Imagine se todos os cirurgiões tivessem o “modo machine”, que fosse possível desligar o lado humano na hora da cirurgia e fazer as escolhas rápidas, precisas e livres de sentimentalismo. Como seria terminar uma cirurgia e não sentir nada? Não sentir alivio ou culpa, alegria ou tristeza, simplesmente tirar as luvas e voltar para casa sem sensação nenhuma... Infelizmente não somos assim e temos escolhas em nossas mãos, querendo ou não sempre haverá uma escolha que temos que tomar e depois arcar com os sentimentos que elas deixaram nas nossas vidas.

Callie: - Meredith cadê minha filha? Fala logo onde ela está!

Meredith: - Ela está bem! Preciso que você mantenha a calma Callie, precisamos conversar
Torres leva as mãos a cabeça e respira fundo.

Callie: - Eu não posso me manter calma se você não diz onde está minha filha!! Você me liga no meio da noite pedindo que eu venha correndo pra cá, eu largo tudo em NY e venho, mas quando chego aqui a única coisa que sai da sua boca é “calma Callie”

Meredith: - Sofia está na minha casa agora, deve estar dormindo com meus filhos. Ela não corre nenhum perigo
O olhar de Callie para a dra Grey é fulminante.

Callie: - E o que estou fazendo aqui? Se Sofia está bem

Meredith: - O problema não é ela, é a Arizona

Callie: - Como assim? Arizona esqueceu dela na escola de novo? Ou viajou por causa de algum congresso idiota e abandonou nossa filha? Talvez ela tenha ficado muito ocupada com alguma residente

Meredith: - Não é nada disso. Arizona está internada aqui, ela sofreu um acidente muito grave. Estamos fazendo tudo o que podemos por ela, mas não podemos garantir nada
Torres arregala os olhos, ficando pálida. A ortopedista perde o chão.

Callie: - O que aconteceu? Eu... Eu não sei o que dizer

Meredith: - Pelo que soubemos ela estava com a Sofia no parque quando um carro desgovernado pegou todos de surpresa. Ela conseguiu livrar a filha de vocês, porém não teve a mesma sorte. Houveram muitos feridos e...
Callie interrompe Grey.

Callie: - Quero vê-la agora! Me diga aonde ela está

Meredith: - Tudo bem, vou te levar até ela, mas ainda precisamos conversar. É algo muito importante

Callie: - Depois Grey, por favor. Eu só preciso ver como a Arizona está
As duas médicas vão para a UTI onde Arizona está sendo mantida em coma induzido. Callie está tremendo e seus olhos ficam cheios de lágrimas ao ver a situação em que sua ex esposa se encontra. A doutora sussurra com a voz tremula.

Callie: - Ai meu Deus Arizona... Me desculpa
Ela toca na mão de Arizona e acaricia.

Callie: - Você vai sair logo daqui. Sofia precisa das duas mães dela. Por favor não desista

Meredith: - Torres temos que sair agora

Callie: - Só mais um instante

Meredith: - Callie!!
Com um beijo na testa a médica se despedi de Robbins.

Callie: - O que você tem de tão importante para conversar comigo?

Meredith: - Não sei se você está ciente, mas Arizona ainda tinha você como responsável dela

Callie: - Não, deve estar acontecendo um engano. Estamos separadas e você sabe disso

Meredith: - Eu sei. Porém isso não impediu dela deixar as decisões médicas sobre ela em suas mãos

Callie: - Deus me perdoe, mas agora eu queria matar a Arizona! Ela não tinha esse direito

Meredith: - Tinha sim, tanto que fez

Callie: - Você deve ligar para o pai dela ou a namorada

Meredith: - Ela não queria isso, ela deixou claro que seria só você a responsável, ninguém mais

Callie: - Isso é loucura! Eu não posso mais decidir pela vida dela, até porque da última vez eu fui culpada por ter causado a amputação da perna dela. Eu não vou assumir outra culpa, eu não posso de jeito nenhum

Meredith: - Entendo como sua amiga, mas como médica
Torres revira os olhos, encostando a cabeça na parede. Grey cruza os braços.

