Estrelas Perdidas escrita por S Q, Lara Moreno


Capítulo 31
Galáxias Distantes


Notas iniciais do capítulo

"I don't care, go on and tear me apart, I don't care if you do, 'cause in a sky, 'cause in a sky full of stars, I think I saw you" - A Sky Full Of Stars, Coldplay



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Quando a minha namorada falou que iria para uma entrevista, é lógico que fiquei nervoso e preocupado, além de irritado com o fulaninho que acha que tem o direito de mandar na vida dela. Para quem não pegou, o fulaninho era Edgar. Mas eu também fiquei muito empolgado. Seria a primeira vez de Riley na televisão depois de tanto tempo, mas Riley como Rita, como a garota que eu conheci alguns meses atrás e me apaixonei. Ela era inteligente, eu tinha confiança que se sairia muito bem. Então, ajudei Pietra e o casalzinho a recolher os caquinhos da cozinha e quando eu digo caquinho não é só a louça que eles derrubaram, mas também a mini treta que teve com a cena icônica de Pipi quase tacando o chinelo neles, como uma senhora rabugenta tentando separar o casalzinho adolescente, porque o fogo no rabo deles estava queimando o quintal dela.

Enfim, depois de dar boas risadas com meus amigos, puxei todo mundo para a sala, porque estava na hora da minha namorada mostrar seu verdadeiro brilho para o mundo. E como eu já esperava, mas meu coração de apaixonado lá no fundo jurava que não, ela começou bem, respondendo às perguntas sobre o motivo do sumiço e tudo mais, mesmo que eu ainda conseguisse perceber um pouco de seu nervosismo que tentava esconder. No final, eu diria que deu tudo certo, se eu não tivesse achado o apresentador inconveniente às vezes e o fato dela mentir sobre as fofocas que falavam sobre a vida dela comigo em Niterói.

Fiquei chateado? Talvez, mas logo a gente se encontraria de novo e a gente conversaria, certo? Bem, era o que eu imaginava, porém, contudo, todavia não foi o que aconteceu. Quero dizer, nós nos encontramos de novo, claro. Mas no dia seguinte, e sem notícias nenhuma de onde ela estava desde o fim da entrevista.

Quando Rita chegou em casa, eu assistia uma série qualquer sobre comédia policial na televisão. Ela colocou as mãos nos meus olhos e demos um selinho logo até que que pude voltar a enxergar. Em seguida, ela se deitou no meu colo e eu puxei o assunto.

— O que aconteceu depois da entrevista que você sumiu?

— Eu fui para a mansão. – Respondeu com o ar tranquilo. – Passei o dia com a minha mãe, ela queria me lembrar como era a minha rotina. – Então, fez uma careta de repúdio. – Era demais, falei para ela que ainda precisava de um tempo para me acostumar e pensar, porque você sabe, eu não sou mais a mesma pessoa e ainda não lembro de tudo.

— Sim, eu sei, então o que você vai fazer?

— Eu aceito fazer entrevistas de vez em quando e quero conhecer a produção, mas cantar num estúdio e me apresentar, acho que ainda está muito cedo, não sei se estou pronta. – Falava, enquanto fazia aspas com as mãos. – Foi o que eu falei para ela.

— E como ela reagiu? O que ela respondeu?!

— Calma, Benjamim. – Pediu com uma risada. – Ela só disse que entende e me apoiou.

— Sério?

O jeito dessa mulher, a parte da conversa dela que eu ouvi, minha intuição e o fato dela submeter a própria filha a uma rotina desgastante... tudo isso era motivo para eu desconfiar da mãe da Riley. Assim, eu duvidava que ela realmente apoiava a decisão de Rita.

— Claro, mesmo que a gente tenha conhecido ela agora, ela é a minha mãe e se eu não confiar nela, em quem mais vou confiar? – Ergueu uma sobrancelha e sorriu para mim.

— Em mim. – Respondi na seriedade, mas Rita deu uma risada curta e me beijou.

Depois dessa conversa, nós íamos conversar sobre meu primeiro dia no teatro, mas acabou que nem deu tempo disso porque apareceu Pietra, e ficamos o tempo inteiro a partir daí só zoando um ao outro e se divertindo.

