Um Caminho Para O Coração escrita por Sill Carvalho, Sill


Capítulo 9
Capítulo 08 – No Fim do Arco-íris




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/757879/chapter/9

A imagem do pai chorando, sentado ao volante da caminhonete ainda dentro da garagem, ficou na mente de Olívia por todo o trajeto do ônibus até a escola. O sentimento de culpa e rejeição crescendo a cada pensamento e pulsação.

Ela foi a primeira a entrar na sala de aula aquela manhã. Não diferente de outros dias, levou o cobertorzinho na mochila para a escola. Sempre que tinha a chance, buscando algum conforto e segurança, abria o zíper da mochila e apertava o tecido sujo entre os dedos como fazia quando estava em casa. Não era novidade que algumas crianças, até mesmo funcionários da escola, haviam notado esse gesto repetitivo desde o começo do ano letivo. Só que dessa vez, a curiosidade da parte de alguns estava prestes a sair do controle.

Dois dos alunos mais arteiros da classe chegaram logo depois de Olívia. O restante chegou com pouco tempo de diferença. A maioria deles distraídos em suas próprias conversas. Os dois meninos levantaram de seus lugares, depois de muito olhar Olívia. Distraída como estava, os pensamentos no pai, Olívia foi surpreendida pelo golpe repentino de um dos meninos puxando sua mochila para longe.

O choque e a surpresa a deixaram de olhos arregalados. O cobertorzinho, que já tinha visto dias melhores, ficou em suas mãos, uma das pontas enroladas em seus dedos pálidos. O material escolar deslizou de dentro da mochila para o chão. Algumas das crianças riram e apontaram com as mãos, outras se mostraram preocupadas e até assustadas com o que estava acontecendo.

A vergonha tomou conta de Olívia. Mas o medo foi ainda pior, num gesto involuntário apertou ainda mais os dedos ao tecido do cobertorzinho. Seus olhos se encheram de lágrimas sem esforço algum. O coração batendo rápido contra o peito lhe dando a sensação de falta de ar.

O mesmo menino que jogou sua mochila para longe, rindo descaradamente, puxou a outra ponta do cobertorzinho.

Disposta a não deixar que fizessem o mesmo que fizeram com a mochila, Olívia se levantou da cadeira, fazendo força para mantê-lo consigo. Alguém debochou sobre levar o cobertor para a escola, e por ser tão velho e encardido. Em algum canto da sala soou outra voz chamando-a de bebezinho.

Algo diferente estava crescendo dentro dela, causando a sensação desconfortável de sufocamento e tristeza.

Lágrimas rolaram em seu rosto quando o cobertorzinho foi puxado uma segunda vez. O segundo garoto se juntou ao amigo na tentativa de tirá-lo de suas mãos. Olívia usou de toda força para mantê-lo consigo. Suas bochechas ficando cada vez mais vermelhas devido o esforço e a vergonha. As juntas de seus dedos perderam a cor, resistindo até o fim por aquilo que lhe era precioso.

O que estavam fazendo a ela era cruel.

Para não perder a única coisa que lhe trazia algum conforto, numa infância tão cheia de desamor, Olívia agiu por instinto, gritando o mais forte que os seus pulmões permitiram gritar.  O som agudo e angustiante fizeram as risadinhas desapareceram quase que no mesmo instante. Os dois encrenqueiros recuarem. Talvez pensando que fosse louca. Talvez pensando que fosse uma aberração. A verdade é que ela não se importava. Continuou gritando sem parar como fosse atacada por um animal selvagem. Sua imagem era a marca do desespero.

A professora chegou à sala de aula correndo, seguida de mais duas alunas. A preocupação estampada no rosto, buscando a origem de toda aquela gritaria e confusão.

— O que aconteceu? — pediu ainda ofegante.

Uma das crianças atrás de suas costas, respondeu que Olívia era maluca. Outros permaneceram apenas apontando com a mão.

Desviando de alguns alunos, Hannah se aproximou de Olívia. Gentilmente estendeu a mão a fim de tocar seus ombros.

