A Criatura de Coração Quente escrita por Cary Monteiro


Capítulo 3
Capítulo 3




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O Doutor, Clara, Ted e sua filha Ellie entraram de volta na TARDIS. O senhor do tempo começou a caminhar freneticamente pelo salão, muito pensativo.

           - Pergunta: por que um alienígena com a força para nos matar não matou nem a nós e nem à criança? Por que ele decidiu que fugir era o melhor a se fazer?

           - Será que foi porque ele estava em menor número? - Clara tentou responder.

           - Nada disso. Um animal daquele porte, eu não consigo lembrar de ter visto nada igual em nenhuma de minhas viagens.

           - Ele parecia ser um lagarto gigante, lembrou-me da rainha Alien que botava ovos…

           - Clara, eu já havia te proibido de comentar desse filme horroroso na minha presença. - Algo acionou na cabeça do senhor do tempo e ele virou-se para Ted. - Rapaz, diga, o que o alienígena fazia no quarto da menina antes da nossa chegada?

           - Huh, ele… - Foi quando Ted se ligou do que havia acontecido. - Ele estava colocando Ellie para dormir. - Aquilo soou tão estranho, mas era exatamente o que havia acontecido. O Doutor apertou os olhos diante da sentença.

           - Interessante.Esquisito, porém interessante.

           - Doutor, há alguma maneira de rastreá-lo? - Clara quis saber.

           - Não. Mas creio que logo descobriremos o paradeiro da criatura. Não há muitos locais na cidade que escondam o tamanho dela. Manterei a TARDIS sintonizada com as notícias. Agora, Ted… Você comentou que o alienígena havia matado sua esposa. - O Doutor sentiu o olhar de Clara sobre ele e acenou como que dizendo que estava tudo sob controle. - Sei que pode parecer doloroso, mas eu preciso de toda a informação que conseguir. Então, diga-me como isso aconteceu. - Ted fungou e sentou-se numa cadeira próxima ao console de comando, observou sua filha ressonar. Doutor tamborilou os dedos uns com os outros enquanto aguardava a resposta.

           - Fazem três noites hoje. O nome dela era Laurie. Ela estava doente a algum tempo, um simples resfriado, então ela permanecia em casa cuidando de Ellie enquanto eu trabalhava. Há dois dias, quando eu cheguei em casa não havia ninguém. Corri para Ellie e lá estava ela dormindo profundamente. Fui até a polícia falar do desaparecimento de Laurie, mas eu não podia simplesmente esperar. Isto não era do feitio de Laurie, sumir assim sem deixar recados, sem dizer para onde ia.

            No dia seguinte eu passei o dia procurando por ela, lugares que costumávamos ir, lugares que ela gostava de ir, mas não achei nada e voltei para casa frustrado. Durante a noite ouvi um barulho e desci as escadas armado para ver o que era. Achei que fosse Laurie que havia retornado, mas era aquela criatura horrível… Eu atirei na direção dela o que a fez fugir, quando cheguei na porta, haviam roupas da Laurie completamente rasgadas e.. Pedaços de pele dela. Os tiros haviam acionado os vizinhos e eu precisei inventar que tinham arrombado minha casa. Não era mentira, mas não havia como eles acreditarem no que eu havia visto.

           Na noite seguinte eu senti que o monstro voltaria e me preparei. No primeiro sinal de barulho eu corri para o quarto de Ellie e lá estava a criatura tentando entrar pela janela. Ela saiu ao me avistar, mas eu corri atrás dela. A chuva dificultou minha busca, mas eu não desisti e corri atrás dele. Foi quando entrei num beco achando ter visto o monstro, mas acabei encontrando vocês e, bem… - Ted terminou e voltou sua atenção à filha que dormia pacificamente em seus braços. Clara podia ver lágrimas caindo sobre a macia pele do bebê, mas preferiu ficar quieta. O Doutor passou a mão no rosto e suspirou antes de começar a falar:

           - Escute, Ted.... Sei que pode parecer loucura, mas vamos ter que agir.

           - O que quer dizer?

           - Eu tenho uma teoria, mas precisamos prová-la. Se eu estiver correto tudo vai dar certo.

           - E que teoria seria essa?

           - A criatura é a sua esposa.

           - O que?! - Ted e Clara falaram ao mesmo tempo, surpresos com a sentença do Doutor.

