Um Caminho Para O Coração escrita por Sill Carvalho, Sill


Capítulo 27
Capítulo 26 — Provocação


Notas iniciais do capítulo

Ruuh, meu amor, esse é dedicado a você. Espero que goste. Muuuuito obrigada pela recomendação.

A todos, desejo uma boa leitura.



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Não foi o encontro romântico que Rosalie, talvez, tenha esperado que fosse. E, tirando a forma como começou, quando chegaram ao local, até que foi interessante.

O tempo dentro do bar tinha finalmente chegado ao fim. Rosalie e Emmett seguiam para o estacionamento caminhando lado a lado. Ela se esforçava em não rir. Tinha perdido as contas de quantas vezes Emmett repetiu à mesma frase, durante e depois do jogo de sinuca.

— Você mentiu para mim. Joga sinuca melhor que alguns dos caras que estavam lá dentro essa noite.

— O que não impediu você de ganhar duas das três partidas que jogamos. Está reclamando do quê? — defendeu-se Rosalie. Não conseguia acreditar que ficou ressentido com isso. Agarrou seu braço musculoso sem pensar. Nem mesmo se deu conta em que momento deixaram de andar. — Não venha me dizer que ficou com orgulho ferido? — Olhou para cima, sem largar do braço dele. A poucos metros do isolado poste de iluminação pública. A luz amarelada formando um círculo no entorno deles.

Emmett sustentou seu olhar. Ela acabou falando o que estava na cabeça.

— É provável que eu quisesse seu corpo tocando o meu enquanto pensava estar me ensinando como jogar sinuca.

Seus rostos próximos demais, incapazes de deixar de olhar um no outro.

— Talvez eu estivesse gostando de como seu corpo parecia se moldar ao meu — então foi a vez dele de falar o que estava pensando.

A luz no poste oscilou, deixando-os em total escuro alguns instantes.

A mão dele descansou na cintura dela.

— Pena que estava muito barulhento. — declarou Rosalie com sinceridade. — E tinha muitos homens. Me senti desconfortável em alguns momentos.

— Me desculpe — pediu Emmett. — Prometo recompensá-la na próxima vez.

— Hummm… Então quer dizer que haverá uma próxima vez?

— Se estiver de acordo.

Ela sorriu para ele. — Estou cem por cento de acordo.

Emmett ergueu a mão, tocando sutilmente na pele de seu rosto. Desenhando o contorno de seu sorriso.

— Você é linda… — murmurou.

A forma como olhava em seus olhos. O tom de sua voz murmurando que era linda, e a carícia na pele de seu rosto fez perceber outra vez o quanto desejava ser beijada por ele de novo. Mas, o barulho de pessoas deixando o bar fez dissolver o momento.

O motoqueiro tatuado era uma das pessoas a deixar o bar naquele momento. Rosalie soube que Emmett o tinha reconhecido no momento em que segurou sua mão e a conduziu para caminhonete.

A voz com entonação de deboche soou no estacionamento onde a iluminação era falha.

— É nessa lata velha que leva sua garota para casa?

Emmett olhou na direção da voz. O peito inchado, postura de quem estava pronto para entrar numa briga.

— Minha moto é melhor que isso. — O olhar do motoqueiro encontrou Rosalie diante a porta fechada da caminhonete. — Ainda pode vir comigo, galega.

Emmett deu um passo à frente, com Rosalie se colocando no caminho, enquanto esbravejava com o outro, que parecia se divertir.

— Por que não cala essa sua boca de merda? — cuspiu Emmett.

A mão de Rosalie alcançou seu peitoral fazendo lembrar o motivo de estarem ali.

— Emmett — pediu ela. — Não dê ouvidos ao que ele diz. Está fazendo isso para te provocar.

Emmett tentou avançar um pouco mais. Rosalie se colocou em seu caminho, decidida impedir que entrasse numa briga.

O sorriso sínico no rosto do motoqueiro, só fazia crescer mais a raiva em Emmett.

— Ollie está esperando por nós. — lembrou. — Precisamos voltar agora.

A menção ao nome da filha fez a nuvem de raiva deixar seus olhos obrigando focar a atenção somente em Rosalie.

