Esfrego várias vezes a minha têmpora, numa tentativa frustrada de amenizar a dor crescente na região. Respiro fundo antes de seguir para o banheiro e tomar um remédio.

Ino acorda mais cedo do que eu, então quase não a vejo quando sai para o trabalho. A confissão na noite passada ainda pairava na minha mente. Me sentia mal e frustrada cada vez que lembro de suas palavras.

Flashback on

— Você o quê? - tento não gritar, ainda em choque com a revelação da loira, me segurando pra manter minha promessa. - Como pôde Ino?

— Sakura - ela agora também estava sentada. Um sentimento de culpa pairava em seus olhos. - Eu bebi demais, você sabe que faço as coisas sem nem perceber quando fico bêbada..

— Isso não justifica Yamanaka - rosno para ela, me deitando na cama, não queria olhá-la. Esfrego a testa. - Tantos garotos no mundo e foi logo o Sasori, aquele idiota, imprestável. E mesmo bêbada você não pareceu uma daquelas pessoas que acordam no dia seguinte se perguntando o nome do cara - ironizo.

— Eu sei que você odeia ele, que ele fez uma merda muito grande com você no passado - ela diz baixo. - Mas eu não fiz por mal. Aconteceu. Ele estava ali e eu..

— Olha Ino, eu não quero conversar mais sobre isso - a interrompo e levanto rapidamente da cama. - Você era minha amiga.

— O quê? - ela pergunta confusa. - Sakura, onde você vai? - sinto seu tom de súplica.

— Tomar um ar. Nem pense em vir atrás de mim - digo ríspida e saio do quarto.

Pego um copo de água e fico alguns minutos na varanda antes de voltar pro quarto, sentada numa cadeira, admirando a lua. Não tinha vontade de ver a loira. Por um momento todas as lembranças de Sasori me vêem à mente. Reprimo as lágrimas. Eu não esperava isso de Ino, minha melhor amiga. A dor que ela me causou conseguiu superar as feridas feitas por Sasori. Eu não sei se poderiam ser cicatrizadas. Me sinto traída.

Flashback off

Tomo um longo banho, arrumo meus cabelos em um rabo de cavalo e visto uma roupa mais elegante - uma calça preta, uma blusa de botões por dentro da calça com pequenos gominhos no meio, e um scarpin salto agulha branco, combinando com meu brinco prateado.

Me admiro por um tempo no espelho. Espero dar um bom resultado, uma perfeita primeira impressão ao meu chefe - e também mostrar que eu não sou desesperada e tão louca como fui na entrevista. Quero me redimir. E esquecer da noite anterior.

Passo meu perfume, antes de tomar um café reforçado, pego minha bolsa e saio para a faculdade. As aulas parecem passar incrivelmente mais rápido hoje - todas as quartas feiras são assim. As aulas são bem mais dinâmicas, mais participativas, o que faz o tempo praticamente voar.

Depois de uma conversa rápida com Naruto e ignorar as mensagens de desculpas e "boa sorte" de Ino, sigo para o meu mais novo emprego, na maravilhosa Kekkei Genkai Company - me desejem sorte.

Assim que adentro o recinto, agora no último andar, o quadragésimo - onde fica a sala oficial do Uchiha -, entro na minha sala, seguida por Tenten, que me auxilia, explicando algumas partes importantes da minha função como secretária.

— Arrumei a sua sala ontem mesmo e já liguei o notebook para ficar à sua disposição - ela aponta já dentro da sala comigo. Me sento na cadeira a observando, atenta à tudo. - O Sasuke nesse momento está em uma reunião, mas pediu que você já começasse revisando a planinha que ele mandou pro seu novo e-mail, da empresa, e mandasse o relatório das filiais.

— Pode deixar - sorrio tranquila, já organizando na mente tudo que faria. Precisava manter a calma. Parecia já ter bastante tarefas para ocupar meu dia. - Não parece difícil.

Tenten é apenas a atendente, mas agora seria minha assistente pessoal também. Era um alívio pra mim já ter uma pessoa próxima na empresa, não me sentiria tão sozinha, além dela ter mais experiência sobre o lugar e conhecer meu querido chefe.

— A reunião deve acabar daqui algumas horas, é bom que apareça na sala de Sasuke depois - ela me olha. - Não brinque, não ria, não chore, nem sequer faça perguntas, a não ser relacionada ao seu trabalho e a empresa.. - Rio achando graça, mas engulo em seco quando vejo que ela não está brincando. Ela arqueia a sobrancelha esperando um sinal de que eu havia entendido. Assinto lentamente. - E em hipótese alguma o chame pelo nome, isso é apenas quando estivermos sozinhas - ela ri.

