Entre Páginas escrita por Raíssa Duarte


Capítulo 12
Capítulo 12


Notas iniciais do capítulo

Capítulo novinho ;)
Beijinho



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Com seu aniversário de vinte e um anos próximo, Melissa finalmente receberia seus pais para uma visita rápida no Rio de Janeiro.
    Por mais que o clube de leitura fosse maravilhoso, Luísa estava cansada de passar tanto tempo fora de casa. Perguntaria aos pais se poderia voltar. Com Melissa prestes á ficar noiva, fazer papel de pajem não seria mais sua obrigação. Aquela estadia estava sendo muito mais complicada do que ela jamais imaginara.
Após uma sessão de livros comentados ter terminado, Lu recolheu seus materiais e encaminhou-se até a saída esperando por Bianca, que conversava com outras meninas.
  Examinando a luva de renda distraidamente, mal percebeu Sofia em seu campo de visão;
   -Meu irmão foi pedir desculpas? – Indagou sem rodeios.
    -Sim. Trouxe até um ramalhete de flores. Eu o desculpei. Mas realmente acho que não podemos mais andar juntas. - Ajeitou seu livro e bloco de notas.
     -Por causa do que aquele idiota disse?
  -Sofia, por mais que goste de sua companhia, seu irmão não se recomenda. Não quero aturar um escândalo a cada vez que ele vier buscar você. Tenho um limite de falatório, sabia?
   -Aquele tolo não virá mais aqui. Eu o convenci a me deixar respirar ar puro sozinha. Acho que realmente envergonha-se do vexame que deu por cá. – Deu de ombros casualmente. – Por falar nisso, é verdade que lê livros indecentes?

Lu ficou boquiaberta.
    -Srta. Albuquerque? – Sua professora a chamou. – Tem um momento?
     Luísa ficou tensa imediatamente.
    Sabia que a Sra. Margarida Castelo não deixaria o incidente de semana passada passar em branco. Na verdade, fora uma grande surpresa que não fora proibida de pisar na biblioteca como punição pelo desrespeito ao público.
     Sofia saiu, deixando-as á sós. A maior parte das garotas já saíra, despedindo-se na calçada do lugar.
    -Por favor, venha comigo. – A professora indicou sua saleta suavemente com a cabeça.
     Comedidamente, Luísa torceu para que ninguém mais a visse tendo um particular com a professora, e a seguiu. No caminho encontrou Bianca e pediu que a esperasse por um instante.
    -Então... – A professora cruzou os braços assim que ficarsm sozinhas no cômodo particular. – Podemos conversar sobre suas leituras?
    -Achei que já tivéssemos conversado no clube, senhora. – Luísa manteve a compostura e o olhar inocente. Mas talvez um olhar altivo como o de sua mãe e irmã surtisse mais efeito, intimidando a mulher.
   -Sem cinismo, mocinha. O Sr. Medeiros fez uma alegação séria sobre você ser uma influência á irmã dele.
    Lembrando-se do jeito debochado da Srta. Medeiros, e de como ela parecera divertir-se com a briga anterior, ela duvidava que fosse capaz de ‘contaminar’ Sofia.
   -Ele é um cavalheiro rude. - Explicou timidamente. - Não foi a primeira vez que tivemos um tipo de desentendimento. Não me orgulho disso, é claro.
    -Entendo. Mas houve um livro ‘impróprio’ envolvido. - Com a ponta do indicador, empurrou os óculos para mais acima na ponte do nariz.
    Luísa não viu motivos para negar. Não gostava de mentir, e duvidava que fosse boa na atividade.
    -Foi um acidente. Estava á procura de novos romances, acabei encontrando o que não deveria.
       -Que seria? - Incentivou.
    -O Cortiço. – Suspirou a menina. – Não fazia a menor idéia do que se tratava. Mas ouvi tantos falarem... Por isso não comentei com ninguém a respeito de tê-lo.

