Mosaico escrita por Chloe Less


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Olá pessoas!
Uma one meio dramática e meio fofinha pra vocês

Eu fui meio inspirada em State of Grace, da Taylor Swift, pra escrever essa história. Além de ter escutado ela durante todo o processo de escrita, também cito ela no meio do capítulo. Então se vocês quiserem ouvir e colocar para repetir, combina com a história

Boa leitura!



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A Terra tinha aproximadamente 7,5 bilhões de pessoas. Eu costumava brincar que um terço disso gostava da mesma lanchonete que eu, o que explicaria a fila constante que eu sempre encontrava na hora do meu almoço.

Eu aproveitava para observar cada um. Eu enxergava uma mistura improvável de padrão e individualidade, e as vezes eu sentia como se estivesse de fora, como se não fosse parte de tudo aquilo.

Pessoas que gostavam de relógios caros e ternos alinhados, pessoas alternativas e seus cabelos coloridos, haviam também os fãs da natureza. Padrões.

Aquele homem de cabelo arrumado que usava uma pulseira de miçangas com o nome do filho. A garota estereotipada de humanas com um colar com um pequeno diamante, presente da avó. O casal alternativo que usava apelidos clichês e alianças. Individualidades.

E eu sabia que havia muito mais por baixo daquilo, lutas, medos, desejos, ambições, manias. Muito além do que eu poderia enxergar as observando diariamente.

E com um mundo tão grande e com pessoas tão distintas, eu tentava entender como o Universo colocou ele em minha vida. Quais cordas o Destino puxou para que nós nos esbarrássemos.

Eu nunca obteria uma resposta, mas eu era grata.

***

Mosaico

Eu me despedi dos meus colegas de laboratório, desejando um bom final de semana enquanto buscava as minhas coisas para sair de lá.

Ser pesquisadora daquela universidade era meu sonho desde que eu descobrira o que eu queria cursar na graduação, eu estava onde eu queria agora e eu amava isso.

Meus colegas eram divertidos e fáceis de se conviver, meus superiores eram pessoas responsáveis e com uma sabedoria imensa. Eu não poderia pensar em nada melhor do que aquilo.

Assim que deixei o prédio, senti meu celular vibrar e sorri assim que abri a mensagem. É, eu não conseguiria pensar em nada melhor.

‘Sai mais cedo e consegui pedir nossos almoços, baby. Mesmo lugar de sempre?

E. C.

***

Explosão

Eu devia ter uns sete ou oito anos de idade quando eles explodiram pela última vez, mas se as outras brigas nunca saíram da minha mente, aquela também não iria.

Estava na sala de estar brincando sozinha – Renée dizia que eu era grandinha e podia brincar só, enquanto ela ia rapidinho conversar com a vizinha – quando os dois chegaram gritando e batendo a porta. Eu me escondi em um canto da sala, com medo de que eles acabassem descontando em mim.

— Eu vi, Renée! Vi com meus próprios olhos! – esbravejou Charlie.

— Deve ter visto com os olhos de outra pessoa, por que você viu errado! – retrucou. – Eu só estava dando adeus a ele, era só uma conversa inocente.

— Não adianta mais mentir pra mim, Renée!

— Você tá ficando cada vez mais paranoico, Charlie. Maluco. Louco. Igual a sua mãe – disse ela despejando veneno.

— Sua manipulação não vai mais funcionar comigo, Renée. Eu vi e não vi um olhar, não vi um sorrisinho, não vi um flerte. Eu vi um beijo, Renée. Vi a porra de um beijo! – gritou ficando vermelho.

— Charlie.

— Vamos, Renée. Admite pra mim que você o beijou, admite pra mim que está dormindo com ele. Vamos – pediu ele em um tom mais baixo, próximo dela, tocando em seu pulso. – Ou você prefere continuar olhando nos meus olhos e mentindo? Prefere continuar vestindo sua mascara de santa e me fazendo acreditar que você me ama?

— Charlie... – chamou Renée baixinho. Lágrimas caindo de seus olhos.

— Seja sincera pelo menos uma vez na vida, Renée – pediu Charlie com desgosto na voz.

— Eu dormi com ele, Charlie – falou baixinho.

— Desde quando?

— Um ano.

— Porra, Renée! – exclamou ele se afastando dela, uma expressão enojada.

