DeH; A Maldição do Castelo Funok escrita por P B Souza


Capítulo 13
3° Conto; A dama no jardim


Notas iniciais do capítulo

Último conto, fechando a história de Funok!



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Por quase um ciclo ninguém ocupou Funok.

As pessoas iam e vinham pilhando o que queriam, até não sobrar nada de valor. A erva daninha rastejou seu caminho de fora para dentro das muralhas, o jardim se cobriu de mato até a altura dos ombros de um homem adulo, as portas de madeira começaram a apodrecer viram lar para cupins e a casa virando lar para animais silvestres que vinham do bosque ao fundo.

O portão enferrujou e caiu, sendo coberto pelo mato, tornou-se invisível. O arco de entrada era de pedra e argamassa, coberto de limo e trepadeiras. Nem de longe lembrava a pedra branca que Betenion se lembrava quando desceu da carruagem.

Lá dentro no jardim repleto pelo mato, o local parecia pequeno como um fundo de casa na cidade.

O companheiro de viagem desceu da carruagem olhando para o castelo com certo ar de duvida. Lançou um olhar para Betenion.

— Passe alguns dias no vilarejo, terei o lugar ajeitado para uma visita...

— Não é necessário. — Gavel Toulline cruzou os braços. — O arco sustentava o portão, posso ver pelos alicerces de ferro. Bem defensível. Foi aqui que aconteceu o combate?

— Ali dentro, aonde o mato cresce. — Betenion apontou. — Está tudo relatado nos jornais da minha mãe, porém devem estar podres... Deixei tudo para trás quando larguei o castelo, passei este ciclo inteiro pagando os impostos ao lorde com meu dinheiro de outros negócios em Lorval.

— Geri uma rede de destilarias, não?

— Descobri certo prazer no álcool, sim. São quatro atualmente. O rei me fundeou para realizar o sonho. — Betenion explicou. — Quem sabe um dia se torne o negócio da família.

— Seria bom ter um castelo. Tem certeza que quer vender? — Gavel puxou sua espada, avançando contra o matagal no jardim. — Vejo muito potencial, consigo imaginar a beleza do lugar, só pela forma que você me descreveu.

— Não lhe incomoda... A maldição? — Betenion disse com cautela. — São muitas mortes...

— Pessoas morrem o tempo todo. Tento não me apegar a dizeres populares. Maldições, previsões, mandingas, oferendas, deuses... Quem tem tempo para isso hoje em dia? Além do que, se a rixa era entre o tal corta-dedos e o povo, o que eu tenho a ver com isso?

— Espero que esteja certo... Vivi pouco tempo aqui, mas nunca vi nada anormal, os relatos... No fim não sou um homem cético como tu. Quem me dera fosse! — Sorrindo um riso torto, Betenion acompanhou Gavel, que avançava abrindo caminho pelo jardim.

— E eu às vezes gostaria de ter um pouco de fé. É difícil ter que fazer tudo sem poder pedir ajuda a ninguém, nem mesmo a um suposto deus! — Chegaram então na soleira da torre. A parte interna da casa estava revirada, o salão cheio de folhas secas, e logo na entrada havia a carcaça do que parecia ser um lobo ainda filhote. — Posso ir dar uma olhada?

— Claro, não deve ter ninguém mesmo.

— E se tiver eu aviso que o dono está na porta e me deixou entrar?

— Se tiver tenho certeza que essa espada serve para mais que cortar grama! — Betenion apontou para a lâmina enquanto Gavel a limpava na sua camisa.

O possível comprador anuiu para Betenion e então adentrou contornando o esqueleto de lobo.

Betenion já havia contado tudo sobre o lugar para o homem. Desde a construção do castelo até ele abandonando-o. Sabia que um comprador era algo difícil de encontrar então preferiu não mentir para o homem ou ocultar detalhes que mais tarde, se descobertos por terceiros, poderiam comprometer seu lucro.

