Futuro Imperfeito escrita por I Hershell I André Victor I


Capítulo 2
Trio Nômade




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Em Algum Lugar De Navidoren                                                                         03/06/2041

(Território Vermelho – Oeste).   

 

 

 

                                                                                           

 Aquilo era estranho.

 Amy notou que desta vez, o tempo de conversa tinha aumentado. Ela estava deitada no banco de trás do jipe-aranha e olhava com os olhos semicerrados a posição do sol por trás de seu visor roxo detalhado em dourado. Seus dedos tencionavam o enorme arco recurvo em sua mão, que de alguma forma tinha se encaixado no espaço entre os bancos do jipe. Ela olhou para o lado e sorriu maliciosamente. Então com uma das extremidades do arco atingiu um ponto entre as pernas do garoto deitado desconfortavelmente nos bancos afrente, paralelo a ela.

—Aii! – Jared se queixou. – Qual é o seu problema, não tá vendo que eu tô me preparando aqui?

 Amy sorriu e ergueu levemente a cabeça olhando novamente para o sobrado do outro lado daquela rua deserta. Nada havia mudado. Continuava apenas uma casa de dois andares velha e empoeirada entre restos destruídos do que já tinha sido um bairro.

—Eu realmente estou no tédio aqui. – disse ela voltando à posição inicial. – Acho que vou acabar dormindo se o Miles não andar logo.

 Jared revirou os olhos e tentou se concentrar novamente no que estava fazendo. O garoto estava na posição contrária a Amy, de forma que via a solo da bota da garota após o fim do banco. Suas mãos mexiam rapidamente em alguns fios de cobre, num comunicador quebrado. Ele tentava arrumá-lo já fazia alguns minutos, e sabia que se desse certo eles teriam contato direto o parceiro a alguns metros dali.

 Um vento forte e passageiro fez com que as folhas de uma velha árvore caíssem sobre o automóvel, junto com a poeira do lugar. Aquilo era horrível. O outono parecia não ir embora nunca, e estava sempre abafado naquela região. Os dois tossiram o mais baixo que podiam e voltaram a se concentrar. Qualquer som suspeito poderia dificultar o êxito da missão, embora Amy duvidasse muito que alguém conseguisse ouvi-los de dentro daquela casa. A jovem tentou se acalmar. Ela não gostava, mas seu temperamento era oscilante. Ia da tranquilidade ao nervosismo em segundos. Naquele momento, por exemplo, tinha acabado de sentir isso. A ansiedade chegava, o que a fazia tencionar os músculos com força, apertando o material sólido do qual o arco era constituído. Os nós dos seus dedos ficaram brancos. “Só queira poder mastigar alguma coisa agora”, pensou. Seus olhos, que ainda piscavam por conta da poeira momentânea, foram da janela do segundo andar para a mão do garoto a sua frente. Os dedos ágeis de Jared conectaram dois rios rapidamente e uma pequena faísca surgiu.

—Isso! – ele sussurrou sorrindo. Havia conseguido. O pequeno aparelho de formato estranho acendeu uma luz azul, e girando um pequeno botão eles conseguiram ouvir a voz de alguém pelo rádio.

“Eu já disse que não me importo se você está perdido nessa merda de cidade abandonada há uma semana, um mês u um ano, você não pode ficar aqui, seu pedaço de lixo”. A voz irritada era de um homem velho.

“Tenho crianças no meu carro lá fora, nós não comemos há algum tempo" — eles reconheceram a voz de Miles - "por favor, nos deixe ficar aqui”.

“Parece que você não ouviu o que eu disse" – falou o velho com uma risada sarcástica – "Vamos ver o que suas crianças acharão de você daqui a dez segundos. Garbage, jogue esse bastardo lá fora”.

 Os dois se olharam por um instante, então Jared notou um sorriso nos lábios da garota.

 “Ok, já que vocês não irão colaborar eu terei que tomar o local à força como tinha imaginado.” A grossa voz de Miles tomou outro tom. De suplica ao confronto. “Preciso do lugar, e vocês acabam de perdê-lo”.

 Ouviu-se um gemido de dor vindo de Miles, e em seguida um corpo rachou a janela do segundo andar. O corpo girou no ar e bateu no telhado acima da varanda, girando novamente e indo em direção ao chão com um baque surdo. “Merda”, falou Jared “ele caiu em cima do comunicador”.

Várias risadas tomaram conta do aposento onde a janela tinha sido quebrada. Amy puxou  o visor sobre os olhos para enxergar com clareza. Viu pelo menos cinco homens olhando pela janela. Um deles usava um chapéu e tinha uma longa barba cinzenta. Eles continuaram conversando entre si e já se afastavam da janela quando uma voz firme gritou.

