Um Caminho Para O Coração escrita por Sill Carvalho, Sill


Capítulo 24
Capítulo 23 — Negando o Que Sente


Notas iniciais do capítulo

Oi, gente!
Primeiro, desculpe pela demora. Era para ter atualizado da metade para o final de dezembro. Ocasionou de cair durante as festas de fim de ano, então eu resolvi esperar um pouco.

Aproveito para agradecer a Tamii pela recomendação. Tamii, minha flor, eu mais do que amei suas palavras. Obrigada, o capítulo é dedicado a você. Espero muito que goste.

Desejo a todos uma boa leitura.



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Emmett caminhou trôpego, os batimentos do coração acelerado, respiração ofegante, fugindo do que tinha acabado de acontecer, lutando com sentimentos que o obrigavam estar no fundo do poço. Desaparecendo dentro de casa pela porta dos fundos, sem ter olhado para trás uma única vez.

Se culpando por ter beijado Rosalie. Culpando-se de trair a memória de Sarah. Não tinha pretensão de fazer o que fez. Quando deu por si, era darde demais. A culpa era dela, de Rosalie, esforçava-se para acreditar nisso. Estava sempre fazendo ou falando coisas que o deixava perturbado. Aos poucos, o enfraquecendo, destruindo barreiras.

Então, a consciência de que foi bom beijá-la, sentir-se vivo, trouxe culpa e com ela veio também à fúria.

Ao alcançar a ilha da cozinha, chutou a banqueta, que colidiu na segunda, e, juntas, foram ao chão. O barulho ecoou pela casa, se misturando ao rugido que se formou no fundo de sua garganta.

Sendo consumido por tudo o que sentia, passou as mãos na cabeça. Buscando uma rota de fuga, desviou das banquetas no chão. Uma rápida olhada ao redor, lembrou-se da garrafa de vodka no armário da cozinha. De detrás de um pote de alimentos, retirou a garrafa com o líquido ainda pela metade. Arrancou a tampa com força, batendo no mármore da bancada ao se desfazer dela.

Não podia ter beijado Rosalie, esse pensamento judiava. Sarah era seu único e grande amor. Não podia se deixar envolver por mais ninguém.

Levou o gargalo da garrafa à boca, as mãos tremeram ansiando um gole. A frase dita por Rosalie voltou a ocupar seus pensamentos: Olívia precisava dele sóbrio. Estava certa, admitiu a si mesmo. Foi difícil largar a garrafa, as mãos suaram frio, a garganta ficou seca, e a boca, salivou. Já podia sentir o tremor no corpo causado pela ausência do álcool, mas conseguiu resistir.

— Papai?

Ouviu a voz sonolenta e assustada da criança atrás de suas costas. As batidas do coração tornaram acelerar. Respirou fundo, apertando as mãos sobre a bancada, arrumando tempo, garantindo que não haveria sinais aparentes de fúria ao olhar no rosto da menina.

— Oi, meu amorzinho? — conseguiu manter a voz serena diante o olhar preocupado da criança. — Por que não está na cama? — pediu, se posicionando de maneira a esconder a garrafa de bebida alcoólica em cima da bancada.

— Eu ouvi um barulho… — Olívia coçou o olho, curvando o pescoço de lado ao olhar para ele.

Emmett cruzou a cozinha, novamente desviando das banquetas no chão, e a pegou no colo.

— Papai esbarrou nas banquetas sem querer — mentiu.

O olhar de Olívia alcançou às banquetas caídas, em seguida, a garrafa de vodka em cima do armário.

— Você bebeu de novo, papai?

— Não, eu não bebi. — Ele sentiu o coração pesar com olhar entristecido de Olívia.

— Você jura? — pediu a menina.

— Juro. Por você, não bebi. Eu juro.

Olívia beijou sua bochecha encoberta pela barba espessa, e fez um carinho.

— Eu tive uma ideia — ele sugeriu. Beijando seu rosto, após falar.

— Qual? — Olívia quis saber.

— Por que não jogamos todo o líquido desta garrafa fora? Você e eu.

— A cerveja também?

— Também.

Um sorriso marcou o rosto infantil de Olívia.

