Zeros e Uns escrita por Creeper


Capítulo 3
Capítulo 2: Em ação!


Notas iniciais do capítulo

Olá meus pedacinhos de safira, como estão nessa linda e ESCALDANTEMENTE (essa palavra nem existe) INFERNAL tarde de sábado? Passando por crises existenciais? Planejando dar um rolê? Fazendo vários nadas? Eu estou aqui, suando em frente ao computador, lhes trazendo um novo capítulo dessa maravilhosa trama.
Espero que gostem!
Boa leitura ♥!



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11hrs00 de 2 de agosto

No dia seguinte, durante a aula, eu me esforçava ao máximo para não dormir. Meus olhos pesavam e eu não raciocinava bem.

André ficava me cutucando ou me beliscando para manter-me acordado, talvez ele se sentisse nessa obrigação já que havia confiscado o remédio e consequentemente me privado de dormir.

Ele inclinou-se sutilmente para frente, a fim de falar algo em meu ouvido.

— Você acha que alguém da nossa sala recebeu o convite para o jogo? – sussurrou.

— É só observar o comportamento das pessoas... – comentei fechando um olho e lutando para manter o outro aberto.

André voltou a sentar-se e olhou ao redor, fiz o mesmo. Alguns alunos estavam apenas cansados como sempre, dormindo ou quase isso; outros conversavam sem dar importância para o que estava acontecendo e o resto copiava o que a professora passava na lousa.

Tudo monótono como sempre... Mas havia apenas uma peça fora do lugar, uma única pessoa que saía do seu padrão de normalidade.

Matheus estava olhando para o teto fixamente, mexendo uma de suas pernas freneticamente enquanto mantinha uma expressão de perplexidade no rosto. Como de costume, ele deveria estar escrevendo na capa de seu caderno (nem eu e nem André conseguíamos identificar o que ele escrevia, eram textos longos demais para serem profanos, porém, também não podiam ser ideologias extraordinárias vindas de um idiota daquele tipo).

"Deve ser só impressão.", pensei bocejando.

— A Jéssica me parece estranha! – André comentou baixinho.

— Ela está mascando o mesmo chiclete faz quatro aulas e mexendo no cabelo, nada de especial. – inclinei a cabeça para cima.

Eu nem precisava conferir, ela estava.

Era visível a ansiedade de André, enquanto a minha era camuflada pelo meu cansaço extremo. Havia ajustado meu relógio com o contador do jogo, dei uma olhada e vi que faltavam 10 horas para a primeira rodada.

Eu devia estar devidamente descansado para tal evento, não?

— Argh. – André resmungou.

Encarei meu irmão, ele estava com os ombros encolhidos e com a cabeça abaixada, havia acabado de ser acertado por uma bolinha de papel, seguida de muitas outras.

— Vem cá. – chamei a atenção dos garotos responsáveis pela brincadeira, mantinha minha voz calma. – Sabem quantas árvores vocês estão matando para matar a autoconfiança de um adolescente de dezesseis anos? – arqueei uma sobrancelha.

— Vá dormir! – um deles riu e me acertou com uma bolinha de papel.

— Confesso que quero muito fazer isso. – afirmei pegando a bolinha maldita. – Você é só um fraco, sabia? – estalei a língua.

— Repete. – o líder dos babacas, Denis, fez menção de levantar-se.

— Você é um fraco. Usando disso. – apertei o papel. – Para rebaixar isso. – apontei para André.

— Ei... – o menor pareceu ofendido.

— Tipo, você só está querendo provar que é “o melhor”. Mas utilizando recursos que nem vem de você, isso porque você não é autossuficiente. Precisa dessas coisas para te dar força. – falei lentamente estralando o pescoço.

— Agora o nerdzinho gay tá querendo me dar uma lição de moral?! Poxa, estou comovido! – Denis debochou, arrancando risadas de seus amigos.

— Agora você está tentando me ofender usando meu nível intelectual e minha suposta sexualidade? Parabéns, bem maduro você. – ironizei.

Depois dessa ele apenas bufou e virou o rosto, já seus lacaios me direcionaram sinais feios e voltaram a atenção para conversas alheias.