—Vocês vão precisar de mais do que isso pra me fazer ir embora.

 Os rostos se voltaram para Miles, de pé em frente ao sobrado, e os homens se entreolharam. O velho berrou alguma coisa e todos desapareceram. Em seguida ouviu-se vozes descendo pela escada do lado de dentro e a porta da frente se abriu. Homens altos e musculosos começaram a sair, todos olhando sorridentes pro homem de meia idade a sua gente. Após cerca de vinte deles terem saído, uma figura magra e curvada apareceu, se apoiando em uma bengala encrustada de rubis na ponta.

—Ora, ora, ora. Tenho que admitir que já faz algum tempo que não vejo alguém tão resistente. – O velho se aproximou, descendo o degrau da frente e olhou para a janela no segundo andar. – Nem todos sofrem uma queda dessa e saem enfrentando tantos homens com o dobro do seu tamanho. Você nem deveria ter vindo aqui. Nós tivemos um grande trabalho pra conseguir essa casa. Matamos, torturamos e estupramos aqueles que viviam aqui antes. E agora isso é nosso. Talvez o pai das antigas moças deva estar olhando pro nada, no fundo do rio ao norte daqui. 

—Acontece – Miles sorriu – Que tudo que vejo são alguns babacas tatuados e um velho que tem um hálito que já deveria ter matado todos dentro dessa casa.

 O senhorzinho olhou para os homens ao seu lado. Seu chapéu deixava seu rosto na sombra, o que impedia que seus olhos fossem vistos. Um dos homens, de jaqueta negra e um moicano ruivo, olhava seriamente para Miles. O velho o cutucou com o ombro. - Garbage, devo dizer que após você matar esse homem, deve escrever: corajoso e idiota na testa dele. Talvez até coloquemos em uma estaca pra deixar de aviso a todos os desgraçados que passarem aqui querendo bancar o chefão. “Olhem o que aconteceu com o ultimo pedaço de lixo que achou que IRIA NOS ENFRENTAR E SAIR VIVO!” – ele berrou com as mãos fixas a bengala

—Sabe o que eu acho engraçado nos tempos de hoje? – Miles tirou duas faixas negras dos bolsos de sua velha e rasgada jaqueta de couro. Enrolou cada uma em volta de uma das mãos devagar e cerrou os punhos. – Está cada vez mais fácil matar quem te subestima.

O velho lançou o chapéu ao chão. - MATEM ESSE APRIMORADO DE MERDA.

Todos os homens avançaram e Miles se preparou para a luta, mas antes de ser atingido agaixou e girou para o lado rapidamente, desviando dos golpes furiosos. Nesse exato momento Amy e Jared ergueram-se nos bancos.

Ela fez uma sucessão rápida de movimentos, pegando uma flecha da aljava, colocando na corda e soltando, enquanto ficava de pé no banco traseiro do jipe. A naturalidade com que fazia o movimento mostrava que a garota tinha o dom para aquilo. Em menos de cinco segundos, três dos homens tinham setas atravessando seus corações. Os outros pararam de avançar confusos por um segundo, se perguntando de onde ela havia surgido. Mas a garota era apenas uma distração. Enquanto ela chamava a atenção deles com flechas Jared preparava sua arma maior. Assim que Miles rolou para o lado ele apertou rapidamente os comandos na lateral do volante. Em segundos, uma espécie de pequeno canhão se montou a sua frente. Ele segurou a pesada arma após se levantar. Parte dela saia de uma abertura perto do capô. O jovem só teve que encaixar os braços em duas entradas e girar a pesada arma. Um sorriso se formou na lateral de sua boca quando ele observou com atenção a mira holográfica a sua frente e estourou os miolos de Garbage, que estava a quinze metros dele. Ele sentia um forte tranco para tras a cada tiro no arranca-cabeças. O movimento fazia todos os seus músculos doerem, mas ele adorava, e por isso era a arma perfeita para ele. O sangue pintou a roupa dos companheiros do homem, que pareciam ainda mais perdidos. O que ocorreu a seguir foi extremamente rápido. O segundo tiro, uma esfera de pura energia, acertou o homem ao lado da primeira vitima.

Aproveitando a desordem formada no grupo pela situação repentinamente mudada, Miles voou para cima de um mercenário que começava a correr, fugindo para dentro da casa. Ele acertou o homem por trás e o derrubou, socando até sua mão doer. Para o azar do homem caído, elas não doíam facilmente.