— Mas a culpa é sua! – gritou Renée. – Você e essa porcaria de trabalho! Vive de plantão e nunca tem tempo pra mim!

— Não jogue a culpa dos seus erros em mim – falou.

— Como não? São tantos plantões e eu senti você se afastando de mim. Eu estava me sentindo tão sozinha, Charlie – disse Renée voltando a chorar.

— Plantões que garantem a vida boa que você tem, que você me cobrou – apontou ele. – E se você se sentia tão sozinha, por que não falou nas diversas vezes que eu tentei conversar com você? Por que preferir transar com ele ao invés disso? Não tente jogar sua falta de caráter nas minhas costas, eu não vou cair mais na sua conversa. Acabou, Renée.

— Charlie – chamou ela estendendo a mão. Lágrimas em seus olhos.

— Acabou – falou.

Foi nesse instante que eu comecei a chorar, assustada com os gritos e com o rumo da conversa, o que acabou chamando a atenção deles.

— Bella! – exclamou Charlie me notando e abaixando, sua voz calma ao falar comigo. – Vamos subir e arrumar uma mala, eu e você vamos embora.

— Você não vai levar a minha filha, Charlie! – gritou Renée entre lágrimas. – Já basta você ir, você não vai levar a minha filha.

— Ela é minha filha também e eu não vou deixar ela com você. Bella estava sozinha enquanto você andava por aí, não vou dar espaço para mais uma de suas irresponsabilidades – retrucou me levantando.

— Bella fica – disse Renée me puxando para os seus braços.

— Eu vou conseguir a guarda dela na justiça – avisou Charlie.

— Bella é minha filha e ela vai ficar comigo, você pode fazer o que quiser, mas nunca vai conseguir tirar ela de mim.

Charlie não a respondeu dessa vez e subiu as escadas, Renée me apertou em seus braços e não me deixou subir com ele.

Quando Charlie desceu, carregava duas de nossas malas de viagem, abaixou na minha altura e me deu um beijo na testa.

— Eu volto pra te buscar, Bells – prometeu.

Mas ele não voltou.

***

Sozinha

Eu não sabia o que minha mãe havia feito, mas o juiz realmente não deu a minha guarda à Charlie.

Ao invés disso, visitas a cada 15 dias e as férias de verão foram o que ganhei com ele. Então visitas mensais e metade das férias, até que o contato se resumiu a ligações breves e visitas rápidas depois que ele casou novamente.

Para mim me restou Renée.

O que mais eu poderia querer?

Ela me amava, certo? Eu era o centro do universo dela. Tudo que ela dizia era o melhor para mim.

Renée precisou arrumar um emprego depois da separação, mesmo que sua ocupação favorita fosse trocar de namorados.

Ela arranjava um namorado, então toda sua atenção era voltada para ele. Saia, viajava... Até que ela pedia algo que ele não pudesse dar, então eles brigavam e ela terminava com ele, ficava triste como se ela tivesse levado o pé na bunda, até cansar de sofrer e arrumar um novo namorado.

Estávamos na fase da troca. Ela havia dispensado o último namorado depois que ele se recusou a bancar uma viagem para os dois na América Latina. Eu? Bem, eu já tinha 14 anos. Ela não precisava mais me carregar para os lugares e eu tinha aulas afinal.

Mas ele havia recusado e ela o dispensou.

Eu não era uma pessoa cheia de amigos. Ser do clube de matemática afastava as pessoas não nerds, ser a única garota no clube me mantinha distante dos outros membros, mesmo que eu tentasse me aproximar.

E isso talvez tenha sido um dos motivos para que eu levasse as palavras de minha mãe tão a sério.

— Você devia se esforçar mais Isabella, pentear esse cabelo, passar uma maquiagem, usar roupas diferentes – comentou enquanto cozinhava. – Eu nem sei porque deixo você comprar essas roupas horríveis.

— Eu gosto das minhas roupas, mãe – defendi.

— Elas não valorizam o que há de melhor em você, docinho – falou com a voz mansa enquanto passava uma mão em minha bochecha.

— Mas mãe – tentei.

— Você não é linda. Mas com o corte de cabelo certo, roupas e uma boa maquiagem você conseguirá conquistar qualquer garoto.

— Mas, mãe – tentei argumentar de novo.

— Seus livros não vão te levar a lugar nenhum, Isabella. Nós não temos dinheiro e que faculdade boa ia querer uma Ninguém de Forks? – questionou de costas pra mim. – Você terá sorte se algo em Seattle a quiser.