A mulher inclinou a cabeça, atenta ao relato.
     -Imagino que seus pais não saibam que o tem.
     -Estou com meus tios, e não, não sabem. Nem sei o que fariam se soubessem.
     -O que achou dele?
    Lu ficou surpresa pela pergunta, sem saber o quê responder.
    -É diferente de tudo que já li. - Respondeu. - E fala de um modo diferente. Eu... Não sei....
    A professora acenou, assimilando a resposta.
      Silêncio.
     Luísa estava impaciente para saber o que resultaria de tal conversa.
     -Serei suspensa? Não poderei participar do clube? - Mordeu o lábio em seguida.
     Um mínimo sorriso despontou nos lábios dela.
     -Não. Mas a senhorita certamente não sairá impune depois daquela infantilidade.
      -Então serei suspensa?
  -Não. Mas vai me ajudar aqui na biblioteca. Como minha assistente.
     Luísa respirou aliviada, e então sorriu.
    -Esse sorrisinho vai desaparecer quando começar a me ajudar, mocinha. Semana que vem começamos. Vai me auxiliar com a papelada e livros depois do fim de cada sessão. Agora pode ir.

 

Com o aniversário de Melissa chegando em maio, seus pais e irmãos vieram passar a data com as meninas, podendo ficar por apenas poucos dias. A visita seria coincidentemente feliz, considerando que Henrique pretendia pedir Melissa em casamento oficialmente, após ela contar-lhe como era feito tradicionalmente.
     Sua mãe estava tão indignada quanto sua tia, e expressou o desgosto no dia marcado para o jantar, enquanto Melissa esperava seu banho ficar pronto. Assim que a empregada terminou de despejar a água quente e saiu, ela não perdeu tempo;
      -Eu não sei que loucura acometeu seu pai para permitir um absurdo desse. – Cruzou os braços elegantemente. As sobrancelhas estavam unidas, demonstrando a insatisfação presente em sua expressão facial. –A esta hora, você poderia estar na Inglaterra, encontrando um nobre.
     Melissa cheirou o óleo perfumado dentro de um frasco de vidro.
   -Um nobre falido, a senhora diz. – Murmurou concentrada em sua tarefa.
    -Ainda assim um nobre. – Insistiu Amélia. – Mesmo aquele patife era filho de um conde.
    -Ah, eu não aceitaria Rodolfo de volta nem mesmo se ele fosse o próximo imperador. – Um exagero, é claro. Ela aceitaria um noivo que a oferecesse uma ótima posição social, mas a temporada atual mostrara-se um fracasso completo, exceto talvez para Luísa. – Por falar no bastardo, como o casalzinho está? – Aspirou outro frasco, em busca do melhor perfume.
    -Continuam falando da rapariga. Ela estragou a própria reputação ao fugir. Uma desmiolada.
    -Ela sabia exatamente o que estava fazendo, acredite. Agora que está casada, eventualmente vão parar de falar. E eu preciso fazer o mesmo.
       -Mas não com um filho de padeiro.
    -Mamãe, o Império acabou! Títulos não passam disso. E nem sequer são mais usados. – Colocou o recipiente sobre a mesinha com utensílios de banho. – A senhora quer mesmo que eu more na Inglaterra? Tendo de pegar um navio sempre que quiser visitá-la?
       -É claro que não! Mas pense no que irão dizer.
    -Irão dizer que sou a esposa de um homem de negócios. Titio quis negociar com ele, e outros também querem. A classe burguesa está emergindo.
    -E você quer ser a esposa de um burguês...
      -Eu queria ter sido uma duquesa! Queria ter sido íntima da Família Real e enobrecer nossa casa. Entretanto, estes sonhos acabaram ano passado. E caso a senhora ainda não tenha percebido, eu não estou em posição de ser seletiva! Este foi o único pedido de casamento que recebi! - Soltou o cabelo escuro e pesado, que caiu sobre as costas.
      Sua mãe ficou em silêncio, com a boca apertada em uma linha infeliz.
      -Você merecia mais...
  -Mamãe, por favor... Papai já deu permissão, e eu estou de acordo. Pode formar sua própria opinião sobre ele hoje á noite.
     Amélia manteve o silêncio resignado.
   -A propósito... – Derramou óleo de lavanda na água fumegante. – Eu contei sobre o namoradinho de Luísa?

