Undercover escrita por nywphadora, nywphadora


Capítulo 5
Capítulo 4




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— Esse ou esse?

Aquela frase lembrou a Jane de um exame de vista, em que precisava escolher entre uma imagem e outra, sendo uma sempre mais borrada que a outra. A diferença era que Myrtle punha dois vestidos estonteantes à sua frente para que ela escolhesse, e nenhum era “borrado” ou menos que perfeito.

No entanto, era difícil se concentrar. A criada estava na frente da cômoda em que, na noite anterior, um vaso de flores tinha sido posto. Tinha que obrigar os seus olhos a se desviarem de lá e a sua boca a não curvar-se em um sorriso toda vez que olhava para o ramo de rosas brancas que Liam tinha levado, junto com um cartão com o desejo de melhoras.

— Senhorita! — reclamou Myrtle, parecendo irritada.

Jane sacudiu a cabeça, forçando-se a se concentrar.

— Certo, o lilás — decidiu.

Por já passarem minutos naquela indecisão, todas pareceram entrar em um consenso de não discutirem a sua decisão, mesmo que não fosse o que elas realmente quisessem.

Ia ser a sua volta para a competição, além de a primeira vez em que todas as selecionadas apareceriam no Jornal Oficial de Illéa. O que toda criada de uma selecionada mais queria, naquele momento, era empurrar maquiagens marcantes e vestidos chamativos para que elas não corressem o risco de passar despercebidas, mesmo que acabassem sentadas na última fileira.

Pomona e Hope ajudaram Myrtle a vesti-la e maquiá-la rapidamente, olhando a todo o momento para o relógio, parecendo calcular o quanto de tempo que tinham antes que ela se atrasasse para o estúdio. Nem tentaram convencê-la a pegar uma das “joias”, sabendo que ela recusaria, então pegaram o mesmo relicário que Jane sempre usava em seu pescoço e um par de brincos simples, em formato de uma flor, que ela apontou.

Assim que o ponteiro do relógio virou mais uma vez, elas deram uma olhada nervosa entre si, enquanto Jane decidia colocar um de seus anéis de última hora.

— Por que estão tão nervosas? — ela perguntou.

E então ouviu batidas na porta.

Olhou indignada para elas, percebendo o motivo de seu nervosismo antes mesmo que pudesse abrir a porta.

— Vossa Alteza, é uma honra recebê-lo — Pomona cumprimentou-o, curvando-se junto com Hope e Myrtle, a última tentando segurar-se para não gargalhar abertamente.

— É sempre um prazer vê-la novamente, Pomona — Liam respondeu, também parecendo conter um riso.

Ele sabia o nome das suas criadas?

— Vamos, senhorita Jane? — ele perguntou a ela, estendendo o braço.

Só restou a ela olhar irritada para as três malandras, o seu olhar prometendo uma conversa séria mais tarde, e aceitar acompanhá-lo até o Jornal Oficial.

— Fico feliz que esteja melhor — Liam disse, enquanto eles desciam as escadas do segundo andar.

— Agradeço pelo desejo de melhoras, Alteza — Jane respondeu.

E então ela manteve-se em silêncio.

Se fosse qualquer outra selecionada, estaria aproveitando aqueles minutos ao máximo, mas ela estava agradecendo pelo fato da monarquia ser obrigada a usar ternos grossos por cima das camisetas de manga comprida, o que o impedia de notar o quão suada a sua mão estava.

Talvez não estivesse tão recuperada do mal estar quanto pensou.

Dentro do estúdio do Jornal Oficial, os funcionários corriam de um lado para o outro, apressados. Os reis já estavam em seus tronos, conversando em sussurros sobre algum acontecimento certamente engraçado.

— Alteza! — uma das funcionárias correu até ela, parecendo aliviada — O Jornal está quase para começar!

Jane tirou a mão do braço dele, curvando-se rapidamente, antes de ir até onde as outras garotas estavam. Tentou não engolir em seco quando percebeu que não havia uma que não estivesse olhando para ela.

Só porque tinha entrado com o príncipe parecia que já tinha ganhado a Seleção, de acordo com os pensamentos aparentes delas.

— Não sente nada, hum? — Sirena murmurou, assim que ela sentou-se ao seu lado, o único lugar vago.

Não teve tempo de responder, já que as câmeras começaram a filmar.

