Stella escrita por Gil Haruno


Capítulo 23
Um dia de lazer - Parte 2


Notas iniciais do capítulo

Voltei, pessoas! Bom feriado a todos! Beijos!



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Por tantas vezes Eu já havia andado o mesmo percurso de praia com a minha família e eram sempre as mesmas emoções, os mesmos lanches, as mesmas discussões bobas... mas, pela primeira vez em muitos anos, aquilo que Eu considerava rotineiro, e até mesmo, bom, tinha ficado para trás, junto à inocência de dias incrivelmente simplórios.
Distraidamente cocei a testa, em um ato impensado de me livrar dos devaneios. O passeio estava sendo bom, Eu diria, maravilhoso, no entanto, me senti emocionalmente estranha.

—Você está bem?

Atordoada, foquei o rosto intrigado do meu acompanhante.

—Estou. – Sorri, desconcertada.

—Não está, não. – Acusou, parando de frente a mim. –Esse lugar te trás lembranças, certo?

—Um pouco. – Confessei, respirando profundamente. –Minha família costumava vir aqui nos fins de semana e feriados.

Bryan se sentou na areia, me incentivando a fazer o mesmo. O cenário marcante das ondas agitadas era nosso maior foco.

—É a primeira vez que viajo sem minha mãe por perto.

Bryan viu graça na minha confissão. –E o que você está achando dessa experiência?

Então, me dei conta de que Eu tinha escancarado minha falta de vivência adulta no mundo.

—Eu não fazia idéia de que era tão bom. – Respirei, enchendo meus pulmões de ar puro.

—Você defende tanto a liberdade de viver, mas, ironicamente, nunca viveu a vida que você tanto fala com convicções.

Eu, o olhei, emocionalmente arrebatada pela sua observação. Que direito me foi dado de julgar a maneira que ele conduzia a vida se nem mesmo Eu conhecia a verdadeira fórmula de viver?

—Você está certo. – Humildemente, reconheci meu grande erro. –Eu posso não ter passado grande parte do meu tempo trancada em um escritório, mas sempre vivi fazendo bicos: limpando o chão de salões de beleza, empacotando compras, vendendo doces... Eu até já cuidei de uma senhora idosa. Era horripilante quando ela se enchia de talco. Vivia dizendo que o excesso de gordura fazia suas dobras assarem. – Bryan sorriu, fazendo que Eu também sorrisse.

—Sua infância não deve ter sido muito agradável.

—Houve momentos bons, também houve momentos ruins. – Foquei o mar. –Não é legal acordar no meio da noite e ouvir os seus pais brigando por causa do aluguel atrasado ou por que estão cansados de trabalhar no mesmo lugar há anos, sem muito progresso. – Voltei a observá-lo. Bryan ainda mantinha seus olhos atentos em mim. –Eu achava que, se Eu me esforçasse ao máximo, nosso orçamento mudaria um pouco, e meus pais parariam de brigar por causa de dinheiro.

Bryan desviou o olhar, assim como Eu também desviei. Algum tempo se passou e o silêncio se fez presente entre nós.

—Já ouvi falar sobre a sua mãe. – Bryan tinha quebrado nosso silêncio, de maneira instigante. –Parece que ela foi uma aluna excepcional.

—Minha mãe quase não fala sobre o seu passado na faculdade. – Tratei logo de revelar a ele a pessoa que Kimberly Evans tinha se transformado. –Ela nem mesmo terminou a faculdade de direito, e exige que Eu estude muito. – Suspirei, cansada das velhas discussões com a minha mãe por causa de estudo. –Acho que ela se tornou depreciativa. Talvez, esteja por anos vivendo uma depressão crônica. – Bryan sabia muito bem quem era o responsável pelo fracasso da minha mãe, embora ele não tivesse coragem de tocar no assunto. –Intimamente, Eu a culpo por ter desistido. – Olhamo-nos.

—Não está sendo cruel com a sua mãe?

—Talvez, mas não me faça querer entender como as pessoas desistem de algo por causa de desilusões amorosas.

—Você acha que sou a pessoa certa para te fazer entender isso?

—Bom... você deve ter tido muitos relacionamentos e, se me lembro bem, está namorando agora.

—Pode ser, mas não entendo como isso funciona. – Deu de ombros. –Nunca desisti de algo por amor.

—Nunca?

—Nunca. – Afirmou com toda a convicção do mundo.