Amy viu que Jared estava se divertindo ao seu lado, matando os homens em fileira, fazendo um semicírculo, e sentiu uma pontada de inveja. Ela decidiu que era hora de mostrar o que tinha de legal. Suas mãos procuraram uma flecha especial, em um compartimento diferente na aljava e ela mirou em um cara barbudo que tentava pegar sua arma em um dos bolsos. Ele estava no canto esquerdo, o lado onde nenhum homem tinha sido atingido ainda. A garota soltou levemente a flecha, que sibilou no ar e travessou um dos olhos da vítima. Em seguida ouviu-se bipes rápidos na ponta da flecha, que explodiu, estilhaçando sua cabeça e fazendo os corpos dos companheiros voarem com a onde de choque. Amy gritou de satisfação e retirou o visor roxo jogando o cabelo negro para o lado. Queria ver aquilo em cores.

—Você gastou uma flecha especial? – Jared olhou assustado.

—Claro. Você viu o efeito que deu? Tem cérebro a dez metros daqui.

 A bagunça formada impediu que os mercenários se concentrassem em pegar suas armas, pois se atropelavam tentando desviar dos lançamentos do canhão ou das flechas. Aos poucos, um por um eles foram caindo, até que em menos de trinta segundos o único de pé era o velho com a bengala, que retirou os óculos devagar para olhar aquilo.

Miles se levantou, com o sangue de um terceiro homem escorrendo das mãos e o olhou friamente.

—Eu disse que queria a casa.

—Nós podemos... – O velho parecia desconcertado. -... Eu tenho muitos pertences... Olha, meu irão também era um aprimorado... Eu só podia agir de maneira tão egoísta porque esses homens... Eles tinham que... Sabe? ...No fim somos todos humanos, e humanos erram. Se me der uma chan... - foi interrompido por uma flecha negra, que atravessou sua garganta sem que ele percebesse. Suas mãos foram a garganta o que fez com que a bengala caísse, e ele tentou se segurar em algo, mas não havia nada. Caiu pra trás e agonizou deitado enquanto sangue esguichava para fora pelo pescoço. Olhou uma ultima vez para os mercenários decapitados, desmembrados e mutilados, e nem conseguiu fechar os olhos antes de parar de respirar.

—Aha, eu acertei o último. – Amy ergueu os braços dançando e deu um soco no ombro de Jared. – Seu babaca de merda. Eu falei que ia matar o velhote.

—Não falou não. – Jared massageou o local atingido e saltou do jipe.

—Mas eu pensei. – ela disse.

Três horas depois, o lugar que outrora havia sido um bairro movimentado começou a escurecer.

O céu já não era o mesmo há algum tempo, principalmente em Navidoren, que estava sempre seco e empoeirado. Antigamente, o pôr-do-sol tinha tons de laranja e vermelho, e os humanos tiravam fotos da paisagem. Nos dias atuais, o céu era um roxo acinzentado e azul escuro após o por do sol. Era como se uma camada de sujeira impedisse que eles pudessem ver a luz. No deserto a alguns quilômetros dali as tempestades eram recorrentes a noite. Raios e trevas tomavam conta do deserto, e inúmeros grupos de assaltantes, mercenários e malfeitores atravessava aquele solo rachado em busca de outros lugares para saquear.

—Apenas um copo – Miles falou ao se sentar.

 Ele havia sido o último a tomar um banho frio no nojento banheiro do segundo andar, e agora que se sentia mais limpo, sentava-se confortavelmente em uma cadeira que rangia a cada movimento, na grande sala principal no andar inferior.

 Jared havia dado uma olhada no sobrado, vasculhando estantes, e achou pão, biscoitos, queijo e carne seca na despensa relativamente grande atrás da cozinha. Ele foi até a mesa e a preparou da melhor forma que podia, com pratos e talheres colocados de forma cuidadosa e organizada. Aquilo até pareceria um jantar normal, se ao se sentarem o cheiro de morte não os alcançasse e as janelas não caíssem sozinhos perto da porta da frente. Jared sabia que era sua culpa já que tinha errado um dos tiros do canhão e feito um buraco ao lado da porta de entrada. Além de rachar as janelas. De acordo com Miles, aquilo teria que ser fechado de algum jeito, se eles não quisessem que algo estranho da noite entrasse nos próximos dias. Mas por hora, tudo que a pequena família queria era comer tranquilamente como pessoas normais, o que estavam longe de ser.