— Eu não quero perder meu emprego no primeiro dia - brinco também, querendo ficar nervosa. Me contenho. - Tudo anotado, obrigada.

— Se precisar, pode me chamar. Esses primeiros dias são bem estressantes.. É muita coragem sua aceitar trabalhar pra ele, tiro pelas últimas secretárias, elas quase não tinham vida por causa do Uchiha - ela revira os olhos antes de sair da sala, acenando pra mim.

Encaro a porta pensando em suas palavras. Não tinham vida? Será que esse emprego atrapalharia meus estudos na faculdade? Espero que não.. A minha situação atual era tão desesperadora que eu não poderia perder essa vaga de jeito nenhum. Então só me restava torcer pra conseguir levar a rotina de trabalho com a dos estudos.

                          (...)

Acabei o relatório que Tenten mencionara e estava na metade da planinha. Meus dedos doíam. Paro um minuto para olhar o relógio, a reunião já havia terminado há quase uma hora, seria bom eu ir até a sala de Sasuke para saber se precisava de algo e mostrar que eu estava ali, fazer presente a dedicação e profissionalismo.

Penso um pouco no que poderia fazer para deixar meu chefe impressionado e satisfeito em um primeiro momento. Será que ele gosta de café? Eu poderia levar um pouco para ele, talvez diminuísse seu mau humor e até mesmo fizesse ter uma imagem agradável de mim.

Decidida, me apronto rapidamente, encomendo pelo telefone um café bem forte e algumas rosquinhas açucaradas em uma cafeteria ali perto. Reuno a papelada e envio as planinhas pra Sasuke antes de sair da sala. O entregador da cafeteria chega e desço até o primeiro andar - infelizmente, já que ele não tem autorização pra subir - para pagar.

Assim que chego a sala de Sasuke logo depois, bato levemente na porta, esperando por sua resposta.

— Entre - ele diz com voz firme. Me seguro pra não agarrar ele. Que voz de homem sexy.

— Senhor Uchiha - digo com um sorriso, uma sacola bege, com as rosquinhas e o café, em uma mão e na outra seguro uma pasta. - Com licença.

Ele me observa entrar, parando de escrever no notebook. Corpo ereto, postura impecável, olhos tão negros e o terno sobre o corpo me fazem estremecer. De repente o calor subiu ou foi apenas eu não conseguindo resistir ao homem à minha frente?

— Fez o que mandei? - pergunta seco.

— Sim, claro - digo rápido, indo até ele. Entrego a pasta. - Está tudo pronto, já te mandei o e-mail.

— Eu vi - sua voz sai fria, como se evidenciasse o óbvio, fazendo questão de me olhar nos olhos. Parecia conhecer todos os meus pecados só em me fitar. - Devia ter vindo antes. Eu disse sem atrasos.

— Eu cheguei na hora - digo confusa. - É, eu sei que devia vir logo que acabou a reunião, é meu primeiro dia e.. - engulo em seco. Não era pra eu ficar puxando assunto com meu chefe. Droga. - Preferi não incomodar, sei como reuniões são cansativas - me conserto rapidamente.

— Hm - ele resmunga.

Agora ele parece nem sequer me dar atenção porque seus olhos se desviam para o notebook mais uma vez, voltando a escrever.

— Er, bem.. - começo sem jeito, levantando um pouco a sacola na mão. De soslaio ele me olha.

— O que é isso? - pergunta com indiferença.

— Trouxe café e algumas rosquinhas - dou um pequeno sorriso o fitando, incerta. - Pensei que gostaria de..

— Não gosto de doces. Não pedi nada - ele olha para a tela novamente, o clima mais pesado do que nunca. - Dispensada.

Fico sem reação com a recusa. Me seguro para não responder, afinal era meu chefe, não poderia soltar a língua como costumava fazer com outras pessoas quando me ignoravam ou irritavam. Abaixo a cabeça contando até dez mentalmente antes de sair.

— Deixe o café - sua voz me pega desprevenida. O olho por cima do ombro, surpresa.

Ando lentamente até ele e deixo o café ali. Ele apenas acena levemente com a cabeça e deixo escapar um sorriso tímido. Saio da sala.

                        (...)

— Não Naruto, já disse que não posso falar com você agora - digo quase em sussurro ao celular, olhando para a porta da minha sala, não querendo ser pega fofocando logo no primeiro dia. - Eu te ligo depois.

— Mas Sakura, eu preciso de você - sua voz de desespero me amolece. - A Hinata não quer nem olhar mais pra mim, acho que ela me odeia.

