Contos de uma Viajante do Tempo Vol 1 - James Dean escrita por Sofia Casanova


Capítulo 12
Capítulo 12




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Sexta-Feira, 22 de Setembro
19:00 horas

Olívia e James estavam sentados no sofá e entre eles um gato siamês que James ganhara de Elizabeth Taylor que ele batizara de Marcus. Era um filhote agitado que gostava de morder e arranhar: ora ficava nas pernas dela, ora subia nos ombros de James.

— Você não me escreveu.

— Não deu. Eu queria mas não deu. – desculpou-se ele. – Mas vou te contar tudo o que aconteceu. Passei algumas semanas sem filmar, porque ainda não havia chegado minha vez e tive que ficar com roupas de cowboy andando pelo set. Rock Hudson ficou pagando de heterossexual mas depois me chamou pro quarto dele e me pediu para vestir uma roupa de mulherzinha. – disse ele acendendo um cigarro.

Olívia o olhou sem acreditar no que ouvia.

— Você está me dizendo que aquele homem lindo de 1,93 m de altura gosta de ... – ela não sabia qual a palavra adequada para a época.

— Ele se veste de bailarina em suas festas privadas com amigos. A Elizabeth me falou e me disse que ele já está sendo falado porque não casou ainda e querem arrumar alguém pra abafar o caso. Parece que ele curte pegar garotos que estão nas esquinas. – ele soltou a fumaça do cigarro lentamente enquanto Olívia o observava. – Ele queria transar comigo, mas eu preferia ficar conversando com  Elizabeth Taylor até de madrugada. Lá é muito quente e dificulta o sono. A gente bebia Martini de chocolate até de madrugada e depois acordávamos fodidos.

Olívia não conseguia formular pergunta alguma nem pensar em nada além do quão bagunçada e errática Hollywood era no privado. Quantas histórias mentirosas não fizeram a cabeça dos fãs ?

— Você está bem calada. – ele acariciava as pernas dela.

— Eu estou chocada com tudo o que você me fala. – ela o olhou em canto de olho. – Você transou com a Elizabeth?

Ele riu ainda com o cigarro na boca. Deu uma tragada e soltou a fumaça.

— Não, mas adoraria. Ela teve um filho tem 3 meses.

Olívia percebera que quando James se mistura com panelinha errática ele muda de comportamento. O James Dean verdadeiro podia ser visto no filme East of Eden: aquele menino doce, sentimental e amável, carente de amor e atenção. O James rebelde, que dorme com cão e gato e possivelmente com mulheres em período de pós-parto não era quem ele realmente era mas quem ele queria ser.

— Dia 29 eu volto pra casa, definitivamente. Vamos para Salinas? Vai ter corrida e eu  recebi um telefone de um amigo que conserta carros de corrida. Meu Porsche está pronto e quero correr nesta cidade. A gente sai dia 30 daqui e volta de madrugada.

— Adoraria . – disse ela . Era esta a resposta para seu dilema: Salinas – Eu já vou estar livre do meu estágio e aí a gente some.

— Quando você terminar seu estágio, o que você vai fazer?

— Não sei. – ela disse a verdade. Ela mentira dizendo que seguiria carreira na área da ciências mas ela estava balançada pelo convite que recebera de Donald.

— Porque você não volta para o estúdio? Você parece gostar de lá.

— Estou pensando nisso. Donald disse que sempre haverá contrato se eu quiser.

— Acho que você deveria investir na sua carreira, talvez você não tenha mais outra oportunidade. Acredito que você ficaria melhor aqui em Hollywood.

***

Olívia rolou a madrugada toda em sua cama com as palavras de James Dean. O plano era salvá-lo e ir embora mas tudo começou a trabalhar para que ela ficasse, como ela de fato havia ficado por um bom tempo anos antes. Olívia havia nascido em 1989, no ano do filme do Batman com Michael Keaton. Cresceu bebendo, comendo e vestindo tudo o que seu tempo podia prover. Ela sempre acreditou na passagem bíblica do livro de Eclesiastes 9 onde diz  que nem sempre o atleta mais rápido ganha a corrida e nem sempre o mais sábio tem o que comer: tudo é uma questão de tempo e oportunidade. Olívia estava esperando a oportunidade que nunca vinha.