—Então, você nunca se apaixonou de verdade. – Acusei, sem rodeios.

—Ao contrário de mim, você parece ter se apaixonado para valer.

—Nunca!

—Nunca? – Indagou, intrigado.

—Nunca me apaixonei. – Confessei, corajosamente. –Nunca dei importância a isso e, sinceramente, não estou nenhum pouco interessada em ser amada, romanticamente falando. – Dei de ombros, desdenhosa. –Mas, me diz você... Como é namorar alguém sem amar a mesma?

—Não é que Eu não ame. Só não me sinto emocionalmente... – Ele não saberia explicar, por que, de fato, Bryan não amava ninguém romanticamente. –Não sei como te explicar isso.

—Tudo bem. – Eu o deixaria em paz, afinal, ele já tinha explicado mais que o necessário. –Estou com fome.

—Eu também. – Ele olhou as horas. –Vamos almoçar e pegar a estrada depois.

—Vamos ficar mais algum tempo.

—Stella...

—Por favor! – Implorei unindo as mãos. –É minha primeira viagem como uma adulta e Eu quero que seja legal!

—Você é uma perita no jogo psicológico.

—É você que me obriga a ser assim. Não é mais fácil e legal aceitar a vontade de outra pessoa, mesmo se for só por educação?

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—Você vai amar a comida do ‘Tá na onda’! Eles fazem os melhores camarões do planeta! – Fiz a propaganda, ansiosa para chegar ao pequeno restaurante.

—Conheço um restaurante perto daqui. A comida é ótima, o lugar é bem jovial, e a sobremesa é...

—Pode parar! Você conhece? Então, vem aqui de vez em quando?

—A Stephany me obrigou a vir aqui uma vez. – Explicou voltando aos passos. –Se quer fazer uma viagem diferente das outras vezes, precisa experimentar coisas novas.

Ele estava certo. Não fazia sentido ir à mesma praia, comer no mesmo restaurante, se aquele passeio deveria ser ‘novo’ para mim.

—Ok. Vou confiar em você.

Depois de vinte minutos de caminhada, por que me recusei a ir de carro, chegamos ao restaurante indicado por Bryan e, como Eu previa, tratava-se de um lugar de alto padrão, só que muito jovial, e muito animado. As garçonetes usavam trajes que lembravam sereias e os garçons se vestiam como marinheiros.  Era tudo muito diferente do que Eu havia freqüentado nos últimos anos: bom demais para ser exótico e exagerado demais para ser um restaurante.

—Eu não fazia idéia de que existem lugares assim! – Comentei observando de perto o aquário gigantesco na entrada.

—Isso não é nada. Você ainda vai conhecer lugares inesquecíveis!

—Mal posso esperar! – Fomos conduzidos a uma mesa. O garçom nos entregou o cardápio, deixando-nos à vontade para escolher. –Não conheço quase nada aqui. – Para a minha plena ignorância, quase todos os pratos estavam escrito em francês. –Tenho medo de escolher um prato e vim escargots. Os franceses comem lesmas, não é? – Perguntei cochichando.

—Não se preocupe com isso. Serveur!

O garçom prestativamente veio à nossa mesa. Para minha surpresa, Bryan também dominava a língua francesa. O que mais Eu deveria saber sobre ele?

—Você não me disse que sabe Francês. – Quase o acusei de guardar um segredo. –Só falta falar em mandarim!

—Já fiz algumas aulas, no entanto, não me interessei.

—Puxa! Você deve ter estudado muito, já que se tornou um poliglota.

—Muitos empresários são influenciados a estudar outras línguas por questão de negócios. Foi observando William que aprendi tanto. Quando o conheci, ele já falava Italiano, Francês, alemão e espanhol.

E, mais uma vez, Bryan deixava em evidência a devoção a seguir os passos do padrasto.

—Eu... posso te fazer uma pergunta?

—Claro.

Ele não seria cordial depois de saber do que se tratava.

—O que houve com o seu pai?

E, naquele momento, percebi que toquei em um assunto que não precisava ser questionado.

—Não quero falar sobre isso.

—C-claro. Desculpe, é que...

—Vou fazer uma ligação. Com licença.

O vi sair, como alguém que, nitidamente, fugia de uma pergunta que, para mim, precisava de uma resposta, afinal, nada Eu sabia sobre o passado da família de Bryan.


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