Campo de Girassóis escrita por Ash Albiorix


Capítulo 18
Sobre o primeiro de muitos


Notas iniciais do capítulo

Último capítulo, galera, espero que gostem. Não se esqueçam que ainda tem o epílogo.



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Quando fui ver Rogério, não pude deixar de pensar na ironia de eu ter passado meses planejando o matar e agora, que ele está realmente morto, e não pelas minhas mãos, tudo parecia tão surreal. Imaginei que com ele fora do caminho, eu finalmente me sentiria seguro. Mas eu ainda estava com medo, e com raiva. Lá estava ele, sem vida, inofensivo, e eu ainda o odiava.
 - É errado sentir raiva de uma pessoa morta? - perguntei a psicóloga, em uma das consultas.
 - Uma pessoa ter morrido não a torna santa. As coisas que ela fez em vida ainda existiram. É sobre seu pai?
 - É. Eu me sinto mal por isso.
 - Nicolas, o que ele fez com você foi inadmissível. Você não deveria se sentir mal por ficar com raiva. Não precisa ser um poço de compaixão.
 Talvez ela estivesse certa.
Uma semana havia se passado desde o enterro. Finalmente tinha chegado o dia do meu encontro com Isabelly
 - Vocês vão onde?  - Jonathan perguntou, sentado no sofá brincando com os bebês. Ele e as crianças se davam bem, bem o suficiente pra eu sentir um pouco de ciúmes. Mas, no momento, estava surtando sobre sair com Isa.
 - Num parque. Acho que não vou.
 Martha, que fazia comida, mas ouvia nossa conversa da cozinha, se intrometeu.
 - O que? Por que?
 - Você vai sim. - Jonathan falou.
 - Eu to nervoso, ok? - me defendi - Nunca saí com uma garota antes.
 - É, mas vive pra lá e pra cá com Isabelly. É a mesma coisa, só que dessa vez vocês vão pra um lugar decente.
 - Shh - falei, ao que ele aumentou o tom de voz. - Sabe que da pra ouvir lá de baixo.
 Ele balançou a cabeça e riu.
 - Certeza que ela que vai tomar a atitude.
 - Cala a boca. - murmurei,  e fui até ele, tirando Gabi de seu colo. Jonathan riu.
 Apesar de tudo, o clima estava bom e eu e Jonathan estávamos finalmente tendo algo parecido com uma relação normal de irmãos.
Dei um beijo na bochecha da minha irmã e ela riu.
 - Nick. - falou,  batendo palmas.
 Martha veio andando da cozinha, surpresa.
 -É o que, meu amor? - falou, olhando pra criança.
 - Nick! - Isa repetiu e riu.
 Eu sorri, um sorriso grande o suficiente pra enrrugar meus olhos, e não lembrava a última vez que tinha sorrido assim.
Aquilo me ajudou a me manter calmo o  suficiente pra raciocinar e decidir ir, sim, no encontro. Afinal, eu mesmo disse que estava preparado, certo?
Marcamos de se encontrar as 18 horas, mas 17:30 Isabelly estava na minha porta.
 -Atende ela. - pedi a Jon, nervoso. Ele fingiu não ouvir - Jonathan. - Isa bateu na porta de novo.
 -Deixa de ser bobo, cara. Parece que é a primeira vez que vê ela. - ele implicou, levantando e indo até a porta. Pensei que fosse abrir, mas ele me arrastou até lá e saiu.
Eu abri a porta e sorri ao ver Isabelly. A garota usava o cabelo num rabo de cavalo e uma blusa largada amarela, com uma calça jeans clara. Parecia como sempre, mas algo no momento me fez a achar excepcionalmente bonita.
 - Eu to usando sua cor favorita. - ela disse, sorrindo. - Esqueci de dizer que é a minha também.
 -Você tá... linda.
 - Você também, Wolverine - ela disse e eu reparei que estava usando uma camisa surrada dos X-men.
 - Isso é injusto, você chegou mais cedo e não deu tempo de eu me arrumar! - reclamei.
 Ela entrou, falou com todos e me disse, rindo:
 - Vai lá se arrumar, vai.
Tomei um banho rápido e coloquei uma calça jeans. Cogitei a possibilidade de passar pela sala sem camisa, de propósito, mas não era confiante o suficiente. Coloquei uma blusa branca surrada e, assim que saímos pela porta, Isabelly disse:
—Eu tenho uma coisa pra você.
Eu franzi as sobrancelhas, confuso.
—O que?
Ela parou na escada, abrindo a bolsa e tirando com cuidado um girassol de plástico. Eu sorri, maravilhado com o fato de que ela pensou exatamente na coisa certa.
Num ato impulsivo, a puxei pra perto e a beijei, segurando forte em sua cintura.
—Se eu soubesse que seria assim – brincou, quando nos separamos – eu teria te dado um girassol bem antes.
Nós dois rimos.
—Você deveria ter me avisado. Aí eu traria algo pra você também.
—Vamos ter próximas vezes.
A olhei nos olhos, ao que ela abaixou o olhar e sorriu. Estava tímida, e eu queria beijá-la de novo. Dei um beijo na testa de Isabelly e fomos andando, de mãos dadas.
Por sorte, o parque era perto o suficiente pra que não precisássemos pegar um ônibus, mas longe o bastante pra eu poder aproveitar caminhar de mãos dadas com ela. O céu estava azul e estava ventando, então soltei a mão dela e passei meu braço ao redor de seu ombro.
Chegando lá, o rosto de Isabelly se iluminou. Foi então que percebi que talvez ela estivesse precisando também de distração. Fomos em quase todos os brinquedos do parque, rindo, como se fossemos duas crianças. Eu nunca tinha ido a um parque e, pra ser sincero, não lembrava de ter me divertido tanto assim em nenhum momento da minha vida. Disputamos um contra o outro no carrinho bate-bate e fizemos as pazes no carrossel. Quase choramos na casa mal-assombrada, mas ficamos bem no final. Apostamos um monte de coisas e, como ela tinha mais experiência no quesito brinquedos de parque, ganhou quase todas.
—Chega de apostar! – falei, rindo, assim que perdi pela terceira vez no tiro ao alvo. – Eu me rendo.
—Bom, agora que eu ganhei as três apostas, você vai ter que fazer três coisas.
—O que? – falei, esperando vir penalidades, assim como da vez que ela me fez ir na casa mal assombrada sozinho.
Isa foi andando até um banquinho comigo, e encostou, virada pra mim, seu cabelo rosa contrastando com o amarelo claro da blusa.
—A primeira delas é que você não vai se afastar de mim se o motivo disso for medo. Eu também estou com medo de um relacionamento, você sabe. Mas não podemos deixar o medo nos guiar. A segunda é que você vai manter o girassol que eu te dei em algum lugar que veja todos os dias. Pode ser na beirada da sua cama, em algum lugar no seu guarda-roupa, não importa. Eu só quero que você lembre todos os dias que eu te amo e que, além de mim, tem gente que se importa contigo.
Ela pausou por uns segundos, e eu só consegui ficar lá parado, sorrindo, genuinamente feliz.
—E a terceira?
—A terceira eu não pensei ainda. Mas temos muito tempo, certo?
A respondi com um beijo, e daquela vez pareceu diferente das outras. Pareceu oficial.
Tudo em mim era feito de nervosismo, medo e, ao mesmo tempo, felicidade. Era como se meu coração fosse explodir de tanta alegria.
Nos afastamos e ficamos ali um pouco, Isa com a cabeça encostada no meu braço.
Olhando pra trás, eu via que percorri um longo caminho, e estava muito grato por todas as pessoas que o percorreram comigo. Alguns meses atrás, eu estava conspirando em como iria assassinar uma pessoa. Agora, depois de tudo, eu estava sentado num banco de parque, com uma garota incrível do meu lado. Em casa, meu irmão e minha madrasta me esperavam, junto com os bebês. Eu tinha pessoas ao meu redor. Eu também sabia exatamente o que tinha de errado comigo e, embora não tivesse descoberto ainda exatamente o que fazer pra mudar, eu estava melhorando aos poucos. Sabia que tinha muita coisa pela frente ainda, mas me sentia leve, pronto pra trilhar meu próprio caminho. Pela primeira vez, me senti livre e me permiti ver o futuro com esperança.
Eu vou ficar bem.


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