Chamas Azuis escrita por Caramelo


Capítulo 9
Quanto Mais Conheço, Menos Sei


Notas iniciais do capítulo

Como estão meus amores? Tudo bem? Tava com saudades já ♥

Eu adorei escrever este capitulo hehehe. E ainda tem muito mais guardado para o próximo.
Espero que gostem ♥

Agora, como sempre, deixarei que vocês fiquem mais uma vez nas mãos de nossa imprudente protagonista:



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/766307/chapter/9

I

Fecho meus olhos enquanto desvio meu olhar da cena agonizante que acontece ao meu lado. Os gritos de Camélia ecoam por toda a cela conforme o enfermeiro quebra os dedos de sua mão esquerda, um por um... Ouço o som de seus ossos estalando, acompanhados da voz grave do enfermeiro que repete as mesmas perguntas sem parar...

Sinto a dor dela como se fosse minha e tenho certeza de que os outros dois também... Eles estão sofrendo, mais que Camélia, ouso dizer. Ver alguém importante para você quebrando pouco a pouco, torturado por alguém, é ainda mais doloroso que ser o alvo da tortura. Presumo que foi por isso que os enfermeiros nos prenderam no mesmo lugar, um ao lado do outro. Para que possamos ver nossos companheiros serem destruídos até que alguém ceda e dê a eles a resposta que procuram.

Não sei a quanto tempo estamos aqui, tudo parece passar mais devagar quando se está com medo. As explosões continuam, porém pequenas, seu som é consideravelmente mais baixo agora. Apesar disso, os pequenos tremores persistem balançando a estrutura caótica do manicômio.

Todos esses barulhos embaralham meu cérebro, misturando-se e confundindo meus sentidos... Tudo parece tão surreal. À pouco estava quase escapando deste lugar, porém agora me encontro presa outra vez... Indefesa e amedrontada. Pensei que a esta hora estaria nos braços de meu pai, sendo confortada por ele, sentindo seu abraço caloroso e ouvindo o som de sua voz dizendo que tudo ficaria bem...

A realidade me mostrou mais uma vez que eu estava errada. É impossível fugir daqui, nem mesmo essas pessoas conseguiram... Uma vez dentro dos portões do S&K, não há jeito de escapar. Talvez seja melhor se eu apenas parasse de resistir. Sim. Talvez fosse melhor me entregar e implorar para que deem fim ao meu sofrimento... Não consigo mais assistir pessoas sendo machucadas por minha causa.

Como será morrer? Sentirei frio? Calor? E o que virá depois? Me tornarei um espírito como Eleonor? Realmente encontrarei liberdade na morte ou apenas estarei à caminho de outra prisão?

Dirijo meu olhar para o garoto moribundo amarrado à minha esquerda... Seus olhos parecem vazios, como se estivesse concentrado em outra coisa, algo perdido em seus pensamentos mais profundos, porém seus dedos se contraem a cada novo grito de dor que Camélia deixa escapar. Seus lábios, extremamente inchados e com alguns cortes devido à quantidade exacerbada de golpes que levou, move-se como se ele estive falando alguma coisa, porém não consigo escutar som algum.

Ele parece estar entoando alguma espécie de mantra ou canção... Algo que lembra uma reza. Fico tentando imaginar o que está passando em sua mente neste momento.

Será que ele pensa o mesmo que eu? Creio que não... Estas pessoas são guerreiras, não são iguais a mim. Eles continuarão lutando até que suas forças se esgotem, tenho certeza disso. Mas creio não importe agora, todos iremos morrer aqui... Lutando ou nos rendendo. Pois não acredito que depois que Jared, Carter ou Camélia revelarem qualquer que seja a verdade para os torturadores desta sala, irão simplesmente ser soltos.

Estamos todos condenados.

A respiração pesada de Camélia à minha direita me faz voltar à tona. Seus gritos pararam e foram substituídos por um choro baixo e controlado. O enfermeiro deixa o alicate, o qual usara para quebrar os dedos da mulher, cair no chão fazendo com que o som do ferro batendo contra o piso ecoe pela sala...

