Contos de cem anos escrita por Noemi R Almeida


Capítulo 6
O armário do céu




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Conto achado de um mundo distante que fora destruído, eis aqui o motivo:

Toda vez que chovia, toda vez que aquelas gotas salgadas saíam do céu e tocavam o chão, sempre vinham as mesmas falas, as mesmas justificativas infantis para a chuva de origem misteriosa:

—Deus está chorando.

—Deus esta lavando roupa.

E a melhor: 

—Deus está usando o banheiro.

Estas falas vinham de crianças ou jovens bobos quando percebiam que não poderiam jogar futebol, pois a quadra estaria molhada, ou quando observavam de dentro das salas de aulas a chuva que cancelava os encontros de pombinhos secretos. Os adultos deste mundo distante não acreditavam nestas falas, era quase uma tradição citá-las ao notar os pingos no rosto, e enquanto abriam os guarda-chuvas cinzas repassavam as justificativas aos seus filhos para que esses passassem para seus filhos e assim por diante. Mas as falas nunca eram levadas a sério.

Quando aos trovões: "Deus está bravo", "Deus está tocando bateria" ou "Deus está arrastando os móveis". E aos raios: "Deus está trocando as lâmpadas do céu", "Deus está tirando foto com flash" ou "Deus está treinando pontaria".

Brincavam muito com estas falas naquele mundo, mas não as levavam a sério. 

Elas não sabiam que o Deus daquele mundo distante era desastrado e bagunceiro. 

Então em um sábado, enquanto chovia pois Deus estava lavando o seu quintal, o mesmo resolveu mover de lugar um armário que ganhou no início dos tempos. Era um armário pesado, gigantesco e de madeira escura. Deus o moveu de lugar diversas vezes, pois nunca estava perfeito.

O levou à América, à Ásia e a Europa. Mas encontrou o lugar perfeito no topo do mundo.

No entanto quando estava prestes a move-lo em direção ao polo norte, o Deus desastrado tropeçou em algum dos brinquedos de seu cão Ortros e derrubou o imenso armário no mundo. O som foi  um estrondo, todas as pessoas do mundo o ouviram ao mesmo tempo, os ouvidos estouraram e tudo que todas as pessoas do mundo ouviam era apenas um zumbido.

As roupas do armário caíram no mundo como chuva, o Canadá inteiro ficou coberto com blusas sociais enquanto os rios do Brasil eram tampados por uma imensa gravata vermelha. Os cabides eram os mais mortais, quando tocavam o chão causavam explosões como bombas nucleares. Algumas pessoas ao sentir o chão tremer pensavam que a Copa havia começado, pegavam suas vuvuzelas e saíam as ruas, sendo atingidas por partes do gigantesco armário. 

E assim se foi aquele mundo, destruído com um acidente estulto. O Deus não aceitando que havia dizimado toda a sua criação fugiu para as profundezas do universo, se cobriu com uma nebulosa e dormiu para sempre.

 


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