Entre Páginas escrita por Raíssa Duarte


Capítulo 11
Capítulo 11


Notas iniciais do capítulo

Novo capítulo! :3



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Luísa lia Razão e Sensibilidade quando uma batida na porta interrompeu sua atividade.
    Estando deitada relaxadamente sobre um canapé da sala de estar, e próxima o bastante da porta, resolveu atendê-la ela mesma. Deixou o livro fechado sobre o assento, depois de memorizar a página que estava lendo.
   -Pode deixar. – Estendeu a mão para uma empregada que se aproximava, em um gesto que dizia para não se preocupar com aquilo.
   Suas sobrancelhas subiram em surpresa ao contemplar o rosto do visitante;
    -Sr. Medeiros... – Decidiu que não estava com vontade de brigar tão cedo. O melhor era ouvir logo o que ele tinha a dizer e então retornar á sua leitura. Reparou que ele trazia em mãos um ramalhete de flores.
   -Srta. Albuquerque... – O tom de voz dele tampouco era agressivo. Muito civilizado, na verdade. – Espero não estar incomodando.
   -De modo algum. – Abriu um espaço minúsculo de entrada para ele. – Por favor, sinta-se a vontade.
   Quão maravilhosa era a sociedade na qual viviam, onde ela precisava convidar um rapaz detestável a entrar e ele a aceitar.
   -Com licença. – Entrou. Mas não se sentou.
   -Eu queria me desculpar por meu comportamento naquela tarde... Não foi nem um pouco cavalheiresco. Sinto muito se causei constrangimento. – Esticou o braço, entregando o pacote de margaridas.
   Luísa aceitou;
   -Causou. – Concordou. – E desde que nos conhecemos, sinto que o senhor tem prazer em fazer isso.
   -Peço desculpas, não sei o que quer dizer.
   Sem que ambos soubessem, estavam sendo observados por duas mulheres pela escadaria, uma mais jovem e a outra, a mais velha, dona da residência.
   -Sabe sim. – Sua voz era suave, enquanto as flores repousavam em seu antebraço. – Desde que cheguei.
   Ele parecia sinceramente confuso.
   Ótimo. Ele sequer se lembrava de tê-la chamado de insípida.
   -Seja como for, coloquemos uma pedra neste assunto. Está desculpado por qualquer constrangimento, e a partir de agora evitaremos a companhia um do outro. Acho que será mais fácil assim. - 
   -Sr. Medeiros! – Amália desceu os degraus segurando a saia engomada delicadamente em uma das mãos. – Mas que surpresa agradável! Como está sua mãe?
   Surpresa agradável? Luísa discordava terminantemente.
    -Muito bem, Sra. Camargo. – Deu um leve aceno com a cabeça.
   -Que lindo buquê! – Sorriu para a sobrinha com malícia brilhando nos olhos claros. – Dolores! Coloque em um vaso, sim? Ah, e também traga chá para o nosso visitante! O senhor gosta de chá ou prefere um refresco?
   Roberto parecia encabulado pelo convite.
  Pois eu prefiro que escafeda-se daqui. Pensou Lu.
  -Vamos, sente-se! Faz tanto tempo que não vejo sua mãe! E como está sua irmã?
   Perplexa, Luísa foi puxada por sua tia para o sofá mais próximo. Conteve um ofego de choque ao ver Roberto sentando-se sobre seu livro.
   -Ah, perdão... – Pegou-o sem jeito, ao perceber a falha gravíssima que cometera e sem saber onde colocá-lo, manteve-o sobre o braço do sofá.
   -Por que não trouxe Sofia com você? Lu gosta tanto dela... As duas deram-se muitíssimo bem nos primeiros encontros do clubinho...
   Ele a olhou muito sério.
   Essa não...
   Ele contaria á sua tia sobre O Cortiço.
   Não muito depois de seu lançamento, o livro fora considerado absurdamente indecente para moças como ela. Ela só conseguira adquiri-lo por conta de um vendedor desinteressado e porque o livro havia acabado de sair.
   Em pânico, enviou uma mensagem pelo olhar, esperando que fosse o suficiente para que ele compreendesse.
   Ora essa, mesmo se ele entendesse, que prato cheio seria para ele dedurá-la.