Em seu rosto, encontra-se uma expressão satisfeita, como se ele estivesse deliciando aquele breve momento de fraqueza de Camélia. Não consigo encara-lo por muito mais tempo, então desvio meus olhos rapidamente e encontro os dedos retorcidos da mão da jovem. Cada junta parece ter sido contorcida e deslocada com tamanha força que não acho que voltarão ao que eram antes algum dia... Estão todos inchados e com tons de roxo e vermelho vivo, tão deformados que parece que poderiam cair pelo mais simples toque.

— Está pronta para revelar onde estão as bombas? - pergunta o enfermeiro com um sorriso sádico estampado em seu rosto de forma macabra. - Ou devo quebrar os dedos da mão direita também? Talvez eu arranque alguns desta vez... - Ele passa seus próprios dedos pela mão direita de Camélia, como se estivesse acariciando-a. - Seria um grande desperdício destruir mãos tão delicadas...

— Vá para o inferno! - vocifera a mulher cuspindo no rosto do enfermeiro. Seus olhos, cheios de lágrimas, exibem todo o ódio que ela sente, qualquer um que a visse perceberia... Ela jamais dirá nada a este homem horrível.

O enfermeiro apenas limpa o rosto com as mãos e volta a encara-la. Ele não se exalta nem mesmo por um segundo, sua pose inquebrantável mantem-se exatamente como antes.

— Talvez eu devesse fazer isto com o seu irmão? - ele direciona seu olhar para Carter. - Ao invés de seus dedos eu posso arrancar seus dentes, ou a língua... O que acha disso?

— Vá em frente - zomba o homem de olhos verdes vibrantes do outro lado de Camélia -, não importa o quanto nos torture... O quanto tente nos destruir. Jamais diremos nada a você, Bélior.

O enfermeiro caminha até ficar de frente para o homem negro e surrado amarrado na cadeira que ainda o encara de forma obstinada. Seus olhos não vacilam nem por um segundo.

— Pois eu acho que dirão sim... - debocha o homem quase duas vezes maior que Carter. - Vou fazê-los dizer. Nem que tenha que desmembrar cada um de vocês até que alguém resolva abrir a boca...

— Acha que temos medo de você ou de qualquer um de seus seguidores? - Carter revida. - Tudo irá acabar, esta noite.

— Para alguém que está prestes a morrer, você parece bem confiante... Sempre soube que pessoas como vocês tinham um ego exorbitante, mas não imaginava o quão detestáveis podiam ser. - O enfermeiro ressalta a pequena parte de seu discurso com nojo.

"Pessoas como vocês..." Está frase fica presa em minha mente e repito-a sem cessar. Fico imaginando qual a relação deles com os enfermeiros do S&K. O que há com este clima estranho?

— Vindo de um Ser como você, creio que devo aceitar isto como um elogio - Carter ri.

Dito isto, o enfermeiro deixa sua mascara de passividade cair e, em menos de um segundo, disfere um soco contra o rosto do rapaz. Seguro um grito de surpresa em minha garganta mordendo os lábios enquanto encaro o homem cuspindo uma quantidade considerável de sangue...

— Eu vou adorar assistir esse sorriso desaparecer - diz o enfermeiro, desta vez, sem demonstrar qualquer satisfação ou alegria, apenas tormento... - Até quando vão conseguir aguentar, me pergunto, algumas horas, dias talvez... Já torturei tantos iguais à vocês e todos sucumbiram, não será diferente.

Assim que o homem termina, a risada histérica de Camélia, misturada ao choro de dor, substitui a voz grave do enfermeiro, chamando a atenção de todos para si. A mulher parece estar completamente... Louca.

— Acha mesmo que terá tanto tempo? - ela pergunta mostrando uma personalidade quase insana. - Bélior, está ouvindo isso? - no mesmo instante em que ela pronuncia estas palavras outra explosão reverbera pelo S&K fazendo-me sentir calafrios por todo o corpo. - Tic tac... O relógio não para... Quantas bombas mais faltam para destruir este lugar de vez? Sabe dizer?

