LUZ
É incrível como a nossa vida pode mudar com apenas um estralar de dedos, hoje era para ser um dia incrível e agora eu estou aqui sentada no banco do carona com Willy no volante e uma arma apontada na minha cabeça, talvez eu morra essa noite, depois de perder a minha família eu não tive mais medo da morte e ainda corri atrás dela e por esse motivo eu não entendo o porquê de estar morrendo de medo de morrer. Eu nunca desconfiei que Willy seria capaz de fazer algo assim, aliás, eu não sei o motivo para isso, eu só sei que ele me dá medo, seus olhos me lembram alguém mas não é possível que seja ele, não o meu amigo que tanto me ajudou.
— Você vai me dizer porque está fazendo isso?
— Por agora não.
— Então me diga pelo menos para onde você está me levando.
— Estamos indo para o seu apartamento, acho bom você ser uma boa garota e me ajudar com o que eu preciso – ele responde me olhando de lado com um sorriso que me faz arrepiar.
Estava tão distraída que não reparei que o caminho feito por ele era o que levava ao meu apartamento, ele estaciona o carro em uma das vagas disponíveis em frente ao edifício.
— Escuta bem o que eu vou te falar, eu vou guardar a arma e nós vamos passar pela portaria como se nada estivesse acontecendo, me ouviu?
—Sim.
— Se caso você fizer qualquer gracinha eu estouro os seus miolos.
Willy coloca a arma presa na calça e esconde com a camisa, saímos do carro e eu faço exatamente o que ele me diz, ajo o mais natural possível, dou boa noite ao porteiro e seguimos até o elevador, meu apartamento fica no décimo andar e a subida parece uma eternidade, ninguém diz nada, quando chegamos no apartamento eu vejo que a porta está destrancada e ao entrar vejo toda a casa bagunçada, parece que um terremoto passou por aqui.
— Não se preocupe, não foi nenhum assaltante, eu passei aqui mais cedo mas como não encontrei o que queria fui embora.
— Você é louco, o que você quer de mim?
— Eu quero duas coisas, mas vamos resolver a primeira, onde está o diário?
— Você fez tudo isso por causa de um diário?
— Tenho certeza que não é qualquer diário, seu pai era um homem inteligente devo admitir.
— Como você poderia saber que ele foi um homem inteligente se você nunca o conheceu?
— Isso é verdade, mas eu só vou responder suas dúvidas depois que você entregar a porcaria do diário – ele diz caminhando até mim em passos lentos.
— Está no meu quarto.
— Então vamos amor, me leva até seu quarto.
Nos dirigimos até lá e eu tiro o diário do piso, eu realmente não sei se deveria lhe dar isso, entretanto, que escolha eu tenho?
— Você não é nada boba, é um bom esconderijo.
— Toma – entrego o diário – agora você pode me contar tudo o que sabe.
Ele me ignora e começa a folhear o diário folha por folha até se cansar.
— Códigos e mais códigos, é exatamente disso que eu precisava. Sabe amor, eu não sei se o que eu tenho para te contar vai te fazer bem, seus pais eram terríveis.
— Eu não me importo, você pode dizer tudo – sim, eu me importo muito mas preciso saber de tudo.
— Como já te falei, seus pais faziam parte de uma organização secreta que se chama Resgatando, basicamente eles são formados por policiais, detetives e voluntários que tentam resgatar missionários que estão presos em outros países acusados de estarem influenciando as pessoas a acreditarem no cristianismo, alguns até viajam para ajudar no resgate.
— E onde você entra nessa história?
