Estrelas Perdidas escrita por S Q, Lara Moreno


Capítulo 25
Retorno de Saturno


Notas iniciais do capítulo

Aconselho que leiam ouvindo a música homônima do Detonautas.
O título peculiar vem de um evento astrológico (não astronômico, que é a ciência) onde a volta de Saturno ao redor do Sol se completa, abrindo novos horizontes. É interessante de pesquisar.
Espero que curtam.



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A semana que se seguiu deve ter sido a mais estranha da minha vida. Enquanto continuava indo para o trabalho, morando com Ben e Alex, ouvindo todos me chamarem por "Rita", não tinha mais a menor certeza sobre quem eu era. Quer dizer, certeza era algo completamente diferente do que estava rondando minha mente. Benjamin melhorou depois do pequeno surto e simplesmente ficou dias sem mencionar mais o assunto. Ainda bem, ou eu acho que enlouqueceria de vez. Mas deu para ver o quanto ficara afetado. Ao ponto de aceitar uma sugestão do Alex de irem visitar a mãe.

 — Você tem certeza, Ben? Eu sei como vocês não se dão tão bem... — falei, afagando o braço dele quando me contou a ideia estranha.

— É, mas ela ainda é minha mãe né? Do Alex, primeiramente, mas também minha... — comentou pensativo.

Achei melhor não insistir no assunto. De qualquer forma, era uma distração boa o suficiente para as coisas que estávamos descobrindo sobre mim, que não tínhamos como provar. Entendo que achem a gente um pouco covarde, mas se ponham no nosso lugar. Tudo que apareceu da minha vida "passada" era absurdamente grande e diferente, nem tínhamos provas. Não dava para simplesmente aparecer na gravadora (que eu nem faço ideia de qual era) e dizer: "aí eu acho que trabalhava aqui. Me devolve e o emprego e paga um exame de DNA". Fora que minha cara, inchada e com cicatriz era muito diferente de qualquer rosto perfeito de uma dessas cantoras bem-pagas para quem eles dariam alguma credibilidade.

Assim, chegando o final de semana, pegamos carona com Alex para à residencia da mãe deles. Não era muito longe, mas o lugar onde ela morava conseguia ser ainda mais simples que a região onde ficava nosso apartamento. Depois que meu cunhado estacionou, tivemos que atravessar algumas vielas para alcançar a casa, segundo andar de um sobrado nos fundos de uma pequena vila.

 — Foi aqui que você cresceu? — perguntei a Benjamin.

— Ah, não. Ela se mudou para cá depois que eu e Alex fomos morar sozinhos. A casa que cresci era beeem menor! — disse naturalmente, rindo.

Eu não sabia se me sentia mal por ele, ou ria junto daquele sorriso cativante. Óbvio que sendo quem era, acabei rindo enquanto batíamos na porta. Benjamin se aproximou para me beijar, de um modo natural, que não fazia desde o dia em que cantei a música da Riley. Lógico que bem nessa hora a porta abriu.Uma senhora de vestido florido nos encarava de cara feia, cruzando os braços e segurando um pau de macarrão.

— Ora, ora, ele veio. — Roberta falou encarando Benjamin como um dragão. Alex pigarreou:

 — Oi, mãe! Como vai a senhora? 

— Olá, meu filho! Estou trabalhando como uma condenada, sozinha nessa casa! Cheia de dores nas costas... Mas estou bem. — deu uma sonora bufada. Só então olhou para mim. De cima a baixo. — Vamos, entrem! Já que vieram até aqui... Mas aviso que não tem comida para todos. — Esse comentário ela fez olhando diretamente nos meus olhos, sem esconder. Ótima maneira de conhecer a sogra, não é mesmo? Benjamin arregalou os olhos e já ia dar meia volta de volta para a rua, quando Alex segurou seu braço: 

—Não tem problema, mãe, eu peço uma pizza para todos. 

— E eu ajudo a pagar!— fiz questão de dizer.

A bruxa, digo, minha sogra, me olhou com empáfia quando disse isso, mas outra treta foi evitada por Alex que começou a falar sobre os estudos de direito e um grupo de pesquisa jurídica do qual fazia parte agora. Os dois foram caminhando para a cozinha enquanto conversavam, deixando eu e Benjamin sozinhos na sala. Era um cômodo pequeno, mas aconchegante. Tinha as paredes pintadas de amarelo, uma mesinha com um laptop e um sofá de couro um pouco rasgado. Sentamos nele e meu namorado imediatamente me abraçou por trás. 

 — Não liga, ela está tentando ME perturbar. Nunca aceitou a ideia de que eu conseguiria me virar sem seguir os planos de carreira que tinha para mim. Muito menos conseguir uma namorada.— eu ri. — É uma maneira dela se preocupar comigo. Não a melhor, mas é uma. Ao menos, eu prefiro pensar assim.

Foram poucas as vezes que vi Ben tão sério. Todas invariavelmente envolviam as pessoas próximas a ele. Acariciei seu rosto macio.

— Sabia que você é uma pessoa incrível né? Mesmo que sua família não reconheça isso... — ele me encarou atônito com aquela afirmação. Só então me ocorreu a possibilidade daquele ser tão cheio de luz não ter noção do quanto era bom e importante. Ao menos para mim. Decidi abordar pelo lado da brincadeira: — Ah, mas então o MEU HERÓI acha que é uma porqueira?! Assim me sinto até ofendida! Quem seria eu na fila do pão, salva pelo sr. errado? — falei rindo. Ele deu uma gargalhada gostosa, e finalmente colou os lábios aos meus.