Sabia que deveria manter o queixo erguido, olhando para a frente, mas ela só conseguia olhar para as suas mãos. Suas unhas já estavam descascando. Isso era porque ela tinha adquirido o hábito de roê-las? Sua mãe a mataria.

— Boa noite a todos, eu tenho um anúncio a fazer — escutou a voz animada de Rita Skeeter, perguntando-se se era aquela característica que a fez ser contratada — Faz exatamente uma semana que a Seleção começou!

Esse era o anúncio?

Qualquer pessoa com um calendário faria aquela brilhante conclusão.

Sirena revirou os olhos, ao seu lado.

— Cinco garotas já foram mandadas para casa. Agora restam apenas trinta belas mulheres para que o príncipe Liam faça a sua escolha.

E qualquer pessoa com o mínimo de noção matemática também.

Queria compartilhar as suas ironias com Sirena, mas o estúdio estava silencioso demais e seria escutada por toda Illéa.

— Semana que vem, a maior parte do Jornal Oficial de Illéa será dedicada a essas incríveis jovens — concluiu Rita, sorrindo.

Algumas meninas não puderam evitar cochichar entre si.

— O que isso significa? — perguntou Jane.

— Significa que vão nos fazer perguntas sobre o nosso relacionamento com o príncipe — respondeu Reyna, prontamente.

— Deve ser por isso que ele tem tido tantos encontros ultimamente... — comentou Sirena, olhando para as pontas do seu cabelo.

Encontros? Depois de Chavelle?

Jane voltou a olhar para a frente.

— Diga-nos, Alteza, são todas essas jovens gentis e meigas como aparentam ser? — perguntou Rita.

Sirena inclinou-se para a frente. Fabiane olhou-a estranha, achando que ela estava passando mal, mas Jane conseguiu ver as suas costas movendo-se descontroladamente. Era bem improvável que estivesse chorando, então imaginou que ela estivesse rindo.

“São todas essas jovens gentis e meigas como aparentam ser?”

Sem poder evitar, cobriu a sua boca para não começar a rir ali também.

— Oh! Por favor, comportem-se — disse Reyna, o mais dignamente que podia.

— Elas são mais do que isso — escutou Liam responder.

Imaginava quantos corações tinham se derretido com essa resposta. Só fez com que a sua vontade de rir triplicasse.

Olhando para o lado, notou que Fabiane também estava dando um sorriso estremecido e que desviava o olhar de Artemisa, que parecia concentrada demais em olhar para o chão.

Sirena tinha espalhado uma crise de riso para todas.

Notou o quão séria era a situação quando até mesmo Reyna estava dando umas tossidas baixas para disfarçar.

— Boa noite, Illéa — escutou Rita dizer, depois do que pareceram séculos.

E então Sirena ergueu o tronco, começando a gargalhar descontroladamente, acompanhada de todas as anteriormente mencionadas. Mesmo com os olhos cheios de lágrimas, viu algumas selecionadas que não entendiam o que estava acontecendo darem um sorriso envergonhado ou fingirem rir apenas para não ficarem deslocadas no panorama.

Todos pareciam temporariamente incapazes de opinar, olhando abismados para a cena, até que McGonagall resolveu tomar as rédeas da situação.

— Senhoritas! — ela exclamou — Este não é o comportamento de uma futura princesa!

Lucy Malfoy levantou-se de seu lugar, querendo demonstrar o quão superior era por não estar esboçando o mínimo sorriso, mas Jane achava que Liam estava se divertindo.

Ela certamente estava.

♛♛♛

Edelweiss Tonks fechou a porta silenciosamente.

O Salão das Mulheres só era iluminado pela luz natural da lua, vinda das janelas. Depois do jantar, era para todas estarem em seus quartos, preparando-se para dormir, mas Jane descobriu que essa não era a vontade daquele grupo.

Assim que se viu em seu quarto, vestida de camisola, depois do jantar, bateram na porta novamente. Ela sentia esperanças de que fosse Liam, convidando-a para um encontro no dia seguinte. Afinal, por que ele faria questão de levá-la para a gravação do Jornal Oficial de Illéa? Mas era Sirena, acompanhada de Reyna, Edelweiss, Fabiane, Artemisa, Edge, Cara, Stelle e Fran.