Quase dei um sorriso, quase, todavia, recebi o mais ameaçador dos olhares vindo da professora, ela odiava minhas retrucas em suas aulas.

Suspirei cansado e afundei-me em minha cadeira.

— Valeu. – André agradeceu baixinho, usando seu braço para afastar as bolinhas de papel em sua carteira.

— O que não faço por você? – sorri de canto, permitindo que meus olhos se fechassem.

— Juro que um dia serei autossuficiente. – ele engoliu em seco.

Essas palavras me acalmaram, entretanto, viraram neblina em minha mente. Meu corpo pesou e o som do ambiente foi se tornando inaudível.

 

xXx

 

— Dormi durante o resto da aula! – reclamei lavando o rosto com água fria.

— Algum problema? – André encostou-se no batente da porta do banheiro.

— Eu havia planejado dormir pelo resto da tarde, acordar para o jantar e estar disposto para jogar. – dei tapinhas em minhas bochechas.

—É só ir dormir agora. – André deu de ombros.

— Não dá... – respirei fundo. – Não vou conseguir! – afundei os dedos em meus cabelos, os emaranhando. - Ah... – tratei de arrumar os fios desalinhados.

— Lucas! – mamãe gritou e de repente apareceu na porta do banheiro. – O colégio me ligou outra vez! – parecia insatisfeita.

— Vou ir almoçar. – André arranjou uma desculpa para vazar dali.

— Lucas, meu filho, quantas vezes preciso lhe pedir para parar de interromper as aulas com brigas? – ela suspirou.

— O que?! E ficar quieto sendo pisado? – indignei-me.

— Eu sei que é difícil de aturar, mas se continuar assim, não vai mais poder ficar dentro da sala! – mamãe enxugou as mãos em seu avental.

— Ah, legal! Eu, a vítima, quem paga. Eu estou atrapalhando a aula me defendendo, mas o opressor não! Ele faz comentários e ações maldosas que afetam a convivência da turma, MAS TÁ TUDO BEM! – gritei de maneira histérica.

— Lucas, e-eu não quis dizer isso... – mamãe engoliu em seco e abaixou a cabeça.

— Eu só estou cansado de todo mundo tentando rebaixar a gente e ninguém se importando. Não quero que tenham pena de nós, só quero que tenham consciência e um pouco de respeito. Porque se fazem conosco, fazem com os outros e talvez esses outros não saibam como reagir. – afundei o rosto nas mãos e senti um aperto no peito.

— Eu vou falar com a direção, não se preocupe. – ela me abraçou com ternura. – Me desculpe. – sussurrou receosa.

— Ei, está tudo bem. – dei uma risada abafada ao abraçá-la de volta. – Eu já sou crescido, mãe... Sei lidar com essas coisas... Bem, é o que eu acho.

— Vá almoçar e descanse, suas olheiras só pioram. – mamãe desfez o abraço. – Não quero você dormindo tarde hoje! – ergueu-se nas pontas dos pés para beijar minha testa.

Revirei os olhos com desdém.

— Estou falando sério. Vou supervisionar seu quarto esta noite para conferir se está realmente na cama! – mamãe colocou as mãos na cintura.

— Não tenho mais oito anos e preciso de privacidade, mãe! – retruquei, pois logo me veio à mente as 5 partidas de Quod Creature.

— Comigo você nem tenta rebater, rapaz. – mamãe franziu as sobrancelhas, bateu uma mão na outra e saiu andando. – Eu vou sim! – ditou.

— Agora eu preciso de um plano! – bufei.

 

xXx

 

13hrs41

Após o almoço, mamãe voltou para a confeitaria onde trabalhava junto de Marta, deixando a mim e ao André sozinhos.

— André, meu irmão, vamos bolar o melhor dos planos. – o empurrei para que se sentasse no sofá. – Como ficaremos acordados para jogar e dormindo para a senhora Rita? – gesticulei com as mãos.

— Isso é meio que impossível, sabia? – André estava entretido com seu videogame portátil.

— Estou perdendo tempo de descanso, colocando a mente para funcionar. – eu andava de um lado para o outro pela sala.  – Então, por favor, colabore.

