Lacunas escrita por Petty Yume Chan


Capítulo 1
Capítulo I


Notas iniciais do capítulo

Hey pessoinhas !!
Sabe, eu meio que abandonei o Nyah por um tempo por motivos de estar sem computador e o aplicativo do Spirit facilitar muito a minha vida. Mas agora a situação tá um pouco melhor e eu vou passar a postar aqui também.
Então eu resolvi passar essa Shortfic de três capítulos (finalizada no Spirit) para cá, antes de começar qualquer outro projeto ^--^
Todas as informações necessárias para entendimento da fic eu deixei nas notas junto da sinopse.
Boa leitura ^-^



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Desde o momento em que nascemos –­ e até mesmo antes disso – nossos sentidos começam a captar informações as quais são guardadas em nosso cérebro. A tendência é que essas informações aumentem, uma vez que estamos em constante contato com sons, cheiros, sabores, sensações, emoções e etc. Nosso cérebro está sempre recebendo novas informações, e às vezes, revivendo outras, essas sendo conhecidas como memórias. 

As memórias – essas podendo ser de curto ou longo prazo – estão intimamente ligadas ao nosso ser, cada pessoa tem seu próprio conjunto de memórias, memórias essas que se interligam umas as outras, afetando de certo modo nossos pensamentos e personalidades, nos tornando seres únicos. 

As memórias que foram boas para mim podem ser ruins para você, isso porque ela é afetada pelas outras milhares que eram formadas em nosso cérebro antes mesmo de nos entendermos por gente. Todavia, creio que esta constante diferenciação é que dá razão ao termo “indivíduo”.

A questão é que, se as memórias nos formam como indivíduos, quando as mesmas são roubadas de nós – seja por acaso, ou intencionalmente – o que nos tornamos? Somos o tudo ou somos o nada?

Uma folha branca pronta para ser preenchida com tudo o que desejamos, ou uma casca vazia feita de pequenos fragmentos de uma antiga vida que, não importa o quanto tentamos juntar, simplesmente se resume a nada. 

Esses são os questionamentos que vem se passando em minha mente desde aquele dia. É estranho como as coisas acontecem, minha mente se encontrava repleta de lacunas, era como se eu tivesse dormido por anos e acordado em uma vida paralela. 

É comum não nos lembrarmos de todos os rostos que vemos em nossas rotinas de ir ao trabalho, faculdade ou escola, mas quando o rosto de pessoas próximas a você passam a se tornar rápidos lampejos em sua mente, é como se sua vida tivesse sido roubada de você. Minha mãe, meu pai, Leigh e Rosa, o relacionamento dos mesmos, Castiel e os nossos ensaios, tudo era um emaranhado incerto para mim, não sei quanto tempo se passou até que os primeiros resquícios de memórias sobre eles voltassem a minha mente.

Chegou um ponto em que eu não sabia mais diferenciar se meus olhos estavam abertos ou fechados pois tudo era escuro, a escuridão da minha mente. Não importava o quanto eu me esforçava para encontrar minhas lembranças, era inútil, como se eu estivesse a socar um muro com as minhas mãos nuas. Era doloroso, exaustivo e insignificante. 

Entretanto, havia algo em meio a tudo isso que me intrigava, algo que me induzia a continuar socando o muro, a aliança em meu dedo. Quando questionei o meu irmão sobre aquilo, acho que nenhum dicionário teria palavras o bastante para descrever sua expressão. Uma mistura de surpresa e talvez um pouco de melancolia. 

— Você não se lembra?

Foi tudo o que ele me disse, a voz carregada de emoção. Por algum motivo aquilo mexeu muito com ele, o que só me deixou mais curioso sobre o assunto. Eu pensei em tirá-la, mas algo em mim não me permitia, acho que eu tinha medo do que poderia descobrir se o fizesse. 

Desde esse dia eu passei a ter sonhos, a princípio pareciam sonhos comuns, confusos e sem qualquer ordem cronológica, contudo, havia algo em comum em todos eles, uma voz. Regularmente nos meus sonhos uma voz vinha até mim, vez ou outra ela variava, ficando mais grave ou mais aguda, como se meu cérebro tentasse atingir o timbre exato da mesma. 

