Amélia não gostava de ser feliz. escrita por MeninoSemRazão


Capítulo 2
Chorar é uma miragem.


Notas iniciais do capítulo

Rodada 2
TEMA:
"Borbulhante".



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Amélia foi acordada por um senhor franzino, ao abrir os olhos sentiu um susto repentino percebendo o toque de um homem desconhecido pousado sobre si. Mas logo deu-se conta de que era apenas o motorista a notificando que o ônibus havia chegado em seu destino. Agradeceu ao senhor e logo se pôs para fora do veículo, carregando uma mala singela e elegante sob a força da mão esquerda. E logo sentiu aquela velha sensação quando tocou o solo com o primeiro passo, não fazia ideia de que lugar era aquele fim de mundo, pois apenas tinha pego a primeira possibilidade de fuga que lhe apareceu no caminho. Ao procurar ler a placa na frente do ônibus para saber a que destino chegará, foi quando lhe surgiu um gelado no peito e a sensação de um mar por de trás de seus olhos a querer se transbordar.

Era difícil sentir a solidão lhe doer, mas acontecia vez em quando, como a qualquer outro. E sempre que acontecia, Amélia sentia o rosto esquentar de tanta humilhação. Pois tinha a impressão de parecer uma mulher fracassada, a quem faltavam pedaços para não ser mais considerada incompleta. Fazia-lhe sentir como se fosse uma “mulherzinha”, uma megera que não tinha marido ou filhos. E a maior humilhação era esse pensamento, tão alheio a pessoa que era, não acreditava em nada disso e ainda assim se sentia humilhada por não corresponder o que era esperado pelas outras pessoas. E isso quase a fazia se arrepender de suas escolhas. Quase a fazia querer se diminuir para ser uma mulher que cabia naquele mundo. Era assim quando a solidão doía, Amélia sentia-se repugnante, sentia sua cabeça sequestrada por ideias externas, que em outros momentos jamais a compadeciam.

Resolveu procurar um lugar para poder sentar e chorar de uma vez. Não aguentaria aquela mutilação mental sem nenhum sentido por mais tempo que deveria, então logo se encostou em qualquer banco de frente para uma da dezena de lanchonetes que haviam na rodoviária e se deixou padecer ao choro. O choro de Amélia nunca havia sido bonito, de nenhuma forma possível. Nunca foi um choro calado, não lhe escorriam lágrimas em formas de gotas que lembrassem chuva, nunca foi um choro contemplativo. Amélia só chorava para espantar logo seus demônios. Soluçava de um jeito que parecia um animal ferido ao leito da morte. Suas lágrimas ao invés de gotas delicadas, eram apenas um liquido mais que salgado que escorria aos montes e empapava suas bochechas. Lhe escorria mais catarro que lágrimas e nunca havia chorado um choro conformado, pois logo que começava a chorar, escondia o rosto entre as mãos e se punha a grunhir.

Quando chorava, parecia que dentro da cabeça de Amélia havia um caldeirão velho a ferver seu cérebro numa sopa onde junto também ferviam as piores coisas que já lhe haviam acontecido. Tudo aquilo doía e parecia borbulhar dentro de seu corpo, sua cabeça doía pela quentura e o resto do corpo remexia em pequenos espasmos. As lágrimas pelavam como se realmente fossem água fervida. As pessoas ao redor lhe encaravam enquanto seguiam seus caminhos pela rodoviária. Mas ninguém chegava perto, nem mesmo os que se sentiam compadecidos. Apenas um jovem rapaz, com muita cautela, encostou  o sapato na ponta do banco, o mais longe possível de Amélia, para se equilibrar enquanto concertava o cadarço.

Amélia chorou até que as próprias lágrimas parassem de escorrer, e ainda quando elas secaram, continuou parada por um tempo para se certificar de que não retornariam. E também para dar um tempo para a dor imediata dispersar. Era final de tarde quando acabou seu choro que ela mesma não sabia quanto tempo havia durado. Foi então que se levantou e seguiu rumo para fora da estação, estava na hora de conhecer São Paulo. Já que não tinha dinheiro para poder gastar em outra passagem, seria aquilo mesmo.


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