Equidistante escrita por Gaia


Capítulo 4
Olhos




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(Impulsos e negações)

Alec não se importava com as olheiras que tinham feito moradia em seu rosto, nem com as dores no corpo ou com o sentimento de cansaço insuportavelmente constante. O que realmente o irritava era a sua família repetidamente comentando que ele parecia exausto e que isso estava afetando a sua conduta no trabalho. Se alguma coisa estava afetando sua performance profissional era exatamente o fato de que todos estavam incansavelmente no seu pé.

Ele não precisava de alguém supervisionando cada passo que dava. Conforme os dias passavam, ele ansiava pelo fim do expediente cada vez mais. Talvez porque finalmente se via livre de toda a pressão, cobranças e olhares de piedade ou talvez porque gostava de passar tempo na sua padaria favorita mais do que gostaria de admitir.

A saída de James foi um acontecimento rapidamente superado depois que ele experimentou os croissants do novo cozinheiro. A cada hora que passava sentado no escritório, Alec ansiava mais pelo cheiro e sabor irresistível da padaria, junto com a necessidade de cafeína. Ele nunca falaria em voz alta, mas os pães pareciam ser feitos com mágica, com cada detalhe minuciosamente pensado de forma impecável. Desde o cheiro, até a forma que era crocante por fora e macio por dentro, Alec não sabia dizer qual item do cardápio era melhor e quase sentia vergonha por gostar tanto assim.

“Já sei, café expresso.” O homem alto disse prontamente ao vê-lo sentar-se no balcão. “Quando você vai me dizer o seu nome para eu não ter que ficar imaginando toda vez que te vejo?”

Alec franziu a testa, algo no modo desse cara agir e falar o tirava imediatamente fora de sua zona de conforto. Normalmente ele ficaria mais incomodado, mas era impossível ter qualquer tipo de ressentimento por alguém que cozinhava daquele jeito.

“Alexander. Lightwood.” Ele falou pausadamente, sem saber exatamente porquê. “Pode me chamar de Alec.”

Podia ser sua impressão, mas jurava que viu os olhos amarelados do cozinheiro brilharem, como se reagissem ao simples existência do seu nome.

“Alexander, hã? Que nome forte.”

“Acho que sim.” Alec respondeu, tentando ignorar a pontada no seu estômago ao ouvir seu nome inteiro naquela voz suave e desviando o olhar para a vitrine de doces.

“Não vai perguntar o meu?”

“Eu não precisaria se você estivesse usando o crachá corretamente.” Seus olhos subiram para o peito dele, no qual o nome “James Carstairs” brilhava em dourado em contraste com o branco do uniforme. Diferente de James, o substituto claramente se importava com a sua aparência, ficava claro pelo caimento perfeito da camisa branca, que apertava em todas as partes certas, salientando músculos não tão grandes, mas bem definidos.

“Touché.” O outro interrompeu os pensamentos inconvenientes de Alec, enquanto tirava o crachá. “Sou Magnus Bane.”

Finalmente Alec voltou a encará-lo. Os olhos amarelo-esverdeados o encarando como se o desafiasse a decifrá-los, como um labirinto sem entradas ou saídas, apenas deslumbre em cada corredor. Uma fonte eterna de impulso, imprevisibilidade e irracionalidade, os seus maiores inimigos. Então por que estava tão hipnotizado?

Então, sentiu um calor em seu estômago, uma sensação de espontaneidade que nunca tinha sentido antes, que nunca lhe caiu bem. Pela primeira vez em muito tempo ele quis algo diferente do que era-lhe apresentado todos os dias. E a sua vontade parecia selvagem, imprevisível, completamente intrusa. Sem conseguir pensar nem por mais um minuto, não soube dizer se fora os olhos, a depravação de sono ou o seu estômago que o forçou a perguntar:

“Você quer sair comigo?” 

“Alexander! Nós acabamos de trocar nomes, não acha que estamos indo rápido demais?” Seu tom era brincalhão e seu sorriso trapaceiro. Mas seus olhos sagazes eram inquietos, como se contivessem toda a sabedoria do universo, e brilhavam com a luz artificial da padaria, sugerindo apenas uma coisa: problema. “Amanhã eu tenho folga, nos encontramos aqui às 19h?”

Magnus saiu de trás do balcão para atender outros clientes, mas não antes de soltar uma piscadela singela que ressaltou ainda mais o verde de seus olhos marotos.

Alec agora sabia exatamente o que o forçou a chamar um completo estranho para sair.