Luísa esperou pelo comentário...

—Imagino que sim. Sofia é uma moça muito introspectiva. Acho excelente que tenha amigas. - A expressão de Roberto tornou-se relaxada.
   Lu segurou o queixo que desejava ir ao chão.
     Ele a olhou enigmáticamente.
   Com certeza, exigiria algo em troca em alguma ocasião. Luísa não seria tola o bastante para pensar que de repente tornariam-se amigos. Roberto esperaria uma oportunidade para humilhá-la.
   Entretanto, aproveitou o alívio de não ser exposta diante da família.
   Droga de livro.

Após uma conversa ridícula, ele finalmente cansou-se do interrogatório de Amália e resolveu ir embora.
   -Você e sua irmã estão absolutamente convidados para virem aqui para um lanchinho! Meus meninos voltam em pouco tempo, e aposto que vocês terão muito para conversar.
   A jovem fechou os olhos, prevendo o que a irmã de sua mãe tentava fazer.
   E não funcionaria, de modo algum.
   Não havia pessoas mais distintas entre si do que os dois.
  -O que foi aquilo? – Indagou atônita quando Roberto mal deixara a propriedade.
   -Se tudo caminhar corretamente, seu futuro noivo! Vou visitar a mãe dele, preciso saber todos os lugares que o rapaz freqüenta e então você...
   -E então eu certamente ignorarei todos!
   Ela cruzou os braços de modo elegante;
 -Deixe de pilhérias, Luísa Viana Albuquerque. Se isto é seu modo de charme, então...
   -Não é charme! Simplesmente não tolero aquele...
   Uma risada delicada soou;
  -Não tolera? – Melissa desceu ao encontro de ambas. – Desde que o conheceu você só fala nele. Contou-me um milhão de vezes sobre como ele é rude e mal educado. Ele não sai da sua cabeça desde então. Parece-me muito com a história de amor do Sr. Fittzwillian Darcy e Elizabeth Bennet. Você não adora esses romances?
   -Enquanto as duas fizerem troça disso, não comentarei mais nada sobre o assunto. Estou cheia do Sr. Medeiros. – Apanhou seu livro e fugiu para o quarto.
   -O que deu nela? – Questionou Amália.
   -Seja o que for, teremos oportunidade de descobrir nesse tal lanchinho.
   -Ouvindo pelos cantos, Srta. Albuquerque? - Cruzou os braços sutilmente.
   -Só estou preocupada com o futuro de minha irmãzinha. Ela ás vezes é muito ingênua. - Deu de ombros casualmente.

Outra batida na porta.
     Dolores, que arrumava o buquê no vaso de cristal, apressou-se para atender. Em seguida entregou um bilhete para Melissa após atendê-la.
     -A Sra. Carolina quer me fazer uma visita. Hoje. - Informou a moça, lendo a nota.
     -Quer conhecer você de verdade... O que me lembra; Por que Castro ainda não deu á você um anel de noivado? Já tem quase um mês de corte.
     -Eu pedi para que esperasse um tempo de namoro. - Dobrou o papel distraidamente.
    -Você está tentando ver se consegue algo melhor antes que se torne público?
      -Tia, não! Vamos nos casar, eu só...
    -Eu entendo. - Interrompeu - Em sua situação, estaria totalmente insegura.
     Sua única insegurança era Bianca. Como segurar Henrique para que Bianca estivesse oficialmente comprometida? Como garantir que ela não se vingaria da enganação ao delatá-la para seu noivo? Melissa tinha certeza de que sua reputação não sobreviveria á um segundo escândalo. Ao menos não no Brasil.

                        ☆☆☆

Melissa caminhou calmamente por entre os arbustos podados do jardim, com sua futura sogra ao seu lado.
   -O jardim de sua tia é muito bonito. – Elogiou calmamente – Eu mesma tenho um apreço muito grande por flores.
   -Não conheço tanto sobre botânica quanto gostaria. Quem sabe no futuro...
     Mantiveram-se em um silêncio estranho.
    -Eu não quero soar indelicada, mas minha visita aqui tem um propósito. - Pigarreou baixinho.
  Melissa acenou incentivando-a a continuar.
     -Eu quero conhecê-la melhor, já que de acordo com meu filho, em breve seremos uma família. Contudo, antes preciso saber exatamente o que sente por ele.
   A aspereza da pergunta pegou a moça em completa surpresa.