           - Eu ainda não entendo como isso aconteceu, mas estou quase certo de que é isso mesmo. A criatura é a mãe da criança.

           - Eu acho que eu saberia se tivesse me casado com um alienígena!   

           - Tolice, metade do planeta é casado com aliens e desconhece esse fato a vida inteira. Existem muitos utensílios e tecnologias extraterrestriais para transmutar-se em humano ou enganar a mente humana.

           - E por que um alienígena viria para cá?!

           - Para se esconder, para começar uma nova vida mais tranquila. São muitas as razões. A Terra é um planeta acolhedor no fim do universo e se você não está aqui para destruí-lo ou fazer ninguém de escravo é muito bem-vindo. - O Doutor respondeu e sorriu. Ted respirou fundo. Era muita informação para digerir. Seria mesmo sua esposa um alienígena?

           - Como pode ter tanta certeza de que o monstro é a Laurie?

           - Bom, ela arrombou e entrou na sua casa duas vezes. Ela não matou a criança, a babá e nem a nós e também tem o fato dela ter posto a criança para dormir. Mas para ter certeza eu preciso que você confie em mim.

 

          Já passava da meia noite quando o Doutor, Clara e Ted voltavam à rua onde rolara o acontecido. Por ser uma área residencial não havia barulhos além dos do próprio vento e de gotículas de água da chuva batendo no chão ao cair dos altos postes de luzes. Os quatro se mantinham escondidos atrás de alguns arbustos. E começaram a conversar.

           - Certo. O plano funcionará da seguinte maneira: Vamos deixar a criança sozinha no meio da rua.

           - O quê?! - Ted perguntou aturdido.

           - Doutor, diz que não vamos colocar a vida de Ellie em perigo só pra você ter certeza de que tem razão. - Clara comentou preocupada.

           - Ela vai ficar bem. Eu trouxe isto. - O Doutor levantou do chão um tipo de arma sinalizadora do tamanho de uma escopeta e mostrou a eles.

           - Você com uma arma?

           - Não é uma arma, é um atirador de rede em formato ergonômico de arma tamanho gê-gê, o tamanho do nosso monstro. Se ela demonstrar qualquer movimento não-materno para com o infante eu atirarei. Então, Ted, sua garotinha vai ficar bem, eu prometo. - O Doutor lhe sorriu. Ted ainda parecia cético, olhou bem para sua criança. Ela o encarou de volta com seus brilhantes olhos castanhos.

           - Ellie, o papai não tem certeza do que está prestes a fazer, mas vai ser necessário. - Ele suspirou forte e levantou-se do local que estava. Andou até o meio da rua e posicionou Ellie sentada ao chão de concreto. Ele foi andando de costas lentamente de volta ao esconderijo sem tirar os olhos da criança que parecia não entender nada daquela situação. - Eu continuo aqui, Ellie, nada vai lhe acontecer, eu prometo. - Ele sussurrou.

           A criança olhava para os lados, procurando por seus parentes e quando não os avistou, começou um choro baixinho.

           - Droga, Doutor, ela começou a chorar! - Ted tentou levantar, mas o Doutor o segurou com uma das mãos e o fez voltar.

           - Sim. Isso é perfeito. Vai chamar a atenção da mãe.

           - Se for mesmo a mãe dela, não é, Doutor? - Clara comentou descrente.

           - É claro que é!

           Alguns minutos se passaram quando um barulho diferente dos demais aconteceu.

           - Doutor, deixe-me ir pegá-la de volta. - Ted suplicou.

           - Não, não! Escute! - O Doutor levantou o dedo pedindo por silêncio, os três se calaram e começaram a ouvir pegadas. Era um barulho sutil e vinha do outro lado da rua. Quando o som ficou maior até mesmo o bebê virou a cabeça para procurar o dono do tilintar. Das sombras das árvores saiu a criatura. Visto que a rua era bem iluminada pelos postes era possível saber como a criatura realmente era.

           Ela possuía um corpo longo, esquelético e escamoso num tum azul escuro. Não somente andava como um velociraptor, as patas dianteiras levantadas, como tinha garras também parecidas com as do animal. A cabeça era esguia e possuía dois pares de olhos vermelhos, mais um no meio da testa, todos eles virados para a rebenta ao chão frio da noite.