Destruir? Eles pretendem acabar com todo o hospício... Não pode ser.

— Não conseguiriam trazer bombas o suficiente para destruir o S&K... - o enfermeiro volta-se para a mulher de cabelos negros que encara o chão enquanto fala. - Está blefando!

— Está disposto a apostar sua vida nisto, Bélior? - Desta vez é Carter quem pronuncia-se. Apenas assisto à cena que começa a tomar cada vez menos sentido... - Creio que será difícil encontrar outra carcaça nas condições em que se encontra. Vivendo de medos e pesadelos... Apenas migalhas. Suas forças devem estar esgotadas.

— Eu não ouvirei sandices de alguém como você! - vocifera o homem.

— Nem ao menos sentiu nossa presença quando entramos aqui... - Carter o encara de forma desafiadora. - Ficamos por mais de três dias escondidos, nos passando por meros enfermeiros e todos vocês acreditaram. - Ele cospe mais um tanto de sangue fresco, pausando momentaneamente seu curto monólogo. - Seres iguais a você acham-se tão superiores, mas a verdade é que não passam de criaturas boçais.

— Como se atreve a falar desse jeito? - o enfermeiro começa a gritar e sua voz parece se distorcer à medida que seu tom eleva-se, é quase como se duas pessoas falassem ao mesmo tempo. - Acha mesmo que simples explosões e um pouco de fogo são capazes de matar qualquer um nós?

— Ficaria surpreso com o que um pouco de nitroglicerina, pólvora, velas e uma mente brilhante podem fazer. - Camélia interrompe com a voz tremula, porém tenaz.

— Estas pequenas explosões ridículas jamais conseguiriam derrubar algo como o Sword&Katherine. Só serviram para assustar algumas pessoas... - ele revida com a voz firme.

— Se está tão certo disso - Carter confronta-o novamente com altivez -, do que tem tanto medo?

O enfermeiro, com os punhos cerrados, prepara-se para acertar o rapaz mais uma vez, porém é detido por uma voz que ecoa de forma soberana, obtendo a atenção de todos que ali estão, exceto por Jared que continua extremamente concentrado em outra coisa...

— Espere, Bélior - um dos enfermeiros no canto da sala pronuncia-se e o homem alterado congela obedientemente no mesmo instante, voltando-se para o homem estranho que sai das sombras em meio à outros cinco enfermeiros.

Ele com toda a certeza destaca-se em meio aos outros... Seus rosto anguloso e de queixo rubro é bastante incomum. Jamais vi alguém com estas características em toda minha vida. Seus olhos, negros como a noite, parecem brilhar em contraste com os cabelos no mesmo tom. As marcas de expressões vívidas entorno de seus olhos lhe dão um ar de sobriedade e, ao mesmo tempo, arrogância...

Sinto como se pudesse mergulhar em seu olhar e me perder em seu interior, ainda mais intenso e confuso que o de Jared... Mas isto não é a única coisa que o difere. Uma cicatriz, profunda e bastante evidente, contorna seu rosto sombrio. Do olho esquerdo à ponta de seu lábio superior, como se algo tivesse tentado arrancar parte de sua face.

— Não se precipite - o homem da cicatriz continua enquanto aproxima-se de nós abandonando àqueles que ainda aguardam nas sombras. - Devemos mantê-los vivos... Sabe muito bem o por quê.

— Vejo que Bélior arranjou um novo senhor... - diz Carter, porém não tão agressivamente quanto antes. É como se temesse alguma coisa.

— Não se deixe enganar... - o homem pacificamente caminha até ficar de frente para Carter... Vejo uma certa semelhança entre eles e, ao mesmo tempo, inúmeras diferenças. - Sou apenas uma pequena parte de tudo isto. Mas para seres como você é tudo preto ou branco, certo?