— Eu? Eu não, meu pai sim. Existem pequenos grupos extremistas em cada país que são formados por pessoas que tem como missão destruir essas organizações que tanto atrapalham a cultura de outros lugares, você ficaria impressionada com a quantidade de brasileiros que que apoiam esses grupos, mas como eu dizia, meu pai era o líder do grupo aqui no Brasil, eles já conseguiram destruir muitas organizações, entretanto a Resgatando é um grupo muito difícil de se infiltrar, foram muitos meses até meu pai conseguiu colocar um dos dele lá dentro, ele passava todos os tipos de informações que eram úteis mas o que não poderíamos contar foi com a sua traição, nesse tempo que ele ficou na Resgatados eles fizeram a cabeça dele e ele se converteu ao cristianismo, todas as informações que nos passava eram falsas, ele havia contado sobre nós para eles, mais especificamente para seu pai, e num belo dia quase todos do grupo extremista foram presos, inclusive meu pai, na época eu não entendi nada mas com o passar dos anos entre as visitas que fazia no presídio meu pai me contou tudo e começou a me orientar ao que fazer para proteger a identidade daqueles que ainda estavam soltos e continuar o trabalho, ele me deu todas as informações que precisaria saber sobre sua família que claro era nosso principal alvo, no começou quando o agente infiltrado ainda era um dos nossos ele nos contou sobre esse diário que seu pai escrevia, e então planejamos tudo para irmos até a sua casa, pegar o diário que tínhamos certeza que incriminava muitos de nós e por fim a vida daqueles que acabaram com a vida do meu pai e de seus aliados, mas ao chegarmos lá a minha cede por vingança foi maior, eu achei que seria fácil encontrar o diário e então por que não começar matando um por um daquela casa? Começamos com a sua irmã e depois pelos seus pais, coitados, não deu tempo nem de pedir perdão pelos seus pecados.
— Você é um monstro – meu coração dói, minha cabeça gira, as lágrimas estão queimando e eu acho que não vou conseguir ficar em pé.
— Por favor amor, não me diga isso. Veja como eu fui bom para você, se você está viva é porque eu tive compaixão de você – ele começa a se aproximar de mim.
— Sai de perto de mim – Eu quero gritar mas minha voz sai tão baixa como um sussurro.
— Tudo bem, então eu vou continuar a história. Procuramos por toda parte mas não encontramos o maldito diário, decidimos ir embora antes que alguém notasse a movimentação, mas então você apareceu. Sabe Luz, eu já vinha te observando a algum tempo, quando eu te vi pela primeira vez você estava com um vestido azul e uma flor no cabelo, eu não pude deixar de me apaixonar por você, comecei a te seguir e naquela noite te vendo chegar em casa sorridente eu simplesmente não consegui me controlar.
Meu Deus, me tira daqui por favor, todas as lembranças daquela noite surgem como se eu tivesse vivendo o momento novamente, eu havia acabado de ver meus pais mortos, desci desesperada as escadas para chamar ajuda quando fui parada por um homem com uma mascara preta no meio da sala, ele amordaçou a minha boca antes que eu pudesse gritar e foi então que ele acabou com a minha vida, acabou com meus sonhos fazendo-me sentir imunda, ele simplesmente me quebrou, abusou de mim e foi embora deixando sua marca em mim. Eu vou vomitar, eu não consigo reviver isso de novo.
— Como eu pude ser tão cega, era você naquela noite, você pode achar que ao ter poupado a minha vida você me fez bem mas você me matou, depois daquele dia eu nunca mais vivi, eu apenas existi.
— Não meu amor, ali começou a nossa história, você não percebe isso? Você tem que perceber, eu estive todos esses anos sendo seu amigo compreensivo porque eu sabia que em algum momento você ia entender que eu sou o melhor para você, sempre vou ser – ele esta sentado do meu lado na cama acariciando meus cabelos mas eu não tenho mais forças para lutar.
— Tudo o que eu consigo sentir por você é repulsa, eu tenho nojo de você seu asqueroso assassino.
— Cala a boca, Luz! Não era pra ser assim, era para você dizer que me entende e que me ama assim como eu te amo.
— Essas palavras você nunca vai escutar de mim Willy! – Eu cuspo na cara dele e ele me devolve com uma bofetada na cara.
— Você nunca vai ficar com mais ninguém Luz, você é minha! – ele então começa a me acariciar, eu tento me desvencilhar dele mas seu peso é muito maior do que minha força consegue aguentar. Ele começa a subir meu vestido e eu começo a gritar descontroladamente na esperança de alguém me escutar – essa é a segunda coisa que eu quero de você amor, fica quietinha.
— Me soltaaa... Socorro, alguém me ajude? – grito até meus pulmões não aguentarem mais, então é assim que tudo acaba? Tudo o que eu passarei nessa vida é por abusos e tristezas? Então eu faço uma oração, eu nunca mais havia orado mas é isso que faço, a oração mais simples e sincera que já fiz na vida.