Foram definitivamente os olhos.

 

(Inseguranças e atrasos)

 

“Eu realmente devo estar carente.” Magnus reclamava no telefone às 19h do dia seguinte. “Está ouvindo, Catarina? Quem diria que carência era um negócio tão perigoso.”

“Eu disse. Muitas vezes. Durante todo o tempo que nos conhecemos.” Ela retrucou ácida e ele revirou os olhos. “Não revire os olhos pra mim. Pelo que você me disse, ele é um gato e não é como se vocês fossem casar ou algo assim. Saía com o sujeito e, se tudo der certo, leve-o pra casa e o dispense amanhã. Nós dois sabemos que aquela cama está grande demais pra você.”

Ela tinha razão, ele tinha passado muitas noites sozinho para o seu próprio bem. E não era como se Alexander Lightwood fosse o amor de sua vida. Era só um cara com quem ia se divertir. Mas esse era o problema, Magnus não tinha certeza se era capaz de se divertir com alguém como Alec.

“Catarina, você falha em entender a gravidade da situação. Ele é completamente o oposto do meu tipo. Eu não sei o que deu em mim. Em um minuto, eu estou me divertindo provocando-o e o deixando envergonhado, e no outro, estou aceitando sair com um cara mais taciturno que Mr. Darcy!”

“E nesse cenário você seria quem? A reencarnação de Elizabeth Bennet?” Catarina pigarreou, abafando um riso. “Magnus, como sempre, você está sendo dramático. Dê uma chance, o cara tem que ser pelo menos corajoso para chamar alguém para sair assim.”

“Corajoso ou completamente lunático!” Magnus apelou, mesmo sabendo que Catarina estava certa. Ele tinha que pelo menos ver onde tudo aquilo iria dar. Não era como se tivesse mais o que fazer mesmo e fazia tempo que não embarcava em uma aventura. Ou desafio.

“Vamos focar no corajoso.” 

“Ok, mas se algo der errado eu te mando uma mensagem para você me tirar de lá com uma emergência.” Eles já faziam isso há anos, era um método infalível para sair de um encontro indesejado. E por terem feitos tantas vezes, tinham aperfeiçoado o truque de forma impecável, para que não magoassem os pretendentes com desculpas óbvias e clichês geralmente relacionadas a avós. 

“Óbvio.” 

Magnus desligou o celular e deu uma última olhada no espelho. Ele tinha visto como Alec se vestia, então tinha certeza que se destacaria. Não que ele ligasse, ele gostava de pensar que seu senso de moda e quê para o drama só o deixava ainda mais atraente. Então não se inibiria por um estranho que não sabia se vestir, a culpa não era dele que algumas pessoas pareciam ser cegas quando se tratava de moda.

Seus olhos desviaram involuntariamente para o relógio. 19h12, ótimo, estava atrasado. Se fosse outra pessoa, ele provavelmente ainda mataria alguns minutos extras brincando com o seu gato, mas ele sabia por experiência que Alec Lightwood era insuportavelmente pontual.

Percorreu o caminho rotineiro que sabia de olhos fechados e quando chegou não se surpreendeu com a visão do seu pretendente de costas na frente da padaria, o esperando.

“Alexander! Me desculpe, eu…”

Mas as palavras morreram quando Alec se virou. Ele sempre foi bonito assim? A luz artificial da rua iluminava todos os pontos certos do seu rosto, destacando as sombras nos ângulos finos e seu maxilar delicado. A pele branca parecia brilhar, cobrindo um nariz que parecia ter sido esculpido por anjos. Na verdade, Magnus se odiou por ser tão previsível e pensar que se pudesse comparar Alec Lightwood com alguma coisa, seria com um anjo.

Então ele o encarou e o ar de repente ficou rarefeito. Se antes ele o achava o bonito, agora ele estava simplesmente restabelecendo qualquer padrão de beleza que já tinha em sua mente. O que eram aqueles olhos? O azul parecia ser do mais profundo mar de algum lugar distante e cheio de vida. Mas algo neles gritava perigo e distância, uma barreira a ser destruída.

Magnus imediatamente lembrou exatamente o que o fez aceitar um convite daquele completo estranho.

Foram definitivamente os olhos.


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Notas finais do capítulo

Mais uma vez com os clichês. Eu amo contato visual, ah!! E sim, claro que eu ia encaixar o Jem na história de alguma forma, quem seria eu se não fizesse isso, risos.

Gostaram? ♥