Os quartos delas, embora grandes, não eram tanto para abrigarem um terço das selecionadas ainda presentes na competição, então Sirena teve a brilhante ideia de irem até o Salão das Mulheres.

Brilhante, mas perigosa. Era inacreditável que conseguiram esgueirar-se pelos corredores sem esbarrarem com os guardas noturnos.

— Nós poderíamos fazer uma festa do pijama aqui — comentou Cara, puxando o tapete para que todas se sentassem nele.

— Precisaríamos da permissão da rainha — disse Reyna.

— Ah! Claro! A rainha autorizou essa nossa reunião — retrucou Sirena, sarcástica.

— Tem uma diferença entre dez garotas caminharem pelo castelo e dez garotas caminharem pelo castelo com colchões e cobertas! Além do mais, já viu o tamanho daqueles colchões?

Jane não viu nada demais no colchão, mas, pela expressão facial delas, supôs que era maior do que estavam acostumadas a ver.

— Ah! Mas seria muito bom — suspirou Fran, imaginando a cena.

A única coisa que Jane conseguiu imaginar foi a rainha se unindo a elas, e era uma cena bem estranha de se imaginar. Seria assim que os seus súditos se sentiam ao imaginá-la usando roupas casuais, em vez dos vestidos ostentaciosos?

— A gente podia jogar verdade ou desafio — sugeriu Sirena.

— Fala sério! — implicou Fabiane — Isso é tão clichê.

— Era a minha desculpa para desafiar alguém a ir ao terceiro andar.

Todas pareceram prestar atenção, olhando entre si.

— Mas por que o terceiro andar? — perguntou Jane — Não tem nada demais lá!

— Nada demais? — repetiu Stelle, incrédula — É onde o príncipe dorme!

— Como você pode saber se não tem nada demais? — Sirena questionou-a — Nenhuma de nós esteve lá!

Todas olharam para Jane, suspeitando.

— Eu também nunca fui! — ela mentiu.

— Então por que não vai e nos diga como é? — sugeriu Artemisa.

— Não! Isso não vai dar certo! — protestou Reyna — O terceiro andar deve ser bem guardado do início ao fim do corredor!

— Quem vai desconfiar dessa carinha? — Sirena puxou a bochecha de Jane, que afastou-se, reclamando.

— Por que não vão vocês? — perguntou Jane.

— Nós vamos, mas não todas ao mesmo tempo. Seria idiotice.

Como se não tivessem ido todas até o Salão das Mulheres.

— Eu voto por ficarmos! — Jane levantou a mão.

Edelweiss começou a rir, apenas Reyna acompanhou-a.

— Eu tenho uma ideia melhor! — exclamou Fabiane, antes de lembrar de manter o tom de voz baixo para não serem pegas — Por que você não pega a sua câmera fotográfica e tira uma foto do príncipe dormindo?

— Isso é psicopatia!

Sirena olhou para ela, implorando com os olhos.

— Por favor, Jane, por favor! Eu nunca mais toco naquele assunto!

Reyna e as outras olharam curiosas para elas.

Droga, Sirena sabia ser persuasiva.

♛♛♛

— Ai! O meu tornozelo!

Os guardas foram rapidamente para onde Sirena estava, fingindo ter torcido o tornozelo, enquanto Jane caminhava rapidamente pelo lado oposto do corredor com o coração batendo forte.

Reconheceu a porta que guardava o escritório dos monarcas, ao lado da sala de reuniões. Caminhou mais rapidamente, encontrando então as portas mais afastadas. A mais afastada de todas supôs ser dos reis, então abriu com cuidado uma das outras duas portas.

Não era o quarto de Liam, mas tinha uma porta a um lado que, certamente, conectava ao quarto do príncipe.

Não pôde evitar ficar observando, antes de lembrar-se que não poderia estar naquele corredor. Era proibido para as selecionadas. Mesmo que Sirena distraísse os guardas, ela também estaria atraindo atenção, muito em breve, quando o doutor fosse até lá.

Fechou a porta e respirou fundo, antes de abrir a do quarto ao lado.

Pegou a câmera fotográfica, escutando as vozes de Sirena do lado de fora. Posicionou-a em seu olho, aproximando-se o máximo que podia da cama onde Liam dormia. Assim que pressionou o botão, o flash saiu e ela saiu correndo do quarto, assim que ele começou a se mover.