Meredith: - Ela está estável, você não precisa decidir nada por ela agora

Callie: - Você pode me garantir que ela ficará assim até quando

Meredith: - Não posso garantir
Torres caminha pelo corredor do Grey Sloan desorientada. Sua cabeça está fervendo, seu coração parece que vai parar a qualquer momento.
Ela entra na sala dos médicos e para na frente do armário de Arizona. Pega o jaleco da pediatra e pressiona contra o peito.

Callie: - Sua filha da mãe! Como você fez isso comigo Arizona? Não basta o que houve no passado você ainda me trás aqui de volta pra isso. Eu não vou suportar carregar outra culpa, ser rejeitada daquele jeito, não quero ver o desprezo no seu olhar
As lágrimas escorrem pelo rosto de Torres.

Callie: - Eu preciso ver a Sofia, preciso!

Algum tempo depois Callie chega na casa de Grey. Ela bate na porta sem parar, assustando Amelia.

Amelia: - O que está acontecendo? O mundo acabou e eu não fui avisada?
Ela abre a porta.

Callie: - Cadê a Sofia?

Amelia: - Está dormindo, ou estava, agora eu não tenho certeza, afinal você quase derrubou a casa

Callie: - Eu não estou para piadinhas agora Amelia

Amelia: - E quem aqui está brincando?
Sofia aparece sonolenta, a garota caminha lentamente até a sala.

Sofia: - Mamãe

Callie: - Meu amor! A mamãe te ama muito
Ela abraça a filha apertado.

Amelia: - Espero que só ela tenha acordado, pois vai ser um milagre fazer todos dormirem de novo

Callie: - Será que você pode nos deixar sozinhas um pouco?

Amelia: - Tudo bem, vou tentar dormir e você tenta não derrubar a casa ok?!

Callie: - Vai logo Amelia!
Torres senta com a filha e as duas conversam sobre os últimos meses, de como estava a vida dela com Arizona.

Callie: - Fala pra mamãe as novidades

Sofia: - Estava tudo bem até ontem, eu não tinha do que reclamar

Callie: - Acho que vamos precisar passar um tempo juntas em NY

Sofia: - Não! Eu gosto da minha vida aqui mãe e eu não vou abandonar minha mãe Arizona

Callie: - Claro que não vai abandonar, mas ela vai precisar de cuidados médicos e você não ter como ajudar

Sofia: - Eu posso ajudar sim, eu posso dar o meu amor e sei que isso é o bastante pra ela
A resposta da menina deixa a mãe sem palavras.

Callie: - Desculpa minha filha

Sofia: - Ela salvou minha vida e você só pensa em deixa-la

Callie: - Jamais! Eu nunca faria isso

Sofia: - Não foi isso que entendi. Mãe eu amo as duas, quero estar com as duas, mas no momento a mamãe Arizona precisa de mim

Callie: - Tenho orgulho de você
As duas trocaram olhares carinhosos e sorrisos.

Callie: - Ficarei aqui na cidade até tudo se resolver, vamos ficar juntas nessa

Sofia: - Vai ficar só por mim?

Callie: - Ah... Pela Arizona também, ela é uma boa pessoa

Sofia: - Só por isso? Você também não vai ficar por amor?
A médica respira fundo. Ela fica envergonhada, corada.

Callie: - Claro, pelo amor que sinto por você. Mas você se machucou? Fez todos os exames?

Sofia: - Hmmm... Fiz mãe, a tia Meredith cuidou de tudo

Callie: - Ótimo! Que tal irmos para casa, ou melhor, para a sua casa com a Arizona

Sofia: - Ela sempre me disse que a casa nunca deixaria de ser sua também mãe

Callie: - Que gentil da parte dela
O que a ortopedista mais quer é terminar aquela conversa. Ela pega as coisas da filha e as duas vão para casa.
Ao chegar lá a mente de Callie transborda de recordações. Ao passar pela porta por um instante seu coração parou. Naquele lugar ela viveu momentos maravilhosos e momentos ruins.

Callie: - Nossa... Não mudou quase nada

Sofia: - Mamãe Arizona diz que não precisamos mexer em nada

Callie: - Deveriam, mudar faz bem

Sofia: - Manter o que é importante também é

Callie: - De onde você tirou isso?