— O que aconteceu querida? — Ela chegou mais perto. E quando tocou seu ombro, a menina tremeu por inteira. As veias em sua testa e pescoço se mostravam sobressalentes. Os gritos pareciam não ter fim. — Pare de gritar, Olívia. — Nada aconteceu. Hannah pôs a outra mão nos ombros da menina e a sacudiu de maneira controlada, mas os gritos não cessaram e isso a descontrolou. — Já chega Olívia! Pare já com isso. Está assustando a todos. O que deu em você?

Não foi uma boa escolha levantar a voz. Olívia imediatamente relacionou a atitude da professora a do pai e da Sra. Smith, até mesmo da avó que a deixou para trás. Ela sempre sentiu que não era amada e querida por eles, e esse sentimento se estendeu de alguma forma à professora quando levantou a voz para ela.

Um silêncio mortal se instalou na sala de aula quando os gritos de Olívia cessaram. Tremendo e respirando ruidosamente, Olívia olhou no rosto de cada um deles, sem entender por que estavam sendo tão cruéis com ela. De repente, olhou a porta aberta da sala de aula e, segurando firme o cobertorzinho, correu para o corredor.

A professora pediu aos outros alunos que ficassem em seus lugares, e logo estava correndo pelos corredores atrás da menina.

— Olívia? Espere. Eu não quis gritar com você. Não faça isso Olívia.

Crianças de outras salas de aula se amontoaram nas portas e vidraças para ver o que acontecia no corredor.

Olívia correu um longo trajeto, sem olhar para trás, até a biblioteca. Parando somente ao trombar com as pernas de Rosalie, agarrando-se a ela como se sua vida dependesse disso.

Rosalie se assustou com a forma repentina como chegou à biblioteca e se agarrou a ela. Acabou recuando dois passos tentando recuperar o equilíbrio. Se assustando ainda mais ao reconhecer o como a menina parecia desesperada por sua ajuda. Ao tentar ficar na mesma altura que ela, sentiu o coração fraquejar, notando a dor e o desespero nos olhos daquela criança. Rosalie nunca tinha visto algo tão forte.

— Olívia, Olívia... — Rosalie sussurrou, tocada, sentindo a dor da menina se tornar sua dor. Tentou ficar de joelhos na frente dela, mas Olívia se recusou a deixá-la.

A professora chegou pouco tempo de diferença, ofegante. Sentiu-se aliviada ao notar que Olívia correra para os braços de Rosalie. Ao menos tinha buscado segurança.

Ela tomou ar, antes de chegar mais perto e começar a falar:

— Olívia — sibilou Hannah. E tentou segurar mais uma vez nos ombros de Olívia, que se agarrou ainda mais a Rosalie, voltando a gritar. Hannah desistiu, recuando alguns passos. Não era sua intenção fazê-la se sentir acuada.

Rosalie olhou no rosto da professora, desesperada por uma explicação.

— O que aconteceu? Por que ela está assim?

Hannah olhou da menina para Rosalie.

— Ainda não sei bem o que aconteceu. Quando entrei na sala de aula, e nem mesmo demorei a chegar, ela já estava gritando, agarrada a uma coisa. Acho que era um pano, um cobertor, talvez.

Rosalie abaixou o olhar, notando então o cobertor entre as duas mãos de Olívia, a ponta encardida entre os dedos. Amavelmente passou a mão na cabeça da menina, afetada por seu sofrimento.

— Vai ficar tudo bem, querida.

Olívia soluçou. O rosto escondido na barriga daquela a quem lhe acolhia com amor.

— Vamos Olívia — a professora tentou mais uma vez. — Você tem de soltar a senhorita Hale.

— Está tudo bem — Rosalie disse a Hannah. — Não se preocupe comigo, estou bem.

Hannah balançou a cabeça como dissesse que não.

— Tenho de levá-la a diretoria. A Sra. Adams e a orientadora irão querer falar com ela, talvez com o pai. Não acredito que voltará à sala de aula hoje. Eu preciso levá-la e depois voltar para os outros alunos. Eles estão sozinhos, tenho medo que iniciem outra confusão.

Ela tentou mais uma vez pegar a menina.