Jane seguiu calada e xingando Sirena até o Salão das Mulheres, onde as outras permaneciam sentadas no tapete, esperando-as. A amiga chegou logo depois, um sorriso enorme no rosto.

— Ah! Olhe! Eu consegui! Isso é um milagre! Obrigada, cavalheiros — Sirena disse, rindo, lembrando-se de como tinha se livrado dos guardas.

Fabiane começou a aplaudir o mais baixo que podia.

— Você deveria se tornar uma atriz! — ela elogiou.

— Prefiro dar trabalho para os meus pais — respondeu Sirena, sentando-se junto com elas — Mostre a foto, Jane!

Ela suspirou. Precisou pegar uma outra câmera, a sua não revelava a foto instantaneamente, mas esperava que as fornecidas pelo castelo fossem apenas das melhores. Ou seja, esperava que o flash bastasse para uma boa resolução.

— Ele é realmente lindo — suspirou Cara.

Fran pegou a foto das mãos delas, tendo logo tirada das suas. Todas estavam curiosas para ver a foto.

— Você é uma excelente fotógrafa, Jane — disse Edelweiss, tentando ver por cima do ombro de Artemisa.

— Sim, você com certeza deveria se tornar a fotógrafa oficial — concordou Edge, contente — Por favor, se eu me casar algum dia, seja a fotógrafa do meu casamento.

Jane riu, achando difícil ainda estar em Illéa, caso isso acontecesse, mas sentindo-se feliz de imaginar a cena.

— Se casar algum dia? — repetiu Artemisa, franzindo o cenho — Não acha que irá ganhar a Seleção?

— Só estou sendo realista — Edge deu de ombros — Quero dizer, se eu ganhar, ficarei certamente feliz, mas se não...

Dava para imaginar que aquele assunto era delicado.

Algumas estavam ali pelo dinheiro que era fornecido pelo seu tempo de estada, outras estavam pelo coração do príncipe, e ainda havia as que estavam pela coroa.

Muita coisa em jogo em uma só competição.

— Eu tomei o risco, então eu fico com isso! — disse Jane, pegando a foto e levantando-se.

Elas começaram a protestar.

— Exijo guarda compartilhada! — sugeriu Fabiane, mas com o seu sorriso não dava para saber se ela estava falando sério ou não — Vou contratar os serviços da Queensley.

— O pagamento dela vai ser a foto? — brincou Artemisa.

— É capaz de nos processar por invasão da propriedade — disse Sirena.

Elas escutaram passos do lado de fora do Salão das Mulheres e calaram-se, olhando umas para as outras de olhos arregalados.

— Eu não fico mais aqui! — sussurrou Fran, levantando-se.

Assim que ela saiu da sala, elas esperaram mais um pouco, antes de seguirem pelo mesmo caminho, apressadas.

♛♛♛

— Senhorita Jane, acorde!

Ela sentou-se na cama, ainda tonta pelo sono, mas com seu corpo em alerta.

— Os rebeldes estão vindo? — perguntou.

— A senhorita está atrasada — disse Pomona, olhando estranha para ela.

Tentou não resmungar.

Tinha dormido tarde no dia anterior, por causa da história da foto do Liam e de ter ficado conversando com as outras meninas. Imaginava se elas estariam na mesma situação que ela ou se já estavam acostumadas a dormir tarde e acordar cedo.

Claro que não poderia dar uma palavra sobre isso às suas criadas.

— Ladra! Confesse!

Escutou Hope reclamar quando ela afastou-se delas, antes que pudessem terminar de abotoar o seu vestido. Abriu a porta, vendo Valerie Yaxley gritar com uma de suas criadas, algumas portas também abriram-se para observar o que estava acontecendo.

— Senhorita, eu não roubei nada! Eu juro! — a criada chorava.

— O príncipe Liam saberá sobre isso! — Valerie caminhou rapidamente para as escadas.

— Não! Por favor! Eu não fiz nada!

Reyna correu para perto da criada, abraçando-a.

— Acalme-se, Gema — escutou-a sussurrar.

— O show acabou! — gritou Sirena, quando notou os sorrisos de algumas selecionadas de castas mais elevadas.