— Não faça o que ele está querendo. — tornou pedir. — Ollie precisa de você inteiro. E eu também.

Ele foi relaxando aos poucos. Soltando o ar devagar. Deixando que a provocação perdesse força. E assim, a cara feia do monstro do ciúme deixasse de encarar seu rosto.

— Não vale a pena — ela reforçou.

Emmett balançou a cabeça, aceitando. Voltaram a se aproximar da caminhonete. Ele abriu a porta para ela entrar, como havia feito quando a pegou na casa de Norman.

Rosalie o observou atravessar na frente da caminhonete e ocupar o assento atrás do volante.

Montado em uma Harley-davidson Dyna Super Glide, o outro fechou a passagem deles. Rosalie não gostou do que viu nos olhos de Emmett ao ser provocado de tal maneira. A menção de ele sair do carro, segurou seus punhos junto ao volante. Não tinha forças para segurar ele ali, mas precisava fazer enxergar que não deveria ir. Porque não iria acabar bem.

— Não — alertou. — Se cair nas provocações dele, não vai acabar bem. Não quero ir buscar Ollie sozinha e ter de dizer a ela que o pai está na prisão, ou ferido em um hospital qualquer. — Ela percebeu o momento em que os dedos dele se fecharam em torno do volante. — Não faça isso com Ollie.

Foi pensando na filha, que conseguiu forças para controlar o monstro dentro dele. Afrouxou os dedos em torno do volante, permitindo Rosalie finalmente relaxar. O som da buzina da Harley-davidson seguido do som do motor indicou que a provocação havia terminado. Ele estava indo embora.

Emmett fez o mesmo ao colocar a caminhonete em movimento.

— Obrigado — ele murmurou enquanto deixavam o estacionamento.

Rosalie não resistiu o impulso de acariciar o rosto dele, afundando os dedos na barba espessa, sentindo que a fúria o abandonara pouco a pouco.

Momentos depois, estavam descendo da caminhonete em frente a casa  onde Alice vivia com a família.

Ao alcançar o caminho de pedras que levava até a porta, sentiu a mão de Emmett procurar a sua. Dessa vez, não tentava provar nada para ninguém. Ela apertou sutilmente a dele de volta.

Foi ele quem tocou a campainha. Enquanto aguardavam que alguém abrisse a porta, trocaram olhares. No fundo, Rosalie reconheceu ainda haver resquícios de fúria enevoando os lindos olhos dele. Ele estava se esforçando, não podia negar.

Alice apareceu na porta. Sua expressão era de alguém que se divertiu bastante.

— Viemos buscar a Ollie — Emmett foi quem falou primeiro.

— Como ela está? — Rosalie falou em seguida.

— Ela dormiu não tem muito tempo. — Alice chegou para o lado, cedendo passagem aos dois.

A mão de Emmett soltou a de Rosalie deixando a sensação de estar faltando algo.

O forte feito com cobertores foi facilmente localizado por eles.

— Parece que elas se divertiram — comentou Rosalie lançando um olhar na direção de Emmett.

No tapete, alguns DVD’s da Barbie estavam espalhados.

— Vocês precisavam ver — contou Alice. — Assistiram aos filmes comendo pipocas e outras guloseimas. Não se preocupem, fiz com que escovassem os dentes antes que ficassem com sono.

— Eu posso? — Emmett sinalizou a entrada do forte ao falar.

— Claro que sim.

Ele se abaixou, caminhando de joelhos para dentro do forte. Em meio a cobertores, almofadas e travesseiros, duas garotinhas dormiam tranquilamente. Mas foi a de cabelos ruivos que fez o sorriso em seu rosto surgir. O coração pulsar cheio de amor.

Ao pegar Olívia no colo, se certificou de pegar também o cobertorzinho e a ovelhinha.

Rosalie segurou o lençol abrindo passagem para ele com a menina. Tendo o cuidado de pegar a ovelhinha da mão dele.

Alice ajudou recolher outros pertences de Olívia e guardar na mochila para que nada ficasse para trás.

— Espera — pediu Alice, com eles se encaminhando para saída. — Ainda falta uma coisa. — Ela recolheu uma folha de sulfite na mesa da sala de jantar levando para eles. — Olívia fez isso para você.

