Yo Quisiera escrita por wldorfgilmore


Capítulo 2
Capítulo 2




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Darcy observava todo o caminho que percorrera da estação em que viera até a fazenda Ouro Verde, que pertencia a sua família por inúmeras gerações. A cada nova paisagem que seus olhos redescobriam, mais a familiaridade se tonara reconfortante. Questionava-se internamente o porquê não voltara antes ao Vale do Café.

Há sete anos despedia-se de sua terra, deixando toda sua infância e adolescência para trás, havia recém completado 18 anos quando fora morar no exterior com parte de sua família, para formar-se na profissão que fora destinado. Sua pretensão era estabelecer-se apenas o tempo necessário para a sua formação como economista e, logo depois voltar para o Vale do Café e tocar os negócios da família com o seu pai.

Mas aprendera a viver em Londres e gostara da vida que formara no exterior, tornara-se popular em sua universidade, acarretando dezenas de novas amizades. Também frequentava a elite londrina com seus inúmeros bares e casas noturnas. Era um mundo completamente diferente do Vale do Café, onde crescera. Londres o despertara para o mundo e, com a adaptação no ambiente, deixara a saudade do Vale do Café como segundo plano. Contudo, dois anos após a sua formação, estava voltando ao Vale pra resolver algumas pendências econômicas em relação aos negócios de sua família. Seria uma viagem relativamente rápida, pouco mais de um mês para a volta à Londres.

Todavia era surpreendente o que aquelas imagens de um menino ainda ingênuo correndo por aqueles campos estavam lhe causando, surpreso com a saudade, Darcy encontrava-se sorrindo sozinho, há muito havia esquecido o ar aconchegante do Vale do Café.

— Darcy, já estamos chegando? Eu não aguento mais esse cheiro de planta molhada e o balançar desenfreado que esse... esse tipo transporte estranho esta fazendo. Aliás, deveriam asfaltar estas estradas, não acha? - resmungou Susana ao seu lado.

— Isso é uma carruagem, Susana. E estamos no campo, esse desalinhamento é natural.

Susana pôs-se emburrada ao seu lado e calou-se.

Darcy havia conhecido Susana a pouco mais de um ano em um dos bares que frequentava com os amigos. Com os gostos em comum, tornaram-se amigos e, pouco tempo depois, desenvolveram uma relação mais íntima. Darcy, desde seu começo na universidade, vivia cercado por as mais diversas mulheres, era um homem atraente e obviamente isso gerava desejo no sexo oposto. Não as dispensara, gostava dos prazeres que a vida lhe proporcionava, mas nunca havia desenvolvido uma relação sólida com nenhuma de suas pretendentes. Susana tampouco chegara como uma paixão avassaladora em sua vida: Darcy apreciava sua companhia, seus gostos em comum, e ela não o pressionava para o casamento, como alguns de seus pequenos namoros anteriores. Não pensava em casar-se, tampouco descartava a ideia. Darcy havia desenvolvido uma personalidade tranquila em relação a compromissos longos, deixava-se levar enquanto estivesse confortável com a situação, e se, com o tempo de convívio, cogitasse a ideia de dividir a vida inteiramente com alguém, o faria. Susana era o seu relacionamento mais longo, totalizando até então nove meses de relacionamento, era cômodo estar com ela, então continuava com seu envolvimento.

Não havia proposto à moça levar-lhe ao Vale do Café, Susana apresentou curiosidade sobre o local quando Darcy comentou sobre sua viagem. Também não vira mal algum em levá-la e apresentar-lhe aos seus pais, Darcy recordara-se de ter comentado com seus familiares sobre seu envolvimento. Mas, naquele exato momento, começara a mudar um pouco de ideia em relação à vinda em companhia.

— Darcy, e agora, estamos chegando?

— Susana, não aja de maneira infantil. Você me perguntou isso há exatos – olhou no relógio -, 3 minutos.

— Darcy! - repreendeu - Não fale assim comigo. Eu não imaginava que a fazenda era tão longe da cidade e nem que as estradas por aqui estavam nessa situação.

