Venha Comigo. vol 2: Onde Está o Doutor escrita por Cassiano Souza


Capítulo 8
Estou aqui


Notas iniciais do capítulo

Por vários motivos gostei desse capítulo, espero que você também goste, mas não tenho certeza. E de novo algumas coisas do UE.



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Era um dormitório enorme, e duas crianças estavam ali, dois garotos, distintamente se comportando e agindo, onde um se encontrava cabisbaixo e calado de costas para o outro, e de frente à parede sem graça. Mas, já o outro garoto, arrumava animado e bastante feliz a uma pequena maleta, enchendo-a de roupas e alguns dos seus poucos brinquedos, quebrados e sujos. E fora do dormitório, mas observando tudo lá dentro, um homem e uma mulher conversavam baixo um ao outro.

— Você disse que havia gostado do mais quieto. - Lembrou o homem.

— É, mas não sei... Todas as outras crianças disseram ter medo dele!

— Como poderiam? Não é sobrenatural, é?

— Não, apenas frio e impaciente, antissocial e meio esquizofrênico.

— Todos querem ir embora daqui. Vai mesmo acreditar nas outras crianças?

— 20 vezes.

— O quê?!

— Foi o que as funcionárias disseram, aquele garoto foi recusado 20 vezes.

— Coitado.

— Coitado?! Deve ser um futuro psicopata, isso sim.

— Bem, psicopata ou não, ele tem um coração. Só espero que consiga sair daqui algum dia, e ser bem sucedido talvez.

— Hum, você devia dizer isto para o nosso novo filho ali. - Apontou para o outro garoto. – Já terminou com as malas, rapazinho? Venha para a mamãe.

E assim, correu o garoto feliz com a maleta, para os braços de mãe. A felicidade estava no sorriso do garoto e de seus pais, e a tristeza na parede e no olhar do outro, que continuou cabisbaixo, e deixando lagrimas escorrerem por suas bochechas. Mas a tristeza encontrava-se em outros lugares também, como em uma solitária galeria, enorme e fria, onde o velho Felix admirava agora de olhos sedentos por atenção ao seu tão precioso objeto de imponência, o tão caótico Juiz Das Estrelas. A ferramenta que ele faria com que todos o-escutassem.

— Por que você voltou para mim? - Pergunta Félix à máquina. – O seu julgamento caiu sobre o mundo, tudo foi recolocado em algum lugar novamente. E você voltou. - Continuava encarando. – Por quê?

Obviamente, o Puritano Cego nada iria responder, era uma máquina, semi-consciente... Porém, sem qualquer capacidade de expor a opinião que fosse.

— Acho que nós pensamos igual. - Esperava respostas. – Somos iguais. Nunca irá me responder, mas sei que pode me ouvir. Bom... Na verdade não sei, mas tenho esperança. - Admirava o brilho da abóboda da peça. – E tenho algo que sei de que irá gostar.

Trazendo uma espécie de cadeira de rodas, cheia de cabos, aparelhos eletrônicos e com um tipo de capacete metálico, apresentava sorridente aquilo, para a outra coisa.

— É assim... - Sorri. – É assim que conseguirá me ouvir. Está me escutando?

 Gargalha vestindo o equipamento.

***

Olhando pensativa através da janela da van e enquanto ia sentindo o leve balanço da viagem, Grace pensava em toda a história que Dodo havia lhe dito, sobre o que havia acontecido com todos os que sumiram do mundo, e sentia-se agora absolutamente culpada ou fracassada. Não estavam indo para lugar algum em especifico, estavam apenas tomando distancia de Felix e seus homens, e encostava agora a van, entre algumas arvores na beira da estrada. Lá dentro, entre os muitos equipamentos e a sua bagunça, Dodo preparava agora um café em um mine fogão, e servia à colega abatida. 

— Obrigada. - Agradeceu Grace. 

— Não fique triste! Não foi sua culpa.

— Não é por isso.

Dodo esperava uma resposta. A ruiva esclarece:

— É que eu fico pensando... E se ninguém nunca mais puder voltar? E o Doutor? E todos? E o mundo, como ficará?

— Problemas... Sempre ocupando a nossa mente, mas eles não merecem a nossa mente, pense em outra coisa.

— Você faz isso?

Dodo desvia o olhar à janela:

— Tenho que fazer! Estão sempre atrás de mim. Mas agradeço, foi um problema que me fez conhecer o Doutor. - As duas riam.

— Comigo também.

— Acho que com  todas!

— O Doutor até disse que você havia morrido.

Dodo toma um olhar desconfortável. Grace continua:

— Eu também morri um dia! Porém por incrível que pareça ainda estou no mundo real. Mas e você, como foi?