Soluçando, Olívia implorou a Rosalie que não a deixasse ir.

Rosalie sentiu que precisava fazer alguma coisa pela aquela criança tão magoada.

— Por favor, Hannah, você pode ir falar com Sra. Adams sozinha. Pode até voltar para os outros alunos, mas, deixe Olívia aqui comigo. Eu prometo que vou cuidar dela. Tentarei acalmá-la e descobrir o que aconteceu.

Hannah pensou a respeito, embora não estivesse certa sobre deixar a criança para trás.

— Sei que cabe a você, quando aqui na escola, cuidar e tentar entender o que aconteceu. Mas está claro que Olívia não vai se abrir com você. Ela me procurou. Deixe a menina comigo, por favor.

A professora finalmente cedeu.

— Tudo bem. — Hannah olhou a menina e novamente para Rosalie. — Ela realmente parece confiar em você. E você já demonstrou cuidado para com as crianças, só por isso vou deixá-la com você enquanto falo com a diretora.

— Obrigada — Rosalie demonstrou alívio.

— Se a Sra. Adams quiser vê-la, eu terei de vir buscá-la, de toda forma.

— Talvez ela possa vir até aqui — Rosalie sugeriu.

— Eu vou tentar. Só não garanto que será assim — respondeu Hannah.

Assim que ela deixou a biblioteca, Rosalie pegou Olívia no colo. A menina se agarrou ao seu pescoço chorando. O cobertorzinho preso entre as duas, nas mãos pálidas de Olívia.

— Meu anjo... — Rosalie tentou, com suavidade ao se dirigir a menina. Sentou-se na cadeira atrás da mesa de trabalho com ela no colo. — O que foi que fizeram com você? Eu queria tanto entender o que acontece.

Olívia ficou com os braços e pernas em volta dela, a cabeça descansando no ombro. Rosalie deixou que chorasse o tempo que foi preciso. Quando estava mais calma, pediu que olhasse em seus olhos.

— O que fizeram com você, meu anjo? — repetiu a pergunta, e dessa vez, esperando uma resposta. Limpou as lágrimas no rosto de Olívia, e pacientemente esperou que falasse. Porém, antes mesmo de a menina começar a falar, Rosalie reconheceu o quanto o cobertorzinho significava para ela. Olívia não se desfazia dele por nada, o mantinha junto ao peito feito o mais precioso dos tesouros. — Foi por causa de seu cobertorzinho, não foi? — deduziu.

Olívia afirmou com um gesto de cabeça. Rosalie beijou seu rosto molhado de lágrimas, ainda corado de todo esforço feito para manter seu tesouro.

— Conte tudo para mim, meu anjo.

Confiando nela, Olívia contou tudo o aconteceu na sala de aula desde o começo. O momento em que tomaram sua mochila e tentaram fazer o mesmo com o cobertorzinho. A zombaria. As acusações.

Rosalie ouviu cada palavra com atenção redobrada.

A diretora entrou na biblioteca ainda enquanto elas conversavam.

— A senhorita Hannah já voltou para a sala de aula dela. — comentou. — Ela vai conversar com as outras crianças para tentar entender o que aconteceu.

Olívia se agarrou a Rosalie assim que ouviu sua voz, escondendo o rosto na curvatura do pescoço.

— Eu já sei o que aconteceu — avisou Rosalie. A Sra. Adams ficou surpresa. E Rosalie respondeu a pergunta não feita. — Olívia acabou de me contar.

A Sra. Adams olhou a menina no colo de Rosalie.

— Ela parece confiar muito em você. Olívia é uma criança calada. Nem mesmo com a orientadora ela conversa tanto. Sempre está sozinha, mas, parece que com você, foi amor à primeira vista.

Rosalie afagou os cabelos de Olívia.

— Olívia é uma garotinha especial.

A Sra. Adams anuiu, pensativa.

— Gostaria de poder saber mais sobre ela — Rosalie acrescentou.

— Podemos conversar depois em minha sala. Agora eu gostaria de entender o que aconteceu antes de Hannah chegar à sala de aula. Poderia me contar o que descobriu?