Lucy foi a última a voltar para dentro de seu quarto, aumentando o seu sorriso irritante e malicioso. Assim que fechou a porta, o salto alto de Sirena bateu na porta. Se fosse uma madeira menos bem trabalhada, com certeza o sapato teria ficado cravado e nunca mais sairia dali.

— Senhorita Sirena! — uma das criadas repreendeu.

Ela apenas fez um gesto amplo com o braço, antes de voltar para o seu quarto.

Pomona tentou convencer Jane a voltar para dentro, mas ela ficou para ver Valerie puxar o príncipe Liam, enfurecida. Ao vê-lo, Gema pareceu chorar mais forte ainda, nos ombros de Reyna.

— Alteza, eu juro! Eu juro que não fiz o que a senhorita está dizendo! — ela tentou dizer.

— Mentirosa! — Valerie acusou — Ninguém mais tem acesso ao meu quarto...

A porta atrás de Valerie abriu-se e Queensley Shacklebolt saiu, os braços cruzados, já completamente vestida.

— Você a viu roubando? — ela perguntou.

— Não, mas... — respondeu Valerie.

— Todas nós temos três criadas. Se for mesmo uma delas, como poderia dizer que foi ela? — Queensley interrompeu-a.

Valerie não pôde responder a essa pergunta.

— Me diga o que foi roubado, faremos uma busca pelo castelo e pelo seu quarto, talvez o tenha perdido por aí — sugeriu Liam.

— E se tiver sido alguma das outras selecionadas? — perguntou Valerie, seus olhos parando em Jane.

Ah! Era só o que faltava!

— Entrar em nosso quartos é violação da privacidade — disse Queensley.

— Os quartos não são nossos, são da realeza — retrucou Valerie.

— Que estão sendo doados temporariamente a nós. Portanto, nossos.

Liam resolveu intervir.

— Não vou fazer uma busca nos quartos, a não ser que tenha provas de que alguém pegou as suas coisas — ele disse.

— Então devemos aceitar essa situação? — Valerie ofegou, ofendida.

— É claro que não. Roubo é inaceitável, isso está nas regras. A partir de agora, todas vocês terão um guarda à sua porta para a segurança pessoal de vocês e de seus pertences.

Hope puxou o braço de Jane delicadamente para dentro do quarto.

— Não é bonito ficar espiando! — ela repreendeu, fechando a porta.

— Ah! Fala sério! — reclamou Jane.

— Eu acho que não houve furto algum — disse Myrtle, terminando de abotoar o seu vestido — Yaxley parece ser do tipo que mentiria para chamar a atenção do príncipe.

— Gema jamais roubaria — concordou Pomona — Ela não é desse tipo. Nunca jogaria a vida no castelo fora, ela era quase uma Oito.

— Oito? — perguntou Jane, franzindo o cenho.

— Sim, você sabe: os mendigos, incapacitados fisicamente que não têm familiares, órfãos, criminosos depois de sair da cadeia... — disse Hope, dando de ombros.

Viu Myrtle pegar a sua caixa de joias, já acostumada com essa rotina.

Não conseguiu prestar atenção nos anéis e brincos, então apenas aceitou os que sugeriram.

Oito? Ela pensava que só existiam sete castas!

♛♛♛

— Foco, Jane!

Como as entrevistas se aproximavam, elas tiveram a ideia de fingir ser Rita Skeeter e treinarem o que poderiam dizer no Jornal Oficial de Illéa na semana seguinte.

Stelle, inclusive, resolveu encarnar bem na personagem, vestindo uma peruca loira platinada cheia de cachos e nada natural e um vestido verde estranho. Ela era artista de teatro, então para ela era natural se fantasiar daquela forma, embora a sua atuação fosse diferente das atuações das atrizes da casta 3, pendendo mais para o humor e exagero do que retratação do cotidiano.

— Senhorita Jane, foi você quem invadiu o quarto do nosso príncipe favorito? — ela olhou para a sua prancheta, fingindo seriedade, os óculos emprestados na ponta do nariz.

Cara começou a rir, nervosamente.

— Vocês acham que ela já sabe? — perguntou.

— Eu não duvido que o príncipe tenha comentado com alguém — disse Edelweiss — É meio que a segurança dele em risco.

— Ainda mais depois das reclamações da Valerie — Reyna indicou com a cabeça a selecionada, que olhava irritada para todas no Salão das Mulheres, esperando descobrir quem era a culpada pela perda de sua pulseira de brilhantes, dada em sua quinceñera.