Emmett a levou com ele até o balcão onde a colocou sentada. Pegou a garrafa de vodka, e também as de cerveja dentro da geladeira. Pouco a pouco, os dois esvaziaram todas as garrafas dentro da pia e as puseram no latão de lixo reciclável que ficava na garagem. 

Ele a pegou no colo novamente.

— Arco-íris tinha razão… — murmurou Olívia, a cabeça descansando no ombro largo do pai, permitindo o sono, gradualmente, voltar embalar seus sonhos.

— Sobre o quê Arco-íris tinha razão? — ele pediu, alcançando o primeiro degrau da escada, na sala de estar.

— Eu tinha de descer a escada — tornou a murmurar, bocejando logo em seguida.

— Para quê?

Olívia não respondeu, estava dormindo novamente.

Emmett a levou para o quarto e a colocou na cama. Ajeitou seu travesseiro e cobertores, e lhe deu um beijo na testa. Incapaz de se afastar da filha. Sua doçura e inocência eram as únicas com força o bastante para mantê-lo longe do álcool agora.

Apagou a luz do teto, deixando apenas o pequeno abajur aceso. Sentou na poltrona, a mesma que Sarah tantas vezes esteve sentada durante a gravidez, sonhando acordada com o rostinho de Olívia, se perguntando com quem iria se parecer se com ela ou com o pai.

Olhando Olívia dormir, chorou pela falecida esposa. Chorou por ter fracassado no papel de pai nos últimos seis anos. E, principalmente, chorou pela criança inocente que havia sido alvo de sua fraqueza e incapacidade de aceitação em todo esse tempo.

[…]

Rosalie se dobrou, com as mãos nos joelhos, ofegante, ao pisar na varanda da casa do avô.

O choro e a tristeza que tentou manter oculta durante todo o dia, chegando ao limite, vindo a transbordar. A fotografia que Dorothy lhe enviou enquanto lia para Olívia dormir. A negação de Emmett, depois de beijá-la. Tudo isso pesou.

Tomou a postura ereta, olhou na porta fechada da casa do avô. Respirou fundo. Norman estava lá dentro, aguardando por ela.

Passou as mãos encobertas pelas mangas do agasalho no rosto, limpando os últimos resquícios de lágrimas, se esforçando em parecer menos derrotada do que realmente sentia.

Pôs a mão na maçaneta, se preparando emocionalmente para entrar na casa. Respirou fundo, antes de abrir a porta. Pondo o pé para o lado de dentro, se deparou com olhar preocupado do avô. O telefone na mão dele.

Quase desmoronou ao vê-lo. Norman representava conforto e segurança. Desejou como nunca chorar em seus ombros. Mas não podia fazer isso, por ele e por si mesma. Estava certo quando dizia que nenhum deles era digno de uma só lágrima sua.

O que sua mãe fez hoje, certamente doeu bem mais do que o próprio casamento da irmã com o homem com quem chegou a fazer planos para o futuro. Aquele com quem iria se casar.

Foi tomada, de repente, pelos braços do avô. O telefone, ainda nas mãos dele. A forma como ele a recebeu foi o bastante para que soubesse que estava em casa. Mais do que sentiu toda vida na casa onde cresceu ao lado dos pais e da irmã.

— Graças a Deus! — ouviu Norman suspirar, aliviado. — Já estava ligando para a polícia — confessou. Afastando assim os braços, olhando finalmente no rosto da neta.

Rosalie se esforçou para parecer bem.

— Onde você estava? O que aconteceu? Liguei no seu celular várias vezes, só dava caixa postal. Estava aqui a ponto de perder o juízo.

Norman sabia do casamento de Irina, até tinha sido convidado. Em consideração a Rosalie e aos sentimentos dela, ocultou o convite e qualquer assunto relacionado à data.

— Me desculpe vovô, eu acabei desligando.

— Mas… — ele começou nitidamente preocupado.

— Vou ligar de novo, foi só por algumas horas. — Assim, retirou o aparelho do bolso do moletom tornando ligá-lo.

— Por que desligou? — Norman pediu. — Olhe para mim, Rose. — insistiu, uma vez que evitava olhar no rosto dele por muito tempo.