Novamente este termo surge... O que eles querem dizer com isso? A cada novo dialogo sinto que me perco ainda mais na teia de confusão que formou-se ao meu redor. Quanto mais me é revelado, menos entendo...

— E como deveria entender isso? - Carter responde com deboche, mas ainda mantém o tom baixo.

— Do jeito que quiser - responde o outro -, de qualquer forma, não me importo com o que uma peste como você pensa... São menos que lixo. Deformidades. Que apenas vagam perdidos entre dois mundos e, ao mesmo tempo, não pertencem a nenhum...

— Q-Quem é você para dizer isso? - Camélia diz, levantando os olhos pela primeira vez. - A esta altura deveria estar correndo para o mais longe que pudesse deste lugar...

— Não esta referindo-se àquelas explosões, está? - o homem sorri pela primeira vez e, sinceramente, preferia que não o fizesse. Cada palavra que sai de seus lábios me assusta de forma exorbitante.

— Não nos subestime, Alastor - Carter obtém sua atenção outra vez e parece surpreender o outro ao pronunciar seu nome.

—  Como sabe... - ele começa, porém é interrompido pela voz frágil de Camélia.

— Fizemos nossas pesquisas... Não pense que viemos para cá sem saber das consequências. Estamos prontos para morrer se necessário, mas vamos levar toda a escória conosco...

— Está certa disso, minha querida? - o homem recompõe-se e se debruça sobre a cadeira de Camélia, esticando seus dedos longos para tocar na testa da moça. - Pois posso garantir que sua morte será a mais sofrível que possa imaginar...

— Mas não havia dito que precisava de nós vivos? - Carter parece alarmado de repente.

— Não de todos - responde o outro e, imediatamente, seu toque faz com que Camélia grite em agonia.

O som de seu sofrimento reverbera mais uma vez pela sala e sinto meu coração quase saltar pela boca. Não entendo como um simples toque possa fazê-la sofrer tanto, ainda mais que os dedos quebrados. Vejo veias roxas começarem a se espalhar pelo corpo dela... Todas brotando de onde os dedos de Alastor estão tocando... O rosto da mulher empalidece subitamente e seu olhar se perde em algum lugar em meio a escuridão.

Ele está, de alguma forma, matando-a...

Dirijo meu olhar assustado para Carter e nossos olhos encontram-se por apenas alguns segundos... Ele está tão arrebatado quanto eu, tentando a todo custo livrar-se das amarras. Em seus olhos vejo toda a dor que o rapaz sente ao ver sua irmã ser morta de forma tão cruel. Não entendo como não percebi a familiaridade antes... Os mesmos olhos, o mesmo rosto belo e jovial... A mesma sensibilidade e conforto na voz. Poucas diferenças os desirmanam. Eles são uma família... Estranha, mas ainda sim, uma família. Não posso permitir que sejam separados de tal forma. Tenho que impedir isso.

— Pare... - digo, porém minha voz continua rouca e baixa... - Pare, por favor...

Agito-me em minha cadeira desesperada. Sinto minhas mãos, dormentes pelo aperto forte das acordas, contarem-se com o atrito e as minhas lágrimas voltam a brotar descontroladamente. Não entendo direito o porquê, mas não quero que ele a machuque. Não conseguirei suportar vê-la ser morta desta forma. Sei que ela, assim como os outros dois, escondem-me dezenas de coisas, mas ainda sim ajudaram-me... Tentaram me levar com eles. Me concederam a liberdade que tanto sonhei, mesmo que por apenas alguns instantes.

— Eu... - digo enquanto tento pensar em alguma coisa e, então a resposta surge em minha mente como um estalar de dedos. - Eu lhe direi onde estão bombas!

II

A atenção de todos volta-se para mim, incluindo a de Alastor, que afasta-se de Camélia. As marcas roxas, como as raízes profundas de uma árvore velha, desaparecem quando Alastor deixa de toca-la. Todas aquelas veias macabras parecem voltar para o ponto de origem, desaparecendo sob a pele negra de Camélia... A mulher, ainda com uma expressão de horror gravada em seu rosto, deixa seu peso cair para frente, de forma que seus cabelos cacheados passam a ocultar seus olhos em prantos.