                        ♤♤♤

Ao cair da noite, Henrique e Carolina vieram á Mansão Tavares, e uma torrente de apresentações sucedeu. Melissa agradeceu mentalmente por Leonardo ter se comportado e não ter feito nenhuma piadinha para irritá-la em um momento tão especial. Talvez o diploma tivesse enfiado um pouco de juízo naquela cabeça vazia. Sua irmã não estava tão empolgada quanto ficaria em circunstâncias diferentes. Contudo também poupou comentários azedos.
     Depois de um jantar soberbo e conversas frívolas, o momento chegou.
     Diante de todos os familiares, Henrique Castro a pediu em casamento, com um lindo anel de ouro, que exibia um diamante cor-de-rosa, rodeado de pequenos brilhantes brancos. Delicado, mas chamativo, nunca ao ponto do extravagante. Bem ao estilo de Henrique. Discreto, mas nunca passando despercebido.
    Quando Carolina a abraçou cordialmente, sussurrou em seu ouvido;
      -Espero que você o faça feliz.
    A resposta de Melissa foi um belíssimo sorriso enquanto apertava gentilmente as mãos de sua futura sogra, em sinal de prévia boa convivência.
     E então mais conversas na sala de estar enquanto os homens tomavam copos de conhaque ou uísque, discutindo política, e as mulheres tomando um leve licor, conversando sobre família e moda.
    Ao fim da ocasião, Melissa sentiu um alívio ao constatar que o terrível episódio chamado Júlia Martins finalmente acabaria. Casada, jamais seria motivo de riso ou pena novamente. E poderia encarar Júlia de cima, e colocá-la em seu devido lugar.

                        ♤♤♤

—Você gosta dele? – Perguntou Luísa mais tarde, enquanto ambas ainda procuravam pelo sono.
     Surpresa, Melissa indagou;
     -Por que isso é tão importante para você?
        -Quero saber se você tem um coração.
    Um riso pequeno ecoou no quarto escuro.
    -Você quer saber se ainda sou uma completa não romântica. Continuo sem uma gota de romantismo em mim, mas se serve para consolá-la, acho Henrique muito bonito. Tenho certeza de que vou gostar dele. Talvez eu já goste. Ele vai salvar minha reputação, afinal de contas.
      Silêncio.
    -Vai contar para Bianca, não vai? Ela já está namorando, e você noiva.
    Melissa ficou quieta.
    -Não sei como será encará-la depois. – Cochichou Lu.
    -Não precisa envolver você, Lu. Deixe que ela me odeie. Vocês podem continuar amigas.
    -Você não sente falta disso?
    -Do quê?
    -Amigas.
    -Eu tenho amigas.
 -As que acompanhavam você na confeitaria e faziam mexericos? Que agora com certeza têm você como matéria principal?
      Um suspiro de Melissa.
    -Eu não preciso de amigas. Eu tenho você.

 