Pelos próximos minutos, Rosalie contou à diretora o que conseguiu retirar da menina. E então a Sra. Adams declarou.

— Irei resolver isso da melhor maneira. — Ela estava a caminho da porta quando se virou e disse: — Telefonei para o seu pai, Olívia. Ele está vindo te buscar.

Rosalie sentiu o corpo magro da menina estremecer em seus braços.

Olhando para Rosalie, a Sra. Adams acrescentou:

— Vou conversar com ele, antes de trazê-lo até aqui.

Rosalie apenas balançou a cabeça dando a entender que tudo bem.

Enquanto a diretora deixava a biblioteca, Rosalie tentou olhar no rosto de Olívia e descobrir se estava com medo. Por que reagiu com tremor ao saber que o pai viria buscá-la mais cedo hoje.

Emmett estava no trabalho quando recebeu o telefonema da escola. Ter de sair do trabalho àquela hora do dia, quando não tinha muito tempo havia chegado, o deixou bastante irritado. Mas, o que mais o aborreceu foi o fato de Olívia ter causado tudo isso. Por causa dela, toda sua vida vinha sendo uma droga. Essa afirmação martelou na cabeça dele por todo o trajeto até a escola primária onde a filha estudava.

Estacionou numa das vagas, ao lado do prédio, onde havia alguns ônibus a espera do fim do horário letivo.

Em suas roupas havia manchas de sujeira e pó. Os cabelos sujos precisavam de um corte. Ele entrou no prédio direto para diretoria, já conhecia muito bem o caminho. Só estranhou não ter encontrado a filha, sentada no sofá da sala de espera, quando chegou.

— Senhor McCarty — A Sra. Adams indicou a cadeira onde sentar.

— Onde ela está? — Emmett questionou, dando uma breve olhada em volta, como se a menina fosse sair de algum esconderijo agora que estava ali.

A diretora insistiu, indicando que sentasse.

— Não se preocupe, sua filha está bem — seu pensamento sobre ele estar preocupado com a criança estava longe de estar certo. Ele estava mesmo era irritado por ter de ir à escola aquela manhã. — Ela está sendo muito bem cuidada. Está na biblioteca com a moça que está substituindo a Rachel. Nossa orientadora foi até lá falar com elas. O que todos notamos é que as duas se dão muito bem. Na verdade, a senhorita Hale é a única com quem sua filha troca mais de duas palavras. — Se Emmett achou aquilo estranho, não demonstrou.

— Me disseram por telefone que eu teria de vir buscá-la.

— Sim, sim. Foi minha assistente que ligou. Presumo que tenha adiantado o assunto.

Emmett anuiu.

— Estou com um pouco pressa, então se puder...

— Senhor McCarty, lamento ter de tirá-lo assim do trabalho a essa hora. Mas nos precisamos ter essa conversa. Não é de hoje que Olívia tem problemas para se adaptar. O senhor tem de saber o que acontece com sua filha. É sua obrigação como pai. Hoje Olívia foi vítima de uma brincadeira de muito mau gosto da parte de alguns colegas. Acredite os responsáveis por isso irão receber a devida correção. Agora se tratando da forma como Olívia reagiu, sugiro que procure ajuda psicológica. Não sabemos o quanto o que aconteceu a Sarah possa estar afetando essa criança hoje.

Depois de alguns minutos ouvindo o que a diretora tinha a dizer. Inclusive questionar sua atitude como pai, Emmett finalmente foi levado até onde estava a filha.

Não estava nenhum pouco satisfeito com toda aquela situação e a expressão em seu rosto era clara quanto a isso. Ouvir reclamações sobre como cuidava da filha, não estava na lista de coisas que gostaria que acontecesse.

Ele seguiu a senhora corpulenta, alguns passos atrás dela, encontrando a orientadora; uma morena alta, a poucos metros da biblioteca. Trocaram algumas poucas palavras e voltaram a se afastar.

A Sra. Adams entrou na sala, e ele permaneceu do lado de fora.