Rosalie estendeu a mão alcançando a folha. Sorrindo ao ver que Olívia tinha desenhado, dessa vez, os três de mãos dadas. O que mais chamou sua atenção foi que Olívia se desenhou sorrindo. O Arco-íris estava em volta deles, e não apenas criando um caminho até Rosalie. No canto superior direito estava a amiga imaginária, no canto superior esquerdo, Sarah. Ambas as figuras estavam ligadas por um risco de giz de cera vermelho, e logo acima, com caligrafia infantil, estava escrito mamãe. Abaixo de tudo, estava escrito família.

Rosalie mostrou o desenho ao pai dela brevemente. Ele balançou a cabeça aceitando o que via.

— Obrigado por ter ficado com ela essa noite. — Emmett agradeceu antes de sair para o jardim levando Olívia adormecida nos braços.

Rosalie ficou para trás, se despedindo de Alice.

— Nem sei como agradecer a você e a Megan por serem tão legais com a minha pequena.

— Não foi nada. Ollie é uma garotinha muito fácil de cuidar. É muito boazinha. Nós três nos divertimos. Espero que você e o papai bonitão ali, também tenham se divertido.

A resposta veio com o sorriso no rosto de Rosalie.

— Esse sorriso está me dizendo que sim.

— Aconteceram umas coisas, mas, fora isso, até foi divertido.

— Se precisar de alguém para ficar com Olívia de novo, estou aqui.

Deram-se um beijo no rosto em despedida.

— Agradeça a Megan também.

— Pode deixar.

A porta da caminhonete estava aberta. Emmett prendia Olívia na cadeirinha, quando se aproximou. A mochila e a ovelhinha estavam com ela. Aguardou terminar de fechar o cinto, e cuidadosamente ajeitar o cobertorzinho junto ao rosto da menina.

— Cadê a Rose? — a voz sonolenta de Olívia soou dentro do carro.

Ao ouvir sua voz, Rosalie chegou mais perto para que a menina pudesse vê-la.  

— Estou aqui, Ollie.

Olívia sorriu, os olhos se fechando de sono.

— Tem um desenho novo… — conseguiu dizer.

— Eu vi. E ele é lindo. — Deixou as coisas ao lado da cadeirinha, aproveitando para fazer um carinho no rosto de Olívia. A menina sentiu seu carinho, enquanto se entregava ao sono. Afastou-se, permitindo Emmett fechar a porta. Ambos entraram no carro ao mesmo tempo.

— Quer que eu te leve no seu avô agora?

— Acho melhor ir com vocês. Ollie está cansada. Eu pego meu carro e vou sozinha para casa de meu avô.

— Não me parece certo terminar um encontro assim. Deixando que volte para casa sozinha.

— Entendo perfeitamente que não pode e não deve deixar Ollie sozinha. Além do mais, prefiro ir com vocês. Não vou obrigar minha menina ficar mais tempo fora da cama.

Emmett ofereceu a mão para ela. Os olhares se encontraram enquanto seus dedos se tocavam.

— Sinto que estive todo esse tempo esperando por você — se viu dizendo sem planejar.

No banco de trás, em sua cadeirinha, Olívia abiu os olhos preguiçosamente enxergando suas mãos unidas. O desenho de um sorriso carregado de sono estava em seu rosto.

Emmett levou a mão de Rosalie aos lábios beijando sem pressa a pele macia e perfumada. O mesmo aroma do creme que outro dia esqueceu em sua casa, na mesa da sala de jantar enquanto ajudava Olívia montar o quebra-cabeça.

Manobrando o veículo antes de pegar a estrada.

[…]

Rosalie estava ao seu lado ao deixar Olívia na cama dela, ajudando com os cobertores garantindo que ficaria aquecida. A ovelhinha e o cobertorzinho ficaram na cama junto à menina.

Emmett observou beijar no rosto de Olívia, dando boa-noite, após ele ter feito o mesmo. Rosalie sentiu que estava sendo observada. Virando finalmente para olhar na direção onde ele estava.

— O que foi? Por que está me olhando assim?

