Contos de cem anos escrita por Noemi R Almeida


Capítulo 1
Os últimos registros do Padre Rodriguês




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"Estou em meus plenos e últimos anos de vida, trouxe mais seguidores para a cruz do que o próprio Cristo e não me arrependo dos métodos usados. Tenho os demônios do passado tatuados em minhas faculdades mentais, alguns já me deixaram a muito tempo e outros ainda conversam comigo.

Mas, tenho aqueles que levarei para o túmulo.

Foi em 1606, eu ainda era um padre recém-nascido na Igreja Católica, fora escolhido junto com um grupo de padres novos para catequizar tribos no sul do Novo Mundo aonde Portugal possuía colônias. Embarcamos em um navio real, onde fomos servidos por escravos mestiços.

A terra era úmida e castiguei-me por não ter trago sapatos mais firmes e duradouros, fomos levados até uma grande mata fechada e conteúdo desconhecido. Chegamos ao entardecer. Na entrada de uma trilha aberta com facões dois não-civilizados nos esperavam, um deles carregava uma lança e o outro trazia em sua cabeça um belo cocar de penas de diversas cores. 

A tribo era conhecida por possuir pinturas brancas pelo corpo e uma língua agradável de se ouvir, foi nomeada pelos homens de Línguas Brancas. O cacique dos Línguas Brancas nos guiou pela floresta densa e seu soldado ia atrás do grupo de padres carregando sua lança.

No caminho, o indígena com o cocar nos contou o problema que assolava a sua aldeia.

—Nós conhecemos os "homem" branco a pouco tempo, ouvimos sobre seu Jesus e Deus. Nossa tribo é perseguida por Murã, um homem alto de pele vermelha, sempre surge em dia de festa e leva um dos nossos para o além. Ajude-nos e aceitaremos o seu Deus.

Tambores ecoavam pela floresta e invadiam nossos ouvidos conforme nos aproximávamos de onde seria a aldeia, aquela parte da floresta era escura e a luz de uma grande fogueira próxima confortava nossos olhos. O cacique que guiava-nos  fora o primeiro a alcançar a clareira, o grande e forte homem desmoronou diante de nossos olhos, seus olhos lacrimejaram e seu cocar caiu de sua cabeça encontrado confortável repouso no chão.

A nossa frente a tribo inteira entrara em histeria, dançavam formando um enorme círculo em torno da grande fogueira, alguns tocavam os tambores criando o ritmo assombroso, todos com sorrisos demoníacos nos rostos. As pinturas de seus corpos haviam sido arrancadas junto com a carne pintada e fios de sangue eram visíveis. 

No meio do grande círculo um alto homem de pele vermelha saudava-nos e observava a festança sorrindo, triunfante. 

 

Depois daquele dia tranquei-me em igrejas e me dediquei a cruz, rezava pelas almas dos padres que haviam cedido às tentações do demônio vermelho e se juntado a dança. Dezoito anos depois saí de meu exílio espiritual e catequizei com certa força povos não-civilizados.

 Agora nos meus oitenta anos de vida, pergunto-me quem me guiará para a vida no além: Cristo, seu pai ou o homem de pele vermelha?"


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