Ametista escrita por Karina A de Souza


Capítulo 14
Lamento, isso aqui é bem desnecessário


Notas iniciais do capítulo

O título já diz tudo... Brincadeira.
Às coisas estão indo no ritmo de Torchwood por aqui, por isso elas podem dar impressão de que não tem nada acontecendo, mas tudo é sempre necessário, se não fosse eu nem ia escrever.



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—Eu vou ter que te dar um despertador?-Jack perguntou, sem tirar os olhos da estrada. Encostei a cabeça no vidro, me ajeitando no banco do carona.

—Eu tenho um despertador.

—E por que não usa?

—Às vezes eu tenho o sono pesado e não ouço o toque.

—Você sempre teve o sono leve... E perturbado. -O encarei.

—Não tenho um sono perturbado.

—Como é que você vai saber se está dormindo?-Engoli algumas respostas ácidas e espertinhas.

—O caso é: às vezes tenho o sono pesado, aí não ouço o despertador e me atraso. -Left Outside Alone começou a tocar no rádio, Jack aumentou o volume.

—Você disse que ia ser mais pontual.

—Não. Eu disse que ia tentar ser mais pontual. Não é a mesma coisa. -Revirou os olhos.

—Como é que eu tenho tanta paciência com você?-Ri.

—Você não vai chutar a pessoa que corre pra sua cama num estalar se dedos... Espera, esse é o Ianto. No nosso caso, eu estalo os dedos.

—Pare de invocar com Ianto.

—Não.

—Tis. -Olhou pra mim, repreensivo.

—O que? Não sou obrigada a ser amiga dele, ou sou?

—Não precisa ser amiga dele, mas não precisa ser rude. Eu percebi o que você faz.

—Ah, pelo amor dos deuses, Jack Harkness. O que vai fazer, trancar Ianto e eu juntos para que a gente fique amiguinhos?

—Por que você não gosta dele?

—Eu nunca disse que não gostava.

—Não ser irritante não vai te matar.

—Ah. Estou sendo irritante? Que coisa terrível...

—Ametista...

—É melhor matar esse assunto, antes que outra coisa morra. -Olhei pela janela. -Onde vamos?

—Uma dona de casa viu o que não deveria, agora temos que ir lá garantir que não haja problemas.

—Aliens envolvidos?

—Com certeza.

Pouco depois Jack estava estacionando em frente à um grupo de casas todas iguais e horríveis. Enquanto saíamos do carro, um grupo de garotas brigava na esquina, tudo sendo filmado por um garoto.

—Bairro legal. -Zombei.

—Ai, essa deve ter doido. -Apontou para uma garota que gritava enquanto sangue escorria do nariz. -Deve ter quebrado.

—Parece o orfanato onde eu cresci.

—Quebraram seu nariz lá?

—Não. Mas eu quebrei o nariz de um garoto.

—Não estou surpreso. Hum... Acho que é por aqui...

O segui pela calçada, enquanto Jack murmurava o número da casa que estávamos procurando. Não demorou muito para estarmos batendo na porta certa, e uma mulher baixinha e irritada nos atender.

—É sobre o ET?-Perguntou, variando o olhar entre nós.

—Exato. -Jack respondeu, estendendo a mão. -Capitão Jack Harkness. Essa é Ametista. Somos agentes da...

—Entrem logo.

—E você me chamando de rude. -Sussurrei para Jack, passando por ele.

O interior da casa era uma bagunça. Roupas, brinquedos, resto de comida e embalagens. Em algum lugar, uma criança chorava alto.

—A senhora se importa em nos contar o que viu?-Jack perguntou, tirando as latas de bebida de uma poltrona e sentando. Decidi ficar de pé. -Senhora...?

—Sales. -Sentou no sofá, cruzando os braços.

—Certo. Senhora Sales... O que viu essa madrugada?