Na manhã seguinte, Luísa lia distraidamente Romeu e Julieta enquanto seu irmão olhava pela janela, entendiado, e sua irmã lia uma revista de moda, mas parecia inquieta ao fazê-lo. Seu pai e tio estavam no escritório, conversando.
      -Conhecem algum lugar para diversão? 
     -A Confeitaria Doçura. – Respondeu Mel, casualmente.
      -A Livraria Garnier. – Luísa.
     -Algo realmente divertido.
   -Ah... – Melissa piscou, abaixando a magazine. – Esbórnia, você quer dizer. Não somos as mais indicadas para sugerir esse tipo de coisa.
    -Eu quis dizer algo menos tedioso e feminino.
    -É tão terrível para você ficar dentro de casa?
      -Neste dia bonito? Sim.
      Melissa deu uma risadinha;
     -Sabe que sua mordomia vai acabar, não sabe? As partidas de críquete, as idas á barzinhos, a caça ás saias leves...
    -Eu trouxe um diploma da Inglaterra, não trouxe?
    -Tem intenção de usá-lo?
 -Não sei. Talvez eu fique apenas administrando as terras do nosso pai. Não é por isso que ele não me permite sair do meio do mato?
   -Só tenha ciência de que como doutor, terá uma reputação á zelar.
    -Só tenha ciência de que esse assunto não é de sua conta.
    -Vocês dois! – Exclamou Luísa. – Parem com isso!
 -Melissa, como sempre, está particularmente agradável esta manhã, irmãzinha. Com licença, senhoritas.
     Leonardo apanhou seu paletó e chapéu, saindo de casa.
     -O que deu em você?!— Perguntou Lu.
    Melissa apertou a têmpora com a ponta dos dedos, com unhas polidas e perfeitamente lixadas.
   -Estou nervosa. Vou contar a verdade á Bianca.
     Luísa piscou, atordoada;
     -Mesmo?
      A mais velha afirmou com a cabeça;
   -Sim, antes que ela descubra sozinha e tente algo no calor do momento. Todos os cenários que imagino são ruins.
    -Acha que ela pode contar?
   -Dificilmente. Ninguém acreditaria nela. Mas ainda assim...
    A Srta. Albuquerque mais nova olhou para a irmã, tentando desvendá-la.
     -Você gosta dela. – Afirmou.
     -O quê?
     -Está sentindo culpa.
    -Luísa, pare com o sentimentalismo.
    -Ela é a única verdadeira amiga que você já teve. É natural. – Um sorriso minúsculo despontou no rosto de Lu. – Você está fazendo o certo ao contar a verdade, Mel.
    Melissa girou a aliança de noivado no dedo distraidamente. Aquela era primeira vez em semanas, que sua irmã parecia suave com ela.
    Amélia surgiu da sala de jantar, em um farfalhar de saias cor branca. Uma expressão contente harmonizava suas feições;
   -Agora que passamos pelo furor do noivado, que tal falarmos sobre o seu pretendente, meu amor?
    -O Sr. Castro é um homem honrado, mamãe, já sabe disso. Tenho certeza de que vai tratar Mel muito bem. – Informou Luísa.
    -Eu estou falando do seu pretendente, querida. – Sentou-se no sofá onde ela estava deitada.
      -Como é? – Lu ajeitou-se confusamente.
   -Sua tia me deu todas as informações necessárias, e saiba que faço muito gosto. Que pena que sua irmã não tenha encontrada um cavalheiro assim... - Um sorriso contente harmonizava o rosto da matriarca.
   -Eu não tenho pretendente. – Apertou o livro com força, sentindo os dedos ficarem duros. – Por que insistem nisso?
    -Porque você é linda, bem nascida, e está pronta para se casar. Amanhã, no aniversário de sua irmã, quero ver com meus próprios olhos! - Tocou o queixo da caçula carinhosamente.
    -Mamãe. O Sr. Medeiros é o cavalheiro mais arrogante e orgulhoso que já conheci.
   -Parece-se muito com o que Elizabeth Bennet disse sobre o Sr. Darcy, Lu. Cuidado. – Mel riu.
    -Se tivesse prestado atenção no livro como eu prestei, saberia que Elizabeth e Darcy só assumem um verdadeiro compromisso quando ambos consertam seus erros e tornam-se pessoas melhores. – Exaltou-se, frustrada.
    -Talvez você simplesmente não conheça o Sr. Medeiros de verdade. Ele se desculpou e trouxe flores, não foi?
   -Porque a irmã o obrigou.
   -Importa? – Sua mãe parecia deslumbrada pela possibilidade. Agarrou sua mão em um carinho exagerado – No baile saberemos a intenção dele. Em uma dança. Ou talvez, mais.
      -Mamãe!
    Melissa levantou-se, deixando a revista sobre o canapé.
    -Bem, eu devo ir, vou visitar uma amiga.
    -Melissa... – Começou Amélia.
   -Mamãe, já sou uma moça comprometida e vou com Juliana, não se preocupe. Deixe Luísa com o livro dela. Aproveite e pergunte o que ela realmente sente por Roberto Medeiros. Talvez ela deixe escapar alguma coisa. - Apanhou sua capa e foi até a cozinha chamar pela empregada rapidamente.


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Notas finais do capítulo

Alguém curioso pelo desdobramento que esse caso da Melissa vai ter?
Bj



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