 Amy, que tinha olhado o andar de cima e o porão, achara dezenas de caixa de vinho e cerveja. Aqueles mercenários tinham pilhado tanta bebida quanto todo o alimento disponível na casa. Ela notou, após olhar cômodo por cômodo, que a rotina ali parecia ser a mesma. Jogavam, bebiam e caçavam, como demonstrava as diversas peles no porão. Ela chegou a conclusão de que eles estavam ali a algumas semanas. Quatro talvez. Após ter certeza de que tudo estava seguro, ela havia levado levou um vinho escuro de 1997 para a mesa. Miles abrira a bebida envelhecida e agora despejava um pouco no copo dos jovens. E uma quantia relativamente maior no seu próprio copo. Ele sorriu e o ergueu em um brinde. Já faziam alguns meses que eles não tinham tanta segurança. Eles tinham um estilo nômade de viver, que consistia em procurar um lugar novo antes que as coisas ficassem perigosas demais.

—A vida.

—Aos nossos hospedes bondosos que se sacrificaram para nos proporcionaram mais uma noite vivos. – a garota sorriu sarcástica.

 Jared a olhou sério e todos brindaram. A bebida era forte e Miles degustou rapidamente antes de engolir. Jared cuspiu de volta disfarçadamente e tossiu. Ele ficou vermelho e apoiou a testa na mesa respirando fundo.

—Relaxa Jared. Você nunca tinha provado.

—Ele é meio fracote, sem querer ofender. – Amy tinha esvaziado sua caneca e a enchia novamente.

 Jared a olhou como se ela não fosse humana. – É bizarro o gosto. – ele olhou pra Miles, que parecia incrédulo com a garota, que levava novamente e levava a mão a garrafa. Miles puxou rapidamente e a fitou.

—Mais.

—Não. Você só tem dezessete.

—Quem se importa. Não estamos mais em dois mil e vinte. Por favor.

 Ele olhou pra Jared, que deu de ombros. Miles deu a garrafa devagar. – Ok. Vamos ver até onde isso vai.

Amy virou mais três copos após aquele e só então começou a comer.

—Isso definitivamente é muito melhor que aquela merda que a gente tomou na ultima parada. Vinho me deixa viva.

—Não fale isso. – Miles mordeu um pedaço de carne. – Aquilo é derivado do hidromel. A bebida preferida de um Deus nórdico.

—Thor não existe – Amy resmungou mastigando um biscoito.

—Por que diz isso? – Jared largou o garfo. – Você sabe muito bem que ele existe. Miles era seu parceiro de luta.

—É? Então cadê ele? Porque eu não vejo nenhum deus trazer chuva a Navidoren. Isso aqui é quente como o inferno, e cheio de gente bem pior que aquele hidromel falsificado.

—Amy, aquele hidro...

—Por um acaso você se lembra qual foi a ultima vez que viu esse Thor, Miles? Se ele fosse um deus ou sei lá o que estaria aqui nos ajudando. Afinal, você não era um Vingador também?

 Miles parou por um instante.

—Ele foi um dos desaparecidos depois da grande guerra. Acho que deve ter morrido. Não foi nada tranquilo. Mas garanto que existiu. Uma pena vocês trem nascido apenas alguns anos depois daquela bagunça toda. O mundo era até incrível.   

—O que eu não daria pra ter internet – Jared tirou um amontoado de peças do bolso e começou a separá-las do lado do prato.

—Ei, o que falamos sobre arrumar isso na janta? – Miles ergueu uma das sobrancelhas

—Ele era mesmo loiro? – Amy olhava seu copo. – Quem mais sumiu naquela guerra?

—Quase todos – o homem apoiou a cabeça em uma das mãos e olhou entediado pra ela. – Você sempre pergunta isso.

— E você sempre responde da maneira menos detalhada possível. Eu sei que não curte lembrar, mas deve ter sido uma loucura nos dias seguintes.

—É, foi mesmo, o mundo se remodelou todo. Os mais fortes escolheram seus locais e agora temos esses quatro países gigantescos no planeta. Talvez ajam mais, só que por enquanto não pretendo ver se tem mesmo.

—Não é estranho estarem exatamente no norte, no sul, leste e oeste?

—Não estão exatamente – disse Jared sem tirar os olhos do objeto. – recentemente fiz algumas contas, e observando a bússola vi que estamos um pouco a noroeste do centro, no Mar da Discórdia. Ou seja...

—Ou seja, você é um nerd – ela revirou os olhos.

—De onde conhece esse termo?

—Achei em um livro esses dias. Tava na escrivaninha daquela casa que arrombamos em Monte Pesado. O autor usava vários termos antigos.

—Você anda lendo é?

—Ela sabe fazer isso? Achei que não era capaz – Jared disse se controlando pra não rir.