Mordeu o lábio, sem saber ao certo como responder uma pergunta tão inapropriada.
     -Eu sinto em dizer que não posso colocar em palavras a exatidão de meus sentimentos. - Afirmou depois de alguns segundos.
     Carolina parou, ficando de frente para ela.
    -Certamente pode me dizer se o ama ou não. - O questionamento era quase uma exigência.
     -Sra. Carolina. – Sentiu-se encabular com tamanha inconveniência. – Eu não sou particularmente romântica ou sentimentalista. Todavia, posso dizer com certeza que pretendo fazer seu filho feliz e ser uma boa esposa.
   Os lábios de Carolina apertaram-se em uma linha fina.
    -Então não o ama. - Assumiu. - Por que aceitou casar-se com ele?
      -Porque fui pedida.
    -Não é o que eu quis dizer. Conheço muito pouco de sua família, mas sei que são muitíssimo influentes. Por que tornar-se esposa de um empresário quando existem tantos fazendeiros ricos e ex-nobres disponíveis?

Ela estava perto demais da motivação de Melissa ter vindo para o Rio de Janeiro.
   -Seu filho e eu nos damos muito bem. E espero, do fundo do meu coração, que o mesmo aconteça comigo e a senhora. Acredito que será um bom arranjo.

Melissa não era estúpida.
    Naquele momento notou que não era a primeira escolha de Carolina. E tampouco fora uma escolha que a agradara. Mas ela se casaria com Henrique, e a opinião dele era tudo que importava.

Seria melhor prestar mais atenção na mãe de seu pretendente daquele momento em diante.

Carolina não mais insistiu em indagações.
   Falaram sobre frivolidades e amenidades, embora a atmosfera entre as duas continuasse estranha.

                       ☆☆☆

Amanda tentou concentrar-se em manter a pilha de blocos em pé, mesmo quando sua mente insistia em pensar nos dias em que teria de ficar no bar. Ao pedir demissão, seu Manoel ficara absolutamente irritado, e dissera que ela era ingrata, deixando-o sem a menor consideração. Sendo assim, Amanda precisaria ficar até uma nova atendente ser encontrada. E ela necessitava um novo trabalho, pois não queria pedir ajuda ao pai, e tampouco gastar o dinheiro para emergências, guardado em uma conta bancária para ela. Na verdade, esperava não usar o valor investido.
   -Manda, você vai deixar a torre cair. – Avisou Nicole, percebendo a distração da irmã.

Manda recuperou o fio da meada, afastando o rumo de seus pensamentos;
   -Você fez uma base torta, o que esperava? Estou fazendo meu melhor aqui. 

Inácio parecia pouco interessado no palácio que estavam fazendo. Ele preferia construir muros para logo em seguida derrubá-los, só pelo prazer de ouvir o ruído dos blocos de madeira chocando-se uns contra os outros. Estava bem quieto.

Observando a mansão de seu pai, mais uma vez lembrou-se de sua antiga vida ali. Imaginou-se com o cabelo preso em um penteado elegante e firme no alto da cabeça. Um toalete caro, ricamente costurado e bordado, sob medida. E brincos e pulseiras delicadas enfeitando-a. Perguntou-se como seria se seu pai a apresentasse á sociedade, como qualquer filha em tal idade.
    Não. Aquilo não aconteceria. Não poderia acontecer.
   -Manda? – Inácio quebrou o próprio silêncio.
     -Sim?
    -Por que você não volta a morar aqui? Você não gosta mais da gente?
    Amanda suspirou, soprando uma mecha de cabelo escuro que caíra sobre seu rosto.
Como respondê-lo se não sabia explicar sua própria situação?
   Ás vezes sentia-se presa entre dois mundos, sem nunca pertencer á nenhum. Encontrara mais alívio entre as paredes de um cortiço, onde as pessoas estavam sempre tão absurdamente ocupadas consigo mesmos, que nem sequer preocupavam-se com quem ela era ou de onde viera. Uma vida humilde e sem luxos, mas com certeza melhor do que viver trancada em uma gaiola de ouro.
  -Não é nada disso. Eu... simplesmente estou morando em um lugar diferente.
—   Mas o papai disse que ela vai voltar, seu tonto. – Nicole revirou os olhos.