— Pois bem, como você exatamente imaginava que seria uma fazenda? Suntuosas estradas de concreto? Arborização rasteira, completamente podada? – ironizou Darcy.

Susana bufou ao seu lado e revirou os olhos, virando novamente para o seu lado da janela. Darcy fez o mesmo movimento, atentando-se a cada detalhe que perdera enquanto estivera em Londres.

— Charlotte. Papai. - abraçou-os assim que desceu da carruagem. - É sempre um apreço revê-los.

— Meu irmão, eu nem acredito que está aqui novamente. Finalmente veio até nós, sabe que eu não gosto muito das terras londrinas.

— Todos nós sabemos. Sempre foi mais tranquila e fica impaciente quando vai passar as férias comigo. – concordou com a cabeça, sorrindo.

— Oh, achei que disfarçava bem. – fingiu surpresa, brincando com o irmão.

— Meu filho, fico feliz que tenha vindo respirar um ar mais puro. – disse Lorde Williamson. – Torço veementemente para que se acostume e possa ficar conosco de vez.

— Ah, meu pai, sabe que gosto da minha vida em Londres. Eu só estou aqui para os negócios. – respondeu gentilmente. Charlotte e Lorde Archiebald não perdiam a oportunidade de fazer o filho repensar a vida em outro país.

— Infelizmente – sorriu para o filho -, vejo que veio acompanhado de uma bela moça.

— Essa é Susana, suponho que tenha comentado sobre nosso relacionamento em uma de minhas cartas.

— De certo. Esta é a famosa Susana! É um prazer conhecê-la. – cumprimentou o Lorde.

— A mim mais ainda - respondeu simpática. -, Darcy fala muito de vocês, espero que não seja um incomodo a minha visita.

— Claro que não, a namorada de meu irmão é sempre bem vinda nesta casa – disse Charlotte de forma simpática. –, espero que possamos nos conhecer melhor.

— Iremos. Darcy sempre comenta sobre a semelhança em nossos gostos. Também fala que você é uma ótima pessoa.

— Meu irmão exagera um pouco.

— Tenho certeza que é absolutamente fiel em suas descrições.

#

O vestido de Elisabeta havia prendido em dos galhos da árvore que acabara de descer e, ao arrancá-lo, rasgou parte da peça que estava vestida.

— Já imagino toda Ofélia resmungando como nunca, Tornado: "Elisabeta, você é uma inconsequente." – dizia ao cavalo, imitando a voz da mãe. – Essa peça foi especialmente confeccionada para o Baile de pretendentes que Ema fará para si mesma a procura de seu par. Estou levemente encrencada.

Elisabeta sentou na grama, deixando suas costas encostadas na árvore que havia acabado de descer, voltando para tornado novamente:

— Sabe, Tornado... – olhou para o norte. – Eu não me imagino entrando em uma igreja, casando de maneira pomposa, tendo uma vida inteiramente doméstica ou pertencendo a alguém. Mamãe que vive me arrumando pretendente a torto e a direita, até o coronel da cidade entrou em sua lista. – riu, lembrando da lista de homens que a mãe fazia para apresentar-lhe, sabia que era a única filha que não sonhava com um bom marido. – Acho que vai ser só eu e você, Tornado. – acariciou o cavalo. – Eu, você e toda essa imensidão a nossa frente.

Elisabeta era completamente apaixonada pela cidade em que vivia, não imaginava nada mais bonito do que o Vale do Café, e colocava a sua mão no fogo se alguém apostasse o contrário. Havia nascido no meio daquele campo, crescido no meio daquela mata e faria sua vida ali, sentindo a natureza inteira a sua disposição para apreciá-la em cada canto. Conhecia cada pedaço de sua terra, já andara por matas e morros que ninguém na cidade ousara entrar, mas era curiosa e, a cada nova descoberta, o fascínio por o seu lugar preferido no mundo aumentava. Estava com 23 anos de idade, não sonhava em casar como algumas de suas irmãs casaram ou pensavam em se casar. Se questionava constantemente se a sua aversão ao casamento era de sua essência, personalidade e criação, ou se realmente nunca havia se interessado por ninguém a ponto de nutrir tal desejo.