Fez faculdade de Biologia aspirando ser uma Investigadora Criminal mas as portas se fecharam. Fez um curso técnico de Biblioteconomia e começou a trabalhar em bibliotecas onde poderia destruir suas frustrações fazendo o que mais gostava: consertando, limpando e arrumando livros. Ainda assim, ela não conseguia produzir como gostaria. Depois da Segunda Guerra, onde experimentou e fui reeducada nas maneiras old-fashion começou a se sentir deslocada de sua própria realidade: tinha desejo de se casar, ter filho, aprender a cozinhar, costurar e trabalhar. Ninguém em 2017 desejava isso e quem deseja é um perdedor. Outra coisa que ela notou: quando viaja no tempo, suas habilidades e talentos naturais desabrocham e as oportunidades de trabalho são tantas que ela desejaria se dividir em várias para ocupar um cargo em uma edição de revista feminina, editora de jornal, dançarina, atriz. Sua estima era baixa, sua confiança era nula e somando-se a isso, a rejeição. Olívia já havia sido rejeitada ou trocada várias vezes pelos rapazes, mas a coisa mais estranha que ela  já viveu foi zombarem dela por ser inteligente e ainda levantarem a hipótese dela ser louca.

Ser zombada por ser inteligente: ela precisava com urgência sair desta era.

Aqui, na década de 50,foi o ano em que ela se sentiu alguém digno: trabalhou, viveu, pagou suas contas, fez amigos. Ela ainda se sentia terrivelmente só, mas produzia e ganhava reconhecimento próprio e de outros pelo seu trabalho. Ela poderia acatar o conselho de James e ficar.

Dia 29 de Setembro

James Dean chegou ao meio – dia. Desfez as malas, colocou a roupa limpa no guarda-roupa e checou os recados anotados por Brigite e gravados na secretária eletrônica.

Primeiro Recado : Pier Angeli

Oi,Jimmy! Sou eu Pier. Eu soube que você estava no Texas filmando com Elizabeth Taylor e Rock Hudson. Tem coisa grande vindo aí para você. Fiquei feliz em saber. Estou ligando para dizer que Vic e eu vamos ter um bebê e gostaria que você soubesse. Me liga para contar como foi lá na gravação. Até mais.

 

Porque ela ainda faz isso? Se ela não quis casar com ele, porque ainda liga pra esfregar na cara dele a sua felicidade? Não bastasse uma mãe que fazia de tudo para separá-los ( e conseguiu), ela não aceitou casar com ele e ele leva a culpa de tê-la rejeitado. Os jornais dizem que ele não queria perder a liberdade. Que liberdade? Ele nem tinha amigos aqui. A única em quem ele confiava depois de Pier, era Olívia. Ele as achava muito parecidas.

Segundo Recado: Bosco Niemens

Jimmy, rapaz. Você não liga de lá do Texas para dar notícias. Espero que não tenha se machucado e esteja bem de saúde. Eu soube que o calor deixou Elizabeth Taylor em péssimo estado.Me ligue quando chegar.

 

 Terceiro Recado: Jack Warner

Jimmy, aqui é Jack Warner. Estou ligando para lembrar que você está proibido de correr, está me ouvindo? Não quero ver foto sua nos jornais correndo outra vez. Não me foda!

 

Quarto Recado: Eartha Kitt

         Jimmy ,sou eu Kitt.Liguei para saber como você estava. Senti um peso no coração esses dias, quero saber se você está bem.Me liga, garotão.

 

Você não tem nenhum recado.

James pegou o telefone e discou para Rudolf Wutherich , o seu amigo de corrida e criador do seu Porsche.

— Rolf, sou eu Jimmy. Posso pegar o Little Bastard hoje?

***

James Dean era o cliente favorito da concessionária. Depois do filme East of Eden,juntou uns trocados e comprou o carro mais caro da loja: O Porsche Cinza. Mas não parou por ai. Ele pediu para que reformassem e pintassem o nome Little Bastard na traseira do carro. Ah, e ele tinha que prestar para correr e correr muito.

— Está na mão,Jimmy. – Disse Rolf com seu sotaque Alemão nada discreto. – Não é uma belezinha?

— Já posso correr com ele?

— Com certeza. – ele passou a chave para James. – A propósito, seu agente ligou para cá perguntando se você ligou por esses dias.

James riu. Até aqui eles o perseguiam.

— Esse meu agente parece minha mãe. Está tudo certo para irmos à Salinas?

— Só dizer a hora.

James pegou seus par de luvas para entrar no carro mas voltou-se outra vez para Rolf.

— Posso usar seu telefone?

— Claro. – Ele conduziu James para sua sala.

Ele discou o número de Olívia.

— Ei, gata. Está ocupada?

***

“Então esse é o famoso Little Bastard que foi pro leilão quando James Dean morreu?” – pensou Olívia passando a mão pelo Porsche cinza.