Ele se afastou da parede onde estava encostado dando dois passos à frente encurtando a distância entre eles.

— Ainda fico impressionado com o quanto se gostam e se dão bem.

Ela se colocou de pé indo alguns passos na direção dele.

— É o tipo de amor que ela e Sarah compartilhariam — Emmett fez questão em dizer.

O olhar de Rosalie foi direcionado a cama, na garotinha que dormia nela.

— É como se nos conhecêssemos de outra vida. — colocou assim Rosalie. — Na primeira vez que a vi, soube na mesma hora que queria conhecê-la.

Emmett colocou as mãos nos bolsos dos jeans, olhando na mesma direção que ela olhava.

— Alguém, alguma vez já chegou a mencionar que você nasceu para ser mãe?

As palavras levaram Rosalie olhar nos olhos dele. Havia algo diferente nos olhos de cor âmbar, Emmett poderia dizer que era tristeza. Não entendeu porque suas palavras pudessem tê-la deixado triste.

— Você seria uma mãe incrível — completou, avaliando a expressão em seu rosto. Ela tinha gostado de ouvir que seria uma boa mãe. Mas, aquele pequeno sinal, que ele acreditava ser tristeza ainda estava lá, no fundo de seus olhos. Voltou olhar a menininha na cama. — Parece que minha filha concorda comigo.

— É melhor conversarmos do lado de fora. — sugeriu Rosalie.

Os dois saíram para o corredor. Enquanto ela fechava a porta do quarto de Olívia, Emmett voltou mencionar seu fracasso na escolha do local do primeiro encontro dos dois.

— Me desculpe, novamente. Foi um erro de minha parte levar você a um lugar como aquele. É só olhar para você para ver que não é o lugar que frequentaria.

— Esquece isso — ela pediu.

Ele voltou enfiar as mãos nos bolsos.

— Notei que ficou mexida quando mencionei ter nascido para ser mãe. Não acho que tenha se ofendido com meu comentário, foi mais como minhas palavras fizessem lembrar-se de algo.

— Tem uma coisa que não te contei na outra noite quando nos encontramos no jardim dos fundos. — lembrou Rosalie.

— Pela sua expressão poderia dizer que está relacionado ao motivo que a trouxe a esta cidade.

— Eu perdi um bebê.

Emmett enxergou tristeza, mas também um grande amor nos olhos dela ao revelar mais uma parte dos motivos que a levou até Olívia e a ele.

— Eu sinto muito…

Rosalie teve de piscar para afugentar as lágrimas.

— Pouco tempo depois, descobri que minha irmã estava tendo um caso com meu noivo, como você já sabe, e que também estava esperando o filho dele.

Emmett retirou as mãos dos bolsos para segurar nas dela.

Os olhos dela pestanejaram. Estava se esforçando para não chorar.

— É como se ela tivesse ficado com tudo… o noivo e o bebê que eu teria. Como tivesse roubado meu futuro.

— Talvez isso explique sua ligação com Olívia. — Ela ergueu a vista, sustentando seu olhar, como soubesse que o que estava prestes a dizer aliviaria sua tristeza. — Você desejava o bebê que perdeu. Olívia desejava uma mãe.

Rosalie apertou os lábios, conseguindo finalmente falar sem que o choro a vencesse.

— Talvez minha vinda para cá estivesse destinada. É como se alguém lá em cima quisesse que nos encontrássemos.

Emmett levantou os braços envolvendo-a em um abraço cauteloso, sussurrando no alto de sua cabeça.

— Sinto muito que tenha passado por isso. — Ele sentiu que ela concordou, ao menear a cabeça. — Pense que foi a melhor coisa que aconteceu na vida de Olívia.

— Foi a melhor coisa que me aconteceu… — admitiu ela. — Conhecer Olívia foi um presente maravilhoso. — Enquanto falava, seu olhar seguiu pelo corredor parando na porta aberta do quarto de Emmett, lhe trazendo uma lembrança. — Olívia gosta do violoncelo. Ele faz ela se sentir perto da mãe.

— Por que está me dizendo isso?

— Encontrei Olívia tentando tocar, outro dia. Ela é atraída pelo objeto feito um ímã toda vez que olha para ele. Ela vai a sua direção quase sem perceber o que está fazendo.