Ema e Charlotte, suas melhores amigas, sempre censuraram suas ideias, não imaginavam uma mulher que não sonhara de pronto com um casamento.

— Uma flor por os seus pensamentos. – Olegário arrancara uma das pétalas de uma flor ao lado e entregava a ela.

— Amigo, que bom te ver. – sorriu Elisabeta, empolgada com a presença do rapaz. Olegário havia chegado à cidade com os seus familiares há dois anos. Haviam consolidado uma amizade bonita desde então. – Como sabia que eu estava aqui? Ontem mesmo passei na casa de seus pais e você não estava.

— Fui à cidade comprar alguns materiais de pintura para os meus quadros. Informaram-me que estava a minha procura e Ofélia disse que estava com tornado. O vi ao longe.

— Não precisava se incomodar, não era nenhum assunto sério. O que eu queria mesmo era jogar conversa fora, Ema está ocupada com o seu grande e suntuoso baile. – ironizou sua fala, lembrando-se da amiga que amava festas com essas características. – E Charlotte, eu realmente não sei onde essa menina se enfiou. Ela simplesmente sumiu. Sumiu. – enfatizou a palavra. - Estava pensando em ir procurá-la na fazenda.

— Não está sabendo? – questionou.

— Sabendo do que, Ole?

— O irmão de Charlotte voltou à cidade nesta manhã. Ela deve estar passando um tempo com ele.

— Darcy voltou à cidade? – Elisabeta assustou-se com o frio que passara por seu corpo, surpreendendo Olegário com um tom de voz um tanto mais alto.

— O conhece? – A confusão com a reação da amiga era nítida.

— Conheço – o corpo de Elisabeta estava em um estado de euforia, mas a expressão no seu rosto era angustiada. –, éramos amigos... – Pausou. – antes.

Sua expressão não passou despercebida por Olegário. Elisabeta raramente deixava-se abalar minimamente por algum assunto, dizia-lhe, para implicar com a amiga, que sua felicidade constante às vezes atingia um grau irritante.

— Quer me contar?

— Ah, Ole, não é nada demais – tentou sorrir -, nós só éramos amigos quando criança, ele completou 18 anos e foi para a universidade. Eu me lembro que tinha 15 anos na época, éramos bem próximos e, bom, não é nada demais.

— Elisabeta, eu não sou tolo. - encarou os olhos de Elisa. - Sua expressão denúncia que não é só isso. Vocês tinham grande envolvimento? Não tiveram contato desde então? Pode me contar, sou seu amigo, você sabe. – segurou o queixo da amiga, reconfortando-a.

— Bom - bateu no ombro de Olegário -, você realmente não deixa passar uma, seu tonto. – o amigo lhe fez uma careta e apoiou-se nos próprios joelhos. – Você sabe que sou bem próxima dos Williamson e considero Lorde Williamson um padrinho pra mim, assim como Charlotte uma de minhas irmãs. – Olegário concordou. – Mas isso começou com Darcy. Nós nos conhecemos bem novos em uma das festas dos Bittencourt, e a partir deste momento ficamos amigos, desses de infância mesmo, sabe? Crescemos juntos como melhores amigos, assim sempre frequentei a fazenda Ouro Verde. Também era amiga de Charlotte, mas ainda assim, eu era bem mais próxima de Darcy. Lembro que ela ficava doida de ciúmes do irmão, sempre dizia que ele gostava mais de mim do que dela.

— Charlotte sempre foi ciumenta.

— Sempre. Ela não muda. – mordeu o lábio inferior. – Mas eu e Darcy nos entendíamos, apesar de sermos um tanto diferentes. E ele sempre me apoiava em minhas loucuras. Foi uma grande ruptura pra mim quando meu amigo foi para fora do país, apesar de nos comunicarmos por cartas no começo. Ele me contava tudo que acontecia, todos os novos amigos, até sobre algumas conquistas – fez uma careta -, e eu estava realmente muito feliz por ele. Sempre insistia para o meu pai depositar a carta logo para que ele me respondesse. Mas isso mudou. – respirou fundo, encarando o amigo.