— Mas eu sou inteligente, mãe. Eu me esforço – tentei argumentar.

— E quem disse que é o suficiente? – perguntou retoricamente. – Se você quiser ser alguém, quiser conquistar um homem você precisa ser bonita. Ao contrário você vai continuar sozinha, sem amigos ou um namorado. Nem seu pai ficou, Isabella, só eu. Me escute.

Eu não tinha mais argumentos naquele momento, ela estava certa. Eu era chata, desinteressante. Era por isso que eu estava sempre sozinha.

Era por isso que meu pai havia ido embora e por isso ele não se esforçava para manter contato, por que eu era sem graça.

Lágrimas desceram lentamente pelo meu rosto, o choque da compreensão de que minha mãe estava certa me tomando.

— Sh... Docinho. Não precisa chorar – disse se afastando do fogão e acariciando meu rosto. – A mamãe ama você e se você escutar o que eu digo, tudo vai ficar bem.

— Eu também amo você, mamãe – murmurei.

— Agora coloque um sorriso nesse rosto, garotas bonitas não choram – falou Renée enxugando as minhas lágrimas.

Eu a obedeci prontamente. Podia ser desinteressante, desengonçada e feia. Mas eu ainda tinha ela.

Se eu não a escutasse, ela iria embora e eu seria realmente sozinha.

Não, eu não podia deixar isso acontecer. Ela era tudo o que eu tinha.

***

Pedaços

Eu acabei fazendo amigos, os garotos do clube de matemática se tornaram mais receptivos conforme crescíamos e com o tempo eu acabei me sentindo parte do time, aceita de verdade por eles.

E havia Angela, a quieta filha do pastor de Forks, que começou a fazer parte do clube junto comigo.

Eles acabaram me mostrando que eu não estava sozinha no mundo e me fazendo acreditar no meu potencial.

Eu os tinha, mas ainda havia Renée do outro lado. Dizendo que eu não era boa o suficiente, que só ela era capaz de me amar. Ela me manipulava e eu acreditava, mesmo rodeada de pessoas que não tinham meu sangue, mas que me queriam bem.

O ápice daquilo foi quando para surpresa dela eu – assim como Angela –, consegui uma bolsa integral para estudar em Harvard. Ela passou dias tentando me convencer a não aceitar, arranjando desculpas para que eu não fosse embora.

Primeiro dizendo que não teria dinheiro para bancar a minha moradia, até que Charlie disse que havia feito uma poupança pra mim e que eu poderia usa-la. Então me julgando por aceitar dinheiro do meu pai ausente.

Foram desculpas e tentativas de manipulações desde o momento em que eu recebi minha carta de aceitação, que graças aos meus amigos não funcionaram, até eu arrumar as malas.

— Você é uma ingrata, Isabella! – exclamou ela irada. – Vai embora e me deixar sozinha! Eu, que te criei sozinha sem o traste do seu pai. Que te dei do bom e do melhor. Que fui a única que ficou do seu lado. E como você retribui? Aceitando ir para o outro lado do país e me deixar sozinha! Uma ingrata, é isso que você é.

Eu continuei em silêncio enquanto fechava minha mala pela última vez, lágrimas escorrendo pelo meu rosto.

— Você me decepcionou, Isabella – falou com desgosto.

— Eu só queria que você ficasse feliz por mim – murmurei me virando para ela, a voz embargada. – Meu sonho sempre foi estudar em Harvard, fui a melhor aluna por anos para conseguir essa bolsa. E mesmo assim estive ao seu lado todo tempo. Eu vestia as roupas que você queria, saia com os garotos que você queria, comia o que você queria. Eu estive do seu lado em cada relacionamento seu nos últimos 10 anos, eu vi cada um dos seus surtos. E a única coisa que eu queria, a única, era que você ficasse feliz por mim – falei e sai do meu quarto.

— Como ficar feliz se você vai me abandonar? – questionou.

— Eu sempre achei você era a única pessoa capaz de me amar, que ninguém nunca ia gostar de mim como você. Mas hoje eu descobri que na verdade você é a única pessoa incapaz de me amar – falei chorando.

— É claro que eu te amo. Mas você está... – começou.