— Já tinha notado isso.

Eles seguiram pelo corredor, parando no alto da escada. Rosalie se apoiou na parede atrás de suas costas. Emmett, na proteção de madeira no topo da escada.

— A encontrei várias vezes, exatamente assim como descreveu.

— Já pensou em colocar ela para ter aulas de música?

— Na verdade, sim. Estive pensando nessa possibilidade recentemente.

— Tenho certeza que ela iria gostar.

— É incrível como até nisso ela se parece com Sarah. — O olhar distante mostrou que voltou ao passado. Sacudiu a cabeça, afugentando as lembranças.  — Você toca algum instrumento? — pediu, atento a expressão no rosto de Rosalie. Notando quando o rosto se contorceu com uma careta. Aceitando que nem assim ficava feia.

— Fiz aulas de piano por toda minha infância e parte da adolescência.

— Então você deve tocar piano muito bem — arriscou. Ficou esperançoso que pudesse assistir ela tocar piano algum dia.

— Sim. Mas não é algo que eu goste.

— Por quê?

— A verdade é que nunca gostei. Minha mãe me obrigava ter aulas de piano, porque era o que ela queria que fizéssemos minha irmã e eu. Irina sempre foi de fazer as vontades de nossa mãe. Eu só queria ser eu mesma. — Ela se sentou no alto da escada. Emmett fez o mesmo sentando-se ao seu lado. Os ombros quase se tocando.

— Não tem lembranças boas dessa época, não é? — notou.

O olhar de Rosalie se concentrou nas mãos, em seus dedos compridos. Fechou os olhos, revivendo algumas partes de sua infância e adolescência ao lado de uma mãe dominadora e um pai omisso. Lembrou-se da quase dor de suas pequenas mãos esticando-se para alcançar os acordes. Agudos à direita, graves à esquerda. Todas às vezes que foi obrigada a repetir até alcançar a perfeição.

Reconheceu que falar sobre sua infância machucava quase tanto quanto falar do bebê que perdeu, e do bebê que a irmã esperava com o homem com quem pensou um dia se casar.

— Me desculpe por fazer você lembrar. Parece que tudo o que faço é chamar o passado de volta. Se não é o meu, o dos outros.

Quando ela ergueu a vista, notou novamente a tristeza ofuscar aqueles olhos bonitos. Emmett sentiu a necessidade de levantar a mão para acariciar seu rosto.

— Parece que sua infância e adolescência com seus pais, foi um tanto opressora.

— Éramos quase como robôs fazendo o que eles queriam. Como disse antes, Irina parecia não se importar. Talvez tenha sido esse o motivo de ser a predileta deles.

— Aposto que ela nunca foi a favorita de seu avô. — O comentário a fez rir.

— Eu teria de perguntar a ele — brincou.

— Pare com isso. Você sabe que é verdade.

— Talvez ele tenha deixado escapar alguma coisa.

Emmett tornou erguer a mão tocando o rosto dela.

— Prefiro você assim, sorrindo.

Agora que não pensava tanto nas mágoas, reagiu à carícia de outra forma. A pele formigou na extensão onde as pontas dos dedos dele acariciaram. Deixando o leve calor.

— Seus olhos são lindos demais para estarem sob uma cortina de tristeza como a que vi agora a pouco.

Não pôde evitar desejar que a beijasse. Seus lábios formigaram. Mas não queria repetir a mesma cena sob o caramanchão, quando ele fugiu depois de beijá-la.

Ele estava olhando atentamente em seus lábios. A mão grande e áspera deslizou para sua nuca, deixando um rastro de desejo.

— Só faça isso se estiver pronto — falou sem pensar.

Emmett olhou dos lábios para os olhos dela. O coração pulsando forte no peito, lembrando a ele de que estava vivo. Deixando falar mais alto os novos sentimentos em relação à Rosalie.

Seus lábios se tocaram de forma cautelosa, inicialmente. Ele a trouxe para perto tanto quanto o momento permitia. Ao final do beijo, as testas se tocaram. E sua mão tornou afagar o rosto dela.