           A criatura silvou baixo para chamar a atenção de Ellie que parecia feliz com a presença do monstro e havia parado de chorar. Quando chegou perto o bastante, abriu as garras e direcionou-as para a criança.

           - Doutor, acho melhor você usar logo essa sua arma aí! - Clara argumentou receosa. Ted estava paralisado, ele mal podia piscar.

           - Não é uma arma. Espere, ainda não. - O Doutor avisou mantendo-se em seu lugar. Cautelosamente a criatura pegou Ellie nos braços, utilizando a longa cauda para auxiliá-la a não machucar o bebê. Ellie começou a sorrir para o monstro e tatear seu rosto usando suas mãozinhas. - Ah, eu disse! A criatura é Laurie. Agora precisamos ter calma ao chegar perto, ela pode nos tratar como uma ameaça ainda. - Ele avisou.

           - Não pode ser… - Ted falou. Ele observava aquela cena completamente estático. A criatura era mesmo Laurie. - Como isso era possível?

           Quando os três estavam prestes a sair do arbusto ouviram um camburão vindo em grande velocidade. A criatura olhou diretamente para o farol do carro e rosnou. O carro freou a poucos metros dela e de lá três pessoas todas de preto e muito bem armadas saíram. A criatura recuou alguns passos e rosnou de novo tentando afugentá-los.

           - Muito bem, isso é novo. - O Doutor constatou. Ele correu para frente do monstro com as mãos para cima. - Hey, hey, calma. Está tudo sob controle, nós temos o monstro sob meu controle. - Clara e Ted se juntaram ao Doutor. Ted olhou rapidamente para a criatura que já não mostrava um olhar feroz a ele, mas um olhar de surpresa e desespero. Os três homens continuaram a lhes apontar suas armas. O maior, que parecia ser o líder, deu alguns passos para a frente.

           - A criatura é foragida e está sob custódia da empresa Ikeda. Saia da frente ou seremos obrigados a atirar!

           - Acho que podemos chegar a um consenso aqui. A criatura é mãe da criança que segura. Deve a ver algum meio de liberá-la, não? - O Doutor tentou argumentar.

             - Negativo. Zero Dois, atire!

           - Não! Abaixem-se! - O Doutor gritou. O segundo soldado atirou uma rede luminosa na criatura que urrou em resposta. Ela fechou-se como um casulo para proteger a criança do impacto.

           - Laurie! - Ted gritou e foi ao seu encalço. - A criatura silvou baixo e observou o rapaz com seus cinco olhos. Ela abriu seus braços o quanto pode dentro da rede e mostrou a criança intacta e sem ferimentos. - Laurie, é você mesmo? - A criatura afirmou com a cabeça. Ela passou Ellie para Ted por um dos buracos da rede. - Nós vamos te tirar daí!

           O terceiro soldado amarrava um gancho na rede e guinchava o monstro para dentro do camburão.

           - Doutor, não podemos fazer nada?! - Clara suplicou.

           - Dada as circunstâncias, não. - O segundo soldado mantinha a arma apontada para ambos. Quando a criatura já estava totalmente dentro do carro, o primeiro soldado fechou as portas e foi para o volante, o terceiro soldado o seguiu e o segundo foi andando de costas sem tirar a mira do Doutor e Clara até chegar perto o bastante do veículo. Assim como chegaram foram embora em grande rapidez queimando pneu no asfalto. Quando o carro já estava longe Ted correu para perto do senhor do tempo e sua companheira.

           - Doutor! É ela! É mesmo a Laurie! Ela protegeu a Ellie. Precisamos resgatá-la… - Ele não respondeu, apenas dirigiu-se à TARDIS. Ted e Clara se entreolharam e o seguiram. O Doutor fazia uma ligação para a UNIT e falava diretamente com Kate Stewart. O rosto dela aparecia diretamente no monitor da TARDIS.

           - Como assim não pode fazer nada? - O Doutor perguntou incrédulo.

           - Doutor, dezenas de alienígenas pousam na Terra todos os anos. Já é extremamente difícil manter a civilização segura contra isso. A maioria deles são foragidos, assassinos, muito perigosos, trazem consigo armas e organismos nocivos à raça humana. Só podemos cuidar daqueles que vem diretamente até nós e pedem por ajuda. Nós temos um sinal de rádio exclusivo para isto. Se este homem está alegando que a criatura pertence a ele e já está sobre posse do mesmo nós já não podemos fazer absolutamente nada. Nossa prioridade é manter a população humana segura e se não há pretensões à destruição iminente do planeta não é problema nosso. - Ela terminou a explicação.