Ela respira ofegantemente, tentando inspirar a maior quantidade de ar possível. Fico aliviada de saber que ainda está viva, pelo menos, por hora... Carter solta um suspiro de alivio sem tirar seus olhos da irmã, analisando cada detalhe para ter certeza de que ela está minimamente sã.

Porém, meu consolo rapidamente é substituído por uma agonia ainda maior... Dirijo meu olhar para a figura sinistra que se aproxima de mim, encarando-me de uma forma tão fixa que acho que poderia enxergar através de mim se assim quisesse. Meu coração dispara outra vez cada passo sereno que o homem da cicatriz dá em minha direção.

— A garota de olhos violeta... - diz ele em tom suave. - Quase havia me esquecido de sua presença. É tão inútil que não pensei que pudesse dizer qualquer coisa...

— Então admite estava engado - respondo tentando não demonstrar meu medo. Não tiro os olhos de seus dedos, acompanhando suas mãos por onde quer que estejam. Apenas para me certificar de que não me tocaram.

— Isto é o que veremos - continua Alastor obstinado. - Você não é como eles... Não sinto a mesma energia que eles exalam, o mesmo odor repugnante da espécie deles. Não, o seu é diferente. Nunca senti algo assim antes... E eles também não, acredite.

— O que quer... - pergunto confusa. - O que quer dizer com isso?

— Você não é um deles, qualquer um com o mínimo de discernimento pode perceber. - O homem curva-se suavemente para encarar-me nos olhos, mas não me toca... Pelo contrário, leva suas mãos às costas, de forma que as oculta e as tira do meu campo de visão. Dirijo meu olhar para os seus olhos, em contraste com seu ato... E apesar da minha respiração pesada, Alastor mantém-se frio e distante. - O que me deixa duvidoso do quanto eles contaram de seu "plano" para você, uma garota em que claramente não confiam.

— Eles confiam em mim... - digo hesitantemente. Minha voz falha em certo ponto, enquanto ainda mais pensamentos controversos surgem... Pairando como bolhas de sabão em minha mente prestes a estourarem. - Vieram aqui para me salvar, é meu dever fazer o mesmo.

— Eles tem medo de você - afirma ele -, assim como todos que a conhecem... Estão levando você com eles apenas por que acham que pode ser uma ameaça.

— Está errado! - Desvio meu olhar, tentando, de alguma forma, criar uma barreira entre mim e ele.

— Pense bem, o que eles já lhe contaram no curto período em que estavam juntos - a voz de Alastor parecesse sobressair-se entre os sons do ambiente, é como se fosse a única coisa que pudesse escutar. Nem mesmo meus pensamentos estão completamente claros... - Quantas vezes mentiram para você... Tem certeza de que eles confiam em você?

— E-eu... - gaguejo enquanto tento segurar as lágrimas. Alastor está certo... Todas as memórias que tenho com eles, começam a voltar... As mentiras, as enganações, os segredos. Há tanto que ainda não compreendo e, ainda sim, quero proteger estas pessoas. O que estou fazendo?

— Como pode me garantir que isto não é apenas um blefe? - Alastor continua antes que eu tenha a chance de dizer qualquer coisa. Vejo sua figura começar a caminhar envolta de mim, circulando-me enquanto passa a ponta dos dedos na cadeira em que estou, ainda sem tocar-me. Parece... Uma ameaça. - Como sei que posso confiar que você, uma garota sem qualquer ligação com eles, sabe de alguma coisa? Que não está apenas ganhando tempo?

— Não pode - respondo tentando acompanhar cada um de seus movimentos - e não saberá. Sua única escolha... - vacilo por um segundo, hesitando. - É confiar no que digo ou então pode continuar "interrogando" os outros, porém não acredito que lhe dirão qualquer coisa....