Olívia estava sentada no colo de Rosalie, colorindo com giz de cera. A cor que segurava no momento, era o amarelo vivo para colorir um sol sorridente que brilhava acima do arco-íris. O cobertorzinho estava em seu colo e, em curtos intervalos de tempo, apertava-o entre os dedos. Não estava sorrindo, porém, a expressão em seu rosto era suave, o que demonstrava sua tranquilidade em estar ao lado de Rosalie.

Rosalie olhava com atenção o desenho dela, as mãozinhas pálidas trabalhando cuidadosamente com o giz de cera. Ela acariciava os cabelos da menina com as pontas dos dedos. De repente parou, mas sem afastar a mão dos fios ruivos embaraçados, olhando a diretora que acabara de chegar.

— Olívia? — a Sra. Adams chamou sua atenção. — O seu pai está aqui.

As palavras da diretora sobre o pai de Olívia estar na escola, por alguma razão deixou Rosalie ansiosa. Nem mesmo percebeu que corrigiu a postura. Finalmente iria conhecer o pai da garotinha a quem aprendeu a gostar em tão pouco tempo. Com ele ali, pensou, talvez pudesse conhecer mais da menina sentada em seu colo.

Para sua surpresa, quando estava para olhar na direção da porta, Olívia se virou ficando de frente para ela, agarrando-se a seu pescoço.

— O que foi querida? — questionou surpresa com a reação de menina. — É o seu papai quem está lá fora. Ele veio para levá-la para casa. Não está feliz?

Olívia meneou a cabeça, negando. Nenhum som saiu de sua boca.

— Eu não entendo — murmurou Rosalie, olhando da menina para a mulher de pé a sua frente, do outro lado da mesa.

— Olívia — a Sra. Adams tentou mais uma vez, estendendo a mão para afagar as costas dela. — Você precisa ir agora. O seu pai está aqui.

— Não — Olívia sussurrou no ombro de Rosalie.

Rosalie não teve dúvidas que ela iria voltar a chorar a qualquer momento.

— Por que não quer ir com ele, meu anjo?

— Por favor... — a menina sussurrou, outra vez no ombro dela. — Venha comigo?

— Eu não posso querida — Rosalie sussurrou de volta. — Não é uma coisa que eu possa decidir.

Cansado de toda aquela demora, Emmett deu alguns passos a frente, entrando na sala, de repente.

— Vamos Olívia. Eu estou aqui e tenho pressa.

A menina suspirou, se dando por vencida. Não havia mais o que fazer. Então, afastou os braços do pescoço de Rosalie. E, sem olhar para ela, saiu de seu colo.

Rosalie percebeu que além de amedrontada Olívia parecia magoada. Imaginou que a mágoa fosse culpa sua, por ter se negado a ir com ela.

— Me desculpe — sussurrou Olívia, as mãos apertando o cobertorzinho, a cabeça baixa, caminhando ao encontro do pai.

Finalmente, Rosalie desviou a atenção da menina para reparar no pai dela. Ficou surpresa com a figura masculina diante seus olhos. Aproximadamente 1,92 de altura, e de puro músculo. A barba crescida, no estilo lenhador. Os cabelos escuros, bagunçados, precisavam de um corte. A camisa vermelha de flanela estava faltando um botão. Reparou no tom azul dos olhos dele. Reparou, também, na tristeza e indiferença que apagavam seu brilho. Mas não pôde evitar notar o quanto era atraente e absurdamente sexy. Facilmente passou longe na imagem pré-fabricada que tinha do pai de Olívia.

— Senhor McCarty — começou a diretora —, essa é a senhorita Hale. A moça que me referi quando disso que sua filha estava em boas mãos.

Rosalie estendeu a mão para ele. Emmett olhou sua mão apenas um instante antes de desviar o olhar, ignorando completamente seu gesto.

Constrangida, Rosalie abaixou a mão e a manteve junto ao corpo.

— Olívia é uma ótima menina — ela arriscou dizer. Outra vez Emmett não lhe deu atenção.

— Anda logo, Olívia. Eu não tenho o dia todo.

Ciente de que ele a estava ignorando, Rosalie chamou a menina e pôs a mochila, que Hannah pediu que deixassem na biblioteca, em suas costas. Abaixando para ficar na altura dela, lhe deu um beijo na testa.