           - Kate, ela tem família e criança! Não há nenhuma organização de apoio ao extraterrestrial? Clara, lembre-me de criar um mais tarde. - O Doutor constatou, irritado. Kate não respondeu, apenas cruzou os braços. - Kate, o que pode fazer por nós?

           - Eu vou lhe dar apenas o endereço da empresa que você comentou. Eu sei bem como você resolve os seus problemas e não quero ter nada a ver com isso. Combinado, Doutor?

           - Combinado. Você é igual ao seu pai, já lhe disse isso?

           - Mais vezes do que eu gostaria. Mas isso não vai mudar os fatos. E boa sorte em seja lá onde estiver se metendo. - Ela passou o endereço que a TARDIS começou a imprimir numa pequena impressora logo ao lado e em seguida desligou. O Doutor cortou o papel e teclou as coordenadas no console de comando.

           - Doutor, qual é o plano? - Clara quis saber.

           - É muito simples. - Ele saiu porta a fora. Clara e Ted junto de Ellie em seu colo correram logo atrás. Os quatro depararam-se com um grande prédio empresarial, um grande letreiro escrito “INDÚSTRIA FARMACÊUTICA IKEDA S/A” podia ser lido logo acima. - Eu vou me entregar. - O Doutor disse enquanto sorria.

           - Ted, tem certeza absoluta de que sua esposa tinha apenas um resfriado?

           - A única coisa de que tenho certeza, Clara, é que não tenho mais certeza de nada. - Ted respondeu atônito.

            - Antes que eu entre, err… Isso pode ser bem perigoso para todos nós, mas eu vou dar um jeito de me virar, eu sempre dou. Mas caso eu não volte em uma hora, Clara, sabe o que fazer. - O Doutor comentou antes de entrar no prédio.

           - Eu sei? - Clara perguntou risonha.

           - Se não sabe, logo descobrirá. Até mais. - Ele acenou já de costas, passou a chave de fenda sônica na porta de entrada e continuou sozinho.

           - Vamos voltar para a TARDIS, Ted. É mais seguro. - Clara abriu a porta e esperou que Ted entrasse com Ellie antes de entrar também. Ela imaginou o que poderia fazer enquanto o Doutor estivesse fora, tentando resgatar Laurie. Talvez obtendo mais informações. - Como você e Laurie se conheceram, Ted?

         Ele estava tão distraído com a pequena filha que se demorou a responder.

           - Bem, err… Nos conhecemos na faculdade de direito, ela estava alguns períodos acima do meu, mas vendo o quão desesperado eu parecia logo na minha primeira semana de provas, ela me ajudou a encarar e me deu várias dicas sobre vários professores. Desde então eu passei a sair com ela para estudos e para conversar sobre o assunto. Ela sempre foi muito inteligente e principalmente paciente. Eu podia ficar horas e horas ouvindo suas explicações… - Clara ouvia-o com atenção sorrindo ao tom doce contido em suas palavras, ela percebia o quanto ele a amava.

           - Eu sei o que está tentando fazer, Clara, mas… Não consigo lembrar de nenhum indício de que Laurie fosse algum tipo de alienígena disfarçado.

         Clara teclava no celular procurando informações sobre a empresa Ikeda na internet.

           - Você disse que Laurie estava doente. Essa empresa farmacêutica Ikeda é especializada na criação de remédios exclusivos, baseados no seu organismo, claro, se você tiver dinheiro o suficiente para pagar por tamanha luxúria.

           - Impossível. Laurie parou de trabalhar para tomar conta integral de Ellie e assim que seu tempo de amamentação acabou ela começou a adoecer. Ela nunca me contou sobre isso…

           - Bom, tem uma segunda maneira de conseguir um remédio exclusivo deles… - Clara comentou, meio incerta.

           - Diga, como?

           - Sendo cobaia.


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Notas finais do capítulo

As coisas estão ficando tentas né :v well, talvez eu demore um pouco com o próximo cap, peço perdão por isso...



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