Brazil escrita por NMCMsama


Capítulo 1
Futuro?


Notas iniciais do capítulo

#Elenão
#Elenunca



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/768524/chapter/1

Em um Brazil do futuro. Sim, Brasil com “Z” já que devemos nos adaptar aos nossos verdadeiros donos. E eles não gostam do “s”. Nesse “novo” país, tudo, parece estranhamente velho.

É isso que penso quando vou a loja da esquina. No vidro a prova de balas, reflete a minha imagem. Meu colete a prova de balas de cor rosa parece bem. Rosa é estiloso. Rosa é moda. Parece bonito. Até não parece um colete que deve me proteger de projetis mortíferos em si...Bem que comprei em loja de conveniência. Trata-se de um produto de segunda mão, mas o que podia fazer? Não tenho dinheiro o suficiente para comprar algo que verdadeiramente possa proteger a minha vida, assim sendo, uso esse “cópia-fofinha” de colete. Coço o meu pescoço, a etiqueta de Made in EUA se destaca. Somos proibidos de cortar. Não se pode desmerecer nossos donos, não é?

Sabe o que acho engraçado? Fico pensando nisso enquanto caminho, faço isso em padrão ziguezague, a nova moda de andar no Brazil, uma forma de tentar evitar balas perdidas. Onde estava? Sim...O que acho engraçado...Os produtos vindos dos nossos donos, eu sei traduzir, pois somos obrigados a saber o idioma dos nossos mestres nas escolas militares (Ordem, progresso e submissão ao nosso mestre EUA, esse é o lema de nossa nova bandeira), diz Made in EUA (Feito no Estados Unidos da América), mas a matéria prima é do Brazil. As fabricas repletas de trabalhadores terceirizados que trabalham mais de 12 horas por dia estão localizadas no Brazil. Contudo...Por que diz feito no EUA? Será que o motivo seria o fato de na etapa final do processo produtivo enviamos o produto final para os nossos mestres no norte? E lá eles colocam as etiquetas e os selos de Made in EUA? E assim compramos o mesmo produto que sai daqui com o triplo do preço... Isso meio que me lembra algo que li nos livros de história. Colonialismo? Seria essa a palavra? Não tenho certeza. História é uma matéria proibida na escola. História não é algo útil para Brazileiros que só irão cumprir trabalhos de base nas empresas dos nossos mestres. Os livros consegui de forma ilegal. Que os delatores (Bolso-Mans) não saibam...

Pois é...Colonialismo é algo velho, vivemos um neo-colonialismo? Espera...Isso já ocorreu antes! Então seria um neo-neo-colonialismo? Um retrocesso? Mas não é isso que o Grande Capitão diz. Se me recordo, em seus discursos curtos (repletos de paradas para tomar ar e de “Ok”s) ele diz que estamos evoluindo para um futuro brilhante, de segurança e milagre econo...Ops...

Me abaixo.

Uma bala passou roçando por minha cabeça.

Praguejo.

Devia ter comprado o capacete rosa para combinar com o colete! Mas eu não tinha dinheiro!

Correndo, entro na loja da esquina. A portas da loja se fecham com um estrondo. São de metal reforçado. Passo por um detector de metal. Um segurança me revista. Não gosto de como ele me toca...Mas não posso dizer nada. Uso rosa não por ser fofinho somente. É minha marca de gênero. Sou mulher e como tal a rosa é minha cor. E uma mulher de bem não fala nada quando é tocada de forma indevida. Existe uma cartilha que nos ensina isso na escola...Se chama o Kit Pink.

Por fim, consigo passar pela a revista sem que ele pedisse para que eu me despisse. Hoje já está sendo um bom dia. Vasculho com os olhos as prateleiras. Sei que a língua oficial do Brazil é o português, mas os produtos que vejo estão em inglês. Antes eles traduziram, hoje em dia eles nem se importam mais em perder o tempo com isso. Quiçá o Grande Capitão mude novamente a constituição para adicionar o inglês como também nossa língua oficial (será que pode duas línguas oficiais? Ou teremos que optar por uma?). Nosso líder tem essa mania: mudar a constituição. Sei que antes, no Brasil com “s”, isso não podia ser feito com tamanha facilidade, mas hoje no Brazil com “z” era algo que necessitava ser feito. Afinal, muitas das propostas do Grande Capitão, com a antiga constituição (chamada de A Constituição Comunista), não eram possíveis de serem implementadas. Enfim, vou comprar a comida que minha mãe pediu...