Ela dizia frases curtas, às vezes só meu nome ou uma risada, ela nunca estava ligada a um rosto ou a uma situação, era apenas som em meio ao nada. Dificilmente eu me lembrava dela com exatidão ao despertar, tudo o que sobrava em mim era o resquício de uma dor de cabeça. 

— Ei! Acho que isso é seu.

Foi a frase da vez, que se dissolveu como espuma uma vez que meus olhos abriram e a luz se tornou presente. Eu não tinha certeza de que horas eram, quando se está em hospitais você nunca sabe que horas são, uma vez que o tempo parece nunca passar. A luz alaranjada do por do sol que invadia o quarto era o único sinal que eu tinha para me indicar que, provavelmente, estávamos no meio da tarde. 

Minha mente sonolenta ainda não conseguia identificar com clareza meus arredores, mas já captava uma presença ao meu lado, no começo pensei ser o meu irmão, mas melhor observando percebi ser uma silhueta feminina. A luz da janela atrás de si incomodava meus olhos recém-despertos, me obrigando a piscar algumas vezes para que os mesmos finalmente se ajustassem e me permitissem ver com clareza a minha visitante. 

Era uma garota que ainda não havia visto ali, seus cabelos curtos na nuca ficavam mais compridos na frente e tinham um tom de preto extremamente brilhante, remetendo ao azulado, os olhos de um castanho amendoado estavam compenetrados no livro sobre o seu colo, fazendo com que a mesma não notasse o meu recente despertar. 

Camuflado na distração da garota, me permiti espiar a capa do livro, ela tinha um tom marrom escuro a qual se destacava com os dedos brancos e esguios, no meio, em letras douradas, vinham os seguintes escritos. 

Jean Baptiste Racine

Fedra – A filha do sol

Não pude deixar de sorrir, seja quem fosse minha acompanhante, tinha um incrível gosto literário. 

— A mitologia grega nas mãos de Jean Racine, eu realmente aprecio este livro. Já teve oportunidade de presenciar a peça?

A garota que fora tirada de seus devaneios sem prévio aviso direcionou os olhos espantados em minha direção, mas assim que se deu conta do meu despertar abriu um sorriso, e que sorriso. Não sei explicar a sensação que me invadiu ao ver um dos mais belos sorrisos que já presenciei, era um sentimento de nostalgia junto à sensação de ter todo o meu ar roubado de mim, por um momento eu pensei ter morrido e ela seria o anjo a qual me guiaria aos altos céus. 

— Bom dia… Ou devo dizer boa tarde? 

Todos os meus arranjos e composições pareceram perder o sentido ao deparar-se com o tom melódico da sua voz nos meus ouvidos, creio que nenhuma das claves teriam notas e tons o bastante para formarem uma harmonia tão completa. Ainda hipnotizado por seu sorriso e voz eu forcei meu corpo a se levantar, rapidamente ela se levantou para me ajudar, ajustando a cama e as almofadas de modo que eu ficasse sentado e bem acomodado. Durante todo o processo eu não consegui desviar meus olhos dela. 

— Não se force demais, seu corpo ainda está se recuperando. 

Nossos olhares se encontraram. 

Ela sorriu novamente. 

Meu coração acelerou. 

Ela voltou a se sentar, deixando o livro de lado e com os olhos focados em mim. 

— E respondendo a sua pergunta, sim, eu já vi a peça. 

Por mais que meus ouvidos captassem cada palavra, meu cérebro não conseguia processar nenhuma delas, eu me sentia perdido e desnorteado, provavelmente estaria parecendo um completo idiota. 

— Oh, ótimo, é sempre bom conhecer alguém adepto dos clássicos. 

Passei uma das mãos pela nuca timidamente, enquanto dava um riso sem graça do papel de adolescente que fazia, todavia, ela continuava sorrindo para mim, creio que não importava o que eu fizesse ela continuaria sorrindo. 

— Então… — pigarreei enquanto procurava as palavras certas para terminar a frase. — Desculpe a grosseria, mas, quem é você? 

