se soltando quando ele jogou a lembrança na penseira.

 

O bruxo puxou Jacob junto consigo quando se abaixou até a cabeça afundar na água. O trouxa pareceu se desesperar por um segundo, antes de soltar uma exclamação ao notar que não iria se afogar. Na verdade, agora estavam parados no meio de uma escadaria mal iluminada.

 

“Criança desobediente! Volte aqui! Vergonha da casa de Slytherin!” Uma voz feminina ecoou pelas escadas, fazendo Kowalski pular. “Menos cem pontos! Duzentos pontos! Volte já aqui! Pare!”

 

“Professora, foi Lestrange, ela é horrível!” outra voz falou, pertencente à uma garota.

 

A porta no pé da escada se abriu e uma menina entrou, fechando-a rapidamente atrás de si. Ela ficou encostada na madeira por um momento, ouvindo o barulho de passos do lado de fora, antes de subir as escadas. Jacob se encolheu contra a parede, tentando dar espaço para a aluna, enquanto Newt permaneceu onde estava. Leta Lestrange, então com treze anos, correu escada acima e o atravessou.

 

“Como?!” Kowalski apontou para a menina.

 

“É só uma memória. Não estamos aqui de verdade.”

 

Newt continuou escada acima, seguindo a garota que agora desacelerava. Quando eles estavam logo atrás dela, viram um patamar pequeno e escuro ocupado por frascos e caixas, iluminados pela luz fraca que atravessava o vitral da janela.

 

“Scamander?” a menina chamou e Kowalski abriu a boca, olhando do amigo para o menino sentado ao lado da janela. “Por que não está fazendo as malas?”

 

“Não vou pra casa,” o Newt de treze anos respondeu, sem levantar a cabeça para olhar a recém-chegada. Ele estava ocupado demais segurando uma minhoca sobre um pássaro pequenino dentro de uma caixa de papelão.

 

“Por que não?” Leta perguntou, subindo até ele e esticando o pescoço para olhar melhor o que ele estava fazendo.

 

“Ele precisa de mim.” O pássaro engoliu a minhoca que ele lhe entregou. “Encontrei ele machucado.”

 

A garota olhou em volta, fazendo uma careta para os vidros cheios de água e o que pareciam ser peixes ou girinos, algas e grindilows. Newt riu fraquinho, vendo a sua versão adolescente pegar o pássaro nas mãos e acariciar as penugens em sua cabeça. Leta pareceu hesitante, mas se ajoelhou ao seu lado.

 

“O que é isso?” ela perguntou.

 

“Um filhote de corvo.”

 

“Tem um corvo no emblema da minha família,” a garota murmurou.

 

O menino ergueu o pássaro e, com cuidado, colocou-o nas mãos de Lestrange. A menina pareceu tensa por um momento, antes de sorrir para o animal. Newt voltou a acariciar o bichinho e quando Leta o olhou outra vez, o sorriso continuava em seu rosto.

 

Jacob se agarrou ao seu casaco quando o ambiente escuro se dissolveu como tinta na água e eles se viram parados no meio da sala de aula de Defesas Contra as Artes das Trevas. Um professor Dumbledore mais novo estava parado atrás de Newt, que parecia alto demais e desengonçado demais no ápice dos seus dezesseis anos. Na frente deles, havia uma mesa de escritório, abarrotada de papéis e arquivos.

 

“Esse é diferente,” o professor falou, coçando o próprio queixo. “Então, o que o Sr. Scamander mais teme na vida?”

 

“Ter que trabalhar em um escritório, professor,” o Newt adolescente respondeu, mantendo os olhos baixos, e os outros alunos riram.

 

“Muito bem. Pode ir,” disse Dumbledore, indicando a mesa.

 

“O que é isso?” perguntou Jacob, baixinho, como se tivesse medo de interromper a aula.

 

“Um bicho-papão,” Scamander explicou, vendo o seu eu mais novo dar um passo para a frente. Atrás dele, Leta estava encolhida, observando tudo em silêncio. “Eles se transformam na coisa que mais tememos. O jeito de derrotá-los é os transformando em algo engraçado. Eles não gostam de risadas.”