— Desse jeito, você vai ficar famoso rapidinho e em um domingo aleatório vai estar eu e você disputando no Ding Dong no Faustão. – Riley comentou, rindo após o que consegui contar sobre o teatro.

— Ah mas aí seria injusto, você sabe mais de música que eu. – Rebati, ameaçando lhe fazer cócegas na barriga, que cruzou os braços não satisfeita com a minha resposta – Prefiro A Fazenda, seria nós dois disputando para ser o fazendeiro da semana, para depois formar aliança para chegarmos até a final e trair um ao outro.

— Que horror, Benjamin! – Ela soltou uma risada alta e eu acompanhei. – Por que a gente se trairia no final?

— Porque como você disse, eu sou um ótimo ator e você cairia na minha aliança. – Com aspas em "aliança".

— Então eu quero ver com meus próprios olhos se essa sua atuação é boa mesmo. – Arqueou uma sobrancelha e fez biquinho em tom de provocação. – No seu próximo ensaio, eu vou fazer uma surpresinha e se não der sábado que vem, só me aguarde, seu Benjamin, quero ver se eu acreditaria na sua aliança mesmo.

— Vou estar no aguardo de sua presença, dona Rita. – Falei já colocando as mãos em sua barriga e assim, entramos numa guerra de cócegas. Bem infantil, né? Mas eu não ligo, se for com ela, nada mais importa.

Porém, no final de semana seguinte, Rita não apareceu. E nem no próximo, muito menos o outro e o depois desse. Dessa forma, as semanas foram passando e eu sentia falta de Rita. Nós nos encontrávamos em meio a rotina de trabalhos, entrevistas e ensaios, mas era pouco. Não tínhamos tempo para sentar e passar um tempo juntos conversando, por exemplo. O contato foi diminuindo e eu até entendia os motivos, mas ainda assim fui começando a ficar chateado.

Todo sábado eu ia para os ensaios no teatro. No último fim de semana antes da apresentação todos estavam agitados, um pouco nervosos. Foi uma correria total a tarde inteira no teatro. Eu estava muito empolgado com tudo, ansioso para voltar aos palcos. Mas ainda assim, sobrava tempo para ficar na expectativa da porta atrás da plateia se abrir e Rita aparecer. Porém, ela não apareceu. E isso acabou me lembrando da minha infância, quando eu me apresentava e esperava o pai aparecer para me assistir. No fim, eu dava as mãos aos meus amigos atores e me despedia do público, sem a presença dele.

Enfim, continuando. Minha mãe tinha me chamado para casa dela fazia dias, porque queria conversar comigo. Mas por conta das nossas rotinas, a gente nunca arranjava tempo para se encontrar. E por incrível que pareça, eu preferia que a gente se encontrasse na casa dela, porque eu estava com saudades.

Logo, no domingo após o último sábado de ensaios, nós finalmente entramos em acordo. O dia começou e os pássaros cantavam junto com minha apresentação sensacional  digna de um dueto com minha namorada, o que atrapalhou minha. Pasmem, nesse dia consegui tomar um café rápido  com Rita antes de partimos para cantos diferentes do mundo. Ela saindo de uma área pobre e indo para onde os ricos se escondem no Brasil, trocando as buzinas frenéticas e o pagode de fundo para o som dos saltos de plataforma das burguesas. E eu saindo de uma área pobre da cidade para outra área pobre. O mesmo carro da gás de Alex cantando nos dois lugares.

Foi assim que me vi sentado tranquilamente na sala de minha mãe. O pão com mortadela fresquinho, mesmo que eu já tivesse comido em casa, a gente nunca recusa, é lei. Ela estava meio em silêncio para pessoas normais, e isso era demais para ela; fiquei preocupado com o rumo da conversa. Mamãe nunca para de falar e geralmente quando quer falar alguma coisa para mim, me liga e grita, e não chama para sentar e conversar.

— Benjamin, você voltou para o teatro, não é? – Ela começou sem jeito.

— Sim, eu já não tinha te falado? – Perguntei confuso e ela assentiu. – Mãe, fala logo o que a senhora quer, a senhora tá me assuntando assim. – Dei uma risada curta de nervoso.

— Mas você só tá fazendo por causa da dublagem, certo?