Amanda ofereceu um olhar de reprimenda;
   -Nicole, a sua torre vai cair. Preocupe-se com ela. 
  Inácio a olhou com olhos verdes escrutinadores.
   Os gêmeos se pareciam muito, com cabelos avermelhados como os de Heitor e os olhos claros. Mas as personalidades tinham suas diferenças. Nicole era um tanto agressiva e impaciente. Inácio possuía uma natureza doce e sensível que sua mãe uma vez dissera ser como de sua avó materna, A Marquesa Amanda.
   Amanda não se lembrava da avó, mas sabia ter uma mancha de nascença no mesmo local que ela.
  Tampouco lembrava-se do avô. Ele a segurara algumas vezes e trazia doces. No entanto, sua mãe e avó Zilda mantinham distância dele. Algo que Amanda nunca tivera coragem de perguntar sobre.
     Lembrava-se da madrasta. E do ódio com o qual ela a olhava. De como a afastava do irmão, Eduardo, impedindo-os de crescerem juntos. Heitor amava todos os filhos de coração, mas Pérola Passos parecia amedrontada pela possibilidade de que uma ‘mulatinha’, como ela chamava, roubasse a atenção de seus filhos com o marido. Filhos legítimos. Seu pai a protegeu de Pérola, proibindo a mulher de maltratá-la de qualquer maneira possível.
      Amanda comia na mesa, contudo, não tinha permissão para freqüentar os aposentos favoritos da marquesa, como a sala de música e bordado. Era um meio termo que Heitor ferrenhamente conseguira, para manter a harmonia dentro de casa.
      Após brincar com os irmãos, comeu um lanche feito pela empregada, enquanto seu pai trabalhava no escritório. Eduardo finalmente chegara da faculdade, e no momento estava no campo, administrando as fazendas, e enviando relatórios para o pai, na cidade.

                       ☆☆☆

—Quando você vai ter seu próprio consultório? – Indagou Otávio enquanto cavalgavam pelo bairro nobre da capital de São Paulo.
    -Não sei. – Leonardo respirou o ar puro do local. – Meu pai cisma em me arrastar para o campo. Se queriam tanto assim fazer de mim um doutor, porque me enfiar no meio do mato?
     -Você é o único filho.
   -Não posso assobiar e chupar cana ao mesmo tempo.
  -Então terá um diploma de enfeite na parede do escritório do papai, e uma vida provinciana, rodeado por lama nas botas, e cheiro de café.
     -Ah, mas as italianas valem a pena... – Os dois riram.
   -Então o interesse na mulata já se dissipou?
    -Não. Ainda não provei meu ponto. – Nem a moça. Acrescentou para si mesmo.
   

Algo capturou a atenção de seu amigo;
    -Então acho melhor darmos meia volta, pois ela está bem aqui.
    -O quê?!
     -Rápido, abaixe a cabeça. - Ordenou.
   Leonardo inclinou a cabeça levemente para que a aba de seu chapéu escondesse seu rosto. Também acalmou seu cavalo com palmadinhas suaves.
    -É ela. – Cochichou Otávio. – Ali, saindo da propriedade Passos. Atravessando a rua para cá... Ao que tudo indica, saiu pela porta dos fundos.
   Leonardo viu por pouco a jovem passando por eles.
    -O que ela fazia ali?
    Otávio deu uma risadinha maliciosa.
    -O senhor não sabe?
    -Em plena luz do dia? - Ergueu as sobrancelhas, não convencido.
     Ele deu de ombros;
   -Ela trabalha no bar, mas sai pela porta dos fundos de um ricaço. Pelo que ouvi dizer, o tal Heitor Passos é um viúvo que não se casou desde que perdeu a esposa, e isso já faz anos. Deve estar solitário...
    Leonardo fechou o rosto em uma careta.
   Otávio deu-lhe batidinhas reconfortantes no ombro;
   -Desculpe, companheiro, mas acho que você terá de entrar na fila.


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Notas finais do capítulo

Alguém shipa Luísa e Roberto? xD



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