 

O garoto ergueu a varinha e enunciou o feitiço. A mesa tremeu, se retorceu e mudou de forma: as gavetas viraram asas, a papelada se transformou em escamas e em uma cauda, a maquina de escrever virou uma cabeça com uma língua de papel balançando para lá e para cá. Os alunos riram, agora da mesa-dragão, que parecia acuada pelas risadas. Apenas Lestrange, Scamander notava agora, se manteve quieta.

 

“Ótimo, Newt, ótimo!” Dumbledore acenou para que ele fosse para a lateral da sala. “Sua vez, Leta.”

 

A garota se aproximou lentamente, olhando do professor para o bicho-papão com os olhos escuros arregalados. Algumas meninas da grifinória murmuraram algo, fazendo com que o Newt mais novo as olhasse feio.

 

“Isso é meio apavorante, não?” perguntou Kowalski, vendo a sonserina erguer a mão com a varinha e encarar a criatura, que parecia analisá-la. “São crianças...”

 

Scamander havia se esquecido como havia sido ruim ver a amiga naquela situação. O seu medo era relativamente simples de encarar e fácil de tornar divertido, mas, enquanto olhava o bicho-papão se transformar, ele percebeu o quão difícil era para outras pessoas ter que encarar o seu maior medo.

 

Leta estremeceu e seus olhos se encheram de lágrimas enquanto olhava um emaranhado de tecidos flutuar no ar, parecendo estar caindo lentamente, como se estivesse afundando na água. Pela luz que incidia no bicho-papão, era possível ver que havia algo entre os tecidos e, em certo momento, Newt pôde distinguir a silhueta de uma mão pequenina. O homem sentiu um arrepio atravessar o seu corpo e viu o seu eu mais novo puxar o ar abruptamente, parecendo também ter percebido do que se tratava o maior medo da sonserina.

 

“Leta?” Dumbledore murmurou, aproximando-se da aluna devagar.

 

A menina piscou e inspirou, trêmula, antes de sacudir a cabeça e correr para fora da sala. Os outros alunos ficaram em silêncio, confusos.

 

“Isso realmente é apavorante,” disse Jacob, olhando para o Newt jovem. “Você sabia o que era?”

 

A sala de aula se dissolveu e agora eles estavam na beira do Lago Negro. Scamander se aproximava lentamente de Leta, que estava sentada, toda encolhida, na pedra que eles já consideravam como deles.

 

“Não quero falar disso,” Lestrange murmurou, ríspida, e se encolheu ainda mais.

 

Newt não disse nada, apenas esticou uma mão para a garota, que o encarou por um momento, antes de aceitar a ajuda para se levantar. O garoto puxou a varinha do bolso e a acenou para a água, que estremeceu muito discretamente. Scamander deu um passo na direção do lago e, ao invés de seu pé afundar, ele pisou firme sobre a água, como se esta tivesse se tornado sólida. A garota o seguiu, assim como os dois homens que acompanhavam a memória, até que eles tivessem atravessado um bom pedaço de água e alcançado uma pequena ilha a alguns metros da margem do lago.

 

Havia uma única árvore na ilha, um salgueiro todo retorcido com as folhas ondulando na brisa leve. Newt acelerou o passo quando pisou na terra firme, correndo até a árvore e espiando dentro de um buraco no tronco. Lestrange o seguiu e subiu em uma das raízes para enxergar lá dentro: pequenos gravetos se mexiam, mãozinhas se agarrando no tronco e olhinhos espiando os visitantes.

 

“É o Pickett?!” perguntou Jacob, esticando-se também para ver os tronquilhos.

 

“Não, mas foram bons amigos nos meus anos em Hogwarts,” o bruxo explicou.

 

“Eles me conhecem, por isso não estão fugindo. Sabia que eles só fazem ninhos em árvores com madeira de boa qualidade? O tipo de madeira usada para varinhas,” o rapaz explicou, esticando a mão para o tronco. Uma das criaturas se arrastou para a mão dele, ficando em pé ali. “E eles tem uma organização social bem complexa. Se você os observar por tempo suficiente, vai perceber...”