— Fique aqui essa noite — sua voz soou rouca. Sentia-se pronto para o próximo passo. Não queria ter de esperar mais.

— Não posso — murmurou ela em resposta. A respiração pesada.

— Por que não? Somos adultos.

— Meu avô está esperando por mim.

— Por que eu sinto que não está dizendo a verdade?

O olhar dela deixou de sustentar o seu. Levando Emmett chegar a uma conclusão.

— Está com medo que eu tenha outra reação parecida com a de quando demos o nosso primeiro beijo? — Pela forma como reagiu, o sim era a única resposta.

— Iria me magoar muito se algo parecido voltasse acontecer. — admitiu evitando o olhar dele. — O sentimento de rejeição ainda está comigo.

— Estou cem por cento certo que não vai acontecer nada parecido com o que aconteceu aquela noite. Só quero deixar claro que essa é uma decisão sua e eu respeito.

— Não há nada, nesse momento, que eu queira mais do que estar com você. Só que…

Emmett não deixou que terminasse silenciando-a com um beijo.

— Você está com medo — disse um segundo depois.

— Não é de você que tenho medo. É de acabar magoada.  — Descansou a cabeça no ombro largo, sentindo a mão dele afagar suas costas indo e voltando a sua cintura.

— Mesmo que não seja comigo, ainda pode passar a noite aqui. Não gostaria de ver você sair sozinha há essa hora. Posso dormir no sofá, e você na minha cama.

— Não vou fazer isso. Trabalha duro precisa dormir bem.

— Vou dormir bem, se tiver certeza que está segura.

Rosalie segurou o rosto dele entre as mãos enquanto o beijava.

— Você é ligeiramente fofo.

Um sorriso de covinhas se abriu para ela.

— Ninguém nunca me chamou assim antes.

— Fico feliz que tenha sido assim. Será algo apenas nosso.

Emmett arqueou uma sobrancelha.

— Ligeiramente fofo? — repetiu ele.

— Sim. — Rosalie sorriu atirando os braços em volta de seu pescoço. Dando-se mais um beijo.

— Me acompanha até o carro?

— Sim.

Ambos se puseram de pé. Emmett segurou na mão dela. Ainda descendo a escada, falou:

— É importante que saiba que estou fazendo isso contra minha vontade.

Rosalie deu risada.

— Quem poderia imaginar que você fosse assim.

— Ligeiramente fofo? — ele colocou uma expressão travessa no rosto dessa vez.

— Você gostou mesmo de ser chamado assim, não foi?

— Nenhum pouco.

— Deu para perceber. — Ela disfarçou um sorrio enquanto alcançavam a varanda. Ele a acompanhou até o carro.

— Me sinto mal por deixar você ir embora sozinha. — Segurou a porta do carro enquanto Rosalie se acomodava atrás do volante.

— Sabemos por que não pode fazer isso. Então, apenas relaxe.

— Te vejo amanhã?

— Com certeza.

Ele fechou a porta, chegando um passo para trás.

— Dirija com cuidado. E me ligue quando chegar. A propósito, você foi a melhor coisa que aconteceu em minha vida também, depois de tanto tempo.

Rosalie meneou a cabeça, aceitando. Suas palavras trouxeram conforto. Manobrou o carro afastando-se da entrada de veículos. Olhando pelo espelho retrovisor interno, notou que Emmett ainda estava do lado de fora, vendo-a partir.

[…]

— Que susto, vô — disparou Rosalie no momento que Norman falou com ela, na sala de estar. O cômodo estava à meia-luz. No alto da escada, uma única lâmpada estava acesa projetando sombras em algumas partes da sala.

Enfatizando o susto, ela encostou as mãos ao coração.

— Desculpe, não queria te assustar.

Ela entrou no cômodo indo acender as luzes do teto.

— Pensei que estivesse dormindo — comentou. Olhou para Norman, que estava agora, olhando para ela.

— Até tentei — admitiu ele. — Quem disse que consegui. Estava preocupado que algo desse errado em seu encontro com Emmett.

Rosalie se aproximou dele, dando um abraço.

— Pois não deveria. — Beijou seu rosto e se afastou novamente.