A verdade é que os empréstimos que fez com o rei precisavam ser pagos. Suas destilarias geravam lucros, mas o castelo, mesmo sem produzir nada, gerava gastos. O lorde cobrava a taxa de manutenção toda parte-de-ciclo, de forma que o lucro criado pelo seus produtos ia para Magmun, pagando as dividas de Funok, enquanto as dividas com o Rei se tornavam maiores com os juros crescentes, além da inflação de Lorval contra a ilha como um todo.

Se eu conseguir vender esse castelo, pago os empréstimos, me livro das dividas e ainda sobra dinheiro para abrir uma adega no centro da cidade. Sonhava com o amanhã, com a certeza que estava livre daquela maldição. Tudo que sua mãe lhe dissera por cartas e nas raras ocasiões que se viam indicava que ele nada havia feito para provocar os espíritos dali. Estou vendendo o lugar, não ateando fogo. Sou inocente! Dizia para si mesmo.

E foi quando viu o vulto no hall da torre, por cima do esqueleto de lobo.

Se virou olhando para trás, intuitivamente procurando o vulto que parecia “girar” ao redor dele, atravessando a torre de forma imaterial.

Quando terminou seu giro nos calcanhares, deparou-se com muito mais que um vulto.

— M... Mãe? — Jeniz lhe encarava, com uma expressão contente, o rosto translucido era como ver um desenho na cortina com sol forte. Esticou a mão, mas seus dedos atravessaram o rosto da mulher que ela nada além de vapor, como um orvalho se desfazendo e ressurgindo.

— Eles estão esperando. — A voz de Jeniz veio de longe, como se ela falasse do outro lado do jardim, o som ecoando pelas folhas farfalhando. Betenion se virou encarando o matagal. E viu dezenas de sombras, dezenas de névoas pálidas, viu sua avó. — Tão bonito, se tornou... — Jeniz contornou Betenion, olhando para o filho com ternura enquanto seu corpo sumia em luz.

— Encontre o responsável. — Tenissa pediu mais a frente. Sua voz, não diferente de Jeniz, veio de todos os lados. — Liberte-nos, antes que seja tarde.

— Ele não sabe esperar! — Um homem ao lado de Tenissa disse.

— Já se passaram muitos ciclos. — Jeniz ressurgira então. — Finalmente acalmou...

— Precisa encontrar...

— Esperando...

— O responsável...

— Maldição...

— Chega! — Betenion berrou colocando as mãos nas orelhas. As vozes se fundiram uma atrás da outra, pedidos demais, lamurias demais. E então tudo sumiu.

Ficou apenas uma silhueta feita em névoa, não havia rosto sob seu pescoço, mas sua cabeça pendia amarrada em trapos em volta de seu torso, como se fosse um bebe. A bruxa decapitada. Reconheceu a mulher na hora.

— Não espere a treva retornar. Encontre o falso-profeta e liberte sua mãe desse tormento, ou treva ela se tornará! — A bruxa então apontou para trás.

Betenion virou o pescoço, Gavel retornava pelo salão, de espada na mão. Ele olhou para o jardim. Não havia mais espirito algum ali.

— Você gritou?

— Pensei... Ter visto um cachorro do mato. — Mentiu, nervoso. Temia estar vermelho, temia estar tremendo.

— O castelo parece bom, um trabalho de restauração, mas nada muito sério, é mais limpeza. E ficará novo em folha. — Gavel disse, como se não se importasse se Betenion gritara ou não, ou se vira ou não o cachorro do mato. — Lhe pago metade agora, depois o restante em duas parcelas um no meio e outra no final do ciclo. O que me diz?

Betenion olhou para o jardim mais uma vez. Encontrar quem? Era tudo muito vago, e na sua vida precisava de certezas, não de enigmas.

— Feito! — Esticou a mão para Gavel Toulline.

E assim, sem mais nem menos, os Turenc já não eram mais senhores de Funok.

E assim, Betenion Turenc conseguira escapar da maldição do Lorde-Corta-Dedos.


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