— E depois ela é a política do grupo — debochou Fabiane.

— Sou mais a Queensley, acabou com o surto dela — disse Sirena.

Todas precisavam concordar que ela era uma excelente advogada.

Reyna olhou estranhada para Jane, que estava calada.

— O que houve? — ela perguntou.

— Eu só fiquei incomodada. Precisava tratar a criada daquele jeito? — Jane tentou justificar-se.

— Gente como a Valerie só sabe agir assim. Não duvido que ela bata nas criadas dela.

— Mas isso não é certo!

Não conseguia entender como todas agiam tão calmas quanto a isso. Queria discutir sobre a história da casta oito, mas sabia que todas estranhariam. Afinal, ela era illeana, deveria saber que existia uma oitava casta.

— Então, quando se tornar rainha, faça algum projeto que mude isso — disse Sirena.

— Rainha? — perguntou Fran — Um pouco difícil de acontecer, não acha?

— Quem sabe o reino dá sorte e um ataque de rebeldes resulta...

Quem escutou-a, olhou de olhos arregalados para ela.

Era realmente maluca de dizer aquelas coisas, sendo que a qualquer momento a realeza poderia aparecer, mesmo que ninguém ali gostasse de Petuel.

— Senhorita Jane, já teve um encontro com o príncipe? — Stelle retomou.

— Na verdade não, Rita — tentou entrar na brincadeira.

As portas do Salão das Mulheres abriram-se e todas as meninas levantaram-se. A peruca loira de Stelle caiu no chão, tornando a sua levantada cômica.

— Jane, poderia vir aqui fora, por favor? — pediu Liam, já que ele não podia entrar sem a permissão expressa de sua mãe, que não estava presente.

Sirena deu uma piscadela cúmplice para ela, que preferia que ela não tivesse dado.

— O que acha de darmos um passeio agora? — ele perguntou, assim que ela fechou as portas do Salão.

Imaginava tranquilamente as suas amigas com os ouvidos atrás da porta, curiosas para saber o que ele queria falar com ela.

— Ótima ideia — disse Jane.

Apesar de gostar da companhia das outras, não se sentia com cabeça para prestar atenção em suas piadas naquele momento. Tinha esquecido-se momentaneamente da invasão ao quarto.

— Você parece incomodada — Liam observou.

Pelas roupas que vestia, era como se ele tivesse acabado de sair de uma reunião e conseguido um tempo curto livre para desperdiçar com alguma das selecionadas. Ele ainda tinha que ter um encontro com todas elas até o dia da entrevista, o que explicava o seu sumiço. Jane não se importava realmente com isso, nunca tinha ido a um encontro antes.

— A situação de mais cedo me incomodou — repetiu a desculpa — Aliás, perdoe-me por ter ficado olhando para a conversa. Foi falta de educação da minha parte.

— Queensley também estava lá, e Reyna — Liam lembrou-a — Se fosse um assunto tão formal, teria pedido que saíssem.

Ela com certeza ficaria envergonhada por precisar de um pedido para deixar de espiar.

— Foi agradável? — perguntou, antes de poder frear-se — O encontro com Queensley.

Arrependeu-se da pergunta assim que a fez.

— Todas vocês são agradáveis — respondeu Liam.

Aquilo não era uma resposta.

— Alguma vez já foi até a cidade? — perguntou Jane.

— Raramente — ele admitiu, parecendo curioso — Houve uma revolta em Likely uma vez e os rebeldes já invadiram Baffin também.

Eles pararam de caminhar próximo do jardim.

— Poderia lembrar às suas amigas que o terceiro andar é proibido?

Jane ficou um tempo sem entender, até que se lembrou da noite anterior.

— Aconteceu algo? — fingiu-se de desentendida.

— Os guardas viram Sirena caminhando por lá.

Se havia algo a mais, ele não falou, então conseguiu relaxar. Não estava pronta para receber uma bronca por ter desobedecido às regras.

— Certo, eu direi — concordou.

Um dos guardas aproximou-se deles e sussurrou no ouvido de Liam, que suspirou, descontente.

— Eu preciso ir — ele disse, antes de dar um beijo de despedida na mão dela — Nos veremos em breve.

— É claro — Jane respondeu, observando-o se afastar apressado.