Rio do meu amigo. Hinata estuda na mesma faculdade que nós dois. Faz Arte e adora Naruto, é apaixonada pelo loiro desde o dia em que nos conhecemos, mas o meu querido amigo parecia nunca ter notado isso, nem quando eu jogava uns verdes para ele. Agora estava aflito porque a menina estava agindo estranho com ele depois de saber que ficou com uma garota de sua sala.

— Não é o fim do mundo Naruto - reviro os olhos. - E a Hinata não odeia você, ela só.. deve estar passando por alguns problemas.

— Ai caramba Sakura, você acha mesmo? Pensei que fosse algo a ver comigo.

— Por que não pergunta à ela? - sugiro. - Talvez ela precise de um amigo, não acha? - rio dele.

— Tudo bem, mas se ela não quiser?

— Ela vai querer Naruto, relaxa. Apenas fale com ela, est.. - paro de falar por conta do susto que levo ao abrirem a porta.

Dou um pequeno grito, as mãos ao peito e o celular ainda no ouvido. Por Kami, que não seja Sasuke e eu não seja mandada embora.

Abro os olhos com receio, só notando agora que estavam fechados e vejo Itachi. Ele ri de mim, fecha a porta e se aproxima.

— Calma, não precisa se desesperar - ele diz com voz suave. - Pode ficar tranquila, não vou te delatar pro Sasuke - ele ironiza, ajeitando o terno.

— Naruto, preciso desligar - e antes que o loiro me indague, jogo o celular como um floreio na mesa. Agora desligado.

Olho Itachi fixamente, morrendo de vergonha. Ele se aproxima de mim com um pequeno sorriso de canto agora. Aquele me quase me fez cair pra trás. Aliás, eu ainda to sentada? Porque com esse homem na minha frente já era pra estar estirada no chão.

— Me desculpe, era um amigo meu, ele precisava de ajuda e.. - começo a me explicar, nervosa.

— Calma - ele diz me interrompendo. - Está tudo bem, não sou um monstro como meu irmão - ele estende a mão para mim.

O olho surpresa e poucos segundos depois retribuo o aperto, um sorriso surgindo em meus lábios. Ele beija minha mão lentamente, os olhos em mim. Fico sem ar.

— Ah.. Desculpe de novo.. Eu não devia.

— Sei bem como é, ainda mais tratando do Naruto - ele ri se sentando na cadeira à minha frente. - Continua como um tagarela sem noção.

— Sim, é, o Naruto - rio também, me lembrando que eles eram amigos de longa data, apesar de Itachi ser dois anos mais velho. - Por um momento eu tinha esquecido da amizade entre ambos.

— Os gritos dele no celular não deixam - ele brinca me observando. - Ele ia direto na minha casa na época do colegial, ele e Sasuke ficavam horas tocando guitarra e violão. Eu ficava bravo na maioria das vezes porque tinha que estudar pro vestibular. Faz bastante tempo. - ele ri e suspira, pensativo. Balança a cabeça voltando à realidade. - Então, vim lhe dar as boas vindas e oferecer minha ajuda se necessário.

— Isso seria ótimo, senhor Uchiha - digo sincera e grata. Aliviada por Itachi ser tão gentil e não me entregar pro irmão.

— Itachi. Apenas Itachi - ele dá um sorriso sexy. - Diferente do meu irmãozinho, sou bem mais tolerável - levanta e abaixa a sobrancelha sugestivo.

— É verdade - digo sem pensar, soltando uma risada. Arregalo os olhos para ele. - Não, quer diz..

— Tudo bem - ele ri. - Ele é insuportável às vezes. Não me admiro, um dia aqui e você já está pensando várias coisas sobre ele.

— Eu não sou muito agradável na maior parte do tempo também, mas sou gentil - murmuro baixo, me lembrando da cena no escritório com Sasuke. - Eu comprei café com rosquinhas e ele recusou. Nem sequer agradeceu - bufo me recostando na cadeira. Noto Itachi e já faço menção de me desculpar de novo, quando ele levanta a mão.

— Típico de um Uchiha - ele pisca zombeteiro. - Você vai se acostumar com o tempo, senhorita..?

— Haruno. Sakura Haruno - digo sorridente. Ele balança a cabeça.

— Então - ele se levanta com uma postura estonteante, marca registrada de seu famoso sobrenome. Me levanto também. - "Mon amour" - sorri fazendo uma breve reverência.

Me inclino um pouco também, sorrindo para ele que se distancia devagar, como se não quisesse sair da sala. Eu também gostaria que ele ficasse mais um pouco, a presença de Itachi é reconfortante. Mas ele tinha que ir e eu tinha trabalho a fazer.

É parecia que aos poucos tudo ia se encaminhando. Bom, é o que eu espero.