— Então ocorreu tudo bem? Ele foi gentil com você? Nossa Abobrinha ficou bem na casa da amiguinha? Estive preocupado com as duas.

— No começo foi estranho. Me assustei um pouco com o local para onde me levou. — notando que o avô ficou preocupado, fez questão de esclarecer. — Não era um lugar que eu estivesse em perigo. — completando silenciosamente. — Ao menos eu espero.

— Ele te tratou bem?

— Emmett tem me surpreendido a cada dia.

— Fico mais tranquilo sabendo que as coisas sejam assim. Está realmente gostando dele, não está?

Não foi necessário o uso de palavras, a resposta estava estampada nos olhos dela.

— Não quero que se machuque. Na verdade, nenhum dos três.

— Não quero que eles saiam magoados.

— Tenho certeza disso. Só que mais cedo ou mais tarde terá de ir embora. Os três irão sair magoados. É inevitável. Aqueles dois vão sofrer em demasiado. Você trouxe luz à vida deles. Especialmente a Olívia.

— Tenho consciência que em breve terei de partir. E, de verdade, não queria ter de deixar minha menina. Nem ao pai dela. Mas, se for para ser assim, ao menos saberei que ajudei pai e filha se relacionarem de forma carinhosa e afetiva como deveria ter sido desde o momento em que a trouxe da maternidade para casa. Terei deixado marcas positivas na vida deles, da mesma forma que eles a minha. E posso sempre vir visitar.

Norman quis dizer que não era a mesma coisa, porém, achou melhor não.

— Vou aproveitar da melhor forma o tempo que tenho aqui. Perturbando o senhor. Fazendo Olívia e o pai dela felizes. Sendo feliz. Era aqui vovô, nesta cidade, que minha felicidade estava o tempo todo.

— Espero que eu esteja incluso nessa equação de felicidade. Porque desde que chegou minha vida já não é tão solitária. Você também trouxe felicidade para esta casa, minha neta querida.

— Ah, vovô… — Rosalie voltou abraçar Norman. — Eu te amo tanto. E é claro que sei que te faço feliz. Sou sua neta favorita. Até mesmo Emmett sabe disso. Olha que nem falei nada.

Norman deu uma risadinha.

— Está tarde, porque não vamos dormir? Amanhã é um novo dia.

Rosalie assentiu, com a certeza de que voltaria encontrar Olívia e o pai dela no dia seguinte.

Avô e neta subiram a escada juntos. Indo cada um para um lado no corredor, entrando em seus respectivos quartos. Rosalie ocupando o antigo quarto da mãe.

[…]

Emmett olhava no celular cuja tela tinha ganhado uma nova rachadura recentemente. Pensou que Rosalie estava demorando em ligar. Cogitava ele mesmo fazer isso. Acabou sorrindo quando o celular tocou ainda em sua mão mostrando o contato dela na tela.

— Até que fim você me ligou — suspirou aliviado. — Já estava pensando em tirar Olívia da cama só para conferir se tinha chegado bem.

Ao demonstrar preocupação, fez Rosalie se sentir especial. Encerrando a noite da melhor forma.

— Bom, eu cheguei. Já pode ficar tranquilo. Agradeço toda sua preocupação.

— Não iria conseguir dormir se não tivesse certeza que chegou em segurança.

— Então já pode deitar a cabeça no travesseiro e relaxar. — Ele soube que zombava dele quando o som de uma gargalhada cruzou a linda chegando aos seus ouvidos. Foi tranquilizador perceber que, mesmo tendo começado do jeito torto, o encontro acabou sendo divertido para ambos.

— Descanse — disse ele.

— Você também.

[…]

Rosalie e Olívia caminhavam de mãos dadas pela calçada que antecedia o gramado. Tinha acabado de pegar Olívia no ponto de ônibus, depois da escola.

— Alguém deixou alguma coisa na nossa porta. — Olívia reconheceu o pacote ao pé da porta, na varanda. — O que será?

— Já vamos descobrir.

Tiveram o cuidado ao cruzar o jardim, desviando de gravetos e outros objetos que pudesse fazer tropeçar. Olívia não soltou sua mão até que estivessem lá. Aproximaram-se do pacote tentando encontrar o remetente.