— Sim, não quero fazer carreira nem nada, é só que eu preciso ser ator profissional se quero ser dublador profissional.

— E você tá gostando de ter voltado ao palco?

— Na verdade, eu ainda não voltei. Só vou estrear semana que vem, mas sim. Sabe Cinderela? – Ela concordou com a cabeça e eu continuei. – Então, a peça é sobre a Cinderela nos dias atuais, é meio confuso de explicar, mas quando a senhora assistir, vai entender. Enfim, eu vou fazer um daqueles ratinhos dela e mesmo que seja um papel pequeno, eu estou gostando muito porque... 

E aí, eu fui tagarelando sobre a peça e como eu me sentia em relação a ela. Minha mãe foi me fazendo perguntas. Pela primeira vez em muito tempo, ela parecia realmente interessada em algo que eu gostava. Foi uma conversa tão boa que nem percebi o dia passando. Ela já estava tagarelando junto comigo, de volta ao normal, quando um estômago roncou. Percebemos que era hora de almoçar. Dessa vez, cozinhamos juntos. Puxei o gosto e o talento por cozinha da minha mãe, sendo bem modesto, e com razão, por motivos de elogios.

Muitos dos meus jeitos e gostos, vieram tudo de mamãe. E nisso, vamos para a segunda parte da conversa. A atração pela arte e o teatro não foram de mamãe, já que ela sempre foi uma pessoa mais séria e racional. Não curtia muito arte e desde criança, eu consigo ouvir sua voz me perguntando "isso vai ser útil pra você?" num sentido de estudo e profissão. Bem, eu não lhe tiro a razão, mas a real é que na escola, ela costumava ser chamada muitas vezes para conversar com os professores sobre mim e acho que só por saber esse fato, já dá para entender por que vida acadêmica nunca foi minha área.

Diante disso tudo, fica claro que as veias artísticas são do meu pai. E esse foi um dos motivos de inúmeras discussões entre ela e eu. A história é que quando eu era criança, meu pai costumava me levar ao teatro e me incentivar. Ele já tinha sido ator quando mais jovem, porém não deu certo e quando viu que eu tinha essa paixão também, desejou que eu não terminasse da mesma forma que ele e alcançasse meus sonhos. Mas o problema é que mamãe também tinha esse desejo, mas de outra forma. Ela tinha medo que eu acabasse como meu pai, só que tentava contornar isso me pedindo para estudar e me tirando do teatro quando não tínhamos mais meu pai.

— Benjamin, tu me promete não esquecer de mim quando tiver dublando o Leonardo DiCaprio? – Ela perguntou uma hora durante a manhã, estávamos os dois sentados no sofá com a televisão ligada num programa qualquer.

— Quem é a senhora? – Respondi na brincadeira. – Perdão, eu acho que entrei na casa errada. Nem te conheço, senhora.

— Olha que eu arrebento tua voz e acabou essa história de dublar, ouviu, moleque? – Ameaçou bem séria, mas eu não pude deixar de rir.

— Ai mãe, eu vou te pagar viagem pra Caribe, Dubai, França e mais para onde a senhora quiser.

— Vai me largar, Benjamin? Tá achando que eu sou uma dessas meninas que só querem saber de dinheiro? – Botou a mão na cintura, parecendo muito ofendida – Qual o nome mesmo? Xuga, xuca?

— Sugar baby?

— Isso aí. – Falou satisfeita, mas logo voltou a pose de ofendida dramática. – Então, vai me largar num lugar qualquer não, eu quero que o senhor me visite também.

— Que isso, mãe? Tá me estranhando? Sou meu pai não. – Comentei e no mesmo instante, ela arregalou os olhos e caiu na gargalhada sendo seguida por mim.

E nesse clima, nós almoçamos e o dia passou num piscar de olhos com direito a dor nas costas de tantas risadas. No entardecer, eu voltava para casa no ônibus com as bochechas doendo e também a sensação de ter meu coração preenchido, com a certeza de que quando eu olhasse para a plateia no próximo sábado, encontraria minha mãe lá me apoiando como sempre esteve.


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Notas finais do capítulo

E nós estamos vivas, voltamos com esse provável antepenúltimo capítulo. Pois é, a história está quase acabando...
Beijos e até mais ♥



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