— Gira, gira, gira, gira, gira... - Brook fala incansavelmente com a cabeça encostada no meu ombro e olhando para cima enquanto eu dirigia

— O que?

— Nossa vida

— Gira?

— No mesmo ritmo

— O que isso significa?

— Que vivemos do mesmo jeito, eu acho

— E por que trazer isso à tona agora?

— Estava apenas pensando que a vida das pessoas se move como uma espiral

— Monótona?

— Sempre igual, cada canto, cada segundo, se vivêssemos o mesmo dia todos os dias iriamos mesmo notar a diferença?

— Então estamos apenas vivendo em uma espiral sem motivo nenhum?

— Talvez

— E o que acontece quando chegarmos no fim da espiral?

— Quem sabe? - ela escorrega um pouco no banco e seus cabelos se bagunçam no meu braço - Ouvi dizer que as pessoas vão pra algum lugar bem claro quando chegam no fim

— Claro? O quão claro?

— Talvez o fim seja depois da nevoa

— Mesmo? - suspiro encarando o caminho cinzento à nossa frente enquanto aqueles frio cortante machucava meu rosto - Espero que cheguemos logo então

— Eu também

O caminho a nossa frente parecia ser infinito mesmo sem um destino previamente traçado para nós, não sabíamos se encontraríamos algo indo por aquele caminho, também não tínhamos onde ir, Brook estava certa, vivíamos numa constante espiral, dormíamos, comíamos, dirigíamos e vez ou outra saíamos para andar por alguma cidade deserta com aqueles monstros escondidos por ai, eles geralmente não nos davam problemas, mas nunca se sabe quando podem decidir atacar.

— Você quer parar um pouco? - pergunto dela

— Encontrou alguma coisa?

— Apenas queria caminhas um pouco

— Certo

Retiro a chave do veículo e o deixo em uma parte qualquer da floresta, não é como se alguma coisa fosse mexer nisso de qualquer forma. Independente de quantos passos déssemos, a paisagem não parecia mudar, cinza para todo o lado, nossas roupas de mesma cor, a única coisa que me mantinha sã no meio de todas aquelas cores iguais eram os cabelos roxos de Brook, estava ficando tão cansada daquela paisagem. Andando por mais algum tempo encontramos uma pequena cidade abandonada, não haviam muitas casas, mas havia uma grande torre caindo aos pedaços.

— Acho que não vamos encontrar muita coisa interessante por aqui. - ela diz olhando em volta

— Talvez sim, mas.... algo aqui parece familiar, não parece?

— Você acha?

Caminho um pouco pela cidade e paro em frente a uma grande árvore com algumas tabuas de madeira caídas perto de seu tronco.

— Uma casa? - Brook olha para cima - Nós já..... viemos aqui em alguma missão antes? - ela aperta sua cabeça com ambas as mãos - Eu não consigo lembrar

— Quer entrar? - ela faz que sim com a cabeça e subimos as escadas com cuidado para que a madeira velha não se partisse

Ao abrir a porta nos deparamos com a sala, havia uma televisão caída no chão, as mesas e cadeiras bagunçadas e a janela suja, a cozinha, que ficava do lado esquerdo, estava completamente desorganizada, utensílios caídos por ai, comida estragada na geladeira. Do lado direto da sala haviam escadas que levavam para os quartos de cima 4 quartos e um deles era um banheiro, um deles estava com o chão recoberto de peças metálicas e ferramentas, outro estava com marcas de garras por toda a parede, além dos pedaços de madeira que tornavam quase impossível de andar descalço pelo quanto sem conseguir uma farpa no pé, e o ultimo quarto parecia o mais arrumado de todos, era apenas um quarto comum, a cama ainda bagunçada, roupas dentro do armário e uma pequena pilha de desenhos infantis de duas garotas de mãos dadas.

No fim do corredor, depois dos quartos, havia mais uma escadaria, ela levava a um grande salão com janelas grandes em cada parede, um piano velho, quadros em branco ou rasgados, tintas velhas, 3 colchões empilhados num canto e uma passagem pelo teto. Puxando a corda uma escada dobrável descia e nos permitia subir até o terraço, uma grande área aberta onde quase podíamos ver a cidade inteira, se não fosse pela nevoa.

— Já estivemos aqui antes. - digo olhando para o céu cinzento - Eu tenho certeza disso

— Eu sinto o mesmo, mas.... não consigo me lembrar de nada

Olho para os lados e vejo algumas fotos no chão a alguns passos de distancia, vou até elas e as pego.

— Achou alguma coisa? - ela me pergunta vindo até mim e ficando na ponta dos pés para ver as fotos comigo

Uma das fotos tinha um homem-leão abraçando um elfo alto de cabelos longos e brancos, outra de duas lobisomens sorrindo e abraçando uma menina humana, um homem-raposa brincando com uma das lobisomens da foto anterior junto com um menino-fada, duas bruxas fazendo posses engraçadas para a foto, e a ultima era de uma elfa de cabelos ruivos e uma vampira loira, a elfa com o braço envolta do ombro da vampira e dando um grande sorriso, enquanto a vampira apenas sorria timidamente para a câmera, a ultima foto, por algum motivo, fez meus olhos se enxerem de lagrimas.

— Audrey. - olho pra Brook e ela também estava chorando - Quem são elas?

— Eu não sei... - digo com dificuldade enquanto soluçava e chorava desesperadamente - Eu não sei....

— Eu quero me lembrar delas

— Também quero

— Elas estavam aqui? Nós estávamos aqui?

— Eu não me lembro

— Mas conhecemos elas, de alguma forma eu sei quem são

— A quanto tempo eles foram embora daqui?

— Parece ser de antes dos monstros se espalharem por Taminy

— Então..... o que será que aconteceu com todos eles depois?

Brook me abraça me fazendo deixar as fotos caírem no chão, ficamos ali por um tempo, nos abraçando e chorando alto enquanto ninguém podia nos escutar ou se quer sabia que estávamos ali, não me lembrava de quem eram aquelas pessoas, mas de alguma forma todas me pareciam familiares, não sabia se havíamos saído da espiral depois daquilo, ou se ela havia tomado outro rumo, nem mesmo sabia se algo mudaria depois disso, mas tinha certeza que, naquele pequeno momento, eu senti como se tivéssemos acabado de viver uma vida inteira.