— Não. Se amasse você estaria feliz, orgulhosa, não existiria um porém. Mas você está ocupada demais amando a si mesma para amar qualquer outra pessoa – falei abrindo a porta, os pais de Angela estavam ali para me buscar.

— Fica, Isabella – pediu Renée uma última vez.

— Eu queria que você fosse diferente – falei uma última vez depois de colocar as malas no carro e antes de entrar.

— Se você for embora mesmo, pode me esquecer. Não adianta me ligar, mandar cartas, nada – ameaçou.

— Eu amo você e eu queria que você me amasse de verdade – falei olhando para ela uma última vez. Batendo a porta do carro em seguida.

Os pais de Angela deram a partida em silêncio, respeitando o que havia acabado de acontecer, enquanto Ang me puxou para perto e me deixou chorar em seus ombros.

Não era para doer tanto, não era para ser daquele jeito. Mas eu chorei tudo o que tinha para chorar, prometendo a mim mesma que não deixaria com que o egoísmo de Renée me afetasse no meu novo lar.

Eu usaria as roupas que gostava e sairia com quem eu queria, faria tudo o que eu quisesse. Harvard teria Bella em sua essência, não a versão manipulada pela mãe.

Meu coração estava em pedaços, mas eu os juntaria. E eu seria forte. Nunca mais ninguém se aproximaria o suficiente para me machucar como ela.

***

Colisão

Harvard era meu sonho e eu vivia como prometido a mim mesma.

Eu morei com Angela em um dormitório minúsculo até que nós duas arranjamos dinheiro suficiente para alugar um apartamento um pouco melhor. Nós mantivemos contato com os garotos do nosso antigo clube de matemática, que também tinham conseguido bolsas em boas faculdades da Ivy League.

E eu também mantinha contato com meu pai. Mas eu havia cumprido o desejo de Renée e não a procurado mais, assim como ela não havia ido atrás de mim. Eu sabia que ela era orgulhosa demais para voltar atrás, que não me amava o suficiente para me procurar.

Eu tinha feito poucas amizades na universidade, era mais fácil vestir a armadura e manter distância das pessoas, assim ninguém me machucaria mais.

Era quase involuntário afastar a todos.  Eu ainda tinha meus amigos, mas a voz de Renée na minha cabeça, dizendo que eu não era boa o suficiente, que todos me abandonariam, continuava a me assombrar.

Até que meu orientador me incentivou a procurar uma psicóloga.

— Você é um ser humano incrível, Bella – falou Aro Volturi. – Tão divertida, amável e com uma inteligência fora do comum. Mas você nunca deixa as pessoas se aproximarem. Além de que você parece nunca acreditar no seu potencial. Eu sei que você é incrível e se acreditar em si mesma vai ser ainda melhor.

Foi o empurrão que eu precisava para pedir ajuda e foi assim que Rosalie Hale entrou na minha vida.

Ela não era muito mais velha do que eu, tinha uma beleza que me deixava constrangida. Mas aos poucos foi ganhando minha confiança e me ajudando a afastar os meus traumas.

Era uma quinta-feira e eu tinha acabado de sair de seu consultório, animada que nossas sessões haviam diminuído, o que para mim significava que eu estava progredindo. E decidi dar uma volta no parque de bicicleta.

Era dia de semana e no meio do outono, o que significava que o local estava vazio e eu podia curtir minha música sossegada. Então fechei os olhos por alguns segundos, apenas querendo curtir o vento fresco batendo no meu rosto, quando senti o impacto que me fez cair.

Abri os olhos rapidamente e fiquei impressionada com a beleza do azarado que eu havia atropelado.

Ele tinha uma pele de porcelana como a minha, olhos do verde mais intenso e cabelos cor de cobre revoltosos. Eu nunca havia visto um homem tão bonito e eu havia acabado de atropelar esse.

— Meu Deus, me desculpa – falei levantando e tirando a bicicleta de cima dele. – Eu não estava prestando atenção, desculpa.

— Eu também não estava – respondeu uma voz meio rouca, sua expressão revelava dor. – Quebrei meus óculos essa manhã e estava fugindo de um esquilo, não vi você se aproximando.

— Machucou muito? – perguntei estendendo a mão para ajudá-lo a levantar.

— Minha perna direita está doendo muito – murmurou ele fechando os olhos ao levantar.

— Preciso te levar para o hospital – falei preocupada. – Você consegue andar comigo até a entrada do parque? Você vem apoiado em mim e a gente pega um táxi até o hospital.