—Fui levar o lixo pra fora... Como sempre, o imprestável do meu marido devia fazer isso, mas ele nunca faz nada! Aquele inútil... -Troquei um olhar rápido com Jack.

—A senhora saiu e...?

—Vi algo remexendo na lixeira. Achei que era algum morador de rua, isso não é incomum, mas aquela coisa... Não era humana. Aquilo era... Eu não sei. Parecia ter vindo do inferno!

—Então...?

—Então eu achei que era algum idiota mascarado, e gritei com ele. Aí ele... Fez uma coisa... Mostrou os dentes e fez um som esquisito...

—A senhora foi a única a vê-lo?

—Não. Tinha um garoto... Ele filmou tudo. Ele não pode ver nada que já quer filmar com aquele celular ridículo que deve ser roubado.

Troquei outro olhar com Jack. Devia ser o mesmo garoto que agora filmava a briga feminina na rua. Jack fez um gesto com a cabeça, que entendi rapidinho. Assenti e saí da casa.

O garoto ainda estava no mesmo lugar, vendo sua gravação, mas as garotas tinham sumido, apenas algumas gotas de sangue e fios de cabelo arrancados onde elas tinham brigado.

—Celular legal. -Comentei. O garoto se virou, devia ter uns dezoito anos.

—Ah, ele é mesmo, tia. -Suspirei. Tia? Eu não tinha nem vinte e cinco anos ainda!

—Parece que você gosta de filmar coisas com ele. Por que não me mostra?

—Você é policial?

—Deus me livre. Não. -Parou um momento, pensando.

—É do FBI?

—Você tá drogado?-Arranquei o celular da mão dele.

—Ei!

Abri a galeria do celular. Nudes, fotos de carros, motos, mais nudes, garotas, vídeos de brigas e... Ah, lá estava o vídeo do alien. Eu não sabia o que era, mas definitivamente era um alienígena.

—Devolve meu celular...

—Lamento, ele foi confiscado. -Interrompi.

—Por quem?

—Por mim. Pode desistir.

—Tudo bem aqui?-Jack perguntou, aparecendo ao meu lado.

—Ela roubou meu celular!-O garoto gritou.

—É... Às vezes ela faz isso. Você parece nervoso, calma. Aqui. -Estendeu uma garrafa pra ele.

—Que isso?

—Bebida, e das fortes. -O garoto pegou a garrafa, bebendo rapidamente.

—O que tem ali, de verdade?-Sussurrei.

—Algo pra fazê-lo esquecer do que viu. -Jack sussurrou de volta. -O celular tem a gravação?

—Tem. -Entreguei o aparelho.

—Ótimo. -O garoto derrubou a garrafa e cambaleou, Jack o ajudou a sentar. -Não se preocupe, você não foi envenenado. Devolvo o celular assim que der. Obrigado pela colaboração.

***

—Você se saiu muito bem. -Jack elogiou, sentado na minha frente. Dei um gole na minha cerveja.

—Comida, elogio... O que você está querendo?

—Você mal tomou café, não quero que desmaie no trabalho. E você mereceu o elogio.

—Ah, sei. Você tá querendo alguma coisa. Acho que sei o que.

—Nossa relação não é só sexo, Tis. Eu me importo com você.

—Claro, claro.

—É sério. -Cruzei os braços, encarando-o atentamente. -Acima de tudo, nós somos amigos. Eu gosto de você, me importo com você. É isso. Pode dizer o mesmo?

—Você sabe que sim. Eu sempre gostei mais de você do que você gosta de mim. Eu não te culpo por isso. Esse é você. Convive com as pessoas, mas constrói um muro ao mesmo tempo.

—É exatamente o que você faz. Você já começa se relacionando com um muro ao ser redor. -Comecei a falar, mas ele me interrompeu. -Não tente negar. Existe alguém que conheça você de verdade? Alguém que sabe seu nome completo? Alguém que saiba sua idade? Alguém que saiba por que você tem medo do escuro, claustrofobia e o sono perturbado? Alguém sabe, Ametista?