 

O Newt mais novo pareceu se distrair enquanto observava o tronquilho andar de uma mão para a outra, que ele esticava na sua frente para que ele continuasse a caminhada. Leta o observava com cuidado, antes de erguer a mão e tocar a dele, permitindo que a criatura subisse nos seus dedos. Ela sorriu, um sorriso pequeno e ainda meio triste, os olhos ainda meio molhados, porém interessados, e o garoto também o fez.

 

A imagem tremeu e o lago sumiu. Newt e Leta estavam sentados na sala de aula vazia do Professor Dumbledore, um ao lado do outro, mantendo as cabeças baixas e tremendo. As vestes da garota estavam sujas de terra e os cabelos, uma bagunça, enquanto o rosto de Scamander estava arranhado e suas roupas, rasgadas em diversos pontos. Os dois tinham os olhos arregalados e cheios de lágrimas. O magizoologista deu um passo para trás, deixando Jacob mais perto da imagem. Ele queria explicar o que havia acontecido, mas nunca gostara de falar sobre aquele dia. Mostrar podia ser mais fácil, mas talvez ele devesse ter ficado fora da memória.

 

"Leta?" o rapaz chamou, fazendo a bruxa erguer o rosto. Um sorriso forçado esticou os lábios de Scamander e ele estendeu a mão na direção da garota. "Vai ficar tudo bem. Ele vai ficar bem."

 

"Papai vai me matar," a menina sussurrou e pressionou os lábios um contra o outro. "Ele me odeia, Newt. Ele vai me matar se eu-"

 

Os dedos do garoto alcançaram os dela assim que as vozes voltaram a soar no escritório do Professor Dumbledore. A princípio, era difícil distinguir o que estava sendo falado, mas logo as palavras ficaram mais claras, fazendo os dois estremecerem.

 

"Ela pode ser medíocre e malcriada, mas não é louca como esse garoto! Acha que não sei o tipo de má influência que o seu filho é, Fenella?!" Mesmo depois de anos, a voz de Corvus Lestrange ainda fazia Newt se encolher. Jacob, observando tudo com atenção, também se assustou ao ouvir o bruxo gritar do escritório do professor. 

 

"Não ouse falar assim do meu filho, Lestrange!"

 

"O que quer que eu fale? É o tipo de bruxo que nos faz passar vergonha e que leva gente direita para o mesmo buraco!" 

 

"Tanto o Sr. Scamander quanto a Srta. Lestrange quebraram as regras da escola-" A voz de Dippet era calma, comparada aos outros dois, apesar de também estar irritadiça.

 

"Foi um deslize, Armando. Já houve coisa pior por aqui," Dumbledore tentou argumentar, tendo que manter a voz alta para superar os pais em polvorosa. "Uma detenção longa e trabalhos nas férias devem ser o suficiente para fazê-los entender que fizeram algo errado."

 

"Você acha que aquele garoto vai entender que é errado colocar bestas pra dentro de casa quando ele foi criado rodeado por elas?" Lestrange vociferou. "Não se corrige uma criação errada, como a Sra. Scamander pode muito bem nos dizer sobre os seus hipogrifos."

 

"Não ouse comparar o meu filho com um animal!"

 

Leta soluçou, abaixando mais a cabeça e apertando os dedos do amigo. Newt engoliu em seco, erguendo os olhos para a porta do professor.

 

"Dê quantas detenções quiser para a garota, Armando, mas ela não volta para uma escola que acolhe lunáticos como Scamander. Leta já é difícil de disciplinar sem ter gente como ele por perto para incentivá-la a ser pior do que já é!"

 

“Newt?” Uma voz diferente ecoou no ambiente, distante e calma demais, destoando da cena que se desenrolava na frente deles. A sala de aula estremeceu e sumiu quando alguém os puxou pelas camisas.

 

Dumbledore esticou o pescoço para olhar a penseira e suspirou ao ver as figuras adolescentes de Newt e Leta rodando ali dentro. Ele esticou a varinha, pescando a memória prateada e a guardando em outro frasco de vidro, o qual ele fizera surgir do nada.