Sofia: - De nenhum lugar, só é o que eu acho

Callie: - Vocês tem quarto de hospede? Ou posso dormir contigo

Sofia: - Não temos, mas a senhora pode dormir no seu antigo quarto

Callie: - Não! Isso já é demais

Sofia: - Que bobagem, a mamãe Arizona não iria ligar

Callie: - Ela talvez não, eu sim
Torres olha pela brecha da porta do quarto de Arizona. Ela vê as roupas, a bagunça dos estudos e em seguida começa a lembrar dos momentos que elas tiveram juntas na cama. Ela fecha os olhos com força, coloca a mão no peito.

Callie: - O que eu estou fazendo aqui, isso é uma loucura
Ela fecha a porta. Arruma o cabelo.

Callie: - Calliope Torres se recomponha, isso é pura bobagem da sua cabeça

De volta ao hospital.

Meredith: - Alex eu não posso fazer nada nesse momento

Alex: - Você está brincando comigo Grey! Deve ter algo que você possa fazer para ela acordar

Meredith: - Eu entendo que você se preocupe, que queira o bem dela, mas entenda que a Arizona tem que reagir por conta própria

Alex: - Isso é uma piada, você nem sabe o que está fazendo

Meredith: - Pode parar por ai Alex Karev, eu não vou permitir que você venha me ofender. Sua especialidade é outra

Alex: - Eu... Eu só não consigo acreditar que ela não quer lutar

Meredith: - Nunca queremos aceitar

Alex: - A Torres já apareceu? Ela sabe a real situação?

Meredith: - Ela esteve aqui mais cedo e conversamos

Alex: - Grey o que ela disse sobre o que fazer caso a Robbins precise ser ressuscitada

Meredith: - Nada, não tocamos nesse assunto diretamente

Alex: - Que droga Meredith!!!
Karev soca a bancada que está em sua frente. Existe fúria em seu olhar.

Meredith: - Calma! Tudo vai dar certo

Alex: - Vai mesmo? Por que não é o que está parecendo. A cada minuto a Arizona piora

Meredith: - Estou dando o meu melhor, vou ficar aqui com ela

Alex: - Seu melhor não convence, pois eu estou vendo minha amiga morrer

Meredith: - Chega! Vai embora e só volte aqui quando estiver disposto a ser um homem de verdade e não um garoto imbecil que ofende as pessoas

Alex: - Vai se ferrar
Karev vai embora transtornado. Grey entra no quarto de Arizona. Ela fica próxima do leito.

Meredith: - Você precisa lutar doutora Robbins, existem pessoas esperando seu retorno. Sinto que se você partir eu possa ir junto, pois acho que o Alex me mataria aqui mesmo
Grey sorri torto.

Meredith: - Não desista, pense na sua filha. Eu já estive em momentos parecidos com esse que você está e acredite, eu tinha pelo que voltar

Dias se passaram. Arizona não reagia. Callie perdida naquela situação. Grey insistindo pela sua paciente. As coisas ficaram dando voltas em círculos e nada de novo acontecia até que...

Residente: - Chamem a doutora Grey agora! É urgente
Torres e sua filha estavam chegando para visitar Arizona, elas brincavam pelo corredor quando Grey passou correndo por elas. Torres paralisou.

Sofia: - O que houve mamãe?
Ela puxa o braço de Callie.

Sofia: - Mamãe você está me ouvindo? Mamãe?
Dentro do quarto de Arizona.

Meredith: - Comecem a massagem! Vamos Arizona, reaja, vamos
Grey pede o carrinho de parada.

Meredith: - Carrega em 200!
Torres aparece na porta.

Callie: - Para Grey. Ela não queria ser reanimada

Meredith: - Que? Não, eu posso perde-la agora

Callie: - Eu sou a responsável, então pare
Grey olha descrente para Callie. A ortopedista está em prantos, com os braços envolvendo o próprio corpo.

Callie: - Esse era o desejo dela, mesmo não sendo o meu. Para por favor...

Será que ter um botão que liga e desliga nossas emoções seria a solução? Isso evitaria que existisse um vazio dentro de nós ou só aumentaria esse buraco? Nós cirurgiões somos acusados muitas vezes de sermos frios e calculistas, mas na verdade quando encostamos nossas cabeças nos travesseiros só nós sabemos os monstros que nos assombram.