—Por que alguém ia querer saber isso tudo? Pra sentir pena? Quer uma história triste? Eu te recomendo alguns livros...

—Olha o muro aí. Cada vez mais e mais alto, mais resistente...

—O que deu em você hoje? Não pode só me deixar em paz? Virou meu psicólogo, Jack? Você é só meu chefe e o cara que dorme comigo de vez em quando. -Fiquei de pé. -Por que você tem que estragar tudo?

—Ametista...

Me virei e marchei para fora do restaurante, ignorando todos os olhares na minha direção e Jack chamando meu nome.

***

—Cadê todo mundo?-Perguntei, cruzando os braços e me aproximando. Owen ergueu o olhar.

—Todos em missões. Onde você estava? Jack foi te buscar e voltou sozinho... E irritado.

—Decidi dar uma volta para não socar a cara de ninguém.

—Que bom.

—O que está fazendo?

—Dissecando nosso amigo aqui. -Tirou o pano de cima do corpo.

—Esse é o alien...

—Da gravação? Ele mesmo. Encontramos mais cedo.

—Alguma ideia da espécie?

—Ainda é desconhecido. Tosh está rodando no banco de dados, mas nenhuma combinação.

—Okay. Bom... Vou trabalhar nas minhas armas.

Mal dei dois passos, quando um som alto soou pela base, me assustando e fazendo Owen derrubar o bisturi que segurava.

—O que é isso?-Perguntei.

—Quarentena. Acho que ativamos a quarentena.

Portas prateadas fecharam todas ao mesmo tempo, fazendo um som baixo ao serem lacradas. Passei alguns segundos imóvel, chocada, então meu cérebro começou a trabalhar à todo vapor.

—Estamos trancados?

—Sim. Quarentena. Estamos trancados. Não é meio óbvio?

—Não posso ficar trancada. -Corri para uma das portas, batendo nela. -Faça essa coisa abrir.

—Eu não posso. Vamos ficar aqui até a quarentena acabar. Essa coisa aqui liberou um vírus...

—Abra essa porta!-O silêncio se estendeu. Owen parecia surpreso.

—Não há motivo para pânico...

—Estamos presos! Isso é motivo para pânico! Abre essa porta agora!

—Eu não posso. Não tenho como fazer isso. É automático.

—Você tá de brincadeira. A gente... Eu tenho que sair daqui...

—Vamos sair quando a quarentena acabar.

—Não. Você não entendeu. Eu quero sair agora. -Me sentei num degrau da escada, tentando controlar minha respiração.

—Você parece... Em pânico.

—Não suporto ficar trancada. Não importa o tamanho do local. Me sinto sufocada. Abra as portas.

—Sinto muito, eu não posso. -Tirou as luvas e sentou ao meu lado. -Você deve ter claustrofobia.

—Talvez. -Abracei os joelhos.

—Trauma de infância?

—Não falo do meu passado nem com Jack, por que falaria com você?-Deu de ombros.

—Você já foi pra prisão?

—Eu tenho cara de ex presidiária?

—Como seria uma cara de ex presidiária? Olha só, assim que a quarenta acabar, as portas abrem e poderemos sair. É simples.

—Quanto tempo vai levar?

—Não faço ideia.

—Que maravilha. -Tirei o sobretudo e o suéter. Estava esquentando ou era coisa da minha cabeça?

—Não pensar nisso pode ajudar. -Encarei Owen.

—O que sugere? Pensar nos Teletubbies?

—Eu estava pensando em algo mais divertido... E mais adulto. -Ergui uma sobrancelha. Owen sorriu.

Então eu o beijei.

***

—Achei que aquela merda de quarenta ia durar um século. -Comentei, cruzando os braços. Jack, sentado do outro lado da mesa me encarou. -Que foi?

—Parece que você se divertiu bastante durante a quarentena.

—Você sabe que eu tenho claustrofobia num nível bizarro.