— Se está tão certa disso - Alastor afasta-se enquanto esboça um sorriso malicioso com o canto do lábio esquerdo, fazendo com que sua cicatriz lembre uma onda -, façamos um acordo.

— Jane - ouço a voz distante de Carter tentando me tirar do pequeno transe em que Alastor prendeu-me -, não o escute... Acordos com pessoas como ele...

— Calem-no - ordena Alastor aos outros enfermeiros. Os homens se apressam obedientemente e colocam algo em sua boca, que não sei bem o que é. Carter continua a tentar dizer qualquer coisa, porém apenas resmungos podem ser ouvidos.

"Desculpe-me Carter, mas tenho que fazer isso... Tenho que tentar salva-los." Digo em minha própria mente enquanto encaro o rapaz, tentando transmitir estás palavras de algum jeito. Volto meu olhar para Alastor e falo com altivez.

— Que tipo de acordo?

Dito isto, o sorriso do homem abre-se. Como se estivesse maravilhado com minha resposta. Em contraste com isso, meus olhos dirigem-se para as sombras, onde uma figura negra e pálida surge... Destoando-se do entorno. Ela aguarda silenciosamente, oculta e, mesmo que não o fizesse, creio que ninguém mais a veria. Sou a única que tem este "dom".

— Faremos da seguinte forma - continua Alastor obtendo outra vez minha atenção -, Já que está tão segura, por que não apostar sua vida nisso? Você pode me dizer onde estão as bombas, mas se errar, pagará com a mesma... Dará ela a mim de bom grado. Cuidarei pessoalmente para que tenha a morte mais lenta e dolorosa possível. - Engulo em seco, enquanto encaro o homem nervosamente... Apostar minha vida nisso, será que sou capaz? Aceitar esse acordo é como uma sentença de morte.

— Mas e seu eu acertar? - pergunto tentando não demonstrar o medo em minha voz.

— Não acredito essa seja uma possibilidade - responde ele seguramente. - Mas, se for o caso... Voltará para a sua cela no S&K, como se nada houvesse acontecido. Para passar o resto de seus dias como deveriam ter sido antes de estas pessoas repulsivas aparecerem...

Conforme o homem fala, mais figuras pálidas começam a surgir de todos os cantos da cela úmida. Figuras tristes, ensanguentadas, deformadas e queimadas... Todos encarando-me assustadoramente. Como se esperassem pela minha resposta. Não entendo o que está acontecendo.

— Não me parece muito justo... - respondo ponderando sobre o que o homem acaba de propor.

— De fato - Alastor concorda, para minha surpresa. - Mas isto é porque é muito fácil apostar sua própria vida... O que ela vale? Passou anos presa neste lugar, nem ao menos sabe como é o mundo lá fora... Chega a ser deprimente. - Mordo os lábios segurando minhas lágrimas. Suas palavras acertaram-me em cheio. Está é a verdade nua e crua e, embora seja dolorosa, está certa... - E isto nos leva a sua terceira opção.

— Terceira? - repito.

— Ao invés de arriscar em dizer onde estão as bombas, e errar drasticamente, abrindo mão de sua vida... - Alastor exibe mais uma vez aquele mesmo sorriso malicioso que mostrará anteriormente - Você pode escolher um deles para morrer em seu lugar aqui e agora e eu a deixarei livre...

— Livre? - pergunto alarmada ao ouvir tal palavra. - O que quer dizer com isso?

— Você não deveria estar aqui - explica o homem enquanto aproxima-se e coloca seus dedos suavemente sob minha pele nua nos braços... Sinto o toque frio de seus dedos queimar-me. E eu grito... As pequenas veias roxas brotam em minha pele de um tom tão branco que é quase transparente, criando um véu negro sob meus ferimentos... A dor é alucinante, algo que jamais senti antes. - Não é justo que sofra por estas pessoas...

