Chandelier escrita por Lua


Capítulo 1
Descobertas




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Aquele baile deveria estar sendo muito divertido. Os meus maiores amigos (ou devo dizer “pessoas mais ricas associadas à minha família”) estavam lá, eu era a grande estrela da noite e o melhor de tudo: havia bebida à vontade. Contudo, as coisas não iam tão bem: acabara de degustar a minha 5º taça de vinho, e estava longe de me sentir satisfeita. Não via a hora de chegar em casa para poder beber o quanto quisesse, mas por enquanto deveria me conter. Afinal de contas, eu tinha uma apresentação a fazer.

— Eloísa! Que prazer em vê-la - escutei uma voz conhecida atrás de mim.

Ao me virar, encontrei Pedro, um antigo amigo da família. Fora meu padrinho de casamento, e sempre nos demos muito bem. Era um dos poucos em quem eu realmente sabia poder confiar.

— O prazer é todo meu, caro amigo - respondi, sorrindo.

— Mas onde está Edgar? Faz tempo que não o vejo.

— Deve estar conversando com nossos anfitriões - enquanto dizia isso, em segredo, eu me perguntava a mesma coisa.

— Diga a ele que mandei lembranças.

Assim que Pedro se foi, decidi sanar minha dúvida. Discretamente, saí do salão e entrei na parte mais reservada da casa. Por algum motivo, tinha a sensação de que meu marido não se encontrava entre os convidados presentes no local.

 

x-x-x-x-x

 

Enquanto andava pelos corredores, ia apreciando a luxuosa decoração da mansão. Ao passar defronte à um grande espelho, notei algo em meu braço. Ajeitei o vestido, para que ele cobrisse um dos diversos hematomas em meu corpo (cortesia de Edgar) e segui em frente. Por acaso, eu estava próxima à parede na qual estava presa a corda do lustre. Sendo muito observadora, notei que ela estava esfarrapada, como se tivesse sido cortada, e balançava perigosamente de um lado para o outro. Como o lustre ficava diretamente acima do palco no qual me apresentaria, presumi que não havia risco para os demais convidados caso o enfeite desabasse, e decidi continuar minha busca. Mal havia retomado a caminhada quando tropecei em algo no chão e, curiosa, me abaixei para verificar. Atônita, percebi que conhecia intimamente o objeto que pendia entre meus dedos: era o relógio de bolso que havia dado a Edgar em seu aniversário. Estranhando aquela coincidência, guardei-o para questionar meu marido mais tarde.

Caminhei até o final do corredor, e já estava quase desistindo da procura quando escutei alguns ruídos vindos da biblioteca. Aproximei-me silenciosamente da porta, que estava entreaberta, e espiei o interior do cômodo. Estava escuro, mas havia uma vela acesa, e através de sua luz pude observar uma cena chocante: Edgar, aos beijos com uma jovem que eu nunca vira. Congelada pela perplexidade, contemplei o momento em que se separaram e, aos sussurros, trocaram declarações de amor.

— Eu prometo a você: de hoje não passa – ele afirmou, enquanto a garota sorria abertamente.

Lentamente, unindo todas as peças, meu cérebro percebeu o que aquilo significava: meu marido planejara meu assassinato, provavelmente para ficar com minha herança e se casar com sua amante. Assombrada com tamanha crueldade, me afastei do local, tão silenciosa quanto na chegada. Naquele momento, algo se quebrara dentro de mim, e o espírito de vingança se acendera como uma chama. Se Edgar achava que acabaria com a minha vida, estava muito enganado.

 

x-x-x-x-x

 

Retornando ao salão, fui ao encontro de meus anfitriões, tendo um plano completo em mente.

— Estávamos mesmo à sua procura, minha cara – Luís, o dono da casa, afirmou, sorrindo – Já está quase na hora de sua apresentação.

— Você está deslumbrante, querida – Laura, sua esposa, sorriu para mim, enquanto admirava meu vestido.

— Bondade sua – respondi, devolvendo-lhe o sorriso.

Eram ambos muito gentis, apesar de não sermos tão próximos. Me sentia bem em sua companhia, e era uma pena ter que estragar sua grande noite. Ao avistar Edgar entrando no local, já desacompanhado, desfaleci nos braços de Luís. Ou, pelo menos, foi o que eles acharam.

— Ai meu Deus! Alguém traga um copo d’água para Eloísa – Laura gritava, chamando seus criados, enquanto me abanava com seu leque.

De olhos fechados, ouvia os ruídos das pessoas tentando descobrir o que havia acontecido. Lentamente, fingi que acordava, cuidando para manter uma expressão confusa no rosto.

— Como se sente? – alguém me questionou, mas não pude ver quem era.

— Um pouco zonza – respondi, em voz baixa.