— Por quê?

— Não sei – deu de ombros -, as cartas ficaram cada vez mais demoradas, apesar de minhas rápidas respostas, até que um dia pararam de chegar. – abaixou a cabeça. 

— Bom, ele pode ter ficado ocupado – ponderou Olegário -, quando fui para a faculdade de artes, eu tinha turnos puxados.

— Eu realmente não sei, Olegário – respondeu sincera -, ele havia me prometido escrever e estar comigo, mas pode ter sido um trato de adolescentes, sabe? Sem importância pra ele. - apertou as próprias mãos. - O problema é que não consigo não sentir, você bem sabe o quão intensa eu sou.

— Ô se sei, dona Elisabeta. Você é um verdadeiro tsunami em águas calmas. – empurrou seu ombro com o dela.

— Tsunami em águas calmas? E essa liberdade toda para falar assim comigo, onde você encontrou? – brincou a amiga, fazendo-se de ofendida. 

— Tenho toda a liberdade do mundo com você, cara amiga. Já que desde que cheguei não vive mais sem mim. - comentou, gabando-se.

— Não seja presunçoso.

Elisabeta riu do amigo.

— Só te procuro porque você é um bom amigo e sempre me entende. 

— Uau, que interesseira - respondeu em um tom descontraído -, mas obrigada pelas palavras.

Olegário levantou-se, passando as mãos nas calças para se limpar e continou:

— Bom, eu preciso ir. Violet encomendou-me um quadro de seus gatos e preciso voltar ao trabalho.

Elisabeta também pôs-se de pé.

— Tudo bem. Eu também já vou. E obrigada por me escutar, Ole.

— Sempre serei todo ouvidos, Elisa. - depositou um beijo na bochecha da moça. - E desejo que fique bem, ainda mais depois dessa informação.

— Prometo que ficarei. 
Elisabeta viu Olégario subir em seu próprio cavalo e correr pelo campo vasto a sua frente. Respirou fundo, aquela notícia a havia desestabilizado de uma forma que não imaginara. Por muitas vezes ilusionara Darcy voltando ao Vale, mesmo que guardasse certo pesar por não tê-la mais enviado cartas. Já havia acostumado com a ideia de não vê-lo mais desde que soube por Charlotte, que ele não retornaria após a universidade. Evitava tocar no assunto com as amigas, elas tinham ideias infundadas - ou quase, como raro admitia pra si -, sobre a relação que tinha com o Darcy desde que eram menores. E, desde que Darcy parara de se comunicar com ela, evitara tocar no assunto com qualquer outra pessoa e sempre fugia das notícias sobre ele. Era melhor assim, dizia a si mesmo por inúmeras vezes, apesar de muitas vezes se pegar pensando em como seria se voltasse a vê-lo.
Quando Elisabeta subiu no Torno, seu objetivo era voltar para casa, mas com a mente distraída e o pensamento na fazenda Ouro Verde, percebeu-se indo por outros caminhos, até que se viu parando no alto daquele morro que conhecia tão bem. O morro que sempre ia quando era criança, que sempre se refugiava para tranquilizar-se e esquecer seus problemas: O Darlisa.
Darcy e Elisabeta haviam nomeado aquele pedaço de terra com a junção de seus nomes, Dar de Darcy, e lisa de Elisa. Elisabeta lembra de ter rido tanto da cara do rapaz com a sugestão do nome que, com a expressão ofendida do amigo, aceitou o nome de pronto. O monte Darlisa era o local mais alto do Vale do Café, tão alto que quase ninguém visitava o local, mas ele tornara-se o era o lugar preferido dos dois amigos. E ali havia visto o Darcy pela última vez, naquele piquenique improvisado que sua recordação jamais esqueceu.


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