Outra vez teve de se esforçar em parecer bem ao olhar no rosto do avô.

— Quem foi? — Norman a pegou de surpresa com a pergunta. O rosto sério. Pronto para amparar a neta. — Quem a magoou dessa vez? Quem foi? Eu quero saber.

Afetada, Rosalie moveu os ombros como se livrasse de um grande peso.

— Mamãe — contou por fim. — Foi mamãe.

— O que Dorothy fez desta vez?

— Ela sempre está do lado de Irina. Sempre esteve. A vida inteira foi desse jeito. A filha perfeita. Faça como sua irmã. Seja como sua irmã. Se esforce mais. Não está fazendo direito.

Norman segurou sua mão, guiando-a pela sala para que sentasse no sofá com ele.

— Me diga o que exatamente sua mãe fez?

Rosalie mexeu no celular até encontrar o que precisava. Virando a tela para o avô, mostrou a fotografia do casamento da irmã. Norman ficou parado um instante, olhando a imagem na tela do celular, incapaz de acreditar que Dorothy houvesse sido tão cruel a ponto de fazer isso com a própria filha.

— Sua mãe fez isso? — a voz soou com indignação. — Dorothy lhe enviou isso? Isso veio mesmo do telefone dela?

— Absolutamente.

Norman beijou suas mãos.

— Eu sinto muito, minha neta. Sou culpado por ela ser assim. Não fui duro o bastante enquanto ela crescia.

— Não, vovô. Não é culpa sua, mamãe ser assim. Não é culpa sua ela ter predileção por uma das filhas. — Ela beijou as mãos do avô de volta. — O senhor é uma boa pessoa. Tenho certeza de que foi um bom pai. Tanto quanto tem sido como avô.

— Não consigo entender como Dorothy consegue ser tão fria. Sua avó e eu sempre fomos pais dedicados. Criamos com tanto amor. Mas, desde criança, demonstrava insatisfação com tudo que fazíamos. Sua avó estava quase sempre chorando escondido por coisas que ela dizia ou fazia.

— Essa é a mamãe.

Norman pegou o celular, movendo o dedo na tela como tivesse feito aquilo muitas vezes.

— O que está fazendo vovô?

— Apagando esta porcaria. Não vou deixar que continue olhando para isso, se martirizando. Não vou deixar que isso acabe com todo meu trabalho em fazer você sorrir. Não vai chorar por um bunda-mole desses.

Um fraco sorriso alcançou os lábios de Rosalie.

— Bunda-mole? — questionou incapaz de acreditar no que ouviu do avô.

— Isso mesmo. Projeto fracassado de homem. Não soube reconhecer o seu valor.

Rosalie agarrou o pescoço do avô num abraço repleto de carinho e gratidão.

— Obrigado, por existir — murmurou no ombro dele.

Norman sorriu, emocionado.

— Estou feliz que tenha me procurado. Tenha certeza que sempre estarei aqui para o que precisar.

Rosalie beijou sua barba grisalha.

— Avozinho lindo — murmurou, com as mãos no rosto dele.

— Espere aqui. — Norman avisou, se pondo de pé. — Volto num instante.

— Aonde o senhor vai?

— Preparar um chá para gente. Fique bem aí onde está.

— O senhor viu meu bilhete na porta da geladeira?

— Vi, mas ficou tarde e você não chegava.

— Me desculpa por isso. Então, não quer ajuda?

— Não é necessário. Eu não demoro.

[…]

Norman estava demorando demais para quem disse que faria apenas um chá.

Rosalie acabou levantando, indo à cozinha para ver se estava tudo bem. O bule estava em cima do fogão, mas a chama estava apagada. Não havia sinal algum de Norman por perto.

— Vovô? — ela chamou. Nesse momento, reparou na porta que dava para o jardim dos fundos, aberta. A brisa fria entrando sem barreiras, soprando a toalha da mesa. Ao se aproximar, viu o avô andando no quintal com o telefone no ouvido. Ela ouviu, embora não tenha sido sua intenção, parte da conversa dele.