“ Deus, eu realmente não entendo o porquê do Senhor permitir isso mas se você realmente existe, me ama e se importa comigo então não me deixes passar por isso novamente, por favor Deus, eu te suplico, não me abandones”
Quando eu termino a oração eu sinto o corpo do Willy ser retirado de cima de mim e ser arremessado na parede, minha visão está um pouco embasada mas consigo focar e ver quem me salvou, antes de desmaiar de cansaço eu vejo o Caleb acertar o rosto do Willy várias e várias vezes e então tudo fica escuro e eu não vejo mais nada só escuto um barulho de tiro.

CALEB

— Seu desgraçado!
A imagem desse infeliz em cima da Luz não sai da minha cabeça, já disparei dezenas de socos no rosto dele e se não fosse pelo porteiro me segurar eu não sei o que faria, ele tentou atirar em mim mas felizmente acertou o teto, retirei a arma da mão dele e joguei longe.
— Você é um covarde que merece apodrecer na cadeia, e eu farei o impossível para que isso aconteça! – me solto dos braços do porteiro já um pouco melhor quando me lembro de Luz, olho para a cama e ela está desacordada.
— Droga, precisamos levá-la ao hospital.
— Fica Calmo. Pelo que vejo você chegou antes que algo acontecesse. Ela deve ter desmaiado, vou pegar um copo de água, tente acorda-la, a polícia já vai chegar.
Olho para o monstro no chão que parece estar desmaiando e decido amarra-lo caso ele tente fugir, e então me dirijo até Luz, sento ao seu lado, ela parece tão frágil e delicada, faço carinho em sua face e então ela acorda assustada.
— Ei, está tudo bem agora.
Ela começa a se sentar na cama e a procurar por algo em todo o quarto até que seus olhos caem no homem desmaiado no chão.
— Ele está morto?
—Não, Mas ele nunca mais vai te fazer mal nenhum Luz, a polícia deve estar chegando.
— Foi você, você chegou na hora e me salvou.
— Bem, se você quer me ver como um super homem por mim tudo bem – tentei tirar um sorriso dela mas ele não veio.
— Por que você fez isso? Aliás, o que você fazia aqui?
— Eu fiquei preocupado com você andando sozinha por aí a noite, a Lara também disse que socaria minha cara se algo acontecesse com você então eu não pensei duas vezes e segui até aqui.
— Como você entrou Caleb?
— Seu Luís da portaria me deixou subir, não é como se ele não me conhecesse. Luz, desculpa por isso, eu disse que nunca mais te deixaria de novo e foi exatamente o que eu fiz, me perdoa?
— Você não tem nada a ver com tudo isso Caleb, eu sou a única culpada por deixar o assassino dos meus pais entrar na minha vida.
— O que? Do que você está falando?
— Ele matou minha família, um pouco antes de você chegar ele confessou – seus olhos começam a marejar e tudo o que posso fazer é lhe dar um abraço.
Minutos depois a polícia chega, levam o cara preso e colhem o depoimento da Luz aqui mesmo já que ela está muito abalada para ir até a delegacia. Vejo ela contar tudo e quanto mais ela fala mais eu sinto a raiva aumentar em mim, esse monstro havia abusado dela naquela noite, não bastou matar sua família e ainda por cima colocou suas mãos nela, graças à Deus ele foi levado porque eu acabaria com ele aqui e agora. Depois disso os policiais vão embora, e eu não sei se devo ficar ou ir também.
— Luz, se você quiser eu fico com você essa noite – ela não me responde nada então entendo que ela quer ficar sozinha, me levanto mas ela impede que eu vá, Luz segura a minha mão e olhando nos meus olhos balbucia.
— Fica por favor! Eu preciso te contar tudo, não é isso que você queria que eu fizesse?
—Luz, eu já escutei tudo, nós podemos conversar em outro momen...
— Eu preciso falar agora Caleb! Ainda existe uma parte da história que você não conhece e eu quero te contar.
Fico intrigado e preocupado com o que mais poderia existir no meio disso tudo, sento ao seu lado no sofá para ouvir o que ela tem a me dizer.
— Então comece Luz.