—Ah, então o sabichão aí ta me zoando, mas nem sabe diferenciar as cores.

—Ei, Eu não tenho culpa de ser daltônico. Além disso vermelho e roxo são muito parecidos, de acordo com Miles.

—Porque ele não quer que você se sinta um...

O relógio de Miles soltou um bip longo e alto. Os dois jovens olharam pra ele. Sempre que aquilo ocorria era porque algo interessante iria acontecer.

—Senhores – ele levantou – eu tomei a liberdade de lhes dar uma pequena surpresa a essa noite. Sigam-me até o segundo andar. 

 Os três estavam olhando para baixo, sentados na borda do telhado observando os lagartos chegarem.

 Eram criaturas horripilantes. Com pele escamosa e verde escura. Até aí não se diferenciavam dos animais comuns. A mudança era o tamanho e a inteligência. Aqueles seres sibilantes corriam ao redor dos corpos mortos e pareciam sorrir de satisfação. Se empurravam, agitavam as caudas e chocavam-se contra as paredes de madeira do que havia sobrado das casas na rua. Era como um grande playground para répteis.

—Essas coisas já foram pessoas um dia. – disse Miles com os braços apoiados no chão atrás dele. A sua direita Jared continuava tentando arrumar o aparelho quebrado, e a esquerda Amy se imaginava atirando flechas nas criaturas. Calculava a distância, movimentação do vendo e a velocidade deles.  

—Como viraram esses... Bichos?

—Ah, foi um cientista. Alguma coisa Connors. Era bem louco, e seu ultimo teste deu errado na grande guerra. Ou certo, depende do ponto de vista. Pessoas inocentes de bairros inteiros viraram isso aí. Mas fazer o que né. Acho que até soltam algumas palavras as vezes.

—Por que estão aqui?

—Pessoas mortas atraem esses caras. Principalmente pessoas mortas que atiravam neles toda noite pra mante-los afastados. Estão sempre a espreita no deserto ao sul. Só que eles não sabem que não estão ingerindo apenas pessoas mortas.

—Como assim?

—Observe.

 Os olhos reptilianos de um dos lagartos avistou os três em cima da casa e ele semicerrou os olhos interessado. Logo perdeu o interesse ao ser atingido por uma calda. Naquele momento os dois jovens olhavam interessados as figuras correndo pela calçada a vinte metros da casa. Miles se ergueu rapidamente e pegou metade de um braço que estava ao seu lado.

—Ei, pessoal lindo. Olhem esses dedos suculentos. – ele lançou o membro para frente e as criaturas se aglomeraram abaixo do ponto em que iria cair. Ele nem havia alcançado o solo empoeirado quando um dos seres alcançou o pedaço de carne. Assim que mordeu, a bomba colocada dentro do braço explodiu. Ativando pequenas bombas dentro de todos os corpos ali. Um show de luzes se iniciou, quando um por um os lagartos explodiram. Escamas, sangue verde e gritos se espalharam pela rua aquela noite.

—Esses bichos podem ser até interessantes. Mas já tá na hora de serem exterminados. – Miles sorriu.

 Amy olhava perplexa aquelas coisas pintando o chão. Ela estava de boca aberta. Já o garoto ficou interessado por um momento quando viu duas cabeças sibilantes explodirem de uma vez, mas depois olhou para a lua ao longe, pensativo. Miles notou no mesmo momento que ele estava preocupado. 

—Qual o problema?

—O jipe. Ele precisa de mais energia solar pra funcionar. Mas os níveis de poeira só aumentam. Logo vamos ficar sem energia pra continuar.  Miles escutou com atenção e notou quanto o garoto era maduro. Talvez aquele modo de vida o tivesse feito amadurecer mais rápido.

—Nós podíamos levá-lo para os montes do deserto. O jipe subiria tranquilamente, certo?

—Não dá. – o garoto moveu a cabeça. - Eu calculei a distância. E considerando o tanto de bateria que nós temos pra chegar até lá... Não daria pra chegar lá.

 Aquilo era quase irônico. Porém o problema era sério. O jipe-aranha era tudo que permitia que eles continuassem viajando e conseguindo sobreviver naquele lugar estranho.

—Nós vamos dar um jeito. Eu garanto. Não se preocupe com isso agora. - Miles cruzou os braços e esticou as pernas. Ele olhou sorrindo para Amy. Ela olhava para o céu, onde poeira vermelha e verde se fundiam sob a luz da lua. Os três olharam aquilo e respiraram fundo. Os próximos dias não seriam nada fáceis.

Mas eles já estavam acostumados.


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