— Não interessa, ela é sua filha. Não deveria ter enviado aquela foto para ela. Foi cruel o que fez. — fez-se uma pausa, e ele voltou a falar: — Eu me meto, sim. Rose é minha neta. É uma boa garota, mesmo com todas as merdas que você tem feito. — outra pausa na conversa. — Me pergunto todos os dias, onde foi que errei com você? — ele ficou em silêncio novamente. — Claro, volte para sua vida. A vida de aparências que você valoriza tanto. Só não volte a magoar minha neta. Não vou permitir que continue fazendo mal a ela. — Norman calou-se outra vez. — Ela vai voltar, quando achar que está pronta, até lá não volte a procurá-la, a menos que, tenha algo bom a dizer.

Ele deslizou o telefone ao encostar à barba. Rosalie soube naquele momento que a ligação havia acabado de forma brusca. Dorothy teria desligado na cara do próprio pai.

Voltou à sala, não queria ser pega espiando. Como fosse possível, amando o avô um pouco mais, depois daquela ligação.

Levou mais uns poucos minutos até Norman chegar à sala trazendo a bandeja com duas xícaras de chá.

Rosalie estava com as costas apoiadas no encosto do sofá. Os braços em volta dos joelhos. Seus tênis, largados no chão.

— Desculpe — ele pediu. — Levei mais tempo do que precisava.

— Está tudo bem vovô.

Norman colocou a bandeja em cima da mesa de centro. Pegou uma xícara, entregando na mão da neta.

Rosalie tomou um gole enquanto o avô pegava a outra xícara na mão.

— Obrigada, vovô. — Norman a ouviu murmurar. Ele só não sabia que ela agradecia, também, por defendê-la, não somente pela bebida que acabou de trazer.

Ambos terminaram de beber o chá em silêncio. As xícaras foram postas novamente na bandeja com um leve tilintar.

Rosalie deitou no sofá com a cabeça no colo do avô. Após um bom tempo em silêncio, voltou a falar:

— Emmett e eu nos beijamos.

Norman acariciou seus cabelos claros, demonstrando não estar tão surpreso assim.

— Mas ele não ficou muito feliz com o que aconteceu — continuou ela.

— Você ficou triste?

— É, acho que fiquei sim. Nem pude dizer tudo o que queria. Ele me largou lá, sozinha, no jardim.

— Está começando gostar dele?

— Acho que estou condenada a fazer escolhas erradas.

— Isso apenas o futuro poderá dizer — Norman concluiu. A mão sempre afagando os cabelos da neta, oferecendo conforto e carinho.

[…]

Aquela foi mais uma entre tantas noites mal dormidas desde que Sarah se foi. O beijo que deu em Rosalie não ajudou em nada acalmar suas emoções, só serviu para causar mais turbulência.

Quando a luz do dia banhou a casa, estava acordado, sentado exatamente na mesma poltrona, velando o sono da filha. Sentiu as costas doerem quando se mexeu pronto para ficar de pé.

Antes de deixar o quarto ajeitou mais uma vez o cobertor de Olívia, permitindo que dormisse um pouco mais.

Passou rapidamente no banheiro, se trocou e desceu até a cozinha. Aproveitou aquele tempo para arrumar a bagunça deixada na noite anterior. Então, preparou o café da manhã para os dois. Deixando a mesa pronta com tudo o que encontrou em casa: waffles com mel e morangos picados, ovos com bacon, leite, café e pão.

— Dorminhoca — murmurou para Olívia, de joelhos ao lado de sua cama. A mão grande e calejada acariciando os cabelos ruivos bagunçados. — Hora de acordar.

Olhinhos sonolentos piscaram, focando a imagem do papai. O cobertorzinho foi esfregado na bochecha. A cena diante seus olhos, lhe trouxe a reconfortante sensação de proteção.

Ainda sonolenta Olívia sentou na cama arrastando o cobertorzinho junto ao peito, em seguida, seus braços miúdos envolveram o pescoço de Emmett.

— Dormiu bem? — pediu, ainda enquanto ela se afastava.

A menina meneou a cabeça, afirmando.

— Papai, você e a Rose estavam nos meus sonhos — contou com voz de sono.

— É? E o que acontecia no seu sonho? Aposto que foi um sonho muito bonito.