— Até amanhã, meu anjo.

Olívia lhe deu um último olhar triste, que fez Rosalie querer pegá-la no colo e levá-la com ela para a casa do avô.

Emmett saiu do caminho para que Olívia passasse. Rosalie esperou que ele fosse pegar a filha no colo, dar um beijo no rosto e dizer que estava tudo bem. Em vez disso, ele disse para ir andando que o carro estava no estacionamento.

Não pôde deixar de notar o quanto Olívia parecia pequena e frágil ao lado dele. Os ombros sempre caídos pelo peso da tristeza que carregava, mesmo sendo tão jovem.

— Eu avisei sobre trazer o cobertor imundo para a escola. — Ela teve a impressão de tê-lo ouvido se queixar.

Então olhou a mulher ao seu lado.

— Sra. Adams, acha que Olívia vai ficar bem?

— Ele é o pai dela.

— Eu sei, mas... infelizmente, nem sempre isso significa segurança e proteção. Às vezes imaginamos de uma forma e a realidade é bem diferente. Olívia não queria ir com ele. Ela queria que eu fosse junto e como não pude fazer isso, creio que ficou magoada.

— Ele tem essa aparência que assusta, mas, acredito que não seria capaz de fazer mal a própria filha.

— Eu não sei... — mencionou Rosalie, olhando o caminho por onde os dois haviam desaparecido de vista. Então olhou outra vez a Sra. Adams. — A senhora sabe como a mãe de Olívia morreu? — antes que pudesse obter uma resposta, Alice apareceu na porta, chamando pela Sra. Adams.

— Em outro momento terminamos essa conversa — explicou a Rosalie. Em seguida se retirou junto com Alice.

Rosalie suspirou, derrotada. Parece que sempre que buscava informações sobre Olívia McCarty alguém a interrompia.

No estacionamento, Emmett abriu a porta traseira da caminhonete para Olívia subir.

— Anda logo! — bradou. — E vê se coloca o cinto.

Assustada, Olívia acabou se atrapalhando ao entrar no carro. A mochila e o cobertorzinho contribuíram para isso acontecer. Enquanto se colocava na cadeirinha, Emmett se acomodou no assento do motorista.

Ela ainda lutava com o cinto.

— O que eu vou fazer com você, me diz? — Ele colocou o próprio cinto. — Para onde vou levá-la? A Sra. Smith não está na casa dela agora. Eu não posso levá-la comigo, uma construção não é lugar para uma criança. Também não posso deixá-la sozinha em casa.

Olívia não olhava para ele, tinha medo de encontrar o desprezo e a frieza em seus olhos tanto quanto estava em sua voz.

— Você tem ideia de que arruinou um dia inteiro de serviço meu?

— Me desculpe papai... — murmurou Olívia, com a cabeça baixa.

— Suas desculpas não me adiantam de nada. Você só tinha de se comportar, permanecer na escola até o fim do horário letivo, mas parecesse algo muito difícil para você. — O motor da caminhonete rugiu. Em pouco tempo, estavam deixando o estacionamento da escola primária. — E vê se não traz esse cobertor horroroso para a escola outra vez.

Ressentida, Olívia abraçou seu velho cobertorzinho de quando ainda era um bebê. E não voltou a dizer uma única palavra durante o trajeto de volta para casa. Emmett ainda reclamou algumas vezes, com as mãos ao volante, controlando a raiva. Apenas uma única vez se atreveu a olhar para ela através do espelho retrovisor interno. Olívia permanecia de cabeça baixa abraçada ao pano encardido.

Ela era tão parecida e, ao mesmo tempo, tão diferente de Sarah.

A felicidade contínua do que foi a existência de uma e a tristeza persistente na outra. Olhos iguais na cor, porém, diferentes no brilho.

E ele, perdido entre o amor e a indiferença que habitam seu coração.

 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Esse é o link de minha oneshot de halloween, caso alguém não tenha visto ainda e queira dá uma olhadinha.
https://fanfiction.com.br/historia/769733/Gostosuras_ou_Travessuras/