— Tudo bem – concordou.

Nós demos poucos passos até um outro cara nos avistar e oferecer ajuda. O que eu agradeci aos céus, porque carregar o ruivo e a bicicleta era um sacrifício.

Eu devolvi a bicicleta na portaria e voltei a acompanhar o ruivo enquanto esperávamos o táxi.

— A propósito, eu sou Edward. Edward Cullen – falou tentando abrir um sorriso em meio a dor.

— Bella Swan – respondi sorrindo.

***

Ficar

Eu acabei descobrindo que Edward era novo na cidade, estava ali por ter entrado na escola de direito.

Como ele estava sozinho na cidade, acabei me oferecendo para fazer companhia para ele no hospital até que ele tivesse alta. Um misto de culpa e recusa de me afastar dele. Ele precisou colocar gesso na perna direita e usar muletas, mas nada grave demais.

Era tão fácil conversar com ele, que quando percebi estávamos almoçando juntos e eu logo estava o apresentando para Angela e falando dele para Rosalie.

Quando ele finalmente tirou o gesso, me surpreendeu me chamando para um encontro. Um encontro de verdade, como ele disse.

Eu aceitei sem pensar duas vezes. Mas quando fiquei sozinha novamente, a voz da minha mãe voltou a me atormentar.

Eu não era boa o suficiente.

Não era inteligente o suficiente.

Edward era como um modelo de revista, eu tinha uma beleza medíocre.

Como ele poderia gostar de mim?

Quando Angela chegou em casa e me viu no sofá com um pote de sorvete, adivinhou o que se passava na minha mente e me colocou para cima. Espantando o fantasma de Renée novamente.

Eu era boa o suficiente. E se ele não gostasse de mim como eu era, então ele não me merecia.

Coloquei um vestido azul celeste, com o decote fechado e a saia aberta um pouco acima do joelho. Uma gargantilha com um ponto de luz. Uma maquiagem bem leve e um par de all star dourados. Era um encontro, mas eu não deixaria de me sentir confortável.

Quando cheguei ao restaurante que havíamos combinado, La Bela Itália, Edward me esperava na entrada.

Uma calça escura, uma camisa cinza com os primeiros botões abertos e os cabelos normalmente revoltos, hoje estavam arrumados para um lado só com gel.

Ele estava com os lindos óculos de aro dourado, mas quando me notou deu duas piscadas rápidas e abriu um sorriso largo. Meu coração acelerou nesse instante.

— Você está deslumbrante – falou me dando um beijo na bochecha em seguida.

— Obrigada, você também está lindo – falei corando.

— Sério? – perguntou ele corando também.

— Sempre na verdade – soltei ainda corando. – Mas acho que estou com saudades do seu cabelo bagunçado.

— Você gosta do meu cabelo? – perguntou parecendo muito surpreso.

— É muito bonito. Eu sempre sinto vontade de passar a mão, é meio convidativo – confessei. – E tem um ar despojado.

— Obrigado – respondeu ainda corando.

Ele segurou a minha mão e me guiou até a recepcionista, que sorriu e nos levou para uma mesa na varanda do restaurante.

Nós pedimos raviólis e vinho tinto, além de água para alternar e evitar ficar bêbado ou de ressaca.

A conversa fluiu como sempre, falando sobre nossos gostos.

Eu adorava as comédias do Adam Sandler, ele achava quase todas muito ruins, mas também era um fã de Como se fosse a primeira vez.

Nossos gostos musicais eram muito parecidos, mas eu não comia peixe de jeito nenhum e a comida favorita dele era sushi.

Era tão fácil conversar com ele, que acabamos não vendo o tempo passar. Quando o restaurante começou a fechar as portas, nós nos vimos obrigados a ir embora, mas nenhum de nós queria se afastar, então acabamos indo para o parque onde tínhamos nos esbarrado pela primeira vez.

Nós sentamos em um banco próximo a entrada bem iluminada, nós terminamos a garrafa de vinho que havíamos trazido do restaurante enquanto falávamos sobre o que estudávamos.

Quando a garrafa esvaziou, ficamos alguns segundos em silêncio, apenas apreciando a noite e a companhia do outro.

Até que eu sugeri dançarmos, o álcool me tornando desinibida, já que eu não era o que chamam de pé de valsa. Porém para minha surpresa ele aceitou prontamente.