— Você, Rose e eu… e também a Arco-íris, estávamos passeando de mãos dadas na beira de um rio. Era bem bonito lá. Tinha barcos na água. E árvores ao redor.

A descrição do que aconteceu no sonho de Olívia, deixou Emmett pensativo. Ela nunca esteve às margens do rio, exceto no tempo em que a mãe ainda a carregava no ventre. Sua descrição batia exatamente com o Rio Chawan. Ele recordou dos barcos a caminho de Batchelor Bay. Das castanheiras que margeavam a água. Por um instante, sentiu como voltasse no tempo, quase pode sentir o calor da mão de Sara a segurar a sua durante a caminhada.

— Com certeza foi um sonho muito bonito.

Olívia concordou, movendo a cabeça, um pouco mais desperta agora.

— Por que não vai se vestir para ir à escola? Não demora, o ônibus está passando.

Ela levou a mão à cabeça.

— Meus cabelos estão bagunçados.

— Não tem problema. Hoje serei eu a arrumá-los para você.

Olívia não pôde conter o espanto que a declaração lhe causou. Saltou da cama num pulo, sorrindo para Emmett. Depois, correndo até o guarda-roupa, escolhendo uma muda de roupas novas para usar naquela manhã.

Arrancou o pijama trocando-se depressa, se atrapalhando em alguns momentos. Antes que pensasse em buscar as coisas para arrumar os cabelos, Emmett já estava à sua espera, sentado na beirada da cama com tudo o que precisava em mãos.

— Você sabe como fazer isso, papai? — Os olhos brilhando de alegria.

— Não vai ficar tão perfeito quanto quando Rosalie penteia, mas eu vou fazer o meu melhor.

Uma garotinha feliz saltitou para junto dele, se posicionado de costas, de modo que tivesse acesso aos longos cabelos ruivos.

Emmett começou desembaraçando os fios devagar. Olívia estava tão contente, o sorriso o tempo todo no rosto, incapaz de deixá-la. O papai prendeu todo o cabelo no alto da cabeça, trançando o rabo de cavalo. O elástico lilás com uma nuvem branca enfeitando os fios perfeitamente alinhados.

Olívia se virou para olhar no rosto dele, quando disse que tinha terminado.

— Está ainda mais linda — as palavras deixaram seus lábios com facilidade, e verdade absoluta. Encheu-se de orgulho. Todo tempo gasto assistindo tutoriais na internet tinha válido de alguma coisa. Tinha feito à filha sorrir. Se sentir bonita e cuidada.

Vê-la correr até onde estava o pequeno espelho, admirar o resultado de seu trabalho e dedicação foi suficiente para saber que tinha sido a coisa certa.

— Pronta? — sondou.

Olívia correu para junto dele, envolvendo-o num abraço pequeno.

— Obrigada, papai. Ficou lindo! — ela balançou a trança presa no alto da cabeça. Sorrindo para ele.

— Você gostou?

— Gostei um bocado. — A mão pequena deslizou nos longos fios. — Ficou lindo.

Emmett finalmente se levantou, pegando a mochila em cima da cômoda. Uma mão segurando firme na mão pequena da filha, eles desceram até a cozinha para tomar café. O rabo de cavalo trançado, balançando de um lado para o outro, por conta da animação dela.

Ele a ajudou com a cadeira na cozinha, e lhe serviu o café da manhã. Quando terminaram, preparou a lancheira sob o olhar atento da menina.

— Vamos? O ônibus não deve demorar a passar. — Ele segurou a lancheira, colocou a mochila nas costas de Olívia, e outra vez lhe ofereceu a mão.

— Você vai comigo, papai? — uma garotinha encantada com o que estava acontecendo fez a pergunta, olhando para cima, buscando enxergar no rosto do pai.

— Temos de nós apressarmos — lembrou, a caminho da porta da frente, segurando firme na mão pequena. Se esforçando em não pensar que não havia segurado sua mãozinha durante os primeiros passos. Nem em seu primeiro dia de aula na escola primária.

Ambos cruzaram o que restava do jardim, de mãos dadas, então, seguindo pela calçada.

— Olha papai! — Olívia mostrou com a mão livre, o esquilo cruzando o jardim do vizinho.