O sorriso vacilou em seu rosto, de algum modo minhas palavras mexeram com ela, era como se ela já esperasse minha pergunta, mas recebê-la diretamente era mais do que ela podia aguentar. Os lábios se moveram diversas vezes, como se ela buscasse as palavras corretas – a qual não encontrava – os olhos se desviaram para a janela, me permitindo ver apenas as sombras de um rosto melancólico. Ficamos nesse silêncio por alguns segundos até que ela respirou fundo, levou uma das mãos ao peito encenando estar ofendida e finalmente disse. 

— E agora, o que será de mim? Se a única pessoa a qual entendia meus devaneios agora mal reconhece meu rosto. 

Após terminar sua cena dramática ela apenas olhou para mim e riu como uma criança, não pude deixar de rir também, ela era contagiante. 

— Com isso vou interpretar que nós somos bons amigos. 

— Nós somos… Bem próximos…

— Desculpe. É difícil para mim tanto quanto para você. 

— Não é sua culpa. 

Os dedos cruzados sobre o colo estavam ainda mais pálidos, isso me dava a entender o quanto ela estava tensa com a situação embora o rosto ostentasse um sorriso, ela estava se esforçando para manter o clima agradável. Era estranho como, mesmo o rosto dela não me remetendo a nada, eu sentia como se a conhecesse há muito tempo. 

— Conte como nos conhecemos. 

Ela mostrou surpresa com o pedido, mas não hesitou em falar. 

— Foi no colégio, eu pensei que você era um fantasma. 

— É engraçado… E poético. Conte-me os detalhes. 

Logo ela começou um monólogo a respeito de uma punição que teve na escola por conta de uma vingança boba, por consequência ela ficou até tarde na escola limpando as escadarias até ouvir alguns barulhos vindos do porão. Ela fugiu, crente de que havia um fantasma na escola, mas obviamente ninguém acreditou, logo, ela se arriscou voltar lá na noite seguinte para provar a existência do fantasma, a qual ela descobriu ser apenas eu esperando o Castiel para mais um dos nossos ensaios. 

— Nos conhecemos há tanto tempo, e mesmo assim eu não me lembro de nada. 

— Não se force demais, as coisas virão com o tempo. 

— O tempo se tornou uma metáfora para mim. 

Os pequenos lábios carnudos se moveram para falar, porém foram interrompidos antes de formarem qualquer frase. 

— Com licença, mas o horário de visitas acabou.

— Há sim, claro… Já estou indo. 

A garota começou a recolher suas coisas rapidamente enquanto a enfermeira aguardava na porta. Eu não sei ao certo como as coisas aconteceram, mas quando me dei conta os meus dedos já seguravam a manga do vestido na altura do pulso, seu rosto me encarava curioso. 

— Você… Volta?

Dizer que aquilo a surpreendeu seria um eufemismo, ela estava mais do que surpresa, era possível perceber isso em cada respiração sua, mas logo ela sorriu, me acalmando. 

— É claro. 

Eu soltei a respiração – que nem sabia que estava segurando – em forma de suspiro e larguei seu pulso permitindo-a ir. 

— Pronto?

Ela acenou que sim para a enfermeira e saiu do quarto, a porta se fechou em seguida. 

Eu sorri. 

                 · · • • • ✤ • • • · ·

O som da porta se fechando foi como um interruptor que ligasse todas as minhas emoções de uma só vez, minha garganta queimava pelo fato de estar segurando o choro todo esse tempo. Enquanto eu seguia a enfermeira pelos corredores a sensação era de que os mesmos me engoliram a qualquer momento, eu não sentia o chão sob os meus pés, eu não sentia o mundo ao meu redor, era como se eu estivesse flutuando em algum lugar entre o real e o imaginário. 

Quando finalmente chegamos ao piso mais baixo do hospital Rosalya já me esperava na recepção. Não foi necessário palavras, ela lançou o olhar em minha direção, eu balancei a cabeça em negação ela me abraçou com força, o calor do seu corpo sendo a primeira coisa que me trouxera a realidade. Era estranho, eu não sentia nada, mas ao mesmo tempo queria chorar e não conseguia. 

— Eu sinto muito amiga, eu nem imagino o que você deve estar sentido, se o Leigh me esquecesse. — Ela hesitou por um momento, afastou-se e olhou nos meus olhos lançando-me um sorriso carinhoso. — Mas agora que ele está ciente da relação de vocês as coisas vão ser mais fáceis, você vai ver. 

