Amélia não gostava de ser feliz. escrita por MeninoSemRazão


Capítulo 10
Todos os nômades merecem o céu.


Notas iniciais do capítulo

Rodada Final
TEMA:
Episódio de Pingu - https://youtu.be/rmwvaHj_tTA



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Luzes artificiais invadiam o céu noturno e músicas felizes ecoavam até que se desmanchassem no silencio do mundo. Rostos naturalmente inexpressivos eram invadidos por sorrisos clandestinos. Aquela cena não podia representar nada que não uma anomalia no espaço e no tempo, na vida e nos corpos. Era como se não existissem problemas no mundo, não haviam contas a pagar, amores não correspondidos, problemas psicológicos ou crianças morrendo de fome ao redor do planeta. Um lugar de suposta felicidade plena, localizado bem no olho do furacão da depressão do mundo, como um iglu feito da neve justamente para fugir do mesmo frio que compunha aquela mesma neve. Como um paraíso artificial. E a mulher era como um diabo em meio aquilo, igualmente artificial.

Chegara até ali seguindo uma família, que lhe chamava atenção pelo menino (suposto filho do casal) que falava demais. Queria ouvir tudo que o menino tinha a dizer. Mas durante toda a perseguição a voz da criança se desmanchava antes de chegar até seus ouvidos. Lembrava-se apenas de quando o menino voltou-se para a mãe, depois da mesma ter lhe desferido algo, e a questionou: “Então o amor é tudo que dissemos que não era?”.

Agora estava ali, observando os pais comprando algodão doce para as crianças. Eram uma família de quatro, um casal e dois meninos. Mas talvez fossem outra coisa, talvez os adultos estivessem se conhecendo para decidirem se engatariam um relacionamento e levaram os filhos de cada um para que os quatro se conhecessem e pudessem julgar se aquela seria ou não, uma boa família em conjunto. Talvez a mulher fosse lésbica e estivesse apenas acompanhando o amigo e seus dois filhos. Talvez as crianças não fossem seus filhos e sim filhos dos vizinhos que pediram para o jovem casal da porta ao lado, por um favor de ajudá-los por uma noite. As possibilidades eram infinitas, mas a mulher apenas decidiu acreditar que eram uma família de quatro.

Viu eles aproveitarem o som saído da caixa de músicas de um dos ambulantes, os observou comprando cada vez mais comida para as crianças e também ao pai presenteando a mãe com um colar feio que ela com certeza só teria dito que era bonito por educação. Riu quando uma das crianças acertou a cabeça do dono da barraquinha de jogos com uma bolinha. E em certo momento, o menino mais velho acabou indo em um brinquedo de balanço sozinho. Se balançava como se quisesse tomar a lua nas mãos. Os olhos transbordavam uma ganância hiperbólica que apenas parecia ser possível caber de fato, em espíritos infantis. Lembrou-se de Ícaro, das antigas histórias dos gregos. Quando o menino desceu do brinquedo estava tonto, sua ganância soberba não teve a mesma penitencia que o pobre Ícaro. Só são punidos os que conseguem manifestar seus desejos, talvez se tivesse de fato conseguido chegar ao menos próximo de poder alcançar a lua, o menino teria um karma mais severo que a tontura.

A família realmente fazia parte daquela cena feliz, com certeza em suas cabeças aquele lugar estava longe de um simples paraíso artificial. A suposta felicidade que habitava seus peitos tornava o lugar um paraíso ainda mais sofisticado de qualquer outro que poderia existir. A mulher pensou sobre aquela felicidade.

Em certo momento, seus olhos pescaram dois balões mirando o infinito do céu. Haviam escapado das mãos dos meninos, como passarinhos a fugir de gaiolas. Talvez as coisas que tem a possibilidade de voar nunca devessem ser mantidas no chão, pois as maravilhas do céu são incríveis de mais para serem perdidas em algo tão ordinário a ponto de ser pisoteado pelos pés dos homens.

Perguntou-se sobre os momentos em que a felicidade a tinha dado um paraíso.

Perguntou-se se paraísos eram de fato uma ideia atrativa.

Concluiu que só os artificiais eram bons.

Foi embora, seria outra mulher.

Uma que não fosse Amélia, nem Magda, e nem Antonietta.


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