— Ele, muito provavelmente, está buscando comida. Se preparando para o inverno.

— Ahã — murmurou a menininha ao seu lado.

Alcançaram o ponto de ônibus no momento exato que o veículo amarelo apontou na rua. O ônibus parou e a porta foi aberta com um barulho forte.

— Tchau, papai! — Olívia se despediu, olhando do ônibus para o pai.

Emmett entregou a mochila e a lancheira a ela. Depois a ergueu colocando de pé no primeiro degrau. A motorista do ônibus sorriu para os dois.

— Até mais tarde — murmurou, beijando sua testa. — Tenha um bom dia.

— Você também, papai. Tenha um bom dia.

— Agora vai. — Ele se afastou do ônibus. A porta fechou. Assistiu Olívia caminhar pelo corredor e ocupar seu lugar no assento. Ela acenou para ele através do vidro, e ele acenou de volta.

Olívia sorriu para a amiga imaginária, agora sentada ao seu lado, tão feliz com o que tinha acabado de acontecer quanto à própria menina.

Emmett viu o ônibus se afastar, pensando no quanto havia sido cego e egoísta. Reconhecendo que o que precisava para ser feliz sempre esteve ao seu lado. Olívia era parte principal no seu processo de cura, não a causadora de suas feridas.

Voltou para casa com a expressão feliz do rosto da filha preenchendo seus pensamentos.

Momentos depois, enquanto lavava a louça do café, olhando para o jardim dos fundos pela janela sobre a pia, encarando o banco sob o caramanchão, a cena de ontem à noite com Rosalie voltou ocupar espaço em sua mente. Com a lembrança veio também à culpa. A necessidade de pedir perdão a Sarah.

Secou as mãos no pano de prato e saiu da cozinha pela porta de acesso à garagem. Ocupou o banco do motorista, com a cena do beijo voltando ocupar os pensamentos, ainda que recusasse pensar nisso. Sarah não merecia, era o que se esforçava para pensar toda vez que a cena do beijo surgia.

Saiu com o carro da garagem sem destino certo. Dando voltas e voltas pelas ruas da cidade, esquecendo-se do trabalho. A culpa o levou até o cemitério, onde estacionou junto ao meio-fio. Levou mais tempo que o necessário para sair do carro, diferente de outras vezes que esteve ali, se esforçando para não levar com ele os sentimentos confusos em relação à Rosalie.

Fez o caminho tão conhecido até a lápide de Sarah. Nada parecia igual, embora estivesse exatamente como na última vez que esteve ali. A mudança estava dentro dele. Seus pensamentos eram outros. O coração pulsava de forma diferente; não mais com tristeza e dor. Dessa vez, o coração desejava que estivesse do lado de fora daqueles portões. Foi duro admitir que já não desejava mais tanto quanto antes estar ao lado da mulher que tanto amou. Seu desejo hoje era ver a garotinha de cabelos ruivos, e rosto salpicado de sardas, crescer. Se tornar uma mulher apaixonada pela vida como a mãe dela havia sido.

Aquela foi à primeira vez, em seis anos, que chegou até ali sem uma rosa na mão. Sentindo o peso da culpa, se deixou cair de joelhos na grama que começava perder o viço.

Começou pedindo perdão pelos anos de descaso com a filha dos dois. Jurou ser para Olívia, a partir daquele momento, o melhor pai que poderia ter. Pediu perdão, também, pelo beijo que deu em Rosalie. Disse que foi um momento de fraqueza. Declarou seu amor à falecida esposa mais uma vez. Correu os dedos sobre o nome dela, escrito na lápide, relembrando o quanto haviam sido felizes.

Eram quase onze da manhã quando entrou no carro e seguiu para o trabalho.

Jacob e Kalel já estavam no local de trabalho há bastante tempo.

— Achávamos que não viesse hoje — começou Jacob. — É sempre o primeiro a chegar. O que aconteceu?

Emmett não respondeu. Passou direto por ele, indo até à garagem pegar o cinto de ferramentas. Nem mesmo o constante barulho da obra pode manter seus pensamentos longe de Rosalie e do beijo. Martelou o dedo duas vezes. Gritou com Jacob quando disse que estava agindo de maneira estranha, mais do que de costume.