—Então você encontrou uma cura. E então, o que achou do Owen?-Parei um momento, refletindo.

—Como sabe o que aconteceu?

—Há câmeras por todo canto. Pude ver de camarote sua recuperação milagrosa.

—Você ficou vendo tudo? Jack! Qual é o seu problema?

—Eu não vi tudo. Só o começo. Sabe... Você deu um show essa manhã...

—E daí? Qual a ligação? Você se esquece de que eu tenho liberdade de fazer o que quiser.

—Não estou te cobrando por transar com Owen. Eu não ligo.

—Você nunca liga. Pra nada.

—Está sendo ridícula.

—Não. Você está. Não vê o que está bem na merda da sua frente.

—Ah, Tis... Por favor... Se for seus dramas de novo...

—Dramas? É só o que eu faço? Drama? A gente conseguia se entender tão bem.... Então veio a droga da Torchwood, a droga do Ianto...

—Pare de reclamar do Ianto.

—Eu vou reclamar de quem quiser!-Fiquei de pé. -Às vezes parece que preciso gritar pra que você me ouça.

—Então é isso? Você transou com Owen pra chamar atenção?

—O que? Quer saber? Vai se ferrar!

Saí da sala, batendo a porta com força. Pelo som, o vidro rachou.

Tosh, Gwen e Ianto estavam cochichando num canto, mas se calaram quando me viram.

Peguei meu sobretudo e o vesti enquanto saia, furiosa. Faltava algumas horas para o fim do meu turno, mas eu não ligava, só queria ir embora antes que acabasse socando alguém.

—Hey, Ametista!-Olhei por cima do ombro, era Owen, correndo pra me alcançar. Revirei os olhos e continuei andando. -Ei!

—Não tenho tempo. Cai fora.

—Wou, que mal humor. -Conseguiu me alcançar. -Qual é? Você não precisa bancar a irritadinha comigo. Não mais.

—Owen, uma transa não te faz meu amigo. -Parou de andar, fiz o mesmo, olhando pra ele. -Você continua sendo meu colega de trabalho insuportável.

—Então por que transou comigo?

—Por que eu posso. Agora me deixa em paz.

Continuei andando. Owen não me seguiu.

Saí ao ar livre, respirando fundo o ar da noite e me apoiei na grade de proteção. Muitas emoções ao mesmo tempo me deixavam maluca.

“Não quero ficar aqui... Por favor... Me deixa sair... Por favor...”.

Fechei os olhos, reprimindo um soluço. Às vezes eu era como... Não sei, aço. E às vezes parecia de vidro. No fundo... Aquela Ametista durona e rude era uma garotinha assustada que se recusava a morrer. Por mais que tentasse destruí-la, lá estava ela, chorando em momentos inoportunos e querendo ajuda. Eu a odiava, mas ela era uma sobrevivente.

—Tis?-Me virei, era Jack. -Tis... O que foi?

Balancei a cabeça negativamente, sem querer responder e o abracei. Ele retribuiu o abraço, sussurrando que tudo estava bem. Naquele momento, eu o amei como nunca.


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Notas finais do capítulo

É quase tradição da Torchwood todas as minas da base dormirem com o Owen kkkkk Aí eu decidi brincar com isso também. Só que se ele acha que ganhou a Tis, tá muito enganado.
Não sei vocês, mas ADORO essas coisas de quarentena *risada maléfica da Missy*
Okay, Tis e Jack brigaram e se entenderam... Por quanto tempo? Será que temos mais tretas pela frente?
No próximo capítulo... Algo que o Doutor resolveria facilmente, mas que está nas mãos da Torchwood.
Sempre me perguntei onde o Doutor se metia quando tinham tretas colossais que a Torchwood tava tentando enfrentar. Depois, na terceira temporada, ficou no ar que o Doutor se escondia de vergonha que sentia pela humandiade. Beeeem tenso.
Enfim, até mais, galera!



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