— Vamos cronometrar as saídas da mamãe do quarto dela. Eu escondo o notebook debaixo da cama e você joga a lona preta de acampar em cima do computador. – André estirou-se no sofá, ainda com os olhos grudados no console.

— E como vamos saber quando ela vai sair? – mordi o lábio inferior.

— Cama rangendo, ficamos atentos. Pés arrastando, nos posicionamos. Porta abrindo, escondemos as provas. Passos no corredor, fingimos desmaio. Porta do nosso quarto sendo aberta, estamos dormindo. Pá! – ele disse empolgado.

— Só usar a nossa audição? Acha que dará certo? – questionei incerto.

— Vai ter que dar. – André inflou as bochechas e largou o videogame, aparentemente ele havia perdido. – Outra que a Rita é mega barulhenta!

— Sim, mas são sons um tanto baixos... Precisamos de algo maior... Mais alto! – bati um punho na palma da mão.

— Bem... – ele bocejou e cruzou os braços atrás da cabeça. – Colocamos uma armadilha no corredor.

— Armadilha? – arqueei uma sobrancelha.

— Algo que faça a mãe causar um estrondo, algo que denuncie a sua presença. Assim teremos tempo de sobra para estarmos "dormindo" em nossas devidas camas. – ele sorriu maleficamente.

— É uma boa ideia. – estalei os dedos. – Já sei! Assim que elas forem dormir às onze horas, colocaremos um elástico no corredor ligado de parede a parede. Ela irá tropeçar e cair...

— Em cima dessas pelúcias ridículas que cantam! – André pegou um pato peludo e o apertou, fazendo-o cantar uma música da Xuxa.

— Genial! – sorri satisfeito. – É... Ela pode se machucar? – mordi o lábio inferior novamente.

— Colocamos um colchão inflável também. – André deu de ombros.

 

xXx

 

18hrs23

Ao entardecer, quando nossas mães retornaram do trabalho, adivinha o que nos pediram?

— Vocês podem ir ao mercadinho? Aqui está a lista! – Marta entregou um papel dobrado e um pouco de dinheiro ao André.

— Eu não sou dessas de perguntar se podem ou não, pois vocês devem se livrar daqueles bichos hoje. – mamãe disse suavemente e apontou para a pilha de pelúcias cantantes do lado do sofá.

— Não pode ser amanhã?! – arregalei os olhos.

— O lixeiro passa logo cedo. Joguem fora ou doem para alguma criança do bairro. - mamãe ditou, ainda com uma voz doce. – Só não quero mais ver isso aqui em casa.

— Tá, tá, pode deixar... – André a interrompeu. – Vamos antes que o mercado feche. – ele me puxou para fora de casa.

— Precisamos dar a volta por cima! – falamos ao mesmo tempo.

Fomos até o mercado que ficava no final do quarteirão, a lista possuía somente o básico.

— Molho de tomate, ovos, farinha, maçãs... – André ia checando a lista enquanto eu colocava os produtos na cestinha. – E... – ele engoliu em seco. – Absorventes. – sussurrou ruborizando.

— Céus, elas não entram na menopausa nunca? – sussurrei indignado.

— Bem, é sua vez de pegar. – André desviou o olhar.

— Minha vez nada! Da última fui eu quem pagou o mico. – lhe dei um peteleco na testa.

— Corrigindo: passamos o mico juntos. – ele revirou os olhos. – Pedra, papel ou tesoura? – me encarou.

— Pedra, papel ou tesoura. – bufei, ergui o braço e o coloquei para frente tendo a mão fechada.

— Papel! – André comemorou quando viu que joguei pedra.

— Droga. – murmurei encolhendo os ombros.

—Te vejo no caixa, campeão! – ele deu alguns tapinhas amigáveis em minhas costas e desapareceu pelos corredores.

Respirei fundo e me preparei psicologicamente. Era sempre uma vergonha comprar esse tipo de coisa para as nossas mães.

Andei até o corredor de higiene pessoal feminina e minhas narinas imediatamente foram invadidas pelo cheiro adocicado dos desodorantes e cremes.

Olhei para os absorventes nas prateleiras mais baixas da estante cor-de-rosa. Tinha de todos os tipos, cores, tamanhos e sei lá mais o que. Mas não tinha o que eu precisava.