[…]

Rosalie dirigiu pelas ruas tranquilas da cidade, atendendo um pedido do avô; buscar chá no mercado porque o deles havia acabado.

Pegou-se dirigindo pela rua de Emmett, embora não fosse caminho do mercado. E nem ele, nem Olívia estivessem em casa àquele horário.

Não tinha intenção, mas, depois de um tempo, acabou chegando ao local onde Emmett estava trabalhando.

Ele estava em cima da escada, arrumando qualquer coisa no telhado. O cinto de ferramentas na cintura, os jeans manchado e a camisa de flanela que havia virado sua marca registrada.

Desejou sair do carro, falar com ele, mas não sabia o que dizer. Pensou no beijo. No quanto havia gostado de estar nos braços dele, ainda que por pouco tempo. Ele a rejeitou. Era ridículo que estivesse ali, esperando qualquer coisa dele.

Deu partida no motor, se afastando dele e do que sua presença causava.

Como sentisse que estava sendo observado, Emmett olhou para trás, do alto da escada, mas o carro já havia partido.

[…]

— Onde está a sacola? — Norman pediu quando a viu deixar o carro de mãos vazias.

— Desculpe vovô, acabei esquecendo o que tinha ido buscar. — Ela deu meia-volta. — Vou voltar lá agora mesmo.

— Espere! — Norman pediu. — Rose, não precisa fazer isso.

— Não, vovô. Eu disse que traria o que estava faltando, então é isso que farei.

Norman meneou a cabeça, vendo a neta entrar novamente no carro e partir.

[…]

Mais tarde, Rosalie foi esperar por Olívia no ponto de ônibus como de costume. E teve uma grande surpresa ao ver que Emmett também estava lá. Um olhou para o outro, ambos sem jeito, lembrando-se do ocorrido na noite anterior.

Ele usava as roupas do trabalho. O que revelava a pressa em estar ali para receber Olívia.

— Não esperava encontrar você aqui — foi ela quem falou primeiro.

— Desculpe não ter avisado antes que viria — ele pediu. Ambos fingindo não se lembrar do beijo.

— Tudo bem. Ela é sua filha, tem todo o direito de estar aqui.

O ônibus escolar se aproximou reduzindo a velocidade até parar. Em pouco tempo, uma garotinha sorridente, com mochila nas costas e lancheira na mão, surgiu na porta.

— Papai! Rose! — exclamou surpresa que o pai estivesse ao lado de Rosalie, a sua espera.

Emmett segurou a lancheira numa mão e na outra, a mão da filha. Olívia ofereceu a mão livre a Rosalie, que aceitou facilmente.

— Como foi na escola hoje, meu amor? — Rosalie pediu.

— Foi bem.

— É? E você lanchou direitinho?

— Sim.

Emmett olhou de soslaio, reparando na conversa das duas.

Já em frente à casa, Rosalie parou para falar com Olívia:

— Acho que devo seguir para casa agora.

— Não — Olívia gemeu, segurando firme sua mão.

— Não vai precisar de mim hoje. — Ela olhou para Emmett. — O seu papai vai estar com você.

— Mas eu quero que fiquem os dois.

Rosalie olhou da menina para o pai dela.

— Não quero incomodar.

Emmett reparou no rosto desapontado da filha.

— Você pode ficar — disse para Rosalie. — Se quiser.

Olívia olhou para ele, se mostrando satisfeita. Emmett soube que tinha acabado de fazer a coisa certa dizendo para Rosalie ficar.

Rosalie olhou brevemente em seu rosto. Sorrindo ao olhar novamente para a menina. Ambos, atentos aos relatos de Olívia sobre seu dia na escola, seguiram para dentro da casa. Nenhum dos três reparando na tristeza que a imagem do jardim representava.

 


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Notas finais do capítulo

Adoraria ler um comentário seu ;) Tenha certeza que responderei com todo cuidado e carinho.

*Se tiver interesse em ler. Deixo aqui abaixo o link de minha nova história:
https://fanfiction.com.br/historia/786179/Sempre_Em_Minha_Vida/

Obrigada por chegar até aqui.

Sill