Mas esse foi um beijo diferente dos outros que já havíamos trocado. Ele tinha uma espécie de urgência, e fora dado com certeza. Quando nos separamos, se eu estivesse de batom teria ficado toda borrada.Acabamos permanecendo de mãos dadas pelo restante do almoço, ainda que Roberta evitasse olhar muito para a gente. A pizza foi deliciosa de qualquer forma, e Alex zoou um pouco conosco, como sempre fazia:

  — O Bebê não pode comer isso aqui não! É muita gordura, vai acabar golfando... 

— Não sou eu que estou beirando os 100 kg... — Benjamin respondeu cantarolando, enquanto arrancava o pedaço dele da caixa do delivery e enfiava praticamente todo pela boca numa dentada só. Eu sei, um príncipe.

 — FILHO! É sério isso? Você não pode se deixar ficar obeso! — comentou dona Roberta sobre o que Benjamin denunciara. Alex ficou vermelho como um tomate. 

— Eu sei mãe, só que as provas me deixaram ansioso demais. Prometo que logo volto a me cuidar. 

A super-protetora dona da casa, começou a balançar o garfo que levava à boca como se fosse tacar na direção da gente. Mas foi só um blefe estranho, ainda bem. Ao invés de jogar um garfo em nosso direção, se levantou balançando a cabeça e foi pôr uma música da playlist do telefone para "espairecer". Óbvio que seria uma música da Riley. Benjamin ficou pálido na mesma hora. Em alguns segundos estava Alex aplicando-lhe uma manobra de heimlich, tentando desengasgá-lo, enquanto a mãe dava bronca nele pelo pedaço enorme que tinha engolido e eu observava a cena, aflita. Um pedaço grosso e bolorento de comida saiu voando da boca dele e foi parar bem em cima do notebook que estava na sala... 

— MEU COMPUTADOR! — Roberta gritou com a voz mais esganiçada que possam imaginar. Na mesma hora ela largou o filho e foi limpar a máquina como se fosse o bichinho de estimação dela.

Alex e Benjamin se sentaram novamente no sofá, um acalmando o outro. Bem nessa hora o celular antigo de Benjamin começou a tocar. Chamada de Kaio. Ele fez menção de atender, mas quase tropeçou nos próprios pés. Estava se recuperando ainda, então eu mesma fui ver o que ele queria. Resolvi deixar no viva-voz para que meu namorado entrasse na conversa assim que conseguisse.Foi uma das maiores burrices da minha vida. Já sabia que a combinação Kaio + celular era algo que não dava certo. Nunca deu. Por que fui ignorar isso justo ali? Segue o roteiro da chamada/desastre: 

— Alô?

 — Oi, Rita?! Olha só... poxa, você ainda tá com o Benjamin?

 — Hein? D-do que você tá falando, criatura? Ele não pode atender agora, tá passando mal. Quer deixar recado ou... — ele nem ouviu até o final. A anta saiu só me cortando:

 — Ué, agora que a gente descobriu que você é uma cantora de sucesso, pensei que fosse ficar toda metida e nem saber mais da gente. — teve a audácia de comentar rindo — Mas e o Ben 10, cadê ele? A gente pode conversar? — Ignorei a pergunta dele, tentando desconversar a informação bombástica que a casa inteira tinha escutado: 

— Quê? Do que você tá falando? Hahah, Kaio, você é tão engraçado... 

— Ih, nem vem com essa! Sua voz é absurdamente igual à da Riley, garota! Me chamem de conspirador, ou do que quiserem, eu vou provar ainda que minha teoria de que vocês são a mesma pessoa está certa. Você devem ser cegos, ou melhor, surdos para achar ainda que não. Nem o Benjamin faria uma imitação tão perfeita.

 Desliguei a chamada antes que ele falasse algo que colocasse mais desconfiança nos olhares de Roberta e Alex. Benjamin me olhava como se não acreditasse no que acabara de ouvir. Colocando duas mãos na frente do rosto sussurou: 

— Eu vou matar esse filhote de boi...

 Daí para a frente as coisas aconteceram como flashes. Dona Roberta começou a vir, cheia de desconfianças, pedindo para que eu acompanhasse a música. Na maior cara de pau, desespero e falta de noção, declarei com minha voz intacta que estava com dor de garganta e pedi desculpas. Benjamin foi saindo apressado, dizendo que lembrara de um compromisso inadiável, praticamente empurrando Alex pela porta, tão atordoado quanto a mãe. Eu, naturalmente, fui atrás deles, me despedindo de Roberta, enquanto fazia a egípcia.

Já no carro, Alex praticamente gritou com a gente, pedindo explicações. Narramos a história da melhor maneira que conseguimos, um completando o outro, sem deixar de mencionar a incerteza e o nosso próprio susto com a situação. Fomos falando até chega perto de casa, virando na esquina da rua do prédio. Passaríamos por um curto perímetro silencioso e já estaríamos em casa. Mas isso não chegou a acontecer. Na verdade, antes que a gente conseguisse concluir a narração de nossa história louca direito, um barulho de alvoroço à nossa frente começou a chamar atenção.

— Mais essa agora... — resmungou Kaio. — Ei, saiam da frente! 

 Algumas pessoas do grupo se viraram e então começamos a ter alguma noção do que estava acontecendo... Haviam uns repórteres junto de adolescentes estéricos com cartazes do tipo "onde está a Riley?". Olhei ansiosa para os dois meninos comigo no carro. Alex deu com a cabeça no volante. 

— A mamãe deve ter ido falar com aquela vizinha fofoqueira.— Benjamin quase deu um salto no banco: 

— Aquela que escreve para um blog de famosos?Alex respondeu sério:

 — Essa mesma.


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