— James, você tem um ótimo gosto para carro. Sério! Eu não entendo de carro mas... Eu imagino um esmalte desta cor na minha unha. 

— Quer dar uma voltinha?

— Agora. – Olívia pulou por cima do carro.

— O carro tem porta, sabia? – disse James

— Ah...- Olívia pulou de volta para fora do Porsche e abriu a porta. – Foi mal.

— Vamos correr um pouco. Me conte as novas. – disse ele enquanto dava a ré.

— Hoje terminei meu estágio, tirei notas excelentes.

— E agora? Você pensou no que falei?

— Fiquei sem dormir, na verdade.

— Então, mudei sua cabeça?

— Talvez.

— Se você ficar, eu prometo que farei um musical só pra você cantar.

— Eu adoraria ver você dançando em Singin in the Rain.

— Não, esse filme é muito ruim.

— Sai dessa, seu besta! Ruim é tu e ainda tem contrato com a  Warner Bros.

Eles riram.

Eles foram até Victorville, comeram e andaram pelas ruas. Havia chovido e estava abafado apesar de estar anoitecendo. Olívia estava excitada por saber que correriam amanhã e mesmo que não gostasse deste tipo de atividade faria qualquer coisa para salvar a sua vida daqueles assediadores.

Voltaram para casa de James por volta das 21:00 horas e havia um carro parado no portão. O coração de Olívia batia forte, ela estava diante de um dos possíveis assassinos de James. Um homem saiu do carro , acenando para eles.

— Jimmy, você não me ligou! – Disse Bosco.

— Eu ia ligar! – disse James abrindo o portão de sua casa.

Como sempre, Bosco dispensava qualquer contato, educação ou formalidades com Olívia. Era como se ela não existisse. Quando James  estacionou o carro na porta de casa, Olívia desceu do carro, pegou o casaco de James e entrou. Ela pediu para usar o banheiro e ele foi para seu escritório com Bosco.

— Você estava me seguindo hoje, depois que peguei o Porsche? – perguntou James

— Eu? Não era eu. Não desta vez.

— Eu fui seguido até Victorville por um Ford Crown Victoria preto. E pelo que eu sei, ele consta na sua coleção de carros.

— Mas não era eu.

—Não era você no seu carro, mas era seu carro.

 Bosco respirou fundo e rendeu-se.

— Você não me ligou durante esses dias

— E por isso me seguiu até o inferno.

— Pedi para que alguns dos meus fossem atrás de você. Olhe, amanhã eu estava pensando em dar uma festa para comemorar seu trabalho em Giant. Eu pensei que seria bom para você e para a publicidade. E a garota? É caso sério?

— Não darei festa amanhã. Talvez no próximo fim de semana.

— O que vai fazer amanhã?

— Vou para Salinas.

— Jimmy, você vai correr?

— Vou.

— Já tem um tempo que você anda fugindo de suas responsabilidades. Você se esqueceu que eu criei James Dean? Eu peguei aquele caipira mal-educado e  o transformei em um Rebelde por quem todos caem aos pés?

— Sim, e também precisei dormir com a terça parte dos viados de Hollywood.

— Nós temos um acordo, não permitirei que você falhe. Se você não cumpre com o trato você paga com sua vida, você sabe disso.

— Eu não vou mais me submeter a esta  merda de ritual e sexo. Escolha outra vítima e eu sigo daqui. E se você insistir eu mesmo vou te demitir e te entregar.

Olívia estava sentada na sala fingindo que não ouvia nada enquanto lia a revista Photoplay. Agora tudo fazia sentido. Através de rituais, eles enterravam a verdadeira persona e criavam uma. Ela se lembrou do meme que surgiu em 2008 chamado: Toda sala de aula tem. Eram vários desenhos representando a personalidade. Toda sala de aula tem: Um gostosa, um burro, um nerd, o músico, o que só dorme e assim por diante. Agora o tema é: Toda Hollywood tem: Um rebelde sem causa.

Bosco abriu a porta abruptamente e Olívia desviou sua atenção da revista para ele. Ele atravessou a sala e saiu da casa batendo a porta fazendo um grande eco. Não demorou para que James saísse do escritório.

— Faz tempo que você está ai? – perguntou ele

— Acho que sim.

— Você ouviu a conversa?

— Ouvi briga, mas não posso dizer que entendi. Não me meto em briga de homem, me deixa bastante nervosa. – ela levantou a revista – acabei de descobrir que meu antigo crush se divorciou e perdeu a guarda da filha mas ganhou a guarda do cachorro chamado O’Flynn.

— Mal pra ele.- disse ele de mal humor - Vamos, eu te levo para casa.


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