Peguei meu celular e procurei uma das minhas músicas favoritas, State of Grace. Demonstrava completamente meu lado adolescente, a melodia era doce e a letra falava sobre amor, mas eu não conseguia pensar em uma música melhor para dançar com ele.

— Taylor Swift? – questionou com um sorrisinho.

— Fazer o que, eu amo a princesinha do pop – respondi sorrindo.

Ele pegou minha mão e sorriu, nós dois mantivemos distância enquanto fazíamos passos sozinhos, mas unidos pelas mãos. Eu mexia o quadril no ritmo da música, feliz pela noite e pela minha música favorita.

And I never saw you coming. And I’ll never be the same* – cantarolei enquanto levantava meu braço livre.

— Eu gosto da sua voz – comentou ele me fazendo corar.

Ele aproveitou o crescimento da melodia e me rodopiou, me levando para mais perto dele, nossos corpos colados.

— Você é a coisa mais bonita que eu já vi na minha vida – falou Edward ainda mexendo o corpo, mas levando uma de suas mãos para afastar meu cabelo com cuidado. – Não só hoje, mas desde o dia que me atropelou. Eu estava morrendo de dor, mas só conseguia pedir para Deus que você não se afastasse.

— Eu acho que nós tivemos pensamentos parecidos – murmurei corando.

— E então você não era só um rostinho bonito. Mas você era doce, gentil e tão inteligente – comentou acariciando minha bochecha. – E você cora.

— E você também – apontei com um sorriso pequeno.

— Mas você cora mais – retrucou rindo. – Parece que a cada momento que eu passo com você, mais coisas eu descubro. E cada detalhe novo me fascina.

As palavras dele aqueceram meu coração, que batia acelerado. Eu não conseguia fazer outra coisa a nãos ser observa-lo falar.

— E eu continuo pedindo por mais, continuo pedindo que você não se afaste.

— Eu não vou me afastar – prometi.

— Eu também não.

E para provar que não se afastaria, ele se aproximou ainda mais. Com delicadeza, primeiro apenas roçando nossos lábios, testando se eu não me afastaria mesmo. Então tornando o beijo um pouco mais profundo, segurando minha nuca com uma mão. Quando ele pediu espaço pela minha boca com a língua, minhas pernas bambearam e eu agradeci por estarmos sentados e pela sua outra mão me segurando firmemente pela cintura. Eu ignorei o gel em seu cabelo e brinquei com os fios, bagunçando do jeito que eu gostava.

Quando ficamos sem ar e nos afastamos apenas um pouco, Edward se manteve de olhos fechados, a testa grudada na minha.

Nossos corações batiam acelerados no mesmo ritmo e então eu soube, eu queria deixá-lo entrar. Eu queria que ele me conhecesse. E que ele ficasse.

***

Iguais

A medida que eu deixava Edward me conhecer, eu o conhecia na mesma medida.

Nós éramos mais parecidos do que eu imaginava.

Como o gosto por doces e o fato de visitarmos psicólogos.

Apesar de ter uma família amorosa e unida, Edward tinha problemas de auto estima e confiança como eu. Ele também havia sido quebrado em pedaços.

Uma adolescência como pária da escola pequena, pelo jeito nerd, o aparelho dentário e os óculos de grau – um tampão antes disso para resolver o estrabismo –. Então uma namorada popular e manipuladora do último ano do colegial até a metade da faculdade.

Eu descobri o quão parecido era a maneira como ela o tratava com a maneira que minha mãe havia me tratado por toda a vida. Fazendo o acreditar que mais ninguém poderia ama-lo, que ele não era bom o suficiente para ela, que ela estava fazendo um favor para ele em não ir embora.

Edward estava tão quebrado quanto eu, e apesar de ele não ter criado nenhuma barreira após o término, as cicatrizes estavam ali. Mesmo com o tratamento as recaídas aconteciam e ele voltava a não se achar bom o suficiente.

Nós estávamos em seu apartamento, eu deitada ao seu lado enquanto ele terminava um trabalho em seu notebook. Eu aproveitava o momento para observar como ele era bonito.

A luz do abajur iluminava o cabelo cor de cobre e os óculos de aro dourado davam uma seriedade para seus olhos verdes.

Quando ele terminou o trabalho, fechou o notebook e o colocou de baixo da cama, tirando os óculos e colocando em cima do criado mudo, mas sem voltar a deitar.