Olhando para os convidados, percebi que meu marido vinha em nossa direção. Possivelmente, queria saber porque seu alvo ainda não havia se posicionado na armadilha. Quando ele estava quase me alcançando, um barulho de vidro quebrando se espalhou pelo salão. Assustados, todos contemplaram os restos do lustre caído, exatamente onde eu estaria se a programação tivesse sido seguida.

— É como dizem: há males que vem para bem – afirmei, enquanto encarava Edgar, desafiando-o a discordar. Astuto como era, ele percebera que eu sabia do seu plano, a julgar por sua expressão de desagrado.

Já refeita do meu desmaio cenográfico, me despedi do casal de anfitriões, afirmando que precisava descansar e prometendo-lhes que faria outra apresentação assim que pedissem. Eles compreenderam imediatamente, e me desejaram melhoras. Dito isso, andei até Edgar, pegando-o pelo braço e tentando controlar a repulsa que me dominava.   

— Meu querido, precisamos ir. Não me sinto bem, devo repousar em casa.

— Claro, meu amor – ele concordou, a contragosto.

Saímos rapidamente da mansão e entramos na carruagem que nos aguardava. Durante todo o percurso, não trocamos sequer uma palavra. O corpo dele parecia esculpido em pedra, de tão rígido que estava. Controlei-me até chegar em casa, para evitar uma cena na frente do cocheiro. Entretanto, no instante em que cruzamos a soleira da porta, eu explodi.

— Seu cretino! Como ousa tentar me matar? – gritei, enquanto pegava um enfeite de porcelana de cima da cristaleira e lançava em sua direção.

— Eu deveria ter feito isso a muito tempo – ele retrucou, desviando do objeto – Você é e sempre será um estorvo em minha vida.

— Mentiroso! Eu que sempre provi essa casa, você é um inútil, um bon vivant, que nunca moveu um dedo para fazer nada – bradei, calando-o por um instante. Sempre fui passiva, e jamais gritara com ele. Aproveitando-me do efeito surpresa, continuei – Eu quero me separar de você! Cansei de te sustent...

Não pude terminar a frase, pois naquele exato instante fui esbofeteada, caindo de bruços no chão. Em meio à dor que tomara o lado direito de meu rosto, percebi que estava próxima à cômoda que decorava a sala. Havia uma pistola guardada em sua última gaveta, que Edgar mantinha por questões de segurança.

— Jamais ouse repetir essa frase! A única coisa capaz de nos separar, querida... – ele disse, com uma voz assustadoramente calma, enquanto se aproximava de mim - ...é a morte.

Sabendo que tinha pouco tempo, abri rapidamente a gaveta, peguei a arma e me levantei, apontando-a para meu marido.

— Que coincidência – afirmei, deliciando-me com a expressão assustada em seu rosto – Adeus, querido.

Dito isso, sem ao menos hesitar, atirei em seu peito. Fui jogada para trás pelo impulso da pistola, mas pude apreciar Edgar desabando no chão, sem conseguir ao menos gritar. Nunca me sentira tão leve na vida. O peso de anos sofrendo com agressões físicas e psicológicas havia finalmente sido retirado de meus ombros, e eu sorria verdadeiramente pela primeira vez em muito tempo.

Tremendo pelo impacto do que havia feito e das emoções que tomavam conta de mim, guardei a arma em seu devido lugar, sentindo-me grata pelas luvas que usava, responsáveis por ocultar qualquer vestígio de minhas mãos que pudessem ter ficado na pistola. Em meio ao turbilhão de sentimentos, percebi que precisaria de um bom motivo para justificar a morte de meu marido àquela hora da noite e dentro de nossa casa, sem que as suspeitas recaíssem sobre mim.

Decidi que a melhor opção era um assalto. Sendo minha família extremamente rica, não seria a primeira vez que sofríamos algo do tipo. Além disso, o barulho dos gritos, somado ao enfeite quebrado, servia para corroborar a história. Decidida, me levantei e corri para a rua, gritando por ajuda. Os vizinhos rapidamente me socorreram e tentaram me confortar, murmurando coisas como “Pobrezinha”, “Tão jovem, enviuvou cedo”, que me fizeram suspirar aliviada (internamente, claro).

No dia seguinte, cumpri perfeitamente meu papel de viúva entristecida, recebendo condolências das diversas pessoas que compareceram ao velório daquele que viam como um homem bom e honrado. Minhas lágrimas comoveram a todos, levando muitos deles a também se emocionar.

Mal sabiam eles que a razão de as estar derramando não era tristeza, ou sequer pesar.

Era simplesmente alívio.


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Notas finais do capítulo

Esta é a segunda fic de tragédia que escrevo, mas ainda posso dizer que não é exatamente minha zona de conforto (quem leu Rosa Negra sabe do que estou falando). Por isso, aceito críticas construtivas, dicas de como melhorar, elogios (porque ninguém é de ferro xD)... enfim, comentários de todo tipo õ/
Não sejam fantasminhas, adoro interagir com meu leitores ♥