Tenho pouco dinheiro. Cato as notas de Dólar que tenho no bolso. O Real já perdeu o seu valor, logo, é preferível usar o dinheiro dos nossos mestres. Ainda mais, quando os mestres Americanos veem aqui visitar nossas praias e nossa cultura exótica, é mais fácil para eles gastarem sem perder tempo nas casas de Câmbio.

Droga. Houve mais um reajuste nos preços. Pelo visto, teremos que trocar as verduras por alimentos enlatados novamente.

Estou no caixa, observo a mulher com o rosto fortemente maquiado computar o valor da minha mísera compra. O dinheiro não deu para tanto...Mesmo com o meu pai trabalhando em 4 empregos temporários! Minha mãe não pode trabalhar, por ser mulher, o Grande Capitão já disse que nosso sexo é frágil e incompetente por natureza, logo, o melhor para a nação é que fiquemos em nossas casas cuidando dos filhos e da cozinha. Caso a mulher trabalhe, o que é muito raro hoje em dia, deve aceitar os salários menores. Afinal, mulher engravida. Menstrua. Tem menopausa. Enfim, é um ser instável, não é um bom instrumento de trabalho, não é mesmo?

— Gloria a Deus! – Exclamou a caixa.

— Gloria a Deus. – Respondeu sem muito entusiasmo, essa era a saudação normal do Brazil com “z”.

— Deu 25.

— 25? Mas...Eu tinha feito os cálculos antes! Deveria ser 15!

— Oh! Querida, esqueceu da taxa voluntária para alimentar os órfãos da Venezuela?

— Taxa? – Orfãos? Tinha quase esquecido da guerra contra o país latino, mas, o governo do Brazil estava se preocupando com os órfãos daquela terra comunista e demoníaca? Se recordava que o Grande Capitão dissera que queria todos metralhados (lógico que no sentido figurado, pois o Grande Capitão não prega a violência).

— Sim. O Grande Capitão com o seu imenso coração benevolente adicionou essa nova taxa para os cidadãos de classe baixa e média possam pagar. E nós, como homens e mulheres de Bem, devemos aceitar. Os órfãos estão sendo direcionados a campos de “educacionais”, para aprenderem como serem homens de Bem. Afinal, eles também devem viver na mesma felicidade que nós vivemos! Sobre os olhos de nossos mestres EUA! Glória a deus!

—A Classe alta não paga essa nova taxa? – Ousei perguntar. Droga! Eu tenho que conter a minha boca, afinal...Um cidadão de Bem Brazileiro não faz perguntas. Ainda mais uma mulher!

— Ora, tolinha... – Riu a caixa – A classe alta são nossos irmãos altruístas, eles já fazem grandes sacrifícios...

Como o que? Quis questionar, mas me contive. Podia ter um Bolso-man na fila...Busco homens bombados com camisas pretas (com o rosto do Grande Capitão estampado, com o seu famoso sorriso cordial), não encontro nenhum. Suspiro aliviada. Não queria desaparecer e ser taxada de comunista subversiva...Ou pior! Feminista! Sim, os Bolso-men não gostam de feministas. Eles têm uma espécie de ódio-pavor dessas tais feministas, apesar de nunca na escola ensinar sobre esses seres misteriosos. Os garotos da minha classe disseram que eram bruxas de sovacos peludos, fedorentas e que atacam criancinhas. Isso realmente parece assustador!

— Bem... – Vasculho meus bolsos, encontro uma nota amassada e entrego a caixa. Lá se vai o dinheiro extra!

— Gloria a Deus! Que o Grande Capitão guie os seus passos!

— Gloria a Deus. – Respondo com tristeza. Ao fundo, escuto as tevês anunciando mais uma castração química ao vivo. Vejo os clientes parados olhando a cena, como hipnotizados. Gritam eufóricos ao ver o sofrimento do suposto estuprador. Digo suposto pois...A justiça no Brazil com “Z” é por demais relativa. Afinal, estranhamente todos os estupradores são pobres e negros.

Caminho para fora da loja. Em ziguezague. Taques do exercito passam lentamente nas ruas, como estivessem a passeio. Na lateral deles leio as palavras Made in EUA.

Bem, melhor voltar para casa antes do toque de recolher... Todos sabem que mulher que fica andando na rua depois do toque está pedindo para ser estuprada! É a culpa dela! E eu não quero ser uma das culpadas...

Corro. Em ziguezague. Corro.

Rumo ao um futuro incerto.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Brazil" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.