— Com abas, embalagem pink de borboletas, aroma de rosas do campo e o caralho a quatro. – murmurei ao conferir a lista feita por mamãe.

— Hã... – ouvi alguém pigarrear atrás de mim. Virei-me em um susto e dei de cara com uma funcionária alta e visivelmente constrangida. – Posso te ajudar?

— Pode, pelo amor de Deus! – falei um pouco desesperado. – Eu preciso disso. – lhe entreguei a lista e apontei para o bendito item. Ela leu com cautela.

— Oh, eu pego no estoque para você. – ela segurou a risada.

— É para a minha mãe. – mordi o lábio inferior, sendo consumido pela vergonha.

— Não precisa me dar explicações. – ela sorriu e me olhou nos olhos. Suas íris verdes eram encantadoras. – Desculpa. – continuou a prender a risada.

— Estou acostumado. – confessei. – Na verdade, duas mães... – resmunguei.

Por que eu contei isso?!”, arregalei os olhos ao me dar conta do que havia dito.

— Que fofas! – ela disse em um tom de surpresa. – Deve ser legal... – fitou seus pés.

— Sim, é legal. Mas não pega muito bem, às vezes... – desviei o olhar.

— Prazer, Fernanda! – levantou a cabeça e sorriu. – Desculpa de novo, sabe... Por rir. Vou lá pegar o... Negócio. Você deve estar com pressa. – apontou para onde ficava o depósito.

— Obrigado... – arqueei uma sobrancelha, desconfiado de sua gentileza.

Oras, Lucas, ela trabalha aqui, precisa ser gentil com todos!”, revirei os olhos.

De repente, um garoto agarrou Fernanda pelo braço. Não demorou muito para que eu o reconhecesse.

— Não converse com o tipinho dele! – Matheus cuspiu as palavras.

— É o meu trabalho, o que posso fazer?! E você não deveria estar em casa?! – Fernanda franziu as sobrancelhas e desvencilhou-se.

— Não sabia que o seu trabalho era ficar de papinho especialmente com os garotos que querem chamar a atenção de todo o colégio. – ele retrucou me olhando de relance.

— Qual o seu problema?! É um babaca mesmo! – ela o olhou com nojo e correu até o depósito, aparentemente irritada.

— Precisava fazer isso com a garota?! – o encarei com as sobrancelhas franzidas.

— O que te interessa?! – Matheus rangeu os dentes.

— Me interessa que ela é uma garota legal demais para um idiota como você. – bufei.

— Olha, cuida daquela bichinha que você chama de irmão, que eu cuido da minha irmã. – Matheus deu um sorriso cínico.

— S-Sua... – confesso que perdi as palavras.

Nunca passou pela minha cabeça que Matheus tinha uma irmã e que ela era completamente diferente dele.

— Entendi. Está com raiva dela por ela estar sendo legal comigo. Está com raiva porque eu e meu irmão nos tratamos bem, enquanto vocês têm uma relação instável. – estalei a língua. – Não sabia que você era do tipo invejoso... – devolvi seu sorriso.

— E eu não sabia que você gostava tanto de se meter na vida dos outros. Tá se achando muito para alguém que vai levar uma surra do colégio inteiro. Não acha que está sendo presunçoso demais? Ela só te tratou bem, coisa que ninguém faz, e você já ficou cheio de expectativas. – Matheus riu e cerrou os punhos.

— Fiquei, é? – debochei.

— Como se eu não conhecesse isso de longe. Nem tente me contrariar. – Matheus veio em minha direção, me fazendo recuar um passo por reflexo. – Desiste, moleque. – ele me deu um empurrão e saiu andando.

Fiquei observando sua figura desaparecer por entre os corredores, com aquele olhar abestado, indignado com o que ele havia dito.

— Moço, trouxe o que você procurava. – Fernanda tirou-me do transe, me estendendo uma caixa de papelão cheia de pacotes de absorvente.

Minha cabeça deu um estalo, pisquei os olhos várias vezes e minhas mãos moveram-se instintivamente.

— O-Obrigado. – sussurrei envergonhado pegando 3 pacotes e os socando na cestinha.