Ao invés disso ele soltou um suspiro alto.

— Eu estou com medo – murmurou enquanto lágrimas começavam a cair de seus olhos.

Me levantei rapidamente, passando o braço por seus ombros e o trazendo para perto.

— Eu estou tão assustado.

— Você não precisa ter medo, baby – falei com a voz suave, tentando o acalmar.

— Eu quero muito esse estágio – continuou. – Mas eu não sinto que sou bom o suficiente. Eu sou esse desastre sendo o centro das atenções e eu gaguejo quando estou nervoso. Eu nunca devia ter escolhido fazer direito.

— Não, Edward. Você é incrível! – garanti.

— Não sou, não – falou ainda chorando, me abraçando ainda mais.

— Vamos, olhe para mim – pedi o afastando e segurando seu rosto entre as mãos.

Os olhos verdes agora estavam vermelhos e inchados, tristeza em seus olhos.

— Me escute, okay? – pedi e ele assentiu. – Você ama o que estuda, não ama?

— Sim, mas eu não sou bom o suficiente  – respondeu.

— Não, Edward. Não estou perguntando se você se acha bom ou não, estou te perguntando se você ama o que estuda.

— Amo.

— E você dá o seu melhor, não é? – questionei e ele assentiu novamente. – E eu sei que isso é o suficiente. Eu sei das suas notas, elas são ótimas e eu estou acompanhando o seu esforço nos últimos meses. Você dá o melhor de si.

Eu passei a mão em seu rosto, limpando as lágrimas do caminho.

— E você tem feito tanto esforço nos últimos meses, até com sua timidez. E eu tenho tanto orgulho de você. Não existe pessoa melhor para conseguir esse estágio e se a sua professora não conseguir ver isso, ela é uma idiota – falei rindo ao final.

— Obrigado por estar aqui – falou Edward aproximando sua testa da minha. – Eu amo você – disse me surpreendendo.

— Eu amo você também.

***

Mosaico

Eu me perguntava como o Universo tão grande havia feito com que eu e Edward nos esbarrássemos.

Como dentre tantas pessoas na Terra, nós dois havíamos nos encontrado.

Eu não tinha resposta, mas eu era grata.

Nós estávamos há quatro anos juntos, dividindo um apartamento há dois e nos casaríamos em dois meses, no meio da primavera.

Edward fora contratado pela sua antiga professora e agora trabalhava em período integral. Eu estava fazendo o meu doutorado, em Harvard, e ganhando por isso.

Eu poderia desejar mais?

Atravessei o semáforo, pouco ligando para as pessoas passando apressadamente do meu lado.

Do outro lado estava ele. A camisa social com os primeiros botões abertos e um terno cinza por cima, segurava uma sacola com o que imaginei ser nosso almoço. Os olhos verdes com os característicos óculos dourados, um sorriso se abriu quando me viu se aproximar.

— Oi, baby – falou me dando um beijo rápido.

Ele pegou minha mochila e colocou nas costas, eu peguei a sacola com o almoço e entrelacei nossos dedos com a mão livre.

— Parque? – questionei.

— Com certeza – concordou rindo.

Nós caminhamos com ele falando animadamente sobre o caso novo que tinha sido designado pra ele.

Eu adorava ver aquele brilho nos olhos dele, a paixão com que ele falava do serviço. Eu sabia o que ele sentia, a alegria de ser boa em algo, de ser boa o suficiente.

Nós éramos parecidos.

Ele havia sido capaz de manter a minha armadura distante, assim como eu havia feito o mesmo com ele.

Eu tinha me acostumado com a dor de ser rejeitada. De não ser amada o suficiente. Ele entendia o que era aquilo. Sabia tanto quanto eu sobre sofrer e se sentir insuficiente.

Mas tão inesperadamente nós nos encontramos. E com os pedaços de nossos corações quebrados criamos um cenário diferente. Um mosaico.

Uma imagem nova, com respeito, segurança e amor.

Eu não previ aquilo, mas havia me transformado e eu não me imaginaria em outro lugar, sendo amada de outra maneira.

Eu era grata.

Eu o amava.


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Notas finais do capítulo

* E eu nunca previ você chegando. E eu nunca mais serei a mesma

E então, o que acharam?
Choraram? Riram? Se apaixonaram? Me contem, vou ficar muito feliz em saber.

Beijos e até breve