A voz dele penetra minha mente e parece mais alta que meus próprios gritos... Quero expulsa-la manda-la embora! Quero que ele saia de minha cabeça... Pare... Por favor, pare!

Então ele afasta seu toque de repente, trazendo-me de volta à realidade... Meu corpo inteiro treme com a lembrança recente da dor e luto contra a vontade de vomitar. Minha cabeça não para de girar. Me sinto tão fraca e impotente...

— Eles mentem e a enganam desde que a conheceram... Isto não é injusto? Por que sofrer por alguém como eles? Apenas escolha alguém para morrer em seu lugar e eu lhe considerei a vida que tanto quer... Ou pode ficar aqui e ter o mesmo destino que os outros.

— Pensei que os mataria... - digo quase que em um sussurro.

— Não mesmo - ele responde sem qualquer fingimento em sua voz -, tenho outros planos para eles... Apenas um irá morrer hoje... Será você ou um deles? A escolha é sua.

As sombras cálidas, nos cantos, começam a aproximar-se de onde estamos... Amontoando-se ao nosso redor e impedindo que eu veja qualquer coisa além deste pequeno circulo que formou-se de repente.

— Por quê? - pergunto. - Por que está deixando-me escolher algo assim?

— Isso terá que descobrir sozinha...

Meu coração bate de forma descontrolada... Não apenas pelo estranho acordo que este homem me oferece, mas também pelas figuras assombrosas que estão ao nosso redor. O que está acontecendo? Porque há tantas delas? Este lugar... Sinto algo estranho emanando, como um cheiro podre. Tudo é embaçado e negro... Como se algo horrível tivesse ocorrido bem aqui. Os fantasmas ao meu redor me dizem isso. Seus rostos, à principio tristes, agora estão carregados de ódio...

Quero compreender o que está acontecendo, porém não posso desligar-me completamente da realidade... Alastor espera minha resposta. Devo tentar a sorte e apenas chutar um lugar qualquer? Mesmo que acerte, ainda estarei presa no S&K e, para mim, isto é o mesmo que a morte... Mas não posso condenar alguém em meu lugar. Eu quero escapar daqui, quero ter a chance de viver. De conhecer o mundo, mas se precisar fazer algo tão horrível para consegui-lo...

Presumo que não seria capaz.

Alastor deve saber disso. Por este motivo me propôs algo tão absurdo. Ele sabe que estou blefando sobre as bombas... Nem ao menos sei se isso é mesmo obra delas. Como aquele trio pode ter trazido tantas bombas escondidas para um lugar como este...? Nada faz sentido para mim. Seria tão mais fácil se Jared tivesse me contado tudo! Se Camélia não insistisse em guardar segredos. E se Carter simplesmente dissesse o que eles querem saber.

Por que tudo tem que estar em minhas mãos? Não compreendo. Alastor está certo, não tenho que pagar por essas pessoas... Elas nem confiam em mim. Ainda sim, não posso evitar... 

 - Se eu escolher alguém para morrer em meu lugar - digo com cautela -, qualquer um deles, me deixará livre? Poderei ir embora do S&K para sempre? Permitirá que eu tenha a vida que sempre sonhei, sem truques ou enganações? Prometa que não irá me ferir ou que nenhum de seus seguidores o fará!

— Tem a minha palavra - afirma Alastor curvando-se para mim.

— Sendo assim - continuo. - Eu aceito seus termos...


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

E agora? Quem Jane escolhera para pagar em seu lugar? E qual a relação de Alastor com nossos outros três misteriosos personagens? E, principalmente, por que ele concedeu tal decisão a Jane?

Sinto muito, mas as respostas terão que esperar até o próximo capítulo.

Se quiserem deixei um comentário com suas teorias, vou adorar lê-los e saber que vocês estão achando da história, é o que me motiva a continuar.

E se vc ainda não está acompanhando, o que ta esperando? O botãozinho ta aí para isso. Não te custa nada e me ajuda muito. ♥

Tchauzinho, amo vcs. Até o próximo capítulo.



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Chamas Azuis" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.