— Deve ser pro papai — Olívia chegou à conclusão.

Rosalie olhou para ela, abrindo um sorriso.

— Não é para o papai, não. É para você.

— Para mim? — com expressão de quem não pensava que fosse possível, Olívia chegou mais perto tentando ler o que estava escrito no pacote.

Rosalie presenciou com alegria a felicidade de Olívia em descobrir que era realmente seu nome escrito. E, mais ainda ao soletrar o nome da avó paterna. Virou-se para Rosalie com os olhos brilhando.

— É mesmo para mim. Foi vovó que mandou. Ela se lembrou de mim. A vovó lembrou de mim.

Rosalie notou que o fato de a avó ter lembrado dela foi mais significativo que o próprio presente. Que nem sabiam ainda o que era.

— Abre! Vamos ver o que tem dentro — sugeriu Rosalie. Ajudando com a mochila e a lancheira.

A menina ficou de joelhos no piso de madeira da varanda. As mãos pequenas sendo cuidadosa ao retirar o papel de embrulho.

— A vovó nunca me mandou um presente… — dizia, quando percebeu que era uma boneca american girl, de cabelos ruivos compridos assim como os seus. — Ai, meu Deus — murmurou a menina. O sorriso ficou ainda maior. — A vovó mandou para mim uma boneca american girl. E ela se parece comigo. Não acredito nisso.

— Ela é linda, amor. Você gostou do presente da vovó?

Olívia balançou a cabeça, afirmando.

— Gostei muito. Megan tem quase todas as bonecas american girl. E tem uma que se parece com ela.

— Agora você vai poder mostrar a sua para ela também.

Olívia abraçou a boneca.

— Eu ainda gosto mais das bonecas Barbie que você me deu. E também as que o papai deu.

— Não tem problema, você gostar muito da que a vovó te enviou.

Olívia meneou a cabeça.

— Ela é mesmo muito bonita. Antes eu não tinha nem uma sequer e agora tenho um monte de bonecas.

— Que legal, princesa. Vamos ver se tem algum bilhete junto?

Depois de analisar todo o interior da embalagem, chegaram à conclusão que Cheryl não havia escrito nada. Rosalie tentou disfarçar a decepção ao olhar no rostinho da menina. Cheryl deveria ter escrito alguma coisa para a neta, pensou.

— Não tem uma cartinha? — O rosto infantil mostrou decepção.

— O importante é que pensou em você ao enviar a boneca. Não fique triste.

— Talvez o papel na casa dela tenha acabado por isso não pôde escrever uma cartinha para mim — Olívia chegou à conclusão.

Rosalie tocou seu ombro, fazendo um afago. Sem coragem de dizer que não era como pensava, sorriu para Olívia. Por dentro estava com raiva. Agora que Olívia estava começando ler sozinha, seria maravilhoso receber uma cartinha da avó que ela pensava tê-la abandonado.

Recolheu a embalagem do presente antes de entrarem em casa.

— Rose — Olívia chamou. De pé ao lado do sofá, segurando a boneca que acabou de ganhar.

— Oi, amor?

— Você me ajuda escrever uma cartinha pra vovó e também enviar para o endereço dela?

— Claro que sim. Faremos uma cartinha bem bonita.

— Eu vou colocar uma folha em branco junto. Assim a vovó vai poder me responder depois.

Suas palavras deixaram Rosalie comovida.

— Será que na casa dela tem um lápis ou uma canetinha?

— Acredito que sim.

Olívia voltou abraçar a boneca, sorrindo. Feliz, porque, depois de muito tempo, a avó paterna havia se lembrado dela.

No fundo, sabia que isso só tinha sido possível por consequência de seu telefonema, pressionando a mãe de Emmett. Ainda assim queria acreditar que estava pensando na felicidade da neta. Ao menos sabia, Cheryl pensou realmente em Olívia ao escolher a boneca de cabelos ruivos. Tinha pensado na garotinha a quem abandonou ao entrar no carro e partir sem mesmo olhar para trás. Deixando sua vida à própria sorte ao confiar para cuidar dela um homem destruído pela dor de um luto ainda não curado.

 


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