— Uma história de amor e ódio.

— São as minhas favoritas.

— Mas não as minhas, por que precisamos de ódio?

— Bem... Não precisamos. Mas somos assim, foi para isso que a nossa raça acabou evoluindo.

— Ou foi induzida. Quer saber como eu fui e voltei?

Grace confirma com a cabeça. Dodo revela: 

— Vamos lá, acidente de trabalho. Mas na verdade, só o cotidiano, foi um dos seguidores do Mestre, ele me matou. Eu estava no caminho dele.

— Coincidência... Foi o Mestre que me matou também! - As duas gargalham.

— Então somos meio parecidas, só espero que não acabe como eu.

— E como você acabou?

Dodo permanecia calada, no seu olhar, apenas coisas como talvez... Decepção, arrependimento, cansaço e até temor, as suas ambições, capacidades e saudades buscavam alguém do seu passado, e nestes momentos... Ela se sentia até mesmo como o próprio Doutor.

— Continuando. - Diz Dodo. – Eu estava morta e estirada realmente, mas eu tinha alguém que nunca desistiria de mim.

— Era o Doutor?

— Não, ele era jornalista, não médico.

Grace se expressava saliente com as sobrancelhas. Dodo envermelha-se: 

— Não! Pare de me olhar assim.

— Continue, é uma das primeiras histórias de amor que ouço desde que entrei na TARDIS!

— Enfim, ele voltou no tempo por mim, usou o Anel do Tempo, e... Ele me salvou.

— E o que mais? Casamento?

Dodo sorria chateada:

— Sim. 

— Todos precisaremos disso um dia.

— Mas com missões mesmo assim, e brigas, e um filho.

— Filho? E as missões não acabaram? Como conseguiu tempo?!

— Parando aos poucos. - Dava uma pausa. – E depois de cinco anos de família, tendo o meu filho levado, sendo culpada, e abrindo mão do meu amor.

Grace desfazia imediatamente o seu vibrante sorriso, parecia uma história tão bonita a que Dodo havia tido, mas mesmo assim... Nada é tão perfeito o quanto parece, ou dura o quanto queríamos.

— Eu sinto muito. - Lamenta a médica, acabando de tomar o café. – Mas o seu filho...?

— Eu não sei, eu não sei onde ele está. Mas não, não foi o Ditador que o-levou, e é por isso que eu continuei nesse ramo, descobrir. - Tentava continuar. – Descobrir se quem levou ele foram os alienígenas ou... A brutalidade humana.

Grace apenas encarava o chão, sabia que o tempo todo na TARDIS elas estavam cercadas por aliens perigosos, porém, conhecia também e muito bem a maldade do seu povo.

— De onde você tira forças? - Pergunta Grace. – Para continuar, de onde vem?

— Desse café. - Levanta a xícara. – E de umas visitas num álbum de fotos, ou de encarar o espelho todo o dia de manhã.

— Mas e o seu marido, onde está?

— Com a esposa e filhos dele, tive que abrir mão disso. Ele nunca aceitou o meu trabalho, e eu tinha que continuar com isso, indo em busca de nosso filho. Ele desistiu, ele é ele, homens sempre são os primeiros a desistirem.

— É. - Encara triste a vista da janela. – Mas conhecemos um homem que é diferente.

— Sim, mas não apenas exatamente “um homem”, ele é a pessoa mais diferente, diferente de qualquer um. A pessoa mais bondosa, corajosa e amargurada, e o mais humano de todos no mundo. Porém, tendo que ser um alienígena.

— Mas ele sumiu. - Paravam um minuto caladas. – E há outra coisa errada nisso, eu estou sendo punida, mas você e Felix ainda se lembram dele.

Dodo revela um cordão envolta de seu pescoço, usando uma chave como pingente.

— O que é isso? - Pergunta Grace.

— A chave da TARDIS, acho que é ela quem está me protegendo.

— Mas a TARDIS foi embora pela alteração que o Castigador faz, como uma de suas chaves poderia ainda estar aqui? E por que eu também não tenho uma?! - Grace observa a peça.

— Porque o Doutor é muito desconfiado, espero que ele fique mais liberal algum dia! E eu também não tenho, tive que rouba-la do tumulo do Jamie, outro amigo do Doutor. Acho que a chave só não foi embora também porque mesmo com tantas alterações, alguma falha sempre deve restar, um pequeno cisco sempre consegue passar por uma peneira.

— E Felix, por que ele ainda sabe quem sou eu?