♛♛♛

Ela não voltou para o Salão das Mulheres, pelo resto do dia.

— Como foi o encontro? — perguntou Sirena, indo no seu quarto mais tarde.

— Não teve um — Jane deu de ombros.

— O quê? Você ficou no quarto o dia inteiro?

Sirena ficou mais indignada do que ela mesma.

— É porque tem realmente muita coisa para fazer por aqui — debochou Jane.

— E o que você quer fazer? — ela perguntou, como se pudesse resolver os seus problemas facilmente.

Voltar para casa.

— Qualquer coisa — murmurou, voltando a esconder o seu rosto no travesseiro.

Sirena puxou o travesseiro dela, obrigando-a a olhá-la.

— Então levante dessa cama agora — disse, parecendo irritada.

Era difícil de dizer como que elas conseguiam arrumar tanta coisa para fazer, mas como Jane não tinha tamanha criatividade, seguiu Sirena direto para o quarto de Reyna. O mesmo grupo de sempre: Cara, Stelle, Fabiane, Fran, Edelweiss, Artemisa e Edge.

Vários vestidos ocupavam a cama e Reyna erguia um deles à frente de Gema, que parecia extremamente desconfortável, apesar dos esforços de todas.

— O que você acha, Jane? — perguntou Reyna, assim que notou a sua presença.

— Eu acho que ela deveria experimentar — respondeu.

— Apoiado — disse Sirena, jogando-se no canto da cama.

Observou Reyna repreendê-la por ter amassado alguns vestidos que tinha estendido na cama. Jane viu como Hope observava silenciosamente da porta. Seguiu o seu olhar, vendo como Reyna e Fabiane seguravam Gema para que conseguissem pôr o vestido, já que ela parecia apavorada pela simples ideia. Tendo Valerie como sua selecionada, ela não a culpava. Quando voltou a olhar para a porta, Hope já tinha ido embora.

— Nós deveríamos fazer isso com todas as criadas pelo menos uma vez — Artemisa disse a Jane — Elas se dedicam muito a esses trabalhos.

Conseguia visualizar facilmente Myrtle com um vestido delas.

— Agora nós vamos andar pelo castelo! — disse Edge, alegremente.

— O quê? — Gema parecia que ia passar mal.

— Vamos, Gema! Não comece! — exclamou Cara, assim que terminou a maquiagem dela.

Sabia que se negasse sair do quarto, Sirena voltaria para perturbá-la, então seguiu a comitiva de garotas de caminhada pelo castelo, atrás do grupo. Elas passaram rindo e conversando, apenas parando e abaixando o tom quando os guardas ou funcionários passavam, então elas cumprimentavam.

Ninguém parecia notar a diferença de Gema em relação às outras.

— E se a gente arrumasse um namorado para ela? — Stelle empolgou-se com Edelweiss — Poderíamos fazer isso com todas elas!

— Tipo um Liebstertag? — perguntou Jane.

— O que é isso? — Edelweiss ficou confusa.

Eles não tinham um dia dos namorados em Illéa?

— Eu sei! — exclamou Stelle — Uma parte boa de ser artista de teatro é que você tem conhecimento sobre algumas coisas a mais que as outras pessoas. Eu não entendo de germânico, mas a Nova Germânia é um dos únicos países na atualidade a comemorar o que se chamava antigamente de Valentine’s Day. Um dia criado para comemorar o amor! Eu já fiz isso em uma peça, uma vez.

Ela parou de tagarelar, quando as meninas à frente pararam de caminhar outra vez.

— Senhoritas — o príncipe olhou curioso para elas, acompanhado de um de seus assessores.

Liam notou Gema no meio delas, que parecia nervosa, mas ele curvou-se, sorrindo.

— Está linda, senhorita.

E então ele continuou a caminhar. Jane evitou o seu olhar, encostando-se à parede contrária.

— Vocês brigaram? — Edelweiss perguntou de olhos arregalados.

— Ah! Não! Eu não quero que ele te mande embora! — lamentou Stelle.

— Eu não vou ser mandada embora! — Jane disse — E eu não briguei com ele.

Mesmo assim, em todo o caminho todo de volta ao quarto de Reyna, elas continuaram olhando-a como se esperassem que ela fosse se desintegrar do nada.