— De nada. – ela deu um belo sorriso, deixando a caixa no chão e ajoelhando-se ao lado dela. – Vou preencher essa estante. – comentou quando notou que eu não me movia e continuava a olhá-la.

— E eu vou lá... – dei um sorriso embasbacado. – Pagar.

— Ei, sinto muito pelo Matheus. Ele tem esse temperamento difícil. – Fernanda encolheu os ombros.

— Ele sempre te trata mal desse jeito? – franzi as sobrancelhas.

— Não é sempre. – ela arregalou os olhos. – É só que... Ele sabe ser legal de vez em quando, mas na maior parte do tempo está sendo bruto ou cínico... Acho que é uma espécie de defesa.

— Vocês são mesmo irmãos? – brinquei.

— Loucura, né? – Fernanda colocou uma mecha preta de cabelo atrás da orelha. – Pelo visto ele não vai com a sua cara...

— Nem um pouco. – revirei os olhos.

— Uma dica: não se mostre intimidado, ele não vai fazer nada demais. Mas também não esteja sempre na defensiva ou ele te considerará uma ameaça. – ela sussurrou.

Terminamos a conversa por ali, agradeci mais uma vez e fui até o caixa onde André me esperava, ele estava tão impaciente que começou a gritar comigo na frente de todo mundo.

 

xXx

 

20hrs05

Em casa, após o jantar, minha mãe voltou a insistir que devíamos jogar aqueles bichos fora.

E nós? Bem...

— Mas, manhê! – André se jogou no chão e choramingou. – Eu preciso deles para dormir!

— Eles estão mofando aqui na sala faz uma semana! – mamãe cruzou os braços.

— Por favor, mãe. Ele vai chorar a noite inteira. – bufei.

— André tem que deixar de ser mimado, a Rita está o estragando. – Marta colocou as mãos na cintura.

— Estou nada! – mamãe se defendeu. - Por exemplo, agora mesmo estou dizendo que ele não pode ficar com as pelúcias. – disse orgulhosa.

— Ah, é assim?! – André encheu o peito.

— Vamos nos livrar dessas coisas feias e empoeiradas e amanhã mesmo compramos outras novinhas! – mamãe deu um sorriso bobo.

— Viu?! – Marta me olhou pedindo por apoio.

— Tudo bem, vou contar a verdade. – respirei fundo e vi André me olhar assustado. – São para uma garota.

Subitamente, a imagem da Fernanda surgiu em minha mente.

— Uma garota?! – elas gritaram surpresas.

Gente, nem era para tanto, pelo amor.

— Uma garota?! – André ficou de queixo caído, mas fechou assim que lhe dei uma cotovelada discreta.

— Sim. – massageei a nuca e desviei o olhar. – Para dar de presente, sabe. – senti minhas bochechas esquentarem.

— Mas, Lucas, você não é gay?! – Marta colocou a mão no rosto, indignada.

Não! Sim. Quero dizer, talvez... Era confuso.

— Não. – falei automaticamente. – Espera, por que acha isso? Ah, deixa para lá! – me embaracei todo, queimando de vergonha.

— Mas se são de presente para uma garota, ao menos lhe dê uns novos e mais fofos! – mamãe opinou.

— É que ela faz coleção desse tipo. – André finalmente abriu a boca para me ajudar.

— Desse tipo... Feio? – Marta olhou com desdém para as pelúcias.

— Preconceituosas vocês! – André reclamou. – Ela tem gostos peculiares, ué, foi por isso que se interessou pelo Lucas!

— Valeu pela parte que me toca. – lhe dei um soquinho no ombro.

— Tudo bem, vocês venceram. – mamãe suspirou derrotada.

Comemoramos internamente.

— Porém! – Marta levantou o indicador. – Queremos saber mais sobre essa nossa nora. – sorriu maliciosa.

— Eu só estou sendo bacana com ela. Ainda não estou pensando em relacionamentos sérios. – dei de ombros e peguei as pelúcias para levá-las ao nosso quarto.

— Ah, Lucas! Me poupe! – mamãe fez biquinho.

— Não sou tão desesperado como o André. – sorri de canto.

— Ei! Me tira fora dessa! – André bateu o pé.