Eu mordi o lábio inferior, sabendo da bronca que viria por causa do que eu estava prestes a admitir. 

— Eu não contei pra ele. 

Eu disparei as palavras todas de uma vez fazendo com que ela demorasse um tempo para assimilar tudo, quando o fez entretanto, sua reação não foi menos do que o esperado. 

— O QUE?! COMO ASSIM?!

A enfermeira nos lançou um olhar furioso e fez um sinal para que ficássemos quietas, Rosalya segurou meu braço com firmeza enquanto me puxava para fora do hospital, mas seu olhar me deixara claro que a bronca não havia acabado. 

— Já pode começar a se explicar. 

Eu desvie o meu olhar incerto, na realidade eu não tinha qualquer explicação plausível para o meu comportamento, nem mesmo eu sabia o porquê de agir de tal forma. 

— Acho que eu fiquei… com medo…?

Rosa bufou irritada e me deu um leve peteleco na testa. 

— Com medo? COM MEDO? Sua idiota, como espera que as coisas se resolvam se você não faz a sua parte? 

Ela gritava comigo, e no fundo eu sentia que era com razão, deixá-lo a própria sorte sem qualquer resposta não era muito mais cruel? 

— Espera, mas tem uma coisa.

Ela cruzou os braços enquanto batia o pé no chão impacientemente. 

— Ele me pediu para voltar. 

Sua expressão suavizou instantaneamente, um brilho surgindo nos olhos e um sorriso no rosto. 

— Isso é ótimo, talvez você não tenha sido completamente apagada do coração dele. Amanhã nós estaremos aqui bem cedo. 

— Espera… Amanhã?!

— É claro! Quando mais?

— Rosa, eu não sei se estou pronta para já enfrentá-lo assim, de repente. 

— Como assim "não está pronta", você é a NOIVA dele, quem melhor que você para fazer ele se lembrar de você mesma?

Eu entendia o que a Rosa queria me dizer, mas ao mesmo tempo não. Eu sentia a minha boca seca, o coração disparado e as mãos suando só de pensar na hipótese de ter aquele tipo de conversa com o Lysandre.

— O problema é justamente esse! Ele sequer se lembra do meu rosto, eu não posso só chegar e dizer "muito prazer, eu sou sua noiva e nós nos amamos". Eu não quero que ele me ame por obrigação! Eu quero que ele tenha algum tipo de lembrança sobre mim antes de impor qualquer sentimento sobre ele.

A expressão de Rosa se desfez, agora se tornando indecifrável, os lábios se moviam inquietos e hesitantes, acho que de certa forma ela entendeu o que eu queria dizer, e agora se encontrava dividida sobre o que pensar e dizer, todavia, ela não precisou encontrar as palavras, alguém o fez por ela. 

— E se ele nunca se lembrar?

A voz vinha de trás de mim, entretanto, eu não precisava me virar para reconhecer o dono daquela voz grave. 

— Castiel! Cala essa boca!

— Não tem problema Rosa. 

Eu me virei lentamente encontrando a feição cansada do ruivo, seus cabelos estavam bagunçados e a raiz escura já começava a aparecer, enormes olheiras se depositavam sob seus olhos cinzas e seu cheiro era de cigarros. Ele estava completamente desgastado, sua dor sendo quase palpável. 

— Só estou encarando as possibilidades. — Ele deu de ombros, seus olhos se encontraram com os meus, eles tinham um tom mórbido. — E se ele nunca mais se lembrar? 

Eu respirei fundo, suas palavras não me irritaram ou magoaram, eu já o conhecia o bastante para saber que aquele jeito grosseiro era como ele demonstrava a sua preocupação. 

Engolindo em seco eu respondi. 

— Se esse for o caso, então eu irei carregar esse fardo sozinha.


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Notas finais do capítulo

Por enquanto é isso. Ainda não sei como vai ser a publicação dos capítulos porque, como eu disse, a fic já está terminada.
Ainda não decidi se público um por semana ou solto tudo essa semana, enfim, vocês vão descobrir junto comigo.
Até de repente !!
Kissus da yume ♡



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