 

“Elas são boas quando se tem muita coisa na cabeça,” o professor falou, apontando para a penseira e, depois, entregando o frasco para Newt, que o apanhou com os dedos trêmulos. “Eu os aconselharia a sair de Hogwarts o mais rápido possível. Seu irmão está acompanhado de Travers, Montague e Clearwater.”

 

“O que eles queriam?” Scamander perguntou.

 

“Me questionar sobre Grindelwald.” O bruxo foi até a própria mesa e a observou por um momento, pensativo. Com um aceno da varinha, os objetos sobre esta se organizaram em uma pilha. De onde estava, Newt pôde ver, de relance, uma banda de metal presa aos pulsos do professor. “Esteja em Dover ao amanhecer. McLair estará esperando vocês. Perguntem pelo pescador biruta e vão saber te indicar o local onde ele fica.”

 

***

 

Depois do primeiro susto com as escadas que mudavam de lugar, Jacob pareceu se acostumar bem com o castelo, ignorando os xingamentos de Sir Cadogan, que os acompanhou por dois andares, e dando bom dia para os quadros mais educados. Eles estavam tentando chegar à saída do castelo e, depois, ao fim dos terrenos o mais rápido possível e sem serem vistos pelos aurores do Ministério, que ainda estavam na escola, já que Dumbledore disse que não poderia criar outra chave-de-portal para eles.

 

Newt queria poder andar com calma pelos corredores, queria mostrar para o amigo o lugar onde passou boa parte da adolescência, além de querer aproveitar o local por conta própria. As memórias de escola na penseira o fizeram sentir ainda mais saudades do local e agora Scamander queria visitar todos os cantos que antes lhe eram tão conhecidos, queria ver se ainda existiam as marcas que ele e Leta haviam deixado (rabiscos nas mesas, desenhos nos parapeitos, uma marca ou outra de algum feitiço que deu errado).

 

“Eu disse ruim, não burra.” Uma voz soou de dentro de uma das salas de aula, o local onde eles tinham aulas de Transfiguração. Scamander parou abruptamente e segurou Jacob pelo casaco, evitando que ele passasse pela porta. “Não precisa responder, eu sei que nunca gostou de mim.”

 

“Bom, está errada. Eu nunca achei que você fosse ruim,” Dumbledore falou.

 

“Você era o único então. Todo mundo achava isso,” disse Leta, baixinho, apesar de sua voz parecer mais próxima. “E eles estavam certos. Eu sou ruim.”

 

“Leta, eu sei o quão doloroso deve ser ouvir os rumores sobre o seu irmão, Corvus.”

 

“Não, não sabe. A não ser que você tenha perdido um irmão também.”

 

“No meu caso, foi uma irmã.”

 

O som dos pássaros cantando no jardim logo do outro lado do corredor tomou conta do lugar enquanto todos ficaram em silêncio, antes da voz de Lestrange aparecer outra vez, agora menos hostil:

 

“Você amava ela?”

 

“Não tanto quanto devia,” o professor respondeu. “Nunca é tarde para se libertar. Já me falaram que colocar para fora é um alívio, como se um grande peso fosse tirado das suas costas.”

 

Mais um momento de silêncio, durante o qual Newt aproveitou para bater com a varinha na cabeça de Jacob e, depois, na sua própria. Uma sensação de algo gelado escorrer do topo de sua cabeça para o resto do corpo fez com que os seus pelos se arrepiassem. Ao seu lado, Kowalski havia desaparecido sob o seu feitiço desilusório e Scamander teve que tatear o ar até o encontrar e agarrar o seu terno.

 

“O que?!” Ele ouviu um murmúrio.

 

“Shhh. Sou eu.”

 

“O arrependimento é um companheiro constante para mim. Não deixe que ele se torne o seu também,” Dumbledore falou e Newt quase sentiu o sorriso triste na voz dele.

 

O som de saltos estalando contra o chão de pedra se tornou mais alto e Leta Lestrange saiu para o corredor. Ela olhou para os lados e respirou fundo, antes de seguir o seu caminho, passando por eles sem perceber.

 

 


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Notas finais do capítulo

Nesse 25 de Dezembro, sejam gentis e deixem um review para o autor carente :)))



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