— O Puritano é semi-consciente, porém isto ainda é uma consciência, ele tem desejo de castigar, e Felix também, então com certeza modificou todo o espaço-tempo ao seu redor de acordo as suas necessidades. E já que o Doutor sumiu, ele nem deveria estar aqui, mas ele é esperto.

— E ele tem todo este poder?! O mundo, como fica? O universo aceita isso?

— Nem sempre, a natureza não consegue se reajustar completamente. E vemos todo este efeito por aí... Todos estes desastres naturais intensificados na virada do século, o aumento de doenças, e até o aquecimento global.

— Aquecimento global?! Bem, pode até ser, mas temos sim culpa em um monte de coisas. Mas se for assim... Faz todo o sentido aquilo que eu e o Doutor vimos. - Tomava olhos distantes. – Consigo me lembrar agora.

— O que vocês viram?

— Um mundo em ruínas, o Mundo da Antiga Era. Estava acabado, e aquele era o mundo do Puritano, era um mundo de descendentes de “deuses”, como se acabariam?

— Pelo Ditador. E é assim que acabará a Terra, desastres e mais desastres acontecerão, e temos um bem perto daqui.

— Do que está falando?

— Um furacão.

Grace encarava desentendida. Dodo explica:

— Sim, eu sei, na Califórnia não acontecem furacões! Mas como já discutimos, a natureza é sensível, e as leis do universo não irão digerir tudo o que o Ditador lhe oferecer.

— E não podemos fazer nada a respeito?

— Podemos, mas não significa que iremos conseguir. Mas se não revertermos isto logo, amanhã um furacão com ventos de aproximadamente 380 quilômetros por hora arrasará a sua cidade.

— Então vamos tentar trazer o Doutor! Você tem a chave da TARDIS, o Doutor me contou uma vez que... Energizando a chave por um certo fluxo de energia podemos chamar aquela nave!

— E você acha que eu nunca tentei?

Grace desmanchava completamente a sua face de esperança. Dodo finaliza:

— Estamos sós, Grace.

E antes de alguma frase indignada que a doutora poderia lançar, um estarrecedor som rouba completamente a atenção das duas, e o rádio começava a tocar sozinho, porém, não transmitindo músicas, e sim, transmitindo uma linguagem completamente desconhecida.

— Quem está falando isso? - Pergunta Dodo, se voltando para o rádio.

— Conheço essa voz! - Tentava ouvir melhor. – São os Minocrisos, eles chegaram. - Arregalou os olhos.

— E como nos acharam?!

— Não acharam, acho que isto não é para “nós”, é para o mundo inteiro. Afinal, o Juiz está escondido pelos equipamentos de Felix, não sabem onde ele pode estar exatamente.

E aos poucos, as estranhas vozes acabavam se familiarizando, e estavam completamente legíveis às humanas.

— Aliens falando inglês, sempre é assim. - Diz Dodo.

— Tradução universal básica. - Escutavam atentas.

E em todos os rádios, televisores e telefones em geral, ouvia-se a mesma mensagem:

— Entreguem o Juiz, entreguem o Juiz. Tempo, uma hora, tempo, uma hora. Entreguem, entreguem, nossa propriedade, nossa propriedade. Contrario, tomar a força, contrario, tomar a força. - Continuava-se a repetir.

— Querem o Juiz, o que faremos? - Pergunta Grace. – Não podemos entrega-lo, eles também não possuem boas intenções.

— Mas também não podemos entrega-lo ao Felix. O que me faz perguntar, o que faremos?! As naves desses... Minocrisos já estão em orbita, e quando o tempo que deram acabar... Invadirão o planeta.

— E além de tudo, Felix está com meu amigo. Acho que talvez seja a hora de descobrirmos o que é isso então. - Grace tira de seu casaco o estranho aparelho que Mark havia lhe dado. – Você sabe o que é isso? Um amigo achou em um círculo no trigo. Tem alguns caracteres, mas não dá para entender. - Entregava a Dodo.

— É claro que dá! - Dodo observava os botões. – A tradução dos Minocrisos, deve ter sido ela, traduziu isso também!

— Então isto deve ser deles!

— Não, é melhor, aqui diz... “Sinalizador de área criminal”, e sendo assim, possivelmente são dos...

— Rinocerontes armados, a polícia do espaço.

— Você resume muito bem!

— Mas não podemos simplesmente chama-los!

— Por que não?!

— Começariam uma guerra! Eles e os Minocrisos lutando até a morte pelo Ditador, e a Terra sendo o campo de batalha. Temos que dar outro jeito, isto só pode ser a última escolha.

— Você já se aventurou muito, não é? Vejo dedicação e coragem em sua voz.