 

xXx

 

20hrs35

Eu estava desenhando quando uma notificação diferente apareceu em meu computador, logo percebi que era do Quod Creature.

 

“Sem Saída”, faltam 25 minutos para a primeira rodada, prepare-se!

CLIQUE AQUI PARA MAIS INFORMAÇÕES.

 

 

Dei de ombros e cliquei.

 

Caro participante, certifique-se de que a energia esteja estável!

Nosso sistema tranca o aparelho na tela do jogo, não há como abrir o navegador para possíveis pesquisas e nem ouse tentar usar um dispositivo reserva, lembre-se: sabemos de tudo.

Seus mínimos descuidos podem lhe levar a sua desclassificação.

Lhes desejamos boa sorte.

 

Extra: Na ferramenta de chat, há uma opção de "aleatório", encontre novos amigos por este meio ou espere até o final das cinco rodadas quando aparecerá o ranking dos 100 jogadores desde o com a maior pontuação até a menor (incluindo os desclassificados). O chat é disponível apenas nos intervalos entre as rodadas e no tempo livre das 01:00 A.M. até 05:00 A.M.

 

Fiquei estático, olhando para àquela tela de maneira séria. Quod Creature sabia de tudo e havia provado isso logo no cadastro. Aquilo me assustava, confesso.

Respirei fundo, me espreguicei e fiz alguns aquecimentos.

— André, nem pense em colar de mim! – falei.

— Como se eu precisasse. – André revirou os olhos. – Ou sequer pudesse... – sussurrou aterrorizado.

— Bebidas energéticas: OK. Almofadas confortáveis: OK. Bolinha anti stress: OK. Porta trancada: OK. Energia estável: OK. – chequei todos os detalhes.

— Das trinta pessoas que mandei solicitação, cinco me aceitaram. – André comentou todo bobo.

— Não acredito que já está abusando do botão de aleatório. – o olhei com cinismo. – Uma dessas cinco pode ser uma sociopata, já pensou nisso? – arqueei uma sobrancelha.

— Noventa e oito pessoas online e eu não vou ser amigo de nenhuma?! Pelo amor de Deus, né, Lucas. – André revirou os olhos. – E você, não vai fazer amigos?

— Isso não me interessa. – dei de ombros.

— Azar o seu! Já tenho duas garotas, qual a chance delas me passarem seus whatsapps? – ele perguntou animado.

— A chance de elas passarem o número de um sanatório é bem maior. – zombei.

— Idiota! – André mostrou a língua, insatisfeito. Ouvi um barulho de notificação saindo de seu notebook. – Seis amizades. – comentou metido. – Acho que sou popular!

Ri de meu irmão, ele conseguia ser tão bobo e iludido!

Outro som de notificação, acompanhado de sua voz empolgada:

— Sete! Uhuu!

A 18ª notificação de André chegou às 21:00, exatamente quando as telas de nossos aparelhos ficaram brancas e a palavra “Começou!” em pequenas letras cinzas surgiu.

Meu coração falhou uma batida e senti meu corpo inteiro congelar com um arrepio percorrendo minha espinha. Minha mão trêmula segurou o mouse sem firmeza para mover a setinha em cantos aleatórios até que aparecesse alguma coisa.

 

Primeira rodada: Questões alternativas

Tema: Atualidade

 

 

Deixei um suspiro de alívio escapar ao ver que as perguntas se tratavam de eventos recentes, era mais fácil do que eu esperava.

— Será que em algum momento teremos que fazer cálculos ou algo assim? Sou péssimo em exatas! – André comentou do outro lado do quarto, sentado em sua cama.

— Eu não faço a mínima ideia. – sussurrei um pouco perplexo.

Quod Creature era um poço desconhecido, no qual estávamos nos afundando sem receios. Isso teria consequências?

 


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Notas finais do capítulo

Se houver algum erro de ortografia, por favor, me avisem! Dei apenas uma rápida e básica revisão .-.!
Hey, que tal deixarem essa autora aqui feliz? Comentem o que acharam, bora interagir, me contem seus nomes, o que estão fazendo, número e senha do cartão de crédito, quantos anos tem!
Até o próximo capítulo, eu espero.
Abraços.
—Creeper.