Antes que pudesse abrir a porta de seu quarto, viu Chernobyl Lovegood saindo do dela.

— Olá, Jane! — ela cumprimentou-a.

— Olá, Cher — respondeu, agradavelmente — Encontro?

— Na verdade, eu estive pensando em dar uma olhada nos agapantos do primeiro andar. Vi umas criaturinhas estranhas e queria catalogar, talvez sejam os zonzóbulos.

Pelo que se lembrava da ficha divulgada na revista, ela era inventora, então não entendia muito o seu interesse em catalogar animais. E zonzóbulos? Era digno das narrações surreais de Gintare Lockhart, que não conseguia enganar a ninguém com suas histórias.

— O que seriam zonzóbulos? — perguntou, curiosa.

— São umas criaturas que confundem o nosso cérebro, nos deixam confusas. Elas entram pelos nossos ouvidos até o nosso cérebro — Chernobyl explicou.

Concordou com a cabeça, decidindo que não queria debater com ela sobre aquele assunto.

— Alguma de vocês já pediu alguma coisa ao príncipe? — ela perguntou.

— Não que eu saiba — respondeu Jane.

— Eu realmente sinto muita falta da civilização. Será que ele nos deixaria visitar a cidade algum dia? Não me importo em conhecer Angeles, sei que seria difícil de voltarmos às nossas casas antes do fim da Seleção.

Na verdade, aquela era uma ótima ideia. Completamente diferente do que esperava escutar.

— É realmente uma ótima ideia — sorriu — Se precisar de ajuda para convencê-lo, acho que as outras meninas não iriam se opor.

— Obrigada, Jane. Até logo.

E então foi caçar zonzóbulos.

A porta do quarto de Reyna abriu-se, e Gema saiu conversando animada com Fran e Edelweiss. Parecia bem mais à vontade do que antes. Já voltava a usar as suas vestes de criada, mas ainda mantinha a maquiagem.

— Eu tenho certeza de que aquele soldado nunca mais a olhará de outra forma — Fran dizia sobre algum momento que Jane perdeu na caminhada.

A porta do quarto de Valerie abriu-se e ela olhou friamente para a criada.

— Onde esteve a tarde inteira? Você é a minha criada! Deveria me servir! — reclamou.

Gema abaixou a cabeça, perdendo o sorriso.

— Entre — disse Valerie.

Jane não teria se importado mais do que já se importava com aquela situação, se não tivesse notado que ela segurava um cinto na mão.

— Se está tão insatisfeita com sua criada, por que não a substitui? — perguntou, pondo uma mão no ombro de Gema para impedi-la de entrar no quarto.

— Os criados precisam se acostumar a nós. Essas três estão me servindo desde que cheguei ao castelo... — Valerie começou com o seu discurso político.

— Mas certamente o príncipe Liam a concederia essa exceção, não? Ou não são tão próximos? Vocês me pareciam...

Tocou em um ponto sensível. O cinto pareceu afrouxar na mão de Valerie, mas não caiu ao chão.

— É claro que o príncipe me concederia. E ele me concederá.

Olhou para Gema, antes de completar:

— Você não me serve mais. Está dispensada.

Jane só tirou a mão do ombro dela quando a porta se fechou.

— Senhorita Jane, se eu não servir mais a vocês, terei que voltar para a cozinha — disse Gema, tristemente — Ser criada de uma selecionada é uma honra para poucas.

— Tenho certeza de que Liam terá uma solução para isso. Não se preocupe.

Tentava acalmar mais a si mesma do que a ela.

Fran olhou-a de um jeito estranho, e então percebeu que tinha chamado Liam pelo nome em voz alta. Tentou não se envergonhar, retomando a conversa:

— Tenho certeza de que Reyna ficará mais do que encantada se você desejar conversar com ela mais um pouco, até essa situação ser resolvida. 

Girou a maçaneta de seu quarto, podendo finalmente gozar de um pouco de paz.

Myrtle afastou-se da janela, a mando de Pomona, mas foi logo para perto de Jane, os olhos brilhando pela empolgação de uma fofoca.

— O que você acha se formos espiar o encontro?

— Com quem ele está se encontrando agora? — Jane tirou os seus saltos, jogando-os a um canto.

— Sirena.

Ela levantou a cabeça, não podendo evitar mostrar um sorriso debochado.

— Chame Reyna.


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