— Não estou há tanto tempo na TARDIS, mas já pascei muitas coisas com o Doutor. Aprendi coisas, e fiz coisas, já vimos um pouco de tudo. E além disso, sou médica! Tenho que ter coragem, as pessoas sempre entregam as suas vidas nas mãos de um doutor.

— Então você sabe o que faremos agora.

— Sei. - Respira. – Dar uma escolha ao inimigo.

***

E após ter recebido uma ligação minutos atrás, e já estando impaciente, tentava agora fugir do estresse, em sua sala, fumando charuto, e andando de uma lado para o outro, era isso que Felix fazia.

— Elas são sempre assim. - Soprava a fumaça, e Tim acabava tossindo. – Por que a sua namorada está demorando?

Tim responde:

— Ela não é minha namorada.

— E por que não?

Tim tentava imaginar uma resposta:

— Porque... Porque ela é muito ocupada? Ela é a senhora sem tempo.

— Que argumento mais patético. - Riu.

— Ou talvez porque... Porque a Grace não é assim. 

Felix olhava desentendido. O ruivo prossegue:

— Ela é legal, divertida e... Bonita. Mas ela não sai com qualquer um, e sei que eu sou um desses.

— Então são “amigos”? Nunca entendi esta palavra.

— O senhor já teve um amigo?!

Felix encara feio. Tim conclui:

— Todo mundo precisa de um amigo.

— Amigo... É isto que irá leva-lo para o fundo do poço, é por causa de um “amigo” que você está aqui até agora, e é por causa de um amigo que você com certeza nunca mais sairá! 

Encarando sem respostas, Tim desviava o olhar para a porta da sala.

— Pois o Tim está certo, Félix. - Chegava Grace. – Atrasada?

— Muito! - Soprou fumaça.

— Grace?! - Berra Tim, alegre.

— Eu! - Correspondeu, correndo para abraça-lo. – Você está bem?

Felix revirava os olhos. Tim avisa:

— Estou, mas não posso abraça-la. - Estava sentado em uma cadeira e de braços para trás. – Algemas.

— Ah sim, sempre algemas, alguém sempre tem que ter uma por aí! - Comenta Grace, sem jeito.

— Tem?!

— Esqueça isso.

— Temo que terei que interromper os dois.- interrompe Felix. - Mas preciso saber... Irá colaborar agora, doutora Holloway?

— Acho que ainda não.

Felix suspira impaciente. Grace avisa: 

— Vim fazer com você o que eu sempre fazia nas horas vagas da faculdade. Conversar muito.

Após um falso sorriso, e ao invés de uma resposta, Felix apenas joga o seu charuto na lixeira. E nos computadores e televisões daquele prédio, cidade e planeta, a contagem da última hora da raça humana tomava inicio.

 

 


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Notas finais do capítulo

Sim, eliminei a possibilidade da chave trazer a TARDIS, e o Doutor viria junto, assim como Grace disse, isso porque nestas alterações que a máquina faz imagino que como ela eliminou o Doutor então tudo que ele tem vai embora, então se ele voltasse viria com a TARDIS, já que a TARDIS foi junto com ele.
O cara que matou a Dodo foi na verdade um soldado da UNIT, mas hipnotizado pelo Mestre, então resolvi chama-lo de seguidor. E o marido dela se chama James Stevens, então preferi não cita-lo, para não confundirem com o Steven ou com o Jamie, ambos amigos do Doutor. E esse marido dela é coisa do UE, mas isto dela ter se separado foi coisa minha, mas isto dela ter um filho é coisa do UE. O seguidor do Mestre matou a Dodo sem o Stevens saber ao menos de que ela estava gravida, e ele ter voltado no tempo por ela vem do UE também. Então aproveitei este filho, e usei ele como maior motivo para ela estar aqui na história. Cujo tema envolvendo a brutalidade humana pode até ser muito chocante, e deixa a história exatamente como eu planejei. Mas é claro que agora já está BEM alienígena, mas eles não poderiam ficar de fora para sempre, afinal isto é Doctor Who, seria impossível escrever isto sem eles! Kkkkk
E sobre o que eu disse sobre furacões na Califórnia é isto mesmo, lá não tem costume disso mesmo sendo uma região costeira. A maioria dos furacões dos EUAs vem daquelas áreas próximas ao Caribe. Porém 2018 um furacão saiu da região de San Felipe, no México, em direção da Califórnia, mas chegou apenas como uma tempestade tropical, ele perdeu muita força no caminho. Este furacão se chama furacão Rosa.
E parabéns Doctor Who! Já é hoje o aniversário?! Não